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2 REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 Cenário da Gestão Ambiental Contemporânea

2.1.2 Sustentabilidade e responsabilidade socioambiental

Imersos num mundo com uma cultura de que tudo deve ser descartado, rapidamente substituído, e num cenário onde o valor humano é equiparado ao seu poder de compra, os indivíduos são submetidos a refletir sobre o conceito de sustentabilidade. Assim, compreender a sustentabilidade a partir da cultura de consumo e sem fronteiras é como nadar num oceano de tubarões e não ser engolido por eles. Isto é, a partir do mundo pós-moderno, discutir a sustentabilidade do desenvolvimento.

A partir do momento que a sustentabilidade passa a ser discutida, integrada com o desenvolvimento, o Estado assume um papel essencial de orientar e acompanhar os efeitos do desenvolvimento. Por isso, a importância da ressignificação do papel do Estado, que deve assumir responsabilidade que extrapola a punição, ou seja, a legislação, para atuar como um impulsionador de pesquisas, de métodos e de práticas que beneficiem os diversos atores sociais, entre eles os cidadãos.

Numa sociedade democrática, dois poderes precisam legislar conjuntamente, o Estado e os atores sociais. Só com a sinergia entre estes é que se pode promover desenvolvimento sustentável. Nesse sentido, Quintas (2006, p. 9) advoga: “Afinal, não é possível visualizarmos, numa sociedade democrática, a prática da gestão ambiental sem a presença do Estado e da sociedade civil”.

A sustentabilidade deve ser discutida a partir da compreensão de que a continuidade de existência do conjunto de riquezas naturais está condicionada à ação humana, e, portanto, às alterações em função da propriedade. Leff (2008, p. 31) adverte:

O princípio da sustentabilidade surge como uma resposta à fratura da razão modernizada e como uma condição para construir uma nova racionalidade produtiva, fundada no potencial ecológico e em novos sentidos de civilização a partir da diversidade cultural do gênero humano.

A discussão sobre sustentabilidade e responsabilidade socioambiental é evidenciada a partir do modelo de vida instaurado.

A preocupação da sociedade com a sustentabilidade ambiental está atrelada aos eventos naturais de destruição, assim como a escassez de recursos naturais. Ou seja, é uma preocupação reativa sobre os dados que a questão ambiental pode gerar para as pessoas e não uma preocupação em função de consciência de mérito. Por isso, Veiga (2006, p. 17) afirma que: “O que não falta, portanto, são advertências históricas sobre a possibilidade de colapso provocado por danos ao meio ambiente”. Isso reforça a necessidade do poder público agir enquanto mediador de diálogo e reflexão com os diversos atores sociais.

Os conceitos de sustentabilidade e de responsabilidade socioambiental não devem ser discutidos sob a perspectiva da racionalidade mecanicista, muito menos sob uma valorização de curto prazo, mas, a partir dos limites ambientais e da sobrevivência humana. É importante que estes conceitos extrapolem a ingenuidade e os modismos, e recebam legitimidade social em busca de melhorias de produção e de gestão social, promovendo assim, uma integração política, econômica e social em busca do crescimento econômico a partir da preservação ambiental.

A percepção do que é sustentável deve estar vinculada ao valor do ser humano e do respeito que lhe é devido. Assim, para Leff (2008), o discurso acerca deste conceito deve buscar reconciliar os contrários da dialética do desenvolvimento: o crescimento econômico e o meio ambiente.

A sustentabilidade é um conceito recente que invade a academia e as instâncias de poder porque a sociedade passou a se preocupar com a manutenção e existência de recursos naturais que garanta um ambiente propício às gerações futuras. Segundo Silva e Mendes (2005, p. 13), “O foco principal, ao se discursar e se preocupar com a sustentabilidade, está na vinculação do tema ao lugar a que se pretende chegar”. Dessa forma, sustentabilidade está diretamente relacionada à continuidade e dignidade da vida humana. Implementar ações de responsabilidade socioambiental é um desafio para os gestores, pois precisa conciliar os desejos humanos oriundos do sistema de vida capitalista adotado, e, em contrapartida a preservação do meio ambiente.

O conceito surge para promover uma ressignificação do modelo de vida imposto pelo sistema capitalista e pela globalização. Algum tempo atrás, a sustentabilidade era tratada pelos economistas na busca da promoção do crescimento econômico sem, com isso, atentar para os efeitos ambientais. Para Veiga (2006, p. 89), “A sustentabilidade não é, e nunca será, uma noção da natureza precisa, discreta, analítica, ou aritmética, como qualquer positivista gostaria que fosse. Tanto quanto a ideia de democracia [...] ela sempre será contraditória, pois nunca poderá ser encontrada em estado puro”.

A evolução do sistema capitalista e da cultura de consumo foi entre outros, os responsáveis por promover o uso inadequado do meio ambiente. Nesse sentido, segundo Leff (2008, p. 405), “Os propósitos da sustentabilidade implicam a reconstrução do mundo a partir dos diversos projetos de civilização que foram construídos e sedimentados na história”. Reconhecer todo o percurso da humanidade até o mundo pós-moderno é essencial para propor mudanças não só de paradigmas, mas também nos modelos de gestão adotados pela esfera pública.

Internalizar o conceito de sustentabilidade é abrir mão das “verdades” estabelecidas no mundo pós-moderno. É ser capaz de romper com alguns paradigmas já absorvidos pela sociedade. Para implementar ações de sustentabilidade nos processos de gestão municipal é indispensável minimizar os efeitos da cultura de consumo, o que não significa romper com o sistema capitalista, o que hoje é impossível, mas revisitar os valores associados a este. Para Leff (2008, p. 404), “A transição para a sustentabilidade implica a necessidade de superar a ideia da transcendência histórica que repousa na razão econômica como um processo de superação dialética do reino da necessidade, fundado na racionalidade científica e instrumental”.

Parece que a sociedade vem percebendo que o meio ambiente atinge gradativamente seus limites e, portanto, começa a se preocupar com a continuidade da existência. Nesse sentido, Veiga (2006, p. 88) explica:

[...] a expressão “sustentabilidade” passou a exprimir a necessidade de um uso mais responsável dos recursos ambientais. O que só pode ser complicado para qualquer corrente de pensamento que se fundamente no utilitarismo, individualismo e equilíbrio como é o caso da economia neoclássica.

Para Veiga (2007, p. 67-68), a sustentabilidade ambiental só acontecerá quando as comunidades respeitarem uma agenda de pelo menos doze graves desafios:

Quatro decorrem de destruições ou perdas, de recursos naturais: habitat, fontes protéicas, biodiversidade e solos. Três batem em limites naturais, energia, agua doce e capacidade fotossintética. Outros três resultam de artifícios nocivos: químicos tóxicos, espécies exóticas e gases de efeito estufa ou danosos a camada de ozônio. E dois últimos concernem às próprias populações humanas: seu crescimento e suas aspirações de consumo.

O silêncio parece ser a resposta mais fácil para justificar a ausência de ações em busca da sustentabilidade que promovam a responsabilidade socioambiental por parte daqueles que detêm o poder e por parte da sociedade que não clama por uma vida mais justa e qualificada. É a consciência acerca do conceito de sustentabilidade que pode promover tanto nos decisores, quanto nas comunidades a importância da responsabilidade socioambiental. Veiga (2007, p. 89) reforça este pensamento: “A assertiva de que o aparecimento do binômio ‘desenvolvimento sustentável’ como valor fundamental para o século XXI deva ser entendida como síntese dialética socioambiental, em reação à séria falha metabólica na relação da humanidade com a natureza”.

A relação da sociedade com a natureza já está comprometida pelo egocentrismo e, pelo poder que a humanidade acreditou possuir sob todos os recursos naturais. É por isso que, para propor estratégias de sustentabilidade, é obrigatório rever os conceitos de progresso para a sociedade. Há que se buscar o desenvolvimento equilibrado, que promova a satisfação humana, sem desconhecer os limites dos recursos ambientais.

Assim como o conceito de sustentabilidade, também o conceito de responsabilidade socioambiental está sendo utilizado em diversas instâncias políticas e sociais sem o devido cuidado. Parece que todos os passos sejam de organizações públicas ou privadas, estão direcionados por estes conceitos quando, na verdade, seu uso acontece de forma ingênua, comprometendo a eficácia de algumas estratégias. Veiga (2006, p. 85) é audacioso nesse sentido ao afirmar que: “Por isso nada pode ser mais bisonho do que chamar de sustentável esta ou aquela proeza”. É necessário revisitar padrões de consumo e promover um diálogo interdisciplinar para mobilizar os indivíduos na busca de mudanças de comportamentos e retomadas de valores, assim, a atuação do poder público torna-se valiosa neste cenário.

A responsabilidade socioambiental busca promover um diálogo entre os interesses sociais e os limites ambientais. A sociedade só vai poder usufruir do seu desenvolvimento se respeitar o meio ambiente.

O termo responsabilidade socioambiental, não surgiu para questionar o crescimento econômico, mas a forma como ele está acontecendo e, no que isso pode trazer de consequências à sociedade. Veiga (2007, p. 60) esclarece: “Isto é, que o crescimento econômico respeite os limites da natureza em vez de destruir seus ecossistemas. E que dê, assim, uma chance às gerações futuras de que também possam progredir”.

O termo responsabilidade socioambiental foi por algum tempo trabalhado com um hífen entre social e ambiental, que separava as duas esferas: sócio-ambiental. No entanto, diagnosticou-se que é justamente a fusão destes dois termos que possibilita o entendimento de dependência, ou seja, é necessário, se não indispensável, pensar a ação social a partir da ética ambiental. Só assim a vida humana será sustentável. Para Veiga (2007, p. 91),

[...] os dois empregos do termo socioambiental apontam para o mesmíssimo fenômeno: a inevitável necessidade de procurar compatibilizar as atividades humanas em geral [...] com a manutenção de suas bases naturais, particularmente com a conservação ecossistêmica.

O desafio está em verificar se de fato é possível compatibilizar os interesses do sistema capitalista com as limitações de recursos naturais. Parece um termo inviável atualmente, a menos que a sociedade se movimente de tal forma que seu desenvolvimento seja pautado na ética moral ambiental. Isto é, promover um desenvolvimento que não esteja baseado no progresso econômico, mas na qualidade e continuidade da vida humana. Para que isso aconteça, Veiga (2007) sugere que sejam adotas estratégias condizentes, entre elas, as duas mais importantes se concentram na valorização das sociedades que não se desenvolveram e na desvalorização da importância do progresso. Ainda, sugere que sejam criticados os principais vetores do desenvolvimento, as práticas desenvolvimentistas e elogia os modos de resistência dos perdedores que abrem caminho para o pós-desenvolvimento. Ou seja, promover uma revisão nos conceitos que envolvem o desenvolvimento e o crescimento, chegando à adoção da condição estacionária.

Pensar a responsabilidade socioambiental é diagnosticar a relação entre as ações da sociedade e seus reflexos no meio ambiente, os resultados entre causa e efeito. Ou seja, só

será executada a responsabilidade socioambiental se for possível revisitar o modelo de vida e de consumo escolhido pela sociedade.

Veiga (2007), ao explicar a junção do termo social ao ambiental, se utiliza da metáfora do martelo, uma vez que, sem o aço ou sem a madeira as partes perdem suas forças. Portanto, sem os esforços da sociedade não há como melhorar a relação com a natureza e, por isso, a importância do termo. O termo surge para expressar a urgência da adoção de ferramentas na gestão ambiental que possibilitem uma reflexão quanto aos danos e, ainda, quanto à preservação.

As ações de responsabilidade socioambiental devem responder às demandas da sociedade, prezar pela qualidade e continuidade de vida. As ações sociais estão diretamente relacionadas os danos ou reparação ambiental que implica em rever postura e desejos humanos. Assim, não há como dissociar os desejos das pessoas, bem como a qualidade de vida dos efeitos que suas ações causam no meio ambiente.

Uma das possibilidades da gestão pública ambiental agir com responsabilidade socioambiental, pode ser a partir do Triple Bottom Line. Segundo Dias (2011, p. 46) “O Triple bottom line, é também conhecido como os 3P’s, (em português, Pessoas, Planeta e Lucro)”. Este modelo, por mais que venha sendo utilizado em grande parte pela iniciativa privada, não se restringe a esta, por isso, Dias (2011, p. 46) advoga: “[...] é um conceito que tanto pode ser aplicado de maneira macro, para um país ou o próprio planeta, como micro, numa residência, numa empresa, numa escola ou numa pequena vila”.

Os 3P’s são compreendidos como: People – tratamento do capital humano de uma empresa ou sociedade; Planet – é o capital natural de uma empresa ou sociedade; Profit – resultado econômico. No entanto, nem sempre é fácil criar estratégias ou tomar decisões sem que uma destas pernas fique desatendida. Por isso é que nesse contexto surge ainda o Tripé da sustentabilidade, que busca aproximar-se do Triple bottom line, quando apresenta que a solução para o desenvolvimento sustentável está em encontrar equilíbrio entre a questão: econômica, social e ambiental.

Figura 1: Equilíbrio dinâmico da sustentabilidade Fonte: Adaptado de Dias (2011).

Conforme visualizado na figura 1, o desenvolvimento sustentável só acontece quando existe um equilíbrio entre o econômico, social e ambiental. Sempre que uma destas variáveis ficar aquém das demais, têm-se um déficit no desenvolvimento. Assim, tanto para as organizações, quanto para a esfera pública, o equilíbrio do tripé da sustentabilidade deve ser um elemento indispensável nos processos de gestão.

No que tange a questão econômica, Dias (2011, p. 44) afirma: “Do ponto de vista econômico, a sustentabilidade prevê que as empresas têm que ser economicamente viáveis”. Para a gestão pública municipal isso significa cumprir com todos os seus compromissos, seja de recolher os tributos ou investir no município. Ainda, cabe a esta, regulamentar o progresso da iniciativa privada, fiscalizando e zelando pelo bem da sociedade e do meio ambiente.

As organizações privadas estão sendo cada vez mais requisitadas para contribuir no âmbito social. Por isso, Dias (2011) explica que, estas devem satisfazer os requisitos de proporcionar condições de trabalhos aos seus empregados, bem como, atuar na diversidade cultural, para cumprir com o segundo elemento do tripé da sustentabilidade. Neste contexto, a gestão pública precisa responsabilizar-se pela qualidade de vida dos seus cidadãos, sua atuação deve ser de garantir saúde, educação e cultura. Portanto, o desafio da gestão pública é fazer com que as iniciativas privadas possam progredir no que tange produtividade sem com isso, limitar o desenvolvimento humano e social.

O respeito ao meio ambiente e a continuidade de vida no Planeta também deve estar presente nas decisões, sejam da iniciativa privada ou pública. Segundo Dias (2011) é importante a decisão estar pautada na ecoeficiência dos seus processos produtivos, oferecer condições para a cultura ambiental, adotar uma postura de responsabilidade ambiental. Com isso, percebe-se que as ações governamentais devem ser de estímulo e educação para a questão ambiental.

O desequilíbrio entre as questões do tripé da sustentabilidade é resultado da intransigência dos decisores. E, portanto, cabe à gestão pública possibilitar o progresso das iniciativas privadas, sem com isso desmerecer o aspecto social e ambiental. A gestão pública deve gerenciar a sociedade a partir de duas ações básicas, aquelas de controle que representam as normatizações e fiscalizações e as que são de educação e desenvolvimento.