• Nenhum resultado encontrado

Os tratados internacionais e o processo penal

CAPÍTULO 3 – MODELOS INTERNACIONAL E ESTRANGEIRO SOBRE A PERDA DE

3.5 Os tratados internacionais e o processo penal

Passa-se, neste ponto, à identificação dos parâmetros internacionais surgidos no âmbito do processo penal, derivados do sistema global de proteção dos direitos humanos. A dignidade da pessoa humana está na base de todo este arcabouço normativo internacional.305

Decorrente da dignidade, o princípio da igualdade torna-se corolário lógico também no âmbito processual penal, sendo assegurado a todos o direito ao devido processo legal justo306, fundado no direito à prova, com prevalência da publicidade do procedimento e independência e imparcialidade do órgão julgador.307

303 Cf. Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948: “Art. XVII. 1. Toda pessoa tem direito à

propriedade, só ou em sociedade com outros. 2. Ninguém será arbitrariamente privado de sua propriedade.” Cf. Convenção Europeia dos Direitos do Homem, Protocolo adicional à Convenção, n° 11, 1 de novembro de 1998: “Art. 1º. Qualquer pessoa singular ou coletiva tem direito ao respeito dos seus bens. Ninguém pode ser privado do que é sua propriedade a não ser por utilidade pública e nas condições previstas pela lei e pelos princípios gerais do direito internacional. As condições precedentes entendem-se sem prejuízo do direito que os Estados possuem de pôr em vigor as leis que julguem necessárias para a regulamentação do uso dos bens, de acordo com o interesse geral, ou para assegurar o pagamento de impostos ou outras contribuições ou de multas.”

304 Cf. Convenção Americana sobre Direitos do Homem: “Art. 21º. Direito à propriedade privada. 1. Toda pessoa

tem direito ao uso e gozo dos seus bens. A lei pode subordinar esse uso e gozo ao interesse social. 2. Nenhuma pessoa pode ser privada de seus bens, salvo mediante o pagamento de indenização justa, por motivo de utilidade pública ou de interesse social e nos casos e na forma estabelecidos pela lei.”

305 “Art. I. Todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotadas de razão e consciência e

devem agir em relação umas às outras com espírito de fraternidade.” Cf. Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948.

306 Fábio Ramazzini Bechara discorre sobre o processo de internacionalização e constitucionalização da garantia

do processo justo. Cf. Cooperação jurídica internacional em matéria penal: eficácia da prova produzida no exterior. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 88-91.

307 “Art. X. Toda pessoa tem direito, em plena igualdade, a uma audiência justa e pública por parte de um

tribunal independente e imparcial, para decidir de seus direitos e deveres ou do fundamento de qualquer acusação criminal contra ele.” Cf. Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948.

O princípio da presunção de inocência foi inserido como importante parâmetro processual a partir da Declaração Universal dos Direitos Humanos.308

Desde a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, por ocasião da Revolução Francesa de 1789, esse preceito humanitário foi concebido como valor indispensável para o processo justo. Com o advento da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, a presunção de inocência consolida-se como marco normativo internacional, vinculando-se a todos os países subscritores desse acordo.309

Sobre este ponto, dispõe o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos de 1966: “Art. 14. 1. Todas as pessoas são iguais perante os tribunais e as cortes de justiça. Toda pessoa terá o direito de ser ouvida publicamente e com as devidas garantias por um tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido por lei, na apuração de qualquer acusação de caráter penal formulada contra ela ou na determinação de seus direitos e obrigações de caráter civil. A imprensa e o público poderão ser excluídos de parte ou da totalidade de um julgamento, que por motivo de moral pública, de ordem pública ou de segurança nacional em uma sociedade democrática, quer quando o interesse da vida privada das partes o exija, quer na medida em que isso seja estritamente necessário na opinião da justiça, em circunstâncias específicas, nas quais a publicidade venha a prejudicar os interesses da justiça; entretanto, qualquer sentença proferida em matéria penal ou civil deverá tornar-se pública, a menos que o interesse de menores exija procedimento oposto, ou o processo diga respeito a controvérsia matrimoniais ou á tutela de menores.”

A Convenção Europeia dos Direitos do Homem dispõe da seguinte forma: “Art. 6º. 1. Qualquer pessoa tem direito a que a sua causa seja examinada, equitativa e publicamente, num prazo razoável por um tribunal independente e imparcial, estabelecido pela lei, o qual decidirá, quer sobre a determinação dos seus direitos e obrigações de caráter civil, quer sobre o fundamento de qualquer acusação em matéria penal dirigida contra ela. O julgamento deve ser público, mas o acesso a sala de audiências pode ser proibido a imprensa ou ao público durante a totalidade ou parte do processo, quando a bem da moralidade, da ordem pública ou da segurança nacional numa sociedade democrática, quando os interesses de menores ou a proteção da vida privada das partes no processo o exigirem, ou, na medida julgada estritamente necessária pelo tribunal, quando, em circunstâncias especiais, a publicidade pudesse ser prejudicial para os interesses da justiça.”

A Convenção Americana sobre os Direitos do Homem assim dispõe: “Art. 8º. Garantias judiciais. 1. Toda pessoa tem direito a ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou para que se determinem seus direitos ou obrigações de natureza civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza. 2. Toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência enquanto não se comprove legalmente sua culpa. Durante o processo, toda pessoa tem direito, em plena igualdade, às seguintes garantias mínimas: a) direito do acusado de ser assistido gratuitamente por tradutor ou intérprete, se não compreender ou não falar o idioma do juízo ou tribunal; b) comunicação prévia e pormenorizada ao acusado da acusação formulada; c) concessão ao acusado do tempo e dos meios adequados para a preparação de sua defesa; d) direito do acusado de defender-se pessoalmente ou de ser assistido por um defensor de sua escolha e de comunicar-se, livremente e em particular, com seu defensor; e) direito irrenunciável de ser assistido por um defensor proporcionado pelo Estado, remunerado ou não, segundo a legislação interna, se o acusado não se defender ele próprio nem nomear defensor dentro do prazo estabelecido pela lei; f) direito da defesa de inquirir as testemunhas presentes no tribunal e de obter o comparecimento, como testemunhas ou peritos, de outras pessoas que possam lançar luz sobre os fatos; g) direito de não ser obrigado a depor contra si mesma, nem a declarar-se culpada; e h) direito de recorrer da sentença a juiz ou tribunal superior. 3. A confissão do acusado só é válida se feita sem coação de nenhuma natureza. 4. O acusado absolvido por sentença transitada em julgado não poderá ser submetido a novo processo pelos mesmos fatos. 5. O processo penal deve ser público, salvo no que for necessário para preservar os interesses da justiça.”

308 Cf. Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948: “Art. XI. 1. Toda pessoa acusada de um ato

delituoso tem o direito de ser presumida inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa.” Cf. Convenção Europeia dos Direitos do Homem, Art. 6º, 2. Cf. Convenção Americana sobre Direitos Humanos, Art. 8º, 2. Cf. Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos de 1966: “Art. 14, 2. Toda pessoa acusada de um delito terá direito a que se presuma sua inocência enquanto não for legalmente comprovada sua culpa.”

309 Nesse sentido, cf. Maurício Zanoide de Moraes. Presunção de inocência no processo penal brasileiro: análise

O processo penal, a partir desta nova ordem jurídica internacional, passa a ser regido com as seguintes garantias310:

a) direito do imputado de ser informado, sem demora, numa língua que compreenda e de forma minuciosa, da natureza e dos motivos da acusação contra ela formulada;

b) direito do imputado de dispor do tempo e dos meios necessários à preparação de sua defesa e a comunicar-se com defensor de sua escolha;

c) direito do imputado de ser julgado sem dilações indevidas;

d) direito do imputado de estar presente no julgamento e de defender-se pessoalmente ou por intermédio de defensor de sua escolha; de ser informado, caso não tenha defensor, do direito que lhe assiste de tê-lo e, sempre que o interesse da justiça assim exija, de ter um defensor nomeado gratuitamente, se não tiver meios para remunerá-lo;

e) direito do imputado de interrogar ou fazer interrogar as testemunhas da acusação e de obter o comparecimento e o interrogatório das testemunhas de defesa nas mesmas condições de que dispõe as de acusação;

f) direito do imputado de ser assistido gratuitamente por um intérprete, caso não compreenda ou não fale a língua empregada durante o julgamento;

g) direito do imputado de não ser obrigado a depor contra si mesmo, nem a confessar- se culpado;

h) direito do imputado de, após sofrer condenação, recorrer a outra instância311;

i) direito do imputado de não ser processado ou punido por um delito pelo qual já foi absolvido ou condenado por sentença definitiva.312

Documentos relacionados