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A articulação teórica em conceitos abstratos – sempre que possível sem o jargão técnico artificial e com uma linguagem acessível ao maior número – da penetração do novo tipo de capitalismo financeiro e flexível no Brasil é uma tarefa prévia e fundamental para compreendermos os “batalhadores brasileiros”. Mas a outra ponta fundamental do trabalho de uma sociologia crítica do Brasil contemporâneo é o acesso empírico a dramas, angústias e sonhos dos próprios batalhadores. Não existe teoria que substitua esse trabalho, sempre árduo e difícil, mas funda- mental. A relação entre empiria e teoria é de diálogo constante e de aprendizado mútuo. A própria empiria – pelo menos a empiria crítica, que reflete sobre seus pressupostos – já é saturada de reflexão teórica, e vice-versa. É o esclarecimento teórico que permite perceber a existência de classes sociais como o maior segredo da dominação social no capitalismo.

Como vimos, “fala-se” o tempo todo de classes sociais sem que se “compreenda” o que elas são. Classes sociais não são determinadas pela renda – como para os liberais – nem pelo simples lugar na produção – como para o marxismo clássico –, mas sim por uma visão de mundo “prática” que se mostra em todos os comportamentos e atitudes como esclarecida, com exemplos concretos acessíveis a todos, mais acima nesta intro- dução. Esse esclarecimento teórico é fundamental para que a dominação social de alguns poucos setores privilegiados, com acesso à possibilidade de construir e utilizar para seus próprios fins a “pauta das questões julgadas relevantes” em cada época e sociedade específica, não distorça os fatos de modo a legitimar os próprios privilégios.

É justamente a legitimação de privilégios inconfessáveis que está em jogo na noção, hoje corrente entre nós, de “nova classe média” para os brasileiros batalhadores que examinamos. Trata-se de uma interpretação triunfalista que pretende esconder contra- dições e ambivalências importantes da vida desses batalhadores brasileiros e veicular a noção de um capitalismo financeiro apenas “bom” e sem defeitos. A ideia que se quer veicular é a de uma sociedade brasileira de novo tipo, a caminho do Primeiro Mundo,

posto que, como Alemanha, Estados Unidos ou França, passa a ter uma classe média ampla como setor mais numeroso da sociedade. E isso como efeito automático do mercado liberal desregulado. Essa concepção é um produto direto da dominação financeira que fincou sólida base no nosso país nas últimas décadas e que quer interpretar os seus interesses particulares como interesses de todos. Se possível, tenta-se também passar a ideia de que essa “nova classe média” é produto apenas da política monetária e de privatizações do governo de FHC.23

Como a compreensão dessa classe “em constituição” está no centro do debate nacional e sua importância só deve aumentar nos próximos anos, a importância política desse debate é óbvia. Também o marxismo, e não apenas nossos liberais-conservadores, tem extraordinária dificuldade de compreender a nova classe que se constitui entre nós. O problema dos marxistas com a análise do novo capitalismo é o seu apego “afetivo” – que impede um olhar mais atento ao novo mundo que se cria sob os nossos olhos – a conceitos de uma época que não existe mais, como o de proletariado tradicional. Como o proletariado industrial do capitalismo competitivo e fordista era a classe da mudança social e a da iniciativa política, romper com esse esquema tradicional significa também a “ferida narcísica” de perder as ilusões consti- tutivas da própria personalidade desse tipo de intelectual. Nossa pesquisa pretende oferecer uma alternativa a esses dois modelos opostos: tanto o apologético-liberal quanto o de uma esquerda nostálgica que se recusa a se confrontar com uma realidade nova e complexa.

O que percebemos na pesquisa que o leitor irá ler nos capí- tulos seguintes é que a realidade cotidiana dessa classe, ou seja, sua visão de mundo “prática” – que se materializa em ações, reações, disposições de comportamento e, de resto, em todo tipo de atitude cotidiana concreta consciente ou inconsciente – não tem a ver com o que se entende por “classe média”, na tradição sociológica, em nenhum sentido importante. Ainda que “classe média” seja um conceito vago (e, exatamente por conta disso, excelente para todo tipo de ilusão e de violência simbólica que se passa por “ciência”), ela implica, em todos os casos, um componente “expressivo” importante, e, consequentemente, uma preocupação com a “distinção social”, ou seja, com um estilo de vida em todas as dimensões que permita afastá-la dos setores

populares e aproximá-la das classes dominantes. Aqui não se trata de “renda”, já que efetivamente pode-se ter uma renda rela- tivamente alta e uma condução de vida típica das classes populares. Associar classe à renda é “falar” de classes, esquecendo-se de todo o processo de transmissão afetiva e emocional de valores, processo invisível, visto que se dá na socialização familiar, que constrói indivíduos com capacidades muito distintas, como vimos mais acima. Mas é por conta desse tipo de pseudociência que associa classe a renda, uma associação que mais encobre que explica, que é possível falar-se de “nova classe média” sem a cerimônia que se fala no Brasil.

O fato é que acreditamos estar diante de um fenômeno social e político novo e muito pouco compreendido, pelos motivos já explicitados, seja pelos conservadores, seja até pelos mais críticos entre nós: o da constituição não de uma “nova classe média”, mas sim de uma “nova classe trabalhadora” no nosso país, nas últimas décadas. Essa nova classe trabalhadora convive com o antigo proletariado fordista – ou com o que restou dele –, posto que o fordismo não acabou, e grande parte da produção de mercadorias e de acumulação de capital ainda é realizada na típica forma fordista de controle do trabalho. Ainda que o fordismo não tenha acabado e possua uma existência paralela à nova classe trabalhadora que se constitui, houve uma diminuição sensível do número de trabalhadores nesse setor,24 que não pode apenas ser

creditada a ganhos em produtividade e inovação tecnológica. Mas as virtualidades do novo tipo de capitalismo, as quais discutimos em detalhe anteriormente, atingiram em cheio as classes populares brasileiras. No setor mais precarizado, que, como já dito, chamamos em outro livro provocativamente de “ralé”, houve um aprofundamento de sua própria precarização – que é relativa e comparativa em relação às classes logo acima –, que políticas sociais bem intencionadas como o Bolsa Família não têm, ainda que sejam muito importantes para aplacar a miséria mais extrema, o poder de resolver. No setor logo acima da “ralé”, que abrange também setores importantes de uma “elite da ralé” capaz de ascensão social – desde que existam oportunidades de qualificação e de inserção produtiva no mercado competitivo – é que encontramos a nova classe trabalhadora. Essa é uma classe quase tão esquecida e estigmatizada quanto a própria “ralé”. Mas, ao mesmo tempo, conseguiu, por intermédio de uma conjunção

de fatores que serão discutidos em detalhe a seguir, internalizar e in-corporar disposições de crer e agir que lhe garantiram um novo lugar na dimensão produtiva do novo capitalismo financeiro.

Por que nova classe trabalhadora e não nova classe média? Não se trata apenas da ausência do tema do “expressivismo” e, portanto, da ausência de participação na luta por distinção social a partir do consumo de “bom gosto” que caracterizam as classes superiores. As classes dominantes – classes média e alta – se definem, antes de tudo, pelo acesso aos dois capitais impessoais que asseguram, por sua vez, todo tipo de acesso privilegiado a literalmente todos os bens (materiais ou ideais) ou recursos escassos em uma sociedade de tipo capitalista moderna. A classe dominante não é aquela de maior número, como a ideologia e a violência simbólica liberal/financeira gostam de induzir a crer, mas sim aquela com acesso privilegiado a tudo que nós todos lutamos para conseguir na vida nas 24 horas que compõem o dia. Privilégio social é o acesso indisputado e legitimado a tudo aquilo que a imensa maioria dos homens e mulheres mais desejam na vida em sociedade: reconhecimento social, respeito, prestígio, glória, fama, bons carros, belas casas, viagens, roupas de grife, vinhos, mulheres bonitas, homens poderosos, amigos influentes etc.

No tipo de sociedade capitalista na qual vivemos, seja aqui ou na França, as classes que possuem acesso privilegiado a esses bens e recursos escassos são as classes que, tradicionalmente, monopolizaram o acesso ao capital cultural – lócus privilegiado das classes médias – e capital econômico, privilégio bem assen- tado das classes altas e mais poderosas. Ainda que alguma forma de composição entre esses capitais em todas as classes dominantes – média e alta – seja muito frequente, a sua disposição no sentido explicitado acima é a regra.

O expressivismo do qual já falamos serve, antes de tudo, para “legitimar” esse acesso privilegiado das classes dominantes como “talento natural”. A violência simbólica perpetrada aqui age no sentido de negar toda a “construção social do privilégio” como privilégio de classe, transmitido familiarmente de modo insensível e “invisível” pelos mecanismos de socialização familiar. A natu- ralidade dos “bons modos”, da “boa fala” e dos “bons compor- tamentos” passa a ser percebida como mérito individual, pelo esquecimento do processo lento e custoso, típico da socialização

familiar, que é peculiar a cada classe social específica. Esquecida a gênese social de todo privilégio – no fundo um privilégio de sangue como todo privilégio pré-moderno –, os indivíduos das classes dominantes podem aparecer como produto “mágico” do talento divino e se reconhecerem mutuamente como seres especiais merecedores da felicidade que possuem.25

Ainda que o expressivismo burguês das classes média e alta tenha sido, há muito tempo, banalizado em consumo conspícuo,26

o importante aqui é que os privilegiados podem se reconhecer na roupa que vestem ou no vinho que tomam e julgar justa sua própria dominação em relação a todos os seres animalizados e brutos que não compartilham dos mesmos modos e gostos. Esse é o mecanismo que explica toda a endogamia de classe que caracteriza os setores privilegiados e o preconceito aberto ou velado em relação ao gosto popular. Como o “gosto” não é apenas uma dimensão estética, mas, antes de tudo, uma dimensão moral, uma vez que constitui um estilo de vida e espelha todas as escolhas que dizem quem a pessoa é ou não é em todas as dimensões da vida, todo o processo de classificação e desclassificação que separa o “nobre” do “bruto” e o “superior” do inferior” passa a operar com base nessa dimensão externa e corporal.

A linguagem do corpo – mais fundamental, imediata e imper- ceptível que a linguagem mediada pelas palavras e pelo discurso – opera como uma espécie de tradutor universal da posição social ocupada individualmente na hierarquia social. A “distinção social”, negada e reprimida na dimensão explícita e consciente da vida – afinal o mundo moderno se legitima por ter, suposta- mente, superado os privilégios de sangue e de origem familiar –, retorna de modo opaco e implícito e, por conta disso mesmo, com a virulência típica da agressão – espontânea e imperceptível –, sem defesa possível. O “racismo de classe” não permite defesa porque nunca se assume enquanto tal.

A nova classe trabalhadora não participa desse jogo da dis- tinção que caracteriza as classes alta e média. Como na reportagem de um número recente da revista Negócios e Finanças, que foi pensada como um “elogio” a essa classe, mas que estranha que a classe C não se mude de bairro quando ascende economica- mente,27ela tem opções e gostos muito diferentes. Ela é “comu-

nitária” e não “individualista”, por exemplo, nas suas escolhas. Ficar no mesmo lugar onde se tem amigos e parentes é mais

importante que se mudar para um bairro melhor. Mas, antes de tudo, ela não teve o mesmo acesso privilegiado ao capital cultural – que assegura os bons empregos da classe média no mercado e no Estado – nem, muito menos, ao capital econômico das classes altas. Nossa pesquisa mostrou que essa classe conseguiu seu lugar ao sol à custa de extraordinário esforço: à sua capacidade de resistir ao cansaço de vários empregos e turnos de trabalho, à dupla jornada na escola e no trabalho, à extraordinária capaci- dade de poupança e de resistência ao consumo imediato e, tão ou mais importante que tudo que foi dito, a uma extraordinária crença em si mesmo e no próprio trabalho.

Percebemos também que isso foi possível a um capital muito específico que gostaríamos de chamar de “capital familiar”. Esse é o aspecto de mais difícil percepção para as formas dominantes e liberais de afazer científico que domina a academia e a esfera pública brasileira, porque vincula o indivíduo, pensado por essas teorias e visões de mundo dominantes, como sem contexto e sem passado, ao seu mundo social primário. Chamamos esse conjunto interligado de disposições para o comportamento de “capital familiar”, pois o que parece estar em jogo na ascensão social dessa classe é a transmissão de exemplos e valores do trabalho duro e continuado, mesmo em condições sociais muito adversas. Se o capital econômico transmitido é mínimo, e o capital cultural e escolar comparativamente baixo em relação às classes superiores, média e alta, a maior parte dos batalhadores entrevistados, por outro lado, possuem família estruturada, com a incorporação dos papéis familiares tradicionais de pais e filhos bem desenvolvidos e atualizados.

Essa é uma distinção fundamental em relação às famílias da “ralé” que estudamos em livro anterior a este. A família típica da “ralé” é monoparental, com mudança frequente do membro masculino, enfrenta problemas graves de alcoolismo, de abuso sexual sistemático e é caracterizada por uma cisão que corta essa classe ao meio entre pobres honestos e pobres delinquentes. É a classe vítima por excelência do abandono social e político com que a sociedade brasileira tratou secularmente seus membros mais frágeis. Mas mesmo esse quadro desalentador não significa uma condenação sem remédio para os membros menos atingidos pelas mazelas sociais de uma classe estigmatizada e marginalizada em todos os aspectos da vida. Se no livro consagrado à “ralé” toda a

ênfase foi conferida à reprodução social dessa classe como classe excluída, o estudo empírico dos batalhadores permitiu mitigar e contextualizar essa análise. Vários dos batalhadores são oriundos da “ralé” – ou da “elite da ralé”, para a qual os fatores destrutivos puderam ser compensados de algum modo eficaz – e conseguiram a duras penas ascensão material e alguma dose de autoestima e de reconhecimento social.

O núcleo duro desse “capital familiar”, qualquer que seja a origem social dos “batalhadores” pesquisados, parece se con- substanciar na transmissão efetiva de uma “ética do trabalho”. É importante perceber a diferença com relação às classes médias, em que a “ética do trabalho” é aprendida a partir da “ética do estudo” como seu prolongamento natural. Os batalhadores, na sua esmagadora maioria, não possuem o privilégio de terem vivido toda uma etapa importante da vida dividida entre brincadeira e estudo. A necessidade do trabalho se impõe desde cedo, parale- lamente ao estudo, o qual deixa de ser percebido como atividade principal e única responsabilidade dos mais jovens como na “verdadeira” e privilegiada classe média. Esse fator é fundamental porque o aguilhão da necessidade de sobrevivência se impõe como fulcro da vida de toda essa classe de indivíduos. Como consequência, toda a vida posterior e todas as escolhas – a maior parte delas, na verdade, escolhas “pré-escolhidas” pela situação e pelo contexto – passam a receber a marca dessa necessidade primária e fundamental.

Assim, a separação em relação à “ralé”, como fronteira para baixo, se consubstancia na internalização e in-corporação – tornar-se “corpo”, automático – das disposições nada óbvias do mundo do trabalho moderno: disciplina, autocontrole e comportamento e pensamento prospectivo. Ao contrário do que se pensa na vida social cotidiana, ninguém nasce com essas disposições e elas não fazem parte, como a capacidade de ver ou ouvir, do repertório de capacidades ao alcance de todos que estão vivos. Ao contrário, essas disposições têm que ser aprendidas, embora seu aprendizado seja difícil e desafiador e não esteja ao alcance de todas as classes.

A relação com o tempo, que chamamos acima de “pensamento prospectivo”, é muito importante e pedagógica. A capacidade de planejar a vida e de pensar o futuro como mais importante que o presente é privilégio das classes em que o aguilhão da

necessidade de sobrevivência não as vincula à prisão do presente sempre atualizado como necessidade premente. A “ralé” é refém do “presente eterno”, do incerto pão de cada dia, e dos proble- mas que não podem ser adiados. As classes privilegiadas pelo acesso à capital econômico e cultural em proporções significativas “dominam o tempo”, porque estão além do aguilhão e da prisão da necessidade cotidiana. O futuro é privilégio dessas classes, e não um recurso universal.

A meio caminho entre a prisão na necessidade cotidiana, que caracteriza a “ralé” e sua condução de vida literalmente sem futuro, e o privilégio de “poder esperar e se preparar para o futuro”, que caracteriza as classes média e alta, temos a condução de vida típica dos batalhadores. Como inexiste o privilégio das classes dominantes da dedicação ao estudo como atividade principal e muitas vezes única, a apropriação de capital escolar e cultural vai ser, tendencialmente, menor que na verdadeira classe média. Como consequência, salvo exceções, o tipo de trabalho tende a ser técnico, pragmático e ligado a necessidades econômicas diretas. Inexiste o “privilégio da escolha” para os batalhadores. O trabalho e o aprendizado das virtudes do trabalho vai ser, para muitos, como veremos a seguir, a verdadeira “escola da vida”.

Por outro lado, o trabalho disciplinado e regular, muitas vezes no contexto da pequena produção familiar, seja no campo ou na cidade, permite a percepção da vida como atividade racional que pode ser vislumbrada como progresso e mudança possível. Esse ponto é fundamental porque permite perceber como os batalha- dores podem ser percebidos como uma nova classe trabalhadora do capitalismo pós-fordista e financeiro que analisamos.

O que caracteriza toda classe trabalhadora é a sua “inclusão subordinada” no processo de acumulação do capitalismo em todas as suas fases históricas. O trabalhador, ao contrário da “ralé” e de todos os setores desclassificados e marginalizados, é reconhecido como membro útil à sociedade e pode criar uma narrativa de sucesso relativo para sua trajetória pessoal. Vimos isso em quase todas as entrevistas que analisamos. No período fordista, ou no setor ainda fordista da classe trabalhadora tradicional, essa narrativa tende a ser construída com base em vínculos comunitários a partir de um destino que é percebido como comum pelos trabalhadores. O sindicato, as greves, o

partido político e as associações de classe são o reservatório desse tipo de necessidade e sentimento compartilhado.

O capitalismo de novo tipo das últimas duas décadas foi construído, como vimos, para destruir a solidariedade interna da classe trabalhadora tradicional de modo a quebrar todas as resistências à livre ação do processo de valorização do capital. A classe trabalhadora organizada percebia a vida cotidiana como luta contra o capitalista; não apenas em termos de aumentar a fatia do excedente para o pagamento de salários, mas, também, como “luta de trincheira” cotidiana contra todo tipo de controle do trabalho repetitivo e monótono das indústrias fordistas. O custo adicional em controle e disciplina do trabalho sempre foi um gasto extremamente significativo para a valorização do capital. O ganho em produtividade da “produção flexível” japonesa e toyotista era realizado, em grande medida, pelo corte do pessoal que vigiava e controlava o trabalho alheio, ou seja, o corte do pessoal não diretamente produtivo.

Essa é, afinal, a grande transformação que estamos vendo acontecer. A importância do setor financeiro e dos grandes bancos nas fusões e nas transformações de gestão, que caracteri- zaram a passagem do capitalismo competitivo para o capitalismo monopolista no fim do século XIX e começo do século XX, foi fato percebido por muitos estudiosos da época. Mas o capital financeiro não transformou a forma de controle da produção nem a gestão do trabalho. O compromisso fordista espelhava, de fato, o compromisso entre a grande produção estandardizada, que exigia trabalho repetitivo e monótono dos trabalhadores, e a contra- partida de vantagens sociais e bons salários, pelo menos para os setores dinâmicos da economia. Era um compromisso entre o capitalista industrial e seus trabalhadores. Fatia importante do controle e da vigilância do trabalho continuou sendo uma luta