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Desenho 14  História para completar 2ª sessão

3 A CONSTRUÇÃO DO PENSAMENTO E DA LINGUAGEM NA

3.6 A contribuição teórica de Henri Wallon

3.6.1 Os domínios funcionais: afetividade, ato motor, inteligência e a pessoa

experiência fez com que Wallon se dedicasse ao estudo da psicologia da criança.

Wallon percebeu no diálogo entre a psicologia e a pedagogia um campo produtivo de conhecimento. Segundo suas ideias, “a psicologia, ao construir conhecimento sobre o processo de desenvolvimento infantil, oferecia um importante instrumento para a prática pedagógica.” (GALVÃO, 1995, p. 23). Diante desse compromisso, Wallon contribuiu para os estudos em educação, pensando a criança como ser que se desenvolve integralmente.

Durante 14 anos, ele trabalhou em um Laboratório de Psicobiologia da Criança, que funcionava junto a uma escola da periferia de Paris. Essa proximidade com a escola foi o recurso perfeito para que o então psicólogo estivesse mais perto das questões da educação, participando ativamente dos debates educacionais de sua época, discordando dos métodos tradicionais de ensino. Integrou, por 30 anos, uma instituição pedagógica francesa, na qual se reunia com professores para trocar experiências e conhecer de perto os problemas do ensino primário.

Wallon viu na escola o contexto ideal para se estudar a criança de forma concreta e contextualizada. Segundo Galvão (1995, p. 39), “o estudo da criança contextualizada possibilita que se perceba que, entre os seus recursos e os de seu meio, instala-se uma dinâmica de determinações recíprocas […]”, na qual a cultura, as pessoas, a linguagem e os espaços constituem o contexto para o desenvolvimento.

A partir dessa breve contextualização da vida e percurso profissional de Wallon, destacamos alguns aspectos de sua teoria sobre a psicogênese da pessoa, que serão fundamentais para a compreensão do desenvolvimento e a construção do pensamento infantil, mais especificamente nas crianças de quatro e cinco anos, sujeitos principais dessa investigação. Dessa maneira, abordamos no presente capítulo a importância dos domínios funcionais para a construção da pessoa, os estágios do desenvolvimento propostos por Wallon ̶ em especial os estágios sensório-motor e projetivo e o personalista ̶ e analisamos a construção do pensamento e da linguagem na criança.

3.6.1 Os domínios funcionais: afetividade, ato motor, inteligência e a pessoa

O estudo dos “conjuntos funcionais”, como denomina Wallon (2007, p. 113), enfatiza a natureza completa e complexa do desenvolvimento humano, justamente porque “o desenvolvimento da criança, sobretudo nos primeiros tempos, é tão rápido que em suas diversas manifestações imbricam-se entre si […]”. Dessa forma, ele ressalta a importância de

compreendermos o desenvolvimento da criança em sua integralidade, em sua globalidade e, ao mesmo tempo, como processo singular de cada um.

Os conjuntos funcionais, como destaca Mahoney (2012, p. 17), “[…] atuam como uma unidade organizadora do processo de desenvolvimento”, que é visto como uma rede de relações, na qual se distribuem as atividades da criança em seus domínios funcionais: a afetividade, o ato motor, a inteligência e a pessoa. É nessa rede de relações que se constitui a pessoa.

Galvão (1995, p. 49) ressalta que os domínios funcionais “aparecem pouco diferenciados no início do desenvolvimento e, aos poucos, vão adquirindo independência um do outro, constituindo-se como domínios distintos” […], dessa forma, ao longo do desenvolvimento, os domínios funcionais passam por processos de diferenciação, de forma a atender às experiências, necessidades e aos novos desafios que o meio social coloca para a criança.

A afetividade, segundo Wallon (2007), é uma manifestação psíquica que acontece desde a mais tenra idade na criança. No início do desenvolvimento, ela aparece vinculada às necessidades e às primeiras manifestações de bem-estar, desconforto e mobilização do outro, sendo impossível ficar indiferente ao choro, aos risos e aos olhares de um bebê. Essas manifestações são as primeiras formas de expressão e comunicação entre bebês e adultos, que se esforçam para interpretar os apelos e as necessidades dos pequenos. De acordo com o estudioso,

As emoções, que são a exteriorização da afetividade, ensejam assim mudanças que tendem a reduzi-las. Sobre elas repousam arrebatamentos gregários que são uma forma primitiva de comunhão e de comunidade. As relações que elas tornam possíveis aguçam seus meios de expressão, fazem deles instrumentos de sociabilidade cada vez mais especializados (WALLON, 2007, p. 124).

Através do estudo das emoções, Wallon se opõe às teorias mecanicistas, que concebem as emoções como algo perturbador, desagregador sobre a atividade psíquica. Para Wallon, a emoção encontra-se na origem da consciência, é mobilizadora, une as pessoas, é dialética, “atua na passagem do mundo orgânico para o social, do plano fisiológico para o psíquico” (GALVÃO, 1995, p. 57). A emoção é atividade predominante no primeiro ano de vida da criança e constituinte da pessoa. Na verdade, a afetividade, em suas manifestações somáticas, é pura emoção. É importante mencionar que, para Wallon, emoção e afetividade não são sinônimos; as emoções são manifestações dos sujeitos, dentro de uma maior dimensão que é a afetividade.

As emoções, assim como os sentimentos e os desejos, são manifestações da vida afetiva. […] A afetividade é um conceito mais abrangente no qual se inserem várias manifestações. As emoções possuem características específicas que se distinguem de outras manifestações da afetividade. São sempre acompanhadas de alterações orgânicas […] (GALVÃO, 1995, p. 61).

As emoções são manifestações que acompanham o desenvolvimento do sujeito durante toda a vida. Wallon (2007) dá grande destaque, em sua teoria, à manifestação das emoções expressas pelas sensações corporais, variações do tônus muscular e por seu caráter contagioso. De acordo com o teórico, “à emoção compete o papel de unir os indivíduos entre si por suas reações mais orgânicas e mais íntimas, e essa confusão deve ter por conseqüência [sic] ulterior as oposições e os desdobramentos dos quais poderão gradualmente surgir as estruturas da consciência” (WALLON, 2007, p. 124).

Os movimentos, que no início do desenvolvimento são impulsivos e viscerais, passam, em resposta, as interações com o meio e com as pessoas, exercendo uma fonte de comunicação, estreitando as relações entre bebês e adultos, assim como o sorriso, “fonte puramente humana”, como destaca Wallon (2007, p. 122).

Galvão (1995, p. 61) ajuda a compreender esse exemplo clássico walloniano, destacando como a ação do meio social e a relação com o outro, através das interações, colaboram para o desenvolvimento da afetividade.

Pouco a pouco o bebê vai estabelecendo correspondência entre seus atos e os do ambiente […]. Pela ação do outro, o movimento deixa de ser somente espasmo ou descargas impulsivas e passa a ser expressão, afetividade exteriorizada. O sorriso é uma reação que exprime bem esta transformação. No início o bebê sorri sozinho, sem motivo aparente, é um sorriso fisiológico. Em seguida passa a sorrir somente na presença de pessoas, num sorriso social. Já no segundo semestre de vida distingue- se, na atividade do bebê, a presença de emoções bem diferenciadas, como alegria, perplexidade, medo, cólera.

Pela ação do bebê como ser ativo e social e nas interações que estabelece com o outro é que a emoção deixa de ser puramente orgânica e passa a ser expressão afetiva, manifestada nos gestos, no movimento, olhares, sorrisos e posturas corporais dos bebês. Wallon (2007) revela que as manifestações orgânicas e as diferentes relações interindividuais e afetivas ampliam as formas de interações.

Os fatores biológicos são estruturantes para o desenvolvimento, mas não apenas isso, somos seres organicamente sociais, como ressalta Dantas (1992b), relacionamo-nos afetivamente com o outro desde a nossa mais tenra existência e essas relações afetivas, relacionais e interacionais serão fundamentais para os progressos afetivos e da inteligência.

Conforme Wallon (2007, p. 122), as relações com as pessoas e com o contexto social “têm o poder de mobilizar reações semelhantes, complementares ou recíprocas”, possibilitando ao sujeito se constituir, crescer, participar nas relações com o outro; um desenvolvimento recíproco, que também se dá nos conflitos interpessoais e nas situações de oposição, propulsores de pleno desenvolvimento e de constituição da pessoa.

A aquisição da linguagem amplia os modos das crianças se relacionarem afetivamente e os recursos para sua expressão. A linguagem será uma marca importante no desenvolvimento afetivo e social da criança. De acordo com Galvão (1995, p. 62), “o recurso da fala e a representação mental faz com que as variações nas disposições afetivas possam ser provocadas por situações abstratas e ideias, e possam ser expressas por palavras”. Além disso, as palavras também são carregadas de afetividade, expressam sentidos próprios de cada pessoa e peculiaridades das culturas da infância. Por conseguinte, representam muito para as crianças.

Os grupos sociais dos quais as crianças participam, sobretudo nas instituições de educação e cuidado, possibilitam às crianças trocas afetivas, identificação de sentimentos e ideias. Um ambiente verdadeiramente afetivo não se restringe a cantar músicas singelas e a desenvolver projetos de valores humanos como amor, paz e felicidade. A afetividade se vivencia nas relações e nos conflitos cotidianos, nas conquistas das crianças, no respeito às suas expressões, fala e seus diferentes modos de ser e sentir.

Refletindo sobre a importância do grupo social e de um ambiente afetivo para a atividade intelectual das crianças, é preciso possibilitar experiências com seus pares, os adultos, pois fazer parte de um coletivo exerce significativa influência na construção da afetividade e na identidade das crianças.

A Roda de Conversa, assim, constitui-se como uma das possibilidades de se vivenciar a coletividade, a afetividade, na qual o outro tem um papel na construção da pessoa e no desenvolvimento da linguagem… Sobre a importância da coletividade para a construção da linguagem, Galvão (1995, p. 66) ressalta:

A atividade intelectual, que tem a linguagem como um instrumento indispensável depende do coletivo. Permitindo acesso à linguagem, podemos dizer que a emoção está na origem da atividade intelectual. Pelas interações sociais que propicia, as emoções possibilitam o acesso ao universo simbólico da cultura.

As experiências realizadas no contexto da EI, o jogo simbólico, as interações, as brincadeiras e, especialmente, a Roda de Conversa possibilitam um encontro com o outro,

“uma nutrição afetiva”, como diria Dantas (1992b, p. 90). Desse modo, para que haja uma forma requintada de comunicação afetiva na relação com as crianças, é necessário investir na qualidade afetiva das relações entre crianças-crianças e crianças-adultos no contexto da EI.

São diversas as significações do ato motor no desenvolvimento da pessoa. É importante para o desenvolvimento das crianças e tem início nas relações de exploração do mundo físico, sendo fundamental para o desenvolvimento afetivo e cognitivo.

No início do desenvolvimento, o movimento está ligado às manifestações orgânicas, às variações do tônus muscular e emocionais. No entanto, de acordo com a análise genética walloniana, o ato motor começa pela atuação sobre o meio social antes de poder modificar o meio físico. Essas dimensões do movimento só são encontradas nos seres humanos, como revela Wallon,

[…] ora pode pertencer apenas ao ambiente concreto dadas suas condições e seus fins: é o ato motor propriamente dito; ora pode tender a fins atualmente irrealizáveis ou pressupor meios que não dependem nem das circunstâncias cruas nem das capacidades motoras do sujeito: de imediatamente eficiente, o movimento se torna então técnico ou simbólico e se refere ao plano da representação do conhecimento (WALLON, 2007, p. 127).

Gradativamente, os progressos do ato motor se integram à inteligência. A criança se torna mais autônoma para agir sobre a realidade exterior, obtendo conquistas peculiares a esse momento da vida, tais como: a preensão palmar, preensão de pinça, a marcha, movimentos que representam uma grande conquista de exploração do mundo físico ao final do estágio sensório-motor e projetivo, abrindo caminho para os movimentos relacionados às imagens, os quais Wallon denomina de movimentos simbólicos ou ideomovimentos, ou seja, movimentos que contém ideias.

Assim sendo, o processo ideativo ou projetivo “[…] exterioriza-se, projeta-se, em atos, sejam eles mímicos, na fala, ou mesmo nos gestos da escrita.” (DANTAS, 1992a, p. 41). Dessa forma, o movimento acompanha a ação e expressão das crianças, conforme realça Dantas (1992a, p. 41), “Imobilize-se uma criança de dois anos que fala e gesticula e atrofia-se o seu fluxo mental”.

A partir desse importante argumento, Wallon deixa claro o quanto o movimento é importante para alimentar o pensamento. Dessa maneira, uma criança que é impedida de falar, de brincar e de se movimentar é impedida de pensar. Os movimentos simbólicos e ideomotores são comuns tanto nas brincadeiras das crianças, quanto quando conversam, contam histórias e se expressam em suas múltiplas linguagens. Assim, ao falar de um

dinossauro, a criança sente necessidade de se levantar e imitá-lo; ao falar de um leão, ruge mostrando as garras, num verdadeiro “cenário corporal”, como diria Galvão (1995).

O ato de desenhar revela a estreita relação entre o movimento e o pensamento; o movimento acompanhando o pensamento e a expressão das crianças. Assim, é comum ver as crianças procurarem diferentes posturas corporais para realizar seus desenhos, como por exemplo, deitadas em baixo da mesa, em pé, desenhando nas paredes e realizando gestos enquanto desenha. Nas palavras de Galvão (1995, p. 72), é da observação de diferentes situações que “a criança recorre ao gesto para completar a expressão do seu pensamento”. Vemos, portanto, nas atividades da criança, a transição do ato motor para o ato mental.

Processualmente, a criança vai tomando consciência da realidade externa, até então relacionada à presença dos objetos. Através das suas percepções, ampliam-se os padrões de referência da criança, que passa a ser acompanhada de condutas imitativas e elaboração do pensamento. Deteremo-nos nessas importantes conquistas mais adiante.

O domínio funcional do conhecimento (inteligência) está presente na vida dos seres humanos desde a mais tenra idade. Segundo Dantas (1992a), o início do desenvolvimento é caracterizado por uma inteligência prática ou das situações, na qual ocorre uma intensa exploração do ambiente. Nesse momento, a inteligência está voltada à construção da realidade, só que ainda indiferenciada, em que predominam as relações emocionais. A linguagem também exercerá fundamental influência no desenvolvimento da inteligência. Para Wallon (2007), o início da fala da criança traz um grande progresso para as capacidades práticas da criança, novas relações sociais e significativos progressos para a inteligência. É como ele sugere:

Mediante a linguagem, o objeto do pensamento deixa de ser exclusivamente o que, por sua presença, se impõe à percepção. Ela dá à representação das coisas que não existem mais ou que poderiam existir o meio de serem evocadas, confrontadas entre si e com o que é sentido agora. […] Superpõe aos momentos da experiência vivida o mundo dos signos, que são as referências do pensamento, num meio onde ele pode imaginar e seguir trajetórias livres, unir o que estava disjunto, separar o que tinha sido simultâneo (WALLON, 2007, p. 155).

Wallon (2007) esclarece que a substituição da coisa pelo signo também ocorre em meio a dificuldades e conflitos. A capacidade de representação que o signo ajuda a delimitar leva a criança a pensar de uma forma original. Assim, as percepções e o pensamento da criança ultrapassam as relações do campo imediato e perceptivo. A fala e a capacidade de representação serão relevantes para o desenvolvimento da criança, pois marcam uma nova relação da criança com a realidade, libertando a inteligência do campo das impressões

externas. O pensamento passa a ser representado por ideias, experiências, diferentes narrativas, imaginação e criação.

Wallon investigou as manifestações verbais do pensamento da criança com o objetivo de compreender a dinâmica do pensamento infantil. Entrevistou crianças de cinco a nove anos, falando sobre seus conhecimentos e experiências cotidianas, e constatou que o pensamento discursivo da criança é sincrético em sua origem, pois apresenta mecanismos próprios de pensar, em que os pequenos representam a realidade de forma indiferenciada e global.

Ainda segundo o teórico, “a imagem que a criança tem das coisas é dominada simultaneamente por suas tendências espontâneas ou adquiridas e pelas circunstâncias do momento” (WALLON, 2008, p. 194). O que significa que as crianças precisam ser compreendidas em suas formas singulares de pensar. Wallon (2008) denominou essa forma característica de raciocinar da criança de Pensamento Sincrético. Nas suas palavras,

As impressões que a criança deve a cada situação ou a cada objeto formam um conglomerado, onde se misturam os motivos afetivos e objetivos e suas experiências, sem que ela saiba habitualmente distinguir entre os dois. […] O fortuito muitas vezes toma o lugar do essencial, ou melhor, não existe nem essencial nem fortuito, só existe o todo vivido simultaneamente pela criança (WALLON, 2008, p. 194-195).

Aos olhos do adulto, a maneira sincrética de pensar da criança pode parecer confusa e desorganizada. É bem comum ouvirmos dos adultos que a criança é repetitiva quando fala, parece sonhar, inventar, repetir coisas. Entretanto, é preciso que professores e profissionais da EI compreendam que, no pensamento sincrético, encontram-se formas autênticas do pensamento infantil, fundamentais aos progressos da inteligência.

É necessário compreender que a dimensão afetiva é uma importante característica dessa forma de pensar, que está presente na fala, nas definições e explicações infantis sobre a realidade. Assim, como numa conversa sobre bichos, na qual Iarley20 afirma ter visto uma

cobra bem diferente: “eu já vi uma cobra lilás! A cobra existe, tia! Ela sufoca a gente! A

minha irmã já viu uma cobra e ela ficou cega!”21

20 De acordo com Kramer (2002), o “anonimato incoerente” compromete a participação das crianças como

autores das suas falas. Dessa forma, as crianças serão identificadas pelo seu primeiro nome, pois são protagonistas desta pesquisa. A utilização do primeiro nome foi autorizada pelos pais e responsáveis das crianças, conforme consta no Apêndice A.

21 Notas do diário de campo realizadas no dia 13 de setembro de 2016. As falas das crianças aparecem

No pensamento categorial, as crianças voltam sua atenção e ações para a explicação, demonstrando um nítido interesse para as ações objetivas e de explicação. Essa forma de pensar se caracteriza por uma forma diferenciada de pensamento, próxima da noção conceitual, a qual possibilitará à criança pensar nas qualidades, atributos dos objetos e elaborar definições para amortecer suas curiosidades.

Para Wallon (2007), a capacidade conceitual possibilita que as crianças definam e expliquem. Esse conhecimento permite que a criança pense a causalidade das coisas e dos acontecimentos, faça relações, comparações e generalizações. Além de gerar um momento processual, em que a parceria com o outro e as experiências concretas, significativas e desafiadoras terão grande importância para o desenvolvimento da inteligência. Wallon salienta que, nesse percurso em que o sincretismo dá lugar ao pensamento categorial, não é só a inteligência que se beneficia, mas a pessoa como um todo.

Os domínios funcionais da afetividade, do ato motor e conhecimento, como já mencionado anteriormente, agem como unidades organizadoras e estão relacionados entre si no processo de desenvolvimento. Essa integralidade resulta na constituição da pessoa única, singular e rica em possibilidades. Nas palavras de Wallon (2007, p. 198): “é contrário à natureza tratar a criança fragmentariamente. Em cada idade, ela é um todo indissociável e original. Na sucessão de suas idades, é um só e mesmo ser sujeito a metamorfoses”.

As experiências sociais e afetivas, tanto individuais como na relação eu-outro, compõem uma rede de relações, a qual estará dedicada à formação do Eu corporal e do Eu psíquico. Vejamos como essa construção ocorre no processo de desenvolvimento da pessoa.

No início da vida, o bebê está ocupado primordialmente com seu Eu corporal e reage muito pouco aos objetos do mundo físico. Não se diferencia do outro, nem mesmo no plano corporal, numa verdadeira simbiose afetiva e fisiológica, intimamente ligado às pessoas, ao ambiente e às suas manifestações emocionais. Desse modo, por volta do primeiro e segundo anos de vida, explorando os objetos e experimentando sensações corporais, táteis, sensoriais e de pleno movimento, gradualmente, a criança irá diferenciando o que pertence ao seu corpo e ao mundo exterior. Isso justifica a afirmação de Wallon (2007, p. 183) ao frisar que “o andar e o falar darão à criança centenas de oportunidades para diversificar suas relações com o meio.”

As experiências de exploração do ambiente, de reconhecimento da imagem corporal, as interações e o acentuado interesse das crianças em explorar os ambientes e o mundo a sua volta, assim como a marcha, o surgimento da linguagem e da capacidade simbólica são recursos que ampliarão as interações das crianças com o meio físico e humano.

Contribuindo para a formação do Eu corporal, da consciência corporal, importante para o processo de diferenciação eu-outro, colaborando para a formação do Eu psíquico.

Na formação do Eu psíquico, a criança, processualmente, vai tomando consciência de si, enquanto sujeito social, numa espécie de enfretamento para se individualizar e se diferenciar do outro. Esse processo ocorre em meio a alternâncias e conflitos. A construção da subjetividade é constituída por meio de reações de oposição (expulsão do outro) e, ao mesmo tempo, de sedução e imitação (assimilação do outro). Inicia- se o processo de diferenciação eu-outro. Nesse momento, é muito comum vermos as crianças