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3. O PLANEJAMENTO E OS PLANOS URBANÍSTICOS

3.6 Visão integrada de planejamento urbano

Pelo que já foi destacado, o planejamento sofreu um impulso considerável nas últimas décadas devido ao grau de intervenção da Administração Pública no tecido social, especialmente nas funções de ordenação do território, de apoio ao desenvolvimento econômico e social, de promoção da justiça social e de prestação social, no qual o plano tornou-se um instrumento essencial da ação administrativa nos Estados com o modelo de Bem-Estar Social.

Esta é a razão pela qual a Constituição Federal de 1988 indica vários dispositivos sobre planos nacionais e regionais de ordenação do território e de desenvolvimento econômico e social, sobre regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões, sobre o planejamento do uso e ocupação do solo urbano pelos municípios, sobre planos plurianuais, leis de diretrizes orçamentárias e orçamento anual, planos e programas nacionais, regionais e setoriais de desenvolvimento, além de disposições específicas sobre o plano diretor municipal.

Destacam-se, neste cenário, os planos econômicos, ou, talvez mais rigorosamente, socioeconômicos, e os planos territoriais.

Não obstante as íntimas conexões e influências recíprocas que se verificam entre a planificação territorial e a planificação econômica, pode-se afirmar que uma e outra reportam-se a diferentes elementos da realidade.

É o que adverte Fernando Alves Correia:

(...) a planificação territorial distingue-se da planificação económica porque, como escreve A. PREDIERI, tem o território como objecto, sobre ele intervém e pretende intervir directamente, prosseguindo efeitos de planificação da actividade

económica apenas enquanto conexos com a planificação do território, somente enquanto efeitos condicionados ou induzidos pela planificação do solo.127

O citado autor, com base nos ensinamentos de renomados juristas europeus, ainda fornece um conceito sobre plano econômico:

O plano econômico é ‘o acto ou conjunto de actos jurídicos por meio dos quais o Estado define para determinado período os grandes objectivos da política económico-social e as vias ou meios da sua implementação ou concretização’. É com base nos planos económicos que os poderes públicos analisam as probabilidades da evolução económica, definem as orientações desta evolução e incitam os agentes económicos a observá-las.128

Não há dúvidas de que o planejamento urbano deve estar vinculado ao planejamento econômico e social. Neste sentido, por exemplo, a programação de políticas de investimento pela União em obras numa determinada região do país, ou mesmo o incentivo à instalação de empresas ou atividades numa localidade, irá impactar social e economicamente na infraestrutura dos municípios onde elas ocorrerão. Aliás, a própria Constituição de 1988 sinalizou as estreitas relações entre ambos (CF, art. 21, IX).

Embora muitos Municípios sequer consigam implantar o plano urbanístico de ordenação territorial que integra a sua competência, é certo que alguns problemas relacionados à saúde, à habitação, à geração de renda, entre outros, para a sua resolução estrutural, dependem de políticas macroeconômicas, fiscais e definições das esferas estaduais e da União, que seguramente ultrapassam o âmbito municipal.

Como facilmente se compreende, a situação acima caracterizada demanda uma intervenção do Poder Público nos solos urbanos, através do recurso a diversas providências, tendentes a promover uma política de ordenação das cidades que envolva uma interação coordenada nos âmbitos nacional, regional e municipal.

Com efeito, o recurso ao planejamento coordenado entre os entes públicos é uma maneira de se intervir neste problema. Ou seja, trata-se de implantar um sistema racional de planejamento com o objetivo de relacionar intimamente crescimento econômico com

127 CORREIA, Fernando Alves. Manual de direito do urbanismo, p. 352-353. 128 Ibid., p. 353-354.

crescimento urbano, num sistema de planejamento integrado que possibilite a canalização de esforços e recursos dentro de uma mesma visão global de desenvolvimento.

Pode-se afirmar que os problemas referentes ao planejamento físico só podem ser efetivamente enfrentados quando o mesmo está contido numa visão integral de planejamento global. Da mesma forma, o planejamento físico deve estar integrado numa visão que defina níveis de atuação nacional, regional ou local, mantendo a possibilidade de coerência do sistema.

É o que esclarece Roberto Loeb:

Cada cidade, cada região constitui com todos os seus componentes um sistema complexo de variáveis interdependentes, cuja manipulação exige uma apreciável coordenação técnica (política, administrativa, social e econômica) sob pena de perda da possibilidade de atuação sobre esse sistema. Assim, a implantação de determinada política de concentração industrial, a abertura de determinada estrada, ou a criação de um novo imposto podem influir sensivelmente numa dada distribuição espacial, deslocando centros de polarização e criando novos elementos de crescimento. A possibilidade de manipulação de todas essas variáveis torna-se assim possível apenas a partir da formação de equipes de trabalho interdisciplinar nas quais a visão de planejamento integral predomine, em oposição à prática do planejamento setorial para a solução de problemas interdependentes.129

É certo que, em decorrência do planejamento urbano, o Estado realiza intervenção que pode implicar limitação administrativa à propriedade ou ainda sacrifício parcial ou total do direito.

Já a atividade econômica é de livre iniciativa de todos e segue apenas comandos gerais do Estado, sem a imposição de limitações ou restrições específicas, vez que se trata de interesse particular do cidadão desenvolver a atividade econômica que melhor lhe aprouver com a finalidade de obter lucro. No entanto, há casos excepcionais em que o planejamento econômico tornar-se-á obrigatório, como pode ocorrer no controle dos preços, desde que para garantir a livre iniciativa. 130

Assim, o planejamento econômico direcionado aos particulares serve apenas como incentivo, a ser seguido ou não.

129 LOEB, Roberto. Aspectos do planejamento territorial no Brasil. Planejamento no Brasil, p. 143.

130 Cf. BARROSO, Luís Roberto. A ordem econômica constitucional e os limites da atuação estatal no controle

de preços. Revista Diálogo Jurídico. Número 14 – junho/agosto. Salvador: Centro de Atualização Jurídica, 2002, p. 24-27.