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3.1 O Estado e as políticas públicas

3.1.1 Políticas Públicas: Perspectivas Top-Down e Bottom-Up

O estudo organizacional se tornou uma das principais preocupações da análise de políticas (FRIEDMAN, 2008). Esse interesse pelas organizações surgiu a partir dos estudos sobre sua implementação. Como as avaliações das políticas começaram a mostrar falhas do programa, o desafio era ter condições de apontar se as falhas foram resultados de uma concepção equivocada das políticas públicas ou se essas estavam bem elaboradas, mas foram mal implementadas. O foco na implementação, por sua vez, levou a um interesse pelas organizações que implementam a política. De acordo com Barzelay (2001), a separação entre a formulação de políticas e sua implementação é fundamental para as organizações (BARZELAY, 2001). As decisões tomadas pelos street-level bureaucrats4, as rotinas que eles

estabelecem e os dispositivos que inventam para lidar com as incertezas e pressões de trabalho tornam efetivas as políticas públicas que exercem. Mais geralmente, as políticas públicas são determinadas pela combinação de ações legislativas e ações das organizações de implementações e os street-level bureaucrats, que estão presentes dentro delas (LIPSKY, 2010).

Junto com as iniciativas políticas que começam no governo, há o feedback das

4 Na burocracia ao nível “de rua”, há o subconjunto de uma instituição (ou órgão) pública do governo, que contém os indivíduos que realizam e fazem cumprir as ações exigidas por leis e políticas públicas. Ela é acompanhada pela ideia de que estes indivíduos modificam os graus em que eles aplicam as normas e leis que

agências que conduzem as modificações na política e, até mesmo, as iniciativas das agências. As organizações podem ter impactos substanciais no desenho de programas públicos e no ambiente da política social fora do governo.

As influências causais nos dois sentidos criam os vínculos, que conectam a política e as organizações responsáveis por sua implementação. Estas ligações, por sua vez, dependem do comportamento das organizações. Quanto mais forte forem as ligações, mais imbricada será a análise política com a análise organizacional. Assim, a análise organizacional é um instrumento útil; muitas vezes, um componente essencial de análise de políticas.

Os elementos organizacionais surgiram dos estudos de aplicação, mas aos poucos foram elaborados em uma análise organizacional mais complexa e completa. A abordagem top-down foi uma das primeiras formas sistemáticas de análise de aplicação (as questões organizacionais desempenham papel importante nesse contexto). Ela começa com a política formulada na parte superior, partindo da política para as organizações de execução. Começando a partir do topo, sua abordagem para organizações tende a ser hierárquica.

Segundo Friedman (2006), os primeiros trabalhos realizados na perspectiva top-down foram feitos por Van Meter e Van Horn (1975) e Sabatier e Mazmanian (1979). A visão hierárquica era focada nas estruturas, tais como: os canais de comunicação e os mecanismos para controlar as organizações. Dessa forma, um dos elos entre a política e as organizações identificou as formas necessárias de discrição e os construiu na estrutura organizacional. Eles, geralmente, concluem que os tipos de controles hierárquicos vislumbrados em modelos top- down são susceptíveis de não funcionar (FRIEDMAN, 2006; SABATIER; MAZMANIAN, 1983).

A abordagem bottom-up, incluindo o trabalho sobre as burocracias de street-level, enriqueceram a compreensão das relações dentro das organizações e, em particular, a importância das camadas onde os serviços são efetivamente prestados. Segundo Friedman (2006), Richard Elmore (1978) rejeitou modelos hierárquicos, mas sugeriu vários modelos alternativos, incluindo a burocracia street-level, um modelo de desenvolvimento organizacional e um modelo de negociação de conflitos. Os modelos bottom-up também rejeitaram a ideia de que a formulação da política era prerrogativa exclusiva do processo legislativo. Michael Lipsky argumentou que as ações street-level efetivamente determinavam os aspectos importantes da política. A política deve ser formulada por meio de um processo de mapeamento para trás, em que as capacidades e os recursos dos funcionários street-level

sejam avaliados, primeiramente, com o fim de criar programas que irão genuinamente funcionar. Ou seja, ele combinou seu trabalho prévio, chamado backward mapping, com o trabalho posterior, nomeado forward mapping (LIPSKY, 2010).

Pesquisas posteriores consideraram os diferentes graus de discricionariedade ao street level e as capacidades diferenciadas, para controlá-los. Houve, também, o interesse em combinar as abordagens top-down e bottom-up: Sabatier (1986) incorporou elementos do street-level em uma estrutura top-down com os feedbacks vindos de baixo; Mazmanian e Sabatier (1989) mostraram, de maneira formal, muitas das influências cruzadas entre a política, as organizações e os resultados; e Elmore (1985) combinou seu conceito bottom-up de mapeamento passado com o mapeamento de versões posteriores, para acomodar os interesses dos principais decision-makers. Abordagens ecléticas se tornaram comuns. Resumos posteriores condensaram as abordagens de várias maneiras. Do ponto de vista da análise organizacional, as sínteses permitem isso, de uma forma ou de outra, tanto nas estruturas organizacionais bottom-up quanto nas hierárquicas, bem como na variação dos mixes das duas em situações diferentes (SABATIER; MAZMANIAN, 1983).

Embora a abordagem de street-level tenha sido importante para a compreensão das relações dentro de uma organização, outros estudos enfatizaram as relações interorganizacionais. Esta abordagem teve início com a percepção de que muitos programas governamentais são realizados por várias organizações, cada uma delas desempenha tarefas limitadas, conduzindo uma parte da implementação. Cada uma tem diferentes interesses, alguns deles, possivelmente, conflitantes. Partindo do princípio de que os conflitos são prováveis dentro das organizações, os estudos analisaram os mecanismos interorganizacionais para lidar com eles e suas implicações para a política. Segundo Friedman (2006), a pesquisa de Stoker (1989) enfatizou a importância da cooperação e identificou os regimes de implementação com maior probabilidade de eles cooperarem. Goggin (1990) enfatizou o papel do sistema de comunicações entre as várias organizações em uma estrutura que combina os elementos bottom-up e top-down. Ostrom (1998) aprofundou como as comunicações podem afetar a implementação (FRIEDMAN, 2006; GOGGIN et al., 1990; STOKER, R, 1989)

Segundo Friedman (2006), a literatura, para estudar as organizações, focou em suas competências discricionária como um desafio associado à implementação de políticas públicas. Várias respostas organizacionais e políticas a este desafio foram examinadas,

incluindo a análise das organizações, dos funcionários do street-level e das redes formadas por organizações múltiplas. A discricionariedade pode ser o desafio mais importante, mas há outros, como das informações que surgem em muitos serviços cujos resultados são complexos e difíceis de medir. Para a análise organizacional, a tarefa é identificar como as organizações respondem ao problema da informação. Elas podem fazê-lo de muitas maneiras, de modo a impactar os resultados das políticas, como o controle de qualidade das operações. Já que o governo também responde, o resultado depende da interação entre as ações governamentais e as organizacionais. As organizações implementam as políticas governamentais ao mesmo tempo que elas inovam, gerenciam diversos programas e respondem aos vários desafios. Enquanto precisam cooperar com o governo sobre os serviços que contratam com ele, elas, todavia, não agem como servos do governo. Em vez disso, organizações e governos estão entrelaçados na concepção e implementação das políticas. Reconhecer isso significa que a análise política também deve ser interligada com a análise organizacional.