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Pistas para outras cartografias

Mergulhamos no plano da cartografia permitindo-nos afetar e deixarmo-nos afetar nos encontros com as pessoas em situação de rua, com seus processos de subjetivação e suas afecções do corpo: necessidades, alegrias, tristezas, angústias, desejo e multiplicidade de devires. Nesse sentido, os processos de subjetivação das pessoas em situação de rua expressam afecções e a tradução das nossas afetações, segmentaridades e singularizações acerca dos modos de viver, de pensar, de amar, de odiar, de inventar e reinventar-se, que não se restringem só ao campo das ideias, mas também constituem ações, efeitos da produção desse modo de existência (GUATTARI; ROLNIK, 2010).

Cientes da amplitude da problemática e dos desafios enfrentados tanto por parte das pessoas em situação de rua quanto pelas profissionais da rede de assistência social e da rede de saúde, não empreendemos, neste estudo, uma análise das políticas e da efetivação dessas políticas nos estabelecimentos: Centro Pop, CAPS, Consultório na Rua. Permitimo-nos acom- panhar e compor o movimento Pop Rua e apresentar a análise dos resultados da cartografia diurna, haja vista a publicação da maior parte dos resultados da cartografia noturna em um artigo denominado “Modos de viver e fazer arte das pessoas em situação de rua” (FÉLIX-SILVA et al., 2016).

Cartografamos ao longo do processo situações nas quais emergiram problematizações, por parte da população em situação de rua, referentes às relações de poder que, de acordo com as necessidades e as possibilidades, se estabelecem na rua e nos serviços que compõem a rede. Essas provocações acabam por gerar desconfortos e também modificações, inclusive entre as pessoas em situações de rua e nas práticas de profissionais

que deixam de usar equipamentos, como bafômetros e medidas de suspensão, ensaiando mediação de conflitos entre as pessoas que fazem uso do Albergue Municipal.

Durante a pesquisa, contribuímos com os questiona- mentos, as reflexões e as inquietações da população em situação de rua. Dessa forma, nos sustentamos no acompanhamento e suporte das atividades e ações que envolviam o movimento Pop Rua.

Nas cartografias diurnas e noturnas, mapeamos desejos, necessidades e vontades que levam cada pessoa a viver em situação de rua: arte de viver uma vida nômade; arte de viver da arte; trabalho; espera para ter acesso à saúde; tempo para ter acesso a audiências; tempo para ter acesso a emprego; tempo para ter acesso ao Benefício de Prestação Continuada (BPC); tempo para ter acesso a auxílio-doença; recurso para retornar à cidade de origem; além das já citadas em outras pesquisas: fragilização dos vínculos familiares, perda parental, conflito com a Lei, inadequação legal no país e uso de substâncias psicoativas.

As pessoas que vivem em situação de rua projetam o desejo de viver numa casa, conseguir trabalho e renda, ter acesso à terra, à saúde, à educação escolar, à arte, a áreas de lazer e à amorosidade. Ao devir grupalidade, movimento Pop Rua, essas pessoas lutam pela efetivação das políticas de assis- tência social e de atenção à saúde e apostam na felicidade desde uma perspectiva ético-estético-política.

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