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Protestos urbanos

No documento Giane Alvares Ambrosio Alvares (páginas 117-119)

5 PROCESSO PENAL, DIREITO AO PROTESTO E DEMOCRACIA

5.3 Movimentos sociais e protestos no Brasil: violência e repressão no meio rural e urbano

5.3.2 Protestos urbanos

No mês de junho de 2013, ocorreram no Brasil diversos atos de protesto. Essas manifestações, organizadas pelo Movimento Passe Livre (MPL), inicialmente contestavam o aumento dos preços das tarifas de transporte público e depois, com a adesão de diversos setores da sociedade, passaram a postular por uma vasta gama de direitos. A partir daí, os protestos espalharam-se por diversas cidades do país417.

Conforme estudo apresentado pela organização Artigo 19, no transcorrer do ano de 2013, aconteceram no país 696 protestos, com 15 manifestações reunindo mais de 50 mil participantes. Aponta-se que, em razão da intensificação das mobilizações, intensificaram-se também as ações repressivas do Estado contra os atos de protesto e seus participantes. Nesse aspecto, no ano de 2013, 16 manifestações tiveram mais de 16 feridos por ação da polícia, 112 casos de uso de armas menos letais, 10 usos de arma de fogo, 837 pessoas feridas, 2608 pessoas presas, 117 jornalistas agredidos ou feridos e 10 jornalistas presos418.

No levantamento realizado sobre os protestos ocorridos nos estados de São Paulo e Rio de Janeiro, incluindo o ano de 2014 até junho de 2015, consta a ocorrência de 740 protestos, além de manifestações emblemáticas em outros estados da federação. Incluem-se nesse cenário novas mobilizações contra o aumento das tarifas de transporte público no início de 2014 e de 2015, protestos contra a realização da Copa do Mundo em 2014419, grandes protestos de oposição

ao novo governo eleito em 2015, protestos em torno do direito de moradia e mobilizações realizadas pela categoria dos professores no Estado do Paraná em 2015420.

Nesse lapso temporal, de 2014 até junho de 2015, foram apontados dados a respeito dos casos de violência contra os manifestantes e de violação ao direito de protesto, envolvendo abuso de autoridade, desproporcionalidade no uso

416 AFONSO, José Batista Gonçalves. A difícil luta para punir os responsáveis pelos crimes no campo. IN: CANUTO, Antônio et al. (Coords.) Conflitos no campo – Brasil 2013. Goiânia: Comissão Pastoral da Terra, 2013, p.117.

417 ARTIGO 19. Protestos no Brasil 2013. São Paulo: Artigo 19, 2014, p.18-20. 418 ARTIGO 19. Protestos no Brasil 2013. São Paulo: Artigo 19, 2014, p. 28.

419 Não foram registrados no país protestos contra a Copa do Mundo com mais de 10 mil participantes. 420 ARTIGO 19. As ruas sob ataque: protestos 2014 e 2015. São Paulo: Artigo 19, 2015, p.14-21.

da força policial, falta de identificação dos policiais421, prisão de 849 pessoas422, utilização de armas menos letais de maneira abusiva e sem regulação dos procedimentos423 e utilização de armas letais424.

As ações de violência praticadas por manifestantes Black Blocs425 foram bastante presentes nos protestos de 2013, mas, segundo o levantamento apresentado nesta pesquisa, nos anos de 2014 e 2015 foi menos utilizada. Apesar disso, manifestações ocorridas nesse período sofreram restrições por parte do Estado ante o argumento de que haveria Black Blocs cometendo crimes426.

Destaca-se no relatório que em 2015 dois policiais militares do Rio de Janeiro foram condenados por terem forjado, no contexto de uma manifestação ocorrida em 2013, um flagrante de porte de morteiro contra um adolescente427.

No final do ano de 2015, em meio a discussões sobre o projeto do Governo do Estado de São Paulo que tinha por objetivo promover reorganização escolar428 com fechamento de instituições de ensino, estudantes secundaristas protagonizaram atos de protesto com a ocupação de aproximadamente 200 escolas429. Em decisão proferida nos autos de agravo de instrumento apresentado pelo Estado de São Paulo contra decisão que indeferiu a reintegração de posse das escolas ocupadas, o Tribunal de Justiça de São Paulo manifestou que o inconformismo se mostrava inadmissível por não se vislumbrar presente a intenção de despojar o Estado da posse dos bens públicos em questão430.

421Destaca-se no relatório dos anos de 2014 e 2015 que em diversas manifestações, como na ocorrida em São Paulo no dia 26 de janeiro de 2014, policiais da tropa de choque não usavam identificação em suas vestimentas. 422ARTIGO 19. As ruas sob ataque: protestos 2014 e 2015. São Paulo: Artigo 19, 2015, p.31.

423ARTIGO 19. As ruas sob ataque: protestos 2014 e 2015. São Paulo: Artigo 19, 2015, p.38. Consta no relatório que nos protestos protagonizados por professores no Paraná, segundo dados fornecidos pela polícia militar foram utilizadas 2.323 balas de borracha e 1094 granadas de efeito moral, o que resultou em 213 manifestantes feridos, esse último dado de acordo com informações da prefeitura de Curitiba.

424Em São Paulo, um manifestante foi ferido por dois disparos de arma de fogo no contexto de um protesto ocorrido no dia 25 de janeiro de 2014, no bairro de Higienópolis. (ARTIGO 19. As ruas sob ataque: protestos 2014 e 2015. São Paulo: Artigo 19, 2015, p.44).

425Como assinalado por Ilse Scherer-Warren, influenciados por lutas realizadas no plano mundial contra a globalização econômica, os grupos Black Blocs (BB) surgem no Brasil no início dos anos 2000, com a participação de pequenos grupos de ativistas, realizando ações de bloqueio nas cidades de São Paulo e Porto Alegre. (SCHERER-WARRER, Ilse. Dos movimentos sociais às manifestações de rua: o ativismo brasileiro no século XXI. Revista Política e Sociedade. v.13, nº28, set.-dez.2014. Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina, 2014, p.25.)

426ARTIGO 19. As ruas sob ataque: protestos 2014 e 2015. São Paulo: Artigo 19, 2015, p.21. 427ARTIGO 19. As ruas sob ataque: protestos 2014 e 2015. São Paulo: Artigo 19, 2015, p.33.

428Regulamentado pelo Decreto nº61.672, de 30 de novembro de 2015, depois revogado por meio do Decreto n°61.692, de 4 de dezembro de 2015.

429De acordo com notícia veiculada no jornal “O Estado de S.Paulo”. Disponível em: <http://educacao.estadao.com.br/noticias/geral,apos-42-dias--estudantes-deixam-a-1-escola-

ocupada,10000005471>. Acesso em 28.dez.2015.

Além disso, destaca-se da declaração de voto vencedor, o entendimento de que

Não é com essa “postura de criminalizar e “satanizar” os movimentos sociais e reivindicatórios legítimos que o Estado Brasileiro alcançará os valores abrigados na Constituição Federal, a saber, a construção de uma sociedade justa, ética e pluralista, no qual a igualdade entre os homens e a dignidade de todos os cidadãos deixe de ser uma retórica vazia para se concretizar plenamente.431

Segundo a decisão, o Estado está vinculado aos vetores da Constituição da República de 1988, dentre os quais “o respeito à dignidade humana, o pluralismo, e à gestão democrática das políticas públicas, no interior de um Estado Democrático e Social de Direito e de um regime político que se estruturou como democracia participativa” 432.

No documento Giane Alvares Ambrosio Alvares (páginas 117-119)