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Premissas da escolha, os países selecionados e uma caracterização geral

2. SISTEMA NACIONAL DE INOVAÇÃO E A VERTENTE AGRÍCOLA: TEORIA E

3.1. Premissas da escolha, os países selecionados e uma caracterização geral

Considerando a impossibilidade de o estudo contemplar o exame dos principais serviços de extensão rural e de pesquisa agrícola existentes num grande número de países, em face também da existência de fortes assimetrias entre eles, o que produziria um volume considerável de informações, números e análises, entre outros, optou-se por trabalhar com uma amostra de cinco países, incluindo-se o Brasil (tema do Capítulo 5).

Para tanto, referenciou-se a escolha à aderência de cada país a um conjunto de premissas que refletisse a importância da agricultura para o desenvolvimento de cada um

deles, assim como de elementos constituidores de um sistema de apoio à inovação agrícola, com destaque para o serviço de ATER.

A primeira das premissas considerada na seleção da amostra dos países está ligada à presença de um setor agrícola com importância econômica e/ou estratégica, caracterizado como um vetor relevante para o processo de desenvolvimento daquele país. A segunda premissa considerou o grau de integração da agricultura na economia, expresso pela presença de cadeias de valor, denotando encadeamentos da produção agrícola com o setor agroindustrial, demonstração de uma certa maturidade e robustez da economia agrícola. A terceira premissa privilegiou a ocorrência de serviços de pesquisa agrícola e de assistência técnica e extensão rural com algum grau de tradição e maturidade. Uma quarta premissa identificou como relevante a presença de elementos relacionados diretamente ao perfil do setor agrícola de cada país que guardassem alguma articulação com a concepção teórica dos Sistemas Nacionais de Inovação, aspecto essencial para os objetivos deste estudo. A quinta premissa entendeu adequado considerar importante a presença do segmento caracterizado como agricultura de base familiar, articulado ou não com segmentos de agricultura empresarial, na realidade agrícola do país selecionado. A sexta e última premissa, a rigor, uma recomendação, sugeriu que a localização espacial dos países, observadas as recomendações anteriores, fosse a mais diversificada possível, buscando-se, assim, capturar eventuais elementos positivos oriundos das distintas realidades socioambientais e econômicas.

Desse modo, seguindo as orientações estabelecidas no conjunto das premissas discutidas anteriormente e compatibilizadas com os propósitos deste estudo, os países selecionados foram Argentina, Estados Unidos, França e África do Sul.

Uma breve caracterização geral dos países selecionados demonstra que os Estados Unidos se colocam como o país de maior superfície total e também de maior área colhida com cereais em 2013, sendo seguidos, em ambas as situações, por Brasil, Argentina, África do Sul e França. Cabe destacar que a área colhida com cereais nos Estados Unidos em 2013 foi superior em mais de 14 milhões de hectares à soma das áreas colhidas dos demais países.

Quanto à população, os Estados Unidos também despontam como o país mais populoso dentre aqueles selecionados, com mais de 316 milhões de habitantes, ficando a Argentina em último lugar com mais de 41 milhões de pessoas (Tabela 1). O importante dessa informação é notar que os Estados Unidos, embora possuam a maior população dos países aqui selecionados, é também o país que possui, proporcionalmente, a menor participação da PEA-Agrícola na PEA Total (FAO, 2013).

Tabela 1- Superfície, População, Área total colhida com cereais, proporção da área total colhida com cereais na superfície total do país e IDH dos países selecionados

MACRO INDICADORES ARGENTINA BRASIL FRANÇA ÁFRICA DO

SUL

ESTADOS UNIDOS Superfície do país em 1000 ha. (1) 278.040 851.577 54.909,1 121.909 983.151 População em 1000 hab. (2) 41.446,2 200.361,9 65.939,8 53.157,4 316.128,8 Taxa alfabetização adultos /Pop.

Total (3) 97,91 91,33 - 93,72 -

Área total colhida c/ cereais em

1000 ha. (4) 10.962 20.906,1 9.544,1 3.992,8 59.472,6 Índice de Desenvolvimento

Humano (IDH) (5) 0,808 0,744 0,884 0,658 0,914

Fontes: (1)(2) World Bank (2013); (3) World Bank (2012); (4) FAOSTAT. 2013; e (5) Pnud /ONU- 2013 (Disponível

em:<http://www.pnud.org.br/atlas/ranking/Ranking-IDH-Global-2013.aspx.FAOSTAT).

Outra informação relevante, para os propósitos desta tese, trazida pela Tabela 1 diz respeito à taxa de alfabetização de pessoas com 15 anos ou mais, indicador no qual o Brasil aparece, em 2012, como o país de menor taxa dentre os países selecionados. Admitindo-se que essa situação é ainda mais grave no meio rural, tem-se, assim, a presença de um elemento condicionante importante da adoção de inovações na especialmente na agricultura brasileira.62

Uma tentativa da aferição da qualidade de vida nos países selecionados é mensurada pelo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), índice que demonstra o posicionamento líder dos Estados Unidos, seguidos pela França, Argentina, Brasil e África do Sul (Tabela 1). Visto por outro ângulo, é curioso notar que os três últimos países na escala do IDH, Argentina, Brasil e África do Sul, são exatamente aqueles nos quais a agricultura tem o maior peso da economia, ao se analisar a relação PIB agrícola / PIB total (Tabela 2).

Quanto à relevância da economia agrícola, os quatro países selecionados, acrescidos ao Brasil, possuem um peso expressivo no cenário da agricultura global, representando, em 2013, aproximadamente 20% do PIB agrícola mundial (Tabela 2).

62 Segundo dados do Censo 2010, a taxa de analfabetismo alcançou 28% nos municípios com até 50 mil habitantes na região do Nordeste brasileiro. (Disponível em:< http://www.censo2010.ibge.gov.br/pt/noticias- censo?view=noticia&id=3&idnoticia=2019&busca=1&t=indicadoressociais-municipais-2010-incidencia- pobreza-maior-municipios-porte-medio>.Acesso em: 31 maio 2015.

Tabela 2 - PIB Total, PIB Agrícola e participação do PIB Agrícola no PIB Total no mundo e nos países selecionados (em US$ correntes)

PAÍSES

PIB Total (US$ bilhão)

2013

PIB-A (¹) / PIB Total (%) (2010-2013) (²) PIB-A (US$ bilhão) 2013 Argentina 609,89 7,5 45,74 Brasil 2.245,67 5,4 121,27 França 2.806,43 1,8 50,52 África do Sul 366,06 2,5 9,15 E. Unidos 16.768,10 1,3 217,99 MUNDO 75.621,86 3,1 2.344,28

(¹) PIB -A = PIB Agrícola;

(²) Para os E. Unidos e Mundo, considerou-se média do período:2010-2012

Fonte: World Bank e estimativas do autor.

Embora constate-se que a participação do PIB agrícola no PIB total dos países selecionados apresente contribuição bem inferior, relativamente aos seus respectivos setores industrial e de serviços, além de comportamento levemente decrescente no período de 2000 a 2013 (Gráfico 1), a FAO (2013) estima que um terço da população do mundo obtenha sua sobrevivência da atividade agrícola.63

Gráfico 1 - Participação (%) do PIB Agrícola no PIB Total dos países selecionados, 2000 a 2013

Fonte: World Bank (2015).

63 Utilizando-se o conceito de "Agronegócio", cunhado por Davis e Goldberg (1957) e Goldberg (1968), o PIB do agronegócio do Brasil, por exemplo, participou com 22% do PIB total, em 2013, valor bem superior aos 5,4% da Tabela 2. Dados sobre o agronegócio brasileiro, disponíveis em: <http://cepea.esalq.usp. br/pib>. Acesso em: 31 mai. 2015.

Ainda no plano interno aos países selecionados, na média 2010-2013, a Argentina é o país cuja contribuição da agricultura na formação do PIB tem sido bem superior à dos demais, sendo quase 40% superior à contribuição do Brasil, que é o segundo colocado. Os Estados Unidos, embora tenham apresentado no período 2010- 2013 a menor contribuição relativa média, é aquele em que a estimativa do valor absoluto do PIB agrícola foi a mais destacada para 2013, representando quase que a soma do PIB agrícola dos demais países selecionados.

Ademais, não se pode deixar de considerar que esses números do PIB agrícola e PIB total possuem uma relação direta com o grau de desenvolvimento dos setores industrial e de serviços do país. Em certo sentido, os Estados Unidos e a França, países tradicionalmente mais desenvolvidos, possuem economias mais modernas e diversificadas, nas quais o setor agrícola, contabilizado apenas como o setor primário, é um dos grandes indutores da dinâmica econômica, produzindo ligações e articulações a montante e a jusante com os demais setores, dando a falsa impressão de ser um setor de pequena dimensão e gerador de poucos empregos.

Um outro movimento importante constatado ao se observar a caracterização geral da agricultura dos países selecionados é o crescimento da participação relativa feminina na PEA agrícola na Argentina, no Brasil e nos Estados Unidos.64 Saliente-se que, embora a França e a África do Sul não apresentem as mesmas tendências de crescimento dos outros três países, a participação feminina desses dois países na PEA agrícola é a mais expressiva entre todos os selecionados ao longo das mesmas três últimas décadas. Tendências dessa natureza devem, seguramente, fazer parte das novas estratégias dos serviços de extensão e de pesquisa, outrora marcadas pela presença masculina majoritária.

Nesse quadro geral e introdutório, é possível perceber em países como Brasil, Argentina e África do Sul, a presença marcante de uma agricultura de dupla face: uma avançada, competitiva e uma outra, pouco tecnificada e de base familiar, constituída por um contingente expressivo de pessoas e de estabelecimentos agropecuários, cujo atendimento da demanda por serviços de pesquisa agrícola e de extensão rural de qualidade, dentre outros, parece urgente e estratégico.

3.2. Pesquisa agrícola e extensão rural nos países selecionados: evolução e configuração