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2.1 Os Tempos Modernos e o Advento do Humanismo Antropocêntrico

2.1.2 A Era das Revoluções Francesa e Inglesa

As revoluções inglesa e francesa são importantes para se compreender a caracterização dessa época como de muitas guerras religiosas que influenciaram na secularização do poder.

Na França, quando em 1560 Carlos IX assumiu o trono, na verdade era sua mãe Catarina de Médicis, mulher de Henrique II (morto subitamente em decorrência de um torneio), quem governava. Ela tentou implantar uma política de tolerância e conciliação entre católicos e protestantes, dando sua filha Margarida de

163 DE CICCO, Claudio. História do pensamento jurídico e da filosofia do direito; 6ª ed., São Paulo: Saraiva, 2012, p. 146.

Valois, católica, em casamento a Henrique de Bourbon, huguenote (protestante), que se tornou o segundo na sucessão da França.164

Com a morte de Carlos IX subiu ao trono seu irmão Henrique III, tido

como um devasso e governante incapaz. 165

O povo, entretanto, era simpático da Santa Liga Católica, movimento de oposição aos huguenotes, chefiado por Henrique de Guise, cujo pai havia sido assassinado pelos huguenotes, e que era extremamente estimado em toda a França.

Configurava-se assim a disputa pelo trono entre três Henriques: Henrique III, irmão de Catarina e rei à época, tido como um devasso e incapaz; Henrique de Bourbon, o huguenote, e Henrique de Guise, católico.166

O desfecho do embate se deu com o assassinato de Henrique de Guise e de Henrique III por Henrique de Bourbon que se tornou o herdeiro do trono. Mas sua condição de huguenote não permitia a assunção do trono do Reino católico:

Foi então que o bearnês “abjurou de seu credo protestante” e se tornou o Rei Henrique, quarto desse nome. Atribui-se a ele, nessa ocasião, a célebre frase: “Paris vaut bien une messe” – que significa o oportunismo de sua conversão. (“Paris vale bem uma missa”). Em 13 de abril de 1598, Henrique IV promulgou o Édito de Nantes, ou “da tolerância”, igualando católicos e protestantes e concedendo a estes cargos e cidades fortificadas, como La Rochelle, por exemplo.167

La Rochelle, uma cidade fortificada, apoiada pela Inglaterra e Holanda, tornou-se um Estado huguenote dentro de outro Estado, contra o qual se ergueu o então bispo Richelieu, que, por meio de suas posições e discurso conseguiu a confiança do rei Luís XIII e combateu navios ingleses para tomar a cidade, mantendo entretanto, a norma de tolerância, o Édito de Nantes.

Entremeios, a nobreza francesa armou um complô contra o rei para depô- lo e levar ao trono seu irmão Gastão de Orléans que os atenderia, mas Richelieu foi informado do golpe e agiu rapidamente para prendê-los e condená-los à morte.

164 DE CICCO, Claudio. História do pensamento jurídico e da filosofia do direito; 6ª ed., São Paulo: Saraiva, 2012, p. 150.

165 DE CICCO, Claudio. História do pensamento jurídico e da filosofia do direito; 6ª ed., São Paulo: Saraiva, 2012, p. 150.

166 DE CICCO, Claudio. História do pensamento jurídico e da filosofia do direito; 6ª ed., São Paulo: Saraiva, 2012, p. 150.

167 DE CICCO, Claudio. História do pensamento jurídico e da filosofia do direito; 6ª ed., São Paulo: Saraiva, 2012, p. 151.

Assim se fortalecia a monarquia. Richelieu queria levar a França a ser o “fiel da balança” na Europa, motivo pelo qual lutou na Guerra dos Trinta Anos168 a favor das

nações protestantes.169

O cardeal Richelieu construiu o caminho para o reinado do monarca absoluto Luís XIV, que acabou merecendo o título de “Rei Sol”. O rei se aliou à nobreza feudal já bastante reduzida. Revogou o Édito de Nantes, o que provocou novas guerras religiosas colocando de um lado nações protestantes e, de outro, católicas. Vencendo os protestantes ganhou as Antilhas e São Domingos na América e triunfou na Guerra de Sucessão na Espanha, colocando ali seu neto Felipe D´Anjou. Assim o século XVII ficou conhecido como o Século de Luis XIV.

Entretanto, havia uma tensão crescente entre as estruturas políticas conservadoras e os pensadores iluministas. O conflito entre uma sociedade feudal e católica e as novas forças de vertente protestante e mercantil irá culminar na Revolução Francesa.

O ressentimento do povo francês contra a política fiscal, a indiferença e decadência da aristocracia se uniu aos ideais iluministas que, juntos, alimentaram sentimentos radicais, fazendo eclodir a revolução em 1789.

Em consequência, a monarquia absolutista que tinha governado a nação durante séculos entrou em colapso em apenas três anos. Por sua vez, a sociedade francesa passou por uma tremenda transformação quando privilégios feudais, aristocráticos e religiosos ruíram sob um ataque sustentado de grupos políticos radicais de esquerda.

Antigos ideais da tradição e da hierarquia de monarcas, aristocratas e da Igreja Católica foram subitamente derrubados pelos novos princípios de Liberté,

Égalité e Fraternité.

Aproximadamente um século antes, na Inglaterra, o trono foi tomado pelo líder dos puritanos, seita protestante radical, Oliver Cromwell, que acabou com o Parlamento e se tornou ditador, repelindo investidas de monarcas irlandeses e escoceses com mão de ferro. A família real inglesa se refugiou na corte francesa.

168 A Guerra dos Trinta Anos decorreu entre 1618-1648 e assim foi denominada por conta de uma série de guerras travadas entre nações europeias por rivalidades religiosas, dinásticas, territoriais e comerciais.

169 DE CICCO, Claudio. História do pensamento jurídico e da filosofia do direito; 6ª ed., São Paulo: Saraiva, 2012, p. 153.

Nesse cenário surge a concepção de Estado forte de Thomas Hobbes (1588-1679), o Leviatã, para aplacar a ferocidade humana, pois em sua concepção “o homem é o lobo do homem” em total oposição ao pensamento aristotélico de bondade natural em sociedade.

A grande novidade de Hobbes é que o Estado Leviatã seria formado por um consenso entre os governados, que renunciariam a sua liberdade natural aceitando o governo totalitário, governo este que abarcaria tanto a totalidade do poder civil, como do religioso.

Após a morte de Cromwell em 1658 a monarquia foi reinstaurada com Carlos II.

Em 1688, pela Declaração dos Direitos (Bill of Rights), punha-se fim à ditadura e determinava-se a tolerância religiosa. Entretanto, para evitar sobressaltos puritanos, o Parlamento determinara que nunca pudesse ser rei da Inglaterra um católico. Com isso garantia-se a sobrevivência da Igreja Anglicana, sem ceder aos radicalismos.

Insatisfeitos, muitos puritanos passaram a emigrar para as colônias inglesas da América do Norte.

Nesse período começou a ser colocada em prática a concepção de divisão dos poderes do Estado com John Locke (1632-1704), passando o Parlamento a exercer a função legislativa e o Primeiro-Ministro, escolhido pelo Legislativo, a executiva.

Mais tarde Montesquieu conceberia a divisão do Estado em Três Poderes Autônomos, acrescendo aos outros dois, o Judiciário.

Era a época do Iluminismo iniciada entre o final do século XVII e começo do século XVIII, decorrida até a época das guerras napoleônicas (1804-1815).

Como se vê, a era das revoluções francesa e inglesa provocou a separação entre a autoridade da Igreja e o poder dos reis absolutistas, que outorgaram a si próprios a soberania, independente de Deus: “O Estado sou eu”, disse Luis XIV.

E, posteriormente, ocasionou a concepção do poder de governo originado no povo e não mais no próprio soberano.