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(1)UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO FACULDADE DE COMUNICAÇÃO Programa de Pós–Graduação em Comunicação Social. Ariadne Freitas Bianchi de Oliveira. HIP HOP COMO PROCESSO COMUNICACIONAL E SOCIABILIDADE PARA JOVENS INDÍGENAS DE DOURADOS – MS. São Bernardo do Campo, 2015.

(2) UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO FACULDADE DE COMUNICAÇÃO Programa de Pós–Graduação em Comunicação Social. Ariadne Freitas Bianchi de Oliveira. HIP HOP COMO PROCESSO COMUNICACIONAL E SOCIABILIDADE PARA JOVENS INDÍGENAS DE DOURADOS – MS. Dissertação apresentada em cumprimento parcial às exigências do Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social, da Universidade Metodista de São Paulo (UMESP), para obtenção do grau de Mestre. Orientadora: Profª Drª: Cicilia Maria Krohling Peruzzo. São Bernardo do Campo, 2015.

(3) FICHA CATALOGRÁFICA. Ol4h. Oliveira, Ariadne Freitas Bianchi de Hip Hop como processo comunicacional para jovens indígenas de Dourados – MS / Ariadne Freitas Bianchi de Oliveira. 2015. 248 p. Dissertação (mestrado em Comunicação Social) --Faculdade de Comunicação da Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo, 2015. Orientação: Cicilia Maria Khohling Peruzzo 1. Comunicação alternativa 2. Hip Hop 3. Cultura indígena Dourados (MS) I. Título. CDD 302.2.

(4) FOLHA DE APROVAÇÃO. A dissertação de mestrado sob o título “Hip Hop como processo comunicacional e sociabilidade para jovens indígenas de Dourados – MS”, elaborada por Ariadne Freitas Bianchi de Oliveira, foi defendida e aprovada com louvor em 09 de setembro de 2015, perante banca examinadora composta por Cicilia Maria Khohling Peruzzo (Presidente/UMESP), Magali do Nascimento Cunha (Titular/UMESP) e Maria Ataide Malcher (Titular/UFPA).. __________________________________________ Prof/a. Dr/a. Cicilia Maria Khohling Peruzzo Orientadora e Presidente da Banca Examinadora. __________________________________________ Prof/a. Dr/a. Marli dos Santos Coordenadora do Programa de Pós-Graduação. Programa: Pós-Graduação em Comunicação Social Área de Concentração: Processos Comunicacionais Linha de Pesquisa: Comunicação midiática nas interações sociais.

(5) DEDICATÓRIA. A minha avó Nésia e a minha bisavó Antonia (in memoriam), pelo amor dedicado;. Aos meus bisavôs Gumercindo (in memoriam) e Francisco (in memoriam), pelas bases políticas;. A minha mãe Dalva, pela vida e educação;. Aos meus tios, Sidney, Vânia e Alda, Everaldo e Francisco por torcerem juntos pelos meus sonhos;. A minha irmã, Cleire, pelo respeito;. Ao meu irmão, Paulo (in memoriam), pela brilhante lição de vida;. A Eloisa que nos deu Laura, que nos devolveu a luz..

(6) “A vida é a arte do encontro, embora haja tanto desencontro pela vida.” (Vinícius de Moraes).

(7) AGRADECIMENTOS. Eu venho refletindo há bastante tempo sobre o que faz diferença na vida. Entre tantos encontros e desencontros, percebi que a gratidão é um dos maiores atos do ser humano. E que se alguém lhe estende a mão, o ombro, lhe dá voz, lhe dá até mesmo o silêncio, sem saber, nos momentos mais precisos, esse alguém merece seu agradecimento. Quantas vezes falei com Deus para que eu pudesse ter forças para chegar até aqui. Foram muitas, mas ele sempre soube o momento certo de encaixar as pessoas na minha vida. A mão estendida da minha orientadora, Cicilia Peruzzo, foi essencial. Agradeço Deus por isso e a ela pela sensibilidade, pelo conhecimento, pelo respeito as minhas limitações e pela paciência. Agradeço também aos professores da Pós-graduação, Magali Cunha e José Salvador Faro pela atenção e carinho durante esta passagem, dando uma imensa contribuição, inclusive, na minha banca de qualificação. Aos integrantes do Comuni (Núcleo de Estudos de Comunicação Comunitária e Local) com quem pude dividir experiências, Suelen, Marcos, Luzia, Ana, Luis, Renata e a minha eterna professora, Maria Alice, a quem tenho uma grande admiração e foi quem me incentivou para o mestrado. Aos amigos da pós: Gustavo, Honório e Clarissa, pelo companheirismo e contribuições. Aos amigos de Dourados, de infância e de vida, Flávia, Carla, Daniel, Laiz, Fernanda, Maykom, Nerinho, Helton, Layana, Karine e Cassius pelo apoio e incentivo. Aos amigos de Ribeirão Preto, que me acolheram, principalmente a Família Raile, representados pela pessoa da Helle Nice, ao Manoel e Marcela. Aos meus familiares, dos Oliveira, Tosta, Freitas e Bianchi. Aos indígenas de Dourados.. À Universidade Metodista e ao CNPq pelo apoio..

(8) LISTA DE FIGURAS. Figura nº 1 - Reservas Jaguapirú e Bororó. .................................................................... 31 Figura nº 2 – Reserva como Favela. ............................................................................... 31 Figura nº 3 – Apresentação Brô MC’s ............................................................................ 78 Figura nº 4 –CD do Grupo Brô MCs. ............................................................................. 79 Figura nº 5 – B’Boys da Reserva......................................................................................82 Figura nº 6 – Apresentação Jovens dos Conscientes. ..................................................... 88 Figura nº 7 – Grupo Brô MC’s apresentando o Break......................................................94 Figura nº 8 – Oficina da CUFA na reserva de Dourados MS..........................................95 Figura nº 9 – Vocalista do Brô MC’s.............................................................................96 Figura nº 10 - Jovens Conscientes...................................................................................96 Figura nº 11 - Brô MC’s durante gravação......................................................................98 Figura nº 12 - A voz indígena é a voz de agora...............................................................111 Figura nº 13 - Imagem do Distrito de Panambi..............................................................118 Figura nº 14 - Contraste local........................................................................................127 Figura nº 15 - Levantamento de línguas indígenas no Brasil........................................130 Figura nº 16 - Jornal "O Expositor Christão"...........................................................................134 Figura nº 17 - A TV mostra várias coisas...................................................................................137.

(9) SUMÁRIO RESUMO ........................................................................................................................11 ABSTRACT ....................................................................................................................12 RESUMEN ......................................................................................................................13 INTRODUÇÃO ...............................................................................................................14 Capítulo I – ASPECTOS HISTÓRICOS E AS PLURALIDADES DO HIP HOP ........22 1. Aspectos históricos do Hip Hop ............................................................................. 22 1.1. O que é Hip Hop, afinal?.................................................................................. 23 1.2. Movimento no Brasil........................................................................................ 27 2. Pluralidade do Hip Hop: comunicação, política e cultura ...................................... 32 3. Hip Hop como Movimento Social e comunicacional alternativo ........................... 35 Capítulo II – CONTEXTUALIZAÇÃO SOCIOLÓGICA, ANTROPOLÓGICA E CULTURAL ENTRE INDÍGENAS DE DOURADOS ................................................. 43 1. Reorganização da reserva indígena......................................................................... 43 1.1. Sobre as características..................................................................................... 43 1.2. Reserva dos Guarani Kaiowá ........................................................................... 47 2. Cotidiano Indígena .................................................................................................. 49 2.1. A situação dos jovens ....................................................................................... 53 3. Hip Hop na reserva: mediação e resistência ........................................................... 55 4. Equívocos sobre a imagem indígena no Brasil ....................................................... 61 5. Sociabilidades subterrâneas: barreiras invisíveis .................................................... 66 Capítulo III – “ALDEIA UNIDA MOSTRA A CARA” NO HIP HOP ........................ 71 1. Atividades de Comunicação na Reserva ................................................................. 71 2. A prática de Hip Hop na Reserva de Dourados ...................................................... 75 2.1. Vertentes de Hip Hop na Reserva de Dourados ............................................... 81 3. Perfil dos Jovens que participam do movimento .................................................... 83 3.1. Como está a situação dos jovens para as lideranças......................................... 84 3.2. Objetivos do Hip Hop na Reserva .................................................................... 87 3.3. Mas, afinal, do que o rap indígena fala? .......................................................... 87 3.4. Tem dado resultado? ........................................................................................ 89 3.5. E para as lideranças, qual resultado? ................................................................ 90.

(10) 4. Global e Local ......................................................................................................... 93 4.1. Global e Local para as lideranças ..................................................................... 99 5. Tradições e/ou tensões culturais na reserva? ........................................................ 101 5.1. As lideranças opinam sobre o Hip Hop.......................................................... 102 6. Educação ............................................................................................................... 107 6.1. O Hip Hop colabora com a educação? ........................................................... 108 7. Comunicação ........................................................................................................ 111 7.1. “Você não sabe”: mídia e comunicação ......................................................... 112 8. Narrativas e contemporaneidade nas letras de rap ....................................................114 8.1. Letras de músicas ........................................................................................... 114 8.2.Análises de dados ............................................................................................ 115 CONCLUSÃO ...............................................................................................................138 REFERÊNCIAS ............................................................................................................142 LISTA DE ANEXOS ....................................................................................................151.

(11) RESUMO OLIVEIRA, Ariadne Freitas Bianchi de. Hip Hop como processo comunicacional e sociabilidade para jovens indígenas de Dourados – MS, 2015. 247 f. Dissertação (Mestrado em Comunicação Social) - Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo.. Estudo sobre o Hip Hop como processo comunicacional e sociabilidade entre jovens indígenas de Dourados, Mato Grosso do Sul, para verificar quais os principais objetivos da prática do movimento Hip Hop, compreender se serve como comunicação, contribui para o fortalecimento da língua guarani ou gera novas tensões sociais na reserva. Para tanto, foi analisado aspectos históricos do movimento, passando pelos Estudos Culturais, e como Movimento Social, dando início à discussão de uma voz alternativa por meio do Hip Hop. Do ponto de vista metodológico, trata-se de um de estudo de caso, com representantes dos grupos de jovens Brô Mc's e Jovens Conscientes, das reservas Jaguapirú e Bororó, das etnias Guarani-Kaiowá de Dourados (MS). Foram realizadas entrevistas semiestruturadas junto a jovens que participaram das oficinas de hip hop, das lideranças indígenas e professores. A investigação é complementada pela pesquisa bibliográfica, documental e análises das letras de rap em confrontação com as visões da imprensa, a partir da análise dos jornais Diário MS e O Progresso. Os resultados apontam que os jovens se apropriam de uma cultura global para transformar o ambiente local com objetivo de preservar a língua guarani, uma alternativa para o conhecimento, logo para não seguirem caminhos como o das drogas. Negociando falas sobre sua realidade, dentro e fora da reserva, já que nos meios de comunicação locais há pouco espaço para a voz dos indígenas e dentro da reserva ainda há contestação do movimento em um contexto político, na tentativa de atingir uma cultura “pura”, devido à preocupação dos mais velhos com a perda de território.. Palavras chave: Comunicação Alternativa. Hip Hop. Indígena. Cultura. Dourados..

(12) ABSTRACT. OLIVEIRA, Ariadne Freitas Bianchi de. Hip Hop como processo comunicacional e sociabilidade para jovens indígenas de Dourados – MS, 2015. 247 f. Dissertação (Mestrado em Comunicação Social) - Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo.. Study on Hip Hop as communication process and sociability among indigenous youth of Dourados, Mato Grosso do Sul, to see which major motion practice goals Hip Hop, understand it serves as communication, it contributes to the strengthening of the Guarani language or generates new social tensions on the reservation. To that end, we analyzed historical aspects of the movement, through the Cultural Studies, and how Social Movement, beginning the discussion of an alternative voice through Hip Hop. From a methodological point of view, it is a case study, with representatives of youth groups Brô Mc's and Jovens Conscientes, the Jaguapirú and Bororó reserves, Guarani Kaiowá ethnic groups of Dourados (MS). Semi-structured interviews were conducted with young people who participated in the hip hop workshops, indigenous leaders and teachers. Research is complemented by bibliographical, documentary research and analysis of rap lyrics in confrontation with the views of the press, from the analysis of the Diário MS and O Progresso. The results show that young people take ownership of a global culture to transform the local environment in order to preserve the Guarani language, an alternative to knowledge, just not to follow paths as the drug. Trading speak about their reality, inside and outside the reserve, since the local media there is little room for the voice of indigenous and within the reserve there is still contesting the move in a political context in an attempt to achieve a "pure" culture due to the concern of the older with the loss of territory.. Key words: Alternative Communication. Hip Hop. Indigenous. Culture. Dourados..

(13) RESUMEN. OLIVEIRA, Ariadne Freitas Bianchi de. Hip Hop como processo comunicacional e sociabilidade para jovens indígenas de Dourados – MS, 2015. 247 f. Dissertação (Mestrado em Comunicação Social) - Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo.. Estudio sobre el Hip Hop como proceso de comunicación y sociabilidad entre los jóvenes indígenas de Dourados, Mato Grosso do Sul, para ver que los principales objetivos de la práctica del movimiento Hip Hop, entiendo que sirve como comunicación, contribuye al fortalecimiento de la lengua guaraní o genera nueva las tensiones sociales en la reserva. Para ello, se analizaron aspectos históricos del movimiento, a través de los estudios culturales, y como movimiento social, a partir de la discusión de una voz alternativa a través del Hip Hop. Desde un punto de vista metodológico, es un estudio de caso, con los representantes de los grupos de jóvenes Brô MCs y Jovens Conscientes, las reservas Jaguapirú y Bororo, etnias guaraní-kaiowá de Dourados (MS). Entrevistas semiestructuradas se llevaron a cabo con los jóvenes que participaron en los talleres de hip hop, líderes indígenas y maestros. La investigación se complementa con bibliográfico, la investigación y el análisis de las letras de rap en la confrontación con las opiniones de la prensa documental, a partir del análisis de lo Diário de MS y O Progresso. Los resultados muestran que los jóvenes se apropien de una cultura global para transformar el entorno local con el fin de preservar la lengua guaraní, una alternativa al conocimiento, simplemente no seguir caminos como la droga. Trading hablar sobre su realidad, dentro y fuera de la reserva, ya que los medios locales que hay poco espacio para la voz de las comunidades indígenas y dentro de la reserva todavía está disputando el movimiento en un contexto político en un intento por lograr una cultura "pura" debido a la preocupación de la mayor con la pérdida de territorio.. Palabras clave: Comunicación Alternativa. Hip Hop. Indígena. Cultura. Dourados..

(14) 14. INTRODUÇÃO. Mato Grosso do Sul (MS) tem a segunda maior população indígena do Brasil. Dourados, município do sul do Estado, só perde em arrecadação para a Capital, Campo Grande. É nesse município em que estão situadas as reservas Jaguapirú e Bororó, onde estão localizados os Guarani Kaiowá. No Brasil, na verdade, existem três grupos étnicos chamados de Guarani, os Kaiowá, os Guarani Ñandeva e os Mbya, segundo Cavalcante (2013, p. 21). Apesar de grupos distintos, entendemos que o uso do termo Guarani Kaiowá também conota um sentido político, que simboliza uma luta em comum pela terra.. Limbert (2009, p. 171) explica que a terra para o Guarani Kaiowá é o “sustentáculo de sua identificação étnica, constituindo um elemento básico para sua vida”, e como a Reserva de Dourados é superpovoada “dificulta a integridade dos índios”. A perda desses territórios, considerados sagrados e, portanto, tradicionais, tem consequência direta no cotidiano desses indígenas seja na fragmentação política, econômica, social e cultural, seja na organização da reserva, nas questões de convivência, nos conflitos internos, como a violência, a desnutrição infantil, o suicídio. Ademais, os conflitos externos também são visíveis, decorrentes, muitas vezes, da proximidade das reservas com a cidade de Dourados, divididas apenas por uma rodovia, bem como das relações de trabalho, efetivadas quando os indígenas são contratados por empresas para prestarem trabalho braçal, muito próximo ao escravo, como ainda em situações em que afloram o preconceito e a discriminação. Outro problema presente e preocupante nas reservas diz respeito à criminalidade, principalmente relacionada aos jovens, que já nascem em um ambiente de miséria e precariedade em meio a conflitos motivados pela demarcação de terras. Situação essa que pode ser comprovada pelo Relatório de Violência Contra os Povos Indígenas, divulgado, anualmente, pelo Conselho Indigenista Missionário (CIMI), vinculado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Há anos, MS é o estado que aparece como o mais violento do país, haja vista notícias e dados de órgão públicos e policiais. Os mais atingidos são os Guarani Kaiowá. As reservas estão bem longe da “Terra sem Males”, que imaginam os Guarani como terra ideal (SHADEN, 1974, p. 161 e p. 165), lugar de segurança, livres de doenças e mortes, fome ou pobreza econômica. O relatório aponta ainda que parte da violência decorre também da omissão do Poder Público, principalmente, em setores como a.

(15) 15. educação e a saúde. Faltam políticas públicas e alternativas para que os jovens estudem e não caminhem para o mundo das drogas ou das bebidas alcoólicas. Foi por meio de atividades educacionais que professores e jovens indígenas encontraram uma forma de expressarem a indignação diante desse contexto apresentado sobre a reserva de Dourados, valendo-se do movimento político-cultural chamado de hip hop. Teve origem na reserva Jaguapirú o primeiro grupo de rap indígena do Brasil, Brô MCs e, logo após, surgiu o grupo “Jovens Conscientes”, da Bororó. A representação do cotidiano vivenciado por esses grupos evidencia, nas letras das músicas, a realidade que, para eles, não seria enxergada nas notícias da grande mídia e, consequentemente, pelos não-índios. Essa realidade relatada não denuncia apenas a situação dos Guarani Kaiowá de Dourados, mas a dos indígenas, em geral, de Mato Grosso do Sul. Podemos observar que ao mesmo tempo em que o hip hop tem a ligação com a identidade, com as reivindicações de direitos, sendo um movimento político e não apenas um gênero musical, pode ser encarado na reserva, no que se refere aos jovens, como uma tentativa de resgatar a cultura indígena, sobretudo, com o uso da língua guarani. Contudo, as lideranças e os mais velhos podem considerar o hip hop como uma nova tensão social na reserva, por não fazer parte da cultura indígena. Diante dessas considerações, perguntamos: que contribuições a inserção do Hip Hop traz aos jovens indígenas de Dourados? Como o Hip Hop é percebido na reserva? Esta pesquisa, portanto, tem como objetivo geral realizar um estudo para verificar as principais finalidades das práticas do movimento hip hop entre os indígenas de Dourados e quais as contribuições do movimento para os jovens indígenas, avaliando ainda o processo comunicacional, a sociabilidade e a transformação social nesse processo. Com relação aos objetivos específicos, esta pesquisa pretende identificar o perfil dos jovens indígenas que participam do movimento; analisar as questões consideradas importantes pelos indígenas na decisão de participação do movimento; verificar como o movimento Hip Hop funciona dentro da aldeia, quais as vertentes utilizadas; conferir se há mudanças na aldeia a partir da inclusão do hip hop; compreender como é a recepção, ou seja, como os indígenas enxergam o hip hop na aldeia, por meio das opiniões de seus representantes, como suas lideranças; bem como examinar as formas/estratégias de comunicação do movimento; verificar as mensagens transmitidas por meio das letras de rap, de como os indígenas relatam seu cotidiano, dia-a-dia, em confronto com o que é divulgado na mídia – jornais locais; e ainda averiguar se o movimento hip hop contribui.

(16) 16. para a manutenção da tradição oral indígena, bem como para o fortalecimento da língua guarani. Trabalhamos com a hipótese de que o movimento hip hop contribui para visibilidade dos indígenas, servindo como uma alternativa para garantir-lhes expressão e como uma forma de comunicação alternativa, o que ajudaria na manutenção de suas tradições orais, criando novos espaços de sociabilidade. No entanto, o movimento pode gerar novas tensões sociais, porque, mesmo fazendo parte de uma mesma comunidade, com valores, significados, prioridades e tradições em comum, ainda há conflitos. Nesse ótica, soa estranho ouvir dizer que indígenas, diante de suas tradições e características, como as danças típicas e o uso da língua guarani, criam grupos de hip hop. Entretanto, ali ele adquire características específicas. Se isso causa estranheza, merece, então, ser investigado a fundo para que os indivíduos possam compreender sua complexidade. A pesquisa, assim, contribui para as ciências: Esses estudos empíricos ou teóricos podem mudar de sentido a partir da consciência dos pressupostos sociais, culturais, políticos ou mesmo individuais que se escondem sob a enganadora aparência dos fatos objetivos. Assim, ainda que seja muito comum a realização de pesquisas para benefício do próprio pesquisador, não devemos esquecer de que os objetivos das ciências sociais é o desenvolvimento do ser humano. Portanto, a pesquisa social deve contribuir nessa direção. Seu objetivo imediato, porém, é a aquisição de conhecimento (RICHARDSON, 1999, p. 16).. Dentro do contexto social, de indígenas marginalizados e excluídos, o hip hop pode dar voz aos subalternos, promover e expressar sua cultura, assim, contribuindo para a mudança, ou seja, para a transformação social. Para Moassab (2011, p. 116), “o processo de conquistar voz e alterar as relações de poder nas populações oprimidas é parte essencial de um processo emancipatório”. Desse modo, as relações emancipatórias seguem na direção da transformação social, para um mundo com menos desigualdade, discriminação, opressão e oprimidos. Esse processo de introdução do Hip Hop na Reserva Indígena, diante das análises de sociabilidade, pode ser considerado como lúdico, no entanto, diante das tradições desses povos, histórias em comum, também poderia causar um antagonismo nas relações. Os locais da cultura hip hop para os indígenas ainda perpassam as fronteiras da Reserva e vão além, com os grupos formados a partir das oficinas apresentando-se em outros estados, festivais e instituições de ensino pelo país. Estudar o Movimento Social é mostrar o Hip Hop e as inspirações teóricas como instrumentos de comunicação, política, cultura, resistência, sociabilidade e cidadania,.

(17) 17. frente aos poderes instituídos, às construções simbólicas e aos poderes dominantes. Essa luta que no Brasil teve início na década de 1980, com características globais e locais, é tão atual em sua resistência, pois segue até mesmo autônomo em seus processos de negociação, mesmo diante da sociedade baseada em consumo.. Procedimentos metodológicos. O tipo de pesquisa apresentado neste trabalho caracteriza-se como um estudo de caso, que contribui para compreensão dos fenômenos, sejam elem individuais, sociais, políticos ou organizacionais. Nesta análise, o estudo de caso único escolhido é a inclusão do hip hop como processo comunicacional para os jovens indígenas Guarani Kaiowá de Dourados (MS). Para Yin (2010, p. 21), “o estudo de caso permite uma investigação que preserve as características holística e significativas dos eventos da vida real”. Para se analisar acontecimentos contemporâneos, como o hip hop inserido em uma aldeia, é utilizado o estudo de caso, contanto com técnicas de outras pesquisas históricas, mas com um diferencial: O estudo de caso é preferido no exame dos eventos contemporâneos, mas quando os comportamentos relevantes não podem ser manipulados. O estudo de caso conta com muitas das mesmas técnicas que a pesquisa histórica, mas adiciona duas fontes de evidência geralmente não incluídas no repertório do historiador: observação direta dos eventos sendo estudados e entrevistas das pessoas envolvidas nos eventos [...] (Yin, 2010, p .32).. Esse estudo é, para Yin (2010, p. 39), portanto, uma investigação empírica, que analisa um fenômeno contemporâneo em profundidade e no contexto real, principalmente, quando os limites não são claros. No caso deste trabalho, investigaremos se o hip hop é enxergado como processo comunicacional e de sociabilidade entre os jovens indígenas de Dourados, Mato Grosso do Sul, e buscaremos entender quais as contribuições do movimento para esses indígenas, avaliando ainda a comunicação e a transformação social nesse processo. Compreender também se o movimento hip hop contribui para a manutenção da tradição oral indígena, bem como para o fortalecimento da língua guarani ou se gera novas tensões sociais na reserva, também são intenções desta pesquisa. Para tanto, foi realizado um resgate de aspectos históricos do movimento no que se refere à política e à cultura dentro dos Estudos Culturais, e também no que tange a um Movimento Social, com bases na Comunicação, dando início à discussão de uma.

(18) 18. voz alternativa dentro da relação com a invisibilidade indígena, também em uma contextualização sociológica e antropológica. Para essa análise, as entrevistas foram precedidas de pesquisa documental, bem como da pesquisa bibliográfica ao buscar informações sobre os entrevistados. A documentação, as informações orais, escritas e até mesmo visuais, caracterizam, primeiramente, a pesquisa documental. É necessário, no entanto, entender que documento: [...] é, pois, qualquer informação sob a forma de textos, imagens, sons, sinais, etc, contida em um suporte material (papel, madeira, tecido, pedra) fixados por técnicos especiais como impressão, gravação, pintura, incrustação etc. Quaisquer informações orais (diálogo, exposições, aula, reportagens faladas) tornam-se documentos quando transcritas em suporte material (CHIZZOTTI, 2000, p. 109).. Como complemento à documental, a pesquisa bibliográfica serviu-se de bases fontes, como jornais, livros, teses, dissertações, artigos e periódicos no intuito de permitir o conhecimento sobre o tema, bem como sua fundamentação teórica. Para Gil (1999, p. 65): A principal vantagem da pesquisa bibliográfica reside no fato de permitir ao investigador a cobertura de uma gama de fenômenos muito mais ampla do que aquela que poderia pesquisar diretamente. Esta vantagem se torna particularmente importante quando o problema de pesquisa requer dados muito dispersos pelo espaço. Por exemplo, seria impossível a um pesquisador percorrer todo o território brasileiro e, busca de dados sobre a população ou renda per capita; todavia, se tem à sua disposição uma bibliografia adequada, não terá maiores obstáculos para contar com as informações requeridas. A pesquisa bibliográfica também é indispensável nos estudos históricos. Em muitas situações, não há outra maneira de conhecer os fatos passados senão com base em dados secundários.. Para integrar essas pesquisas e obter respostas fidedignas, a entrevista é uma das técnicas mais utilizadas no processo de trabalho de campo (MINAYO, 2004, p. 107) nas ciências sociais e bastante adequada para obter informações, explicações e razões de fatos como o que as pessoas sentem ou desejam (GIL, 1999 p. 117), como o autor define: Pode-se definir entrevista como a técnica em que o investigador se apresenta frente ao investigado e lhe formula perguntas, com o objetivo de obtenção de dados que interessam à investigação. A entrevista é, portanto, uma forma de interação social. Mais especificamente, é uma forma de diálogo assimétrico, em que uma das partes busca coletar dados e a outra se apresenta como fonte de informação.. A entrevista pode ser de vários tipos. Nesse projeto, porém, foi utilizada a do tipo semiestruturada que, de acordo com Minayo (2004, p. 108), “combina perguntas.

(19) 19. fechadas (ou estruturadas) e abertas, onde o entrevistado tem a possibilidade de discorrer sobre o tema proposto”, sem condições impostas pelo pesquisador e tem possibilidade ainda maior de analisar a cotidianidade dos diversos entrevistados e grupos. A conclusão inicial é de que: [...] toda entrevista, como interação social, está sujeita à mesma dinâmica das relações existentes na nossa sociedade. Quando se trata de uma sociedade conflitiva como a nossa, cada entrevista expressa de forma diferenciada essa luz e sombra da realidade, tanto no ato de realizá-las como nas informações que aí são produzidas. Além disso, pelo fato de captar formalmente informações sobre determinado tema, a entrevista tem que ser incorporada a seu contexto e vir acompanhada, complementada ou como parte da observação participante. Desta forma, além da fala mais ou menos dirigida, captam-se as relações, as práticas, os gestos e cumplicidades e a fala informal sobre o cotidiano (MINAYO, 2004, p. 120).. Neste trabalho, foi utilizada a entrevista semiestruturada, pois, ao mesmo tempo que valoriza a presença do investigador, oferece também ao entrevistado liberdade e espontaneidade necessárias que envolvem a investigação. Para tanto, podemos entender por entrevista semiestruturada: “Aquela que parte de certos questionamentos básicos, apoiados em teorias e hipóteses, que interessam à pesquisa, e que, em seguida, oferecem amplo campo de interrogativas, frutos de novas hipóteses que vão surgindo à medida em que se recebem as respostas do informante” (TRIVIÑOS, 2012, p. 146). Apesar de o contexto ser muito semelhante ao de uma conversa informal, na entrevista semiestruturada foi seguido um conjunto de questões previamente definidas por um roteiro, a partir do momento em que entendemos, como pesquisadores, que a qualidade da entrevista dependerá muito do planejamento, garantindo, assim, confiança ao entrevistado e respostas legítimas e válidas. Pelo fato de a entrevista ser um processo de interação social os dados são de natureza social, e isso precisa ser levado em conta na interpretação dos resultados. Dessa forma, um dos primeiros passos pode ser a adequação dos roteiros como forma de o pesquisador se preparar, organizar e tomar ciência do processo de coleta de informações. Esse processo de análise do roteiro seria uma forma de o pesquisador interagir, simbolicamente, com um produto seu, ou seja, o roteiro, frente a uma interação que ainda não ocorreu, mas que nesse processo de análise estaria se preparando para a situação real da coleta de informações por meio da entrevista semi-estruturada (MANZINI, 2004, p. 9).. É essencial explicar que as entrevistas somente foram aplicadas: primeiro a partir da autorização para realizá-las concedida pela Funai. Em segundo lugar, as entrevistas foram realizadas com autorização expressa de cada entrevistado, o qual teve a liberdade de resposta e por livre e espontânea vontade assinaram o TCLE (Termo de Consentimento.

(20) 20. Livre e Esclarecido). Os procedimentos adotados, nesta pesquisa, obedecem, portanto, aos Critérios da Ética em Pesquisa com Seres Humanos, conforme a Resolução do Conselho Nacional de Saúde. A seleção dos participantes das entrevistas foi dirigida com vistas a ajudar ao entendimento da questão de pesquisa, ou seja, os sujeitos escolhidos foram aqueles que mais poderiam contribuir com o projeto. A escolha das lideranças, que respondem pelos indígenas, foi baseada no modelo direcionado pela Funai (Fundação Nacional do Índio). Segundo a Funai, na reserva, existe uma pluralidade de lideranças, sejam elas reconhecidas pelo coletivo maior ou por apenas algumas famílias, por isso as entrevistas foram realizadas com os representantes dos principais seguimentos indicados pelo órgão, dos quais foram entrevistados seis indígenas, entre lideranças tradicionais, capitães, caciques e rezadores. Fizeram parte das entrevistas também dois professores, um representante do grupo Brô MCs e um representante dos Jovens Conscientes, além de mais dois jovens da reserva que não fazem parte da formação desses grupos, mas que participaram das oficinas de hip hop realizadas pela CUFA (Central Única das Favelas). Todos os entrevistados são Guarani Kaiowá das reservas Jaguapirú e Bororó. E, por último, foi entrevistado um representante da CUFA em Mato Grosso do Sul. No total, foram efetivas 13 entrevistas. Sobre a técnica quanto ao uso da entrevista, foram identificadas palavras e conjuntos de palavras que tenham sentido para a pesquisa, assim como na classificação em categorias ou temas que tenham semelhança quanto ao critério sintático ou semântico (OLIVEIRA et al, 2003) que não identifiquem, caracterizem ou descaracterizem o indígena participante. Para integrar a análise, por fim, outra técnica, aplicada na coleta de dados, foi o estudo de letras de músicas de rap criadas pelos grupos Brô MCs e Jovens Conscientes, tendo como critério de escolha as músicas mais divulgadas e conhecidas de cada grupo. Para tanto, as letras foram analisadas de acordo com duas categorias, temas principais e secundários, além de identificar frases que retratam este conteúdo. O passo seguinte constitui-se na confrontação dos principais aspectos identificados nas letras de música de rap com as visões da imprensa sobre as mesmas temáticas, a partir da análise dos jornais Diário MS e O Progresso, que são editados na cidade de Dourados. A escolha das notícias foi realizada por meio de um recorte temporal relativo ao que é considerado o mês de lançamento das músicas dos grupos envolvidos, portanto, dezembro de 2009, quando o.

(21) 21. Brô MCs lançou o primeiro CD no festival Conexão Hip Hop em Dourados e, em abril de 2013, quando os Jovens Conscientes divulgaram suas músicas pela primeira vez no portal independente MP3. A pesquisa foi realizada em todas as editorias, tendo em vista os materiais referentes aos indígenas de Mato Grosso do Sul. É importante enfatizar que a pesquisa respeita a visão de mundo destes povos, ou seja, costumes, atitudes estéticas, crenças religiosas, organização social, filosofias peculiares, diferenças linguísticas e estrutura política, não admitindo exploração física, mental, psicológica ou intelectual e social dos indígenas. A pesquisa pretende colaborar com a construção teórica sobre o movimento Hip Hop e a cultura indígena, abrindo novos caminhos para o conhecimento e tecnologias próprias. Em linhas gerais, este trabalho é dividido em três capítulos. No Capítulo I – Aspectos históricos e as pluralidades do Hip Hop –, serão apresentados, conforme o título, os aspectos históricos do Hip Hop, características na América Latina, desde sua origem política até sua chegada ao Brasil, como também a vertente dos dias atuais. Além disso, apontam-se questões que envolvem política, cultura e comunicação dentro do movimento, e ainda analisa-se o Hip Hop como Movimento Social, dando início à discussão de uma voz alternativa dentro da relação com a invisibilidade indígena. Já o Capítulo II – Contextualização sociológica, antropológica e cultural entre indígenas de Dourados -, trata das diferenças e fatos sociais no cotidiano indígena, a reorganização da reserva. Na sequência discute-se o movimento indígena, relacionando-o às questões étnico-raciais, buscando entender como o movimento deriva a visibilidade de silenciados, assim, tratando o hip hop como mediação e resistência cultural para indígenas. Também analisase o movimento como processo alternativo, conhecimento, cidadania, bem como transformação social a realidade indígena. O Capítulo III - Tradições e/ou tensões culturais na reserva? – revela o que acontece dentro do território e as diferenças étnicas encontradas ali; além disso, se discute se o hip hop vem a ser antagônico à comunidade ou se colabora para manutenção de tradições, como o da língua guarani. Ademais, apresenta considerações acerca do questionamento; o movimento serve como negociação ou surgem novas tensões a partir dele? Por fim, analisam-se as entrevistas, as atividades de comunicação na aldeia, bem como as letras como narrativas do cotidiano comparadas às notícias..

(22) 22. Capítulo I – ASPECTOS HISTÓRICOS E PLURALIDADES DO HIP HOP. 1. Aspectos históricos do Hip Hop. O Hip Hop, que surgiu na cidade pós-industrial de Nova Iorque, Estados Unidos, na década de 70, iniciou sua trajetória em um terreno de lutas de direitos civis do movimento negro, sendo considerado uma expressão cultural da diáspora africana. Durante essa época – delicada - para os norte-americanos, o movimento apropriou-se do espaço urbano, simbolicamente, levando às ruas as expressões que utilizavam o canto, a arte e a dança. As mudanças culturais devido ao período de transformações e o compromisso, a princípio, com a cultura negra levaram a uma discussão mais crítica sobre o movimento. As modificações na economia e no espaço público foram fundamentais, portanto, para o discurso sociopolítico e para mistura que impulsionou a cultura Hip Hop (ROSE, 1997, p. 195). Para Rose (1997, p. 200), os efeitos da política de Nova Iorque ficaram despercebidos, no entanto, dois fatos, ocorridos no ano de 1977, transformaram o município e o bairro Bronx, símbolos de ruína, isolamento e desgosto americano: um blecaute e o saque em várias lojas da região. Enquanto os prédios abandonados tornaramse ícones da cultura popular, vistos em filmes como cenário de barbárie, a geração jovem de negros, porto-riquenhos e jamaicanos, reuniam-se para criar formas alternativas para expressarem-se e identificarem-se. Foi esse o momento, segunda a autora, que a cultura Hip Hop emergiu como fonte de informação de uma identidade alternativa e de status social para jovens: [...] O grupo, com um tipo local de identidade, de filiação grupal e com um sistema de segurança próprio, surge em quase todas as músicas do rap, nas dedicatórias das fitas cassete, nas performances musicais para o vídeo e na entrevista com artistas na mídia. A identidade do hip hop está profundamente arraigada à experiência local e específica e ao apego a um status em um grupo local ou família alternativa. Esses grupos formam um novo tipo de família, forjada a partir de um vínculo intercultural que, a exemplo das formações das gangues, promovem isolamento e segurança em um ambiente complexo e inflexível. E, de fato, contribuem para as construções das redes da comunidade que servem de base para os novos movimentos sociais (ROSE, 1997, p. 202). O Bronx foi um exemplo desse novo espaço coletivo. O bairro, devido a construções mal elaboradas tornou-se um local desvalorizado e uma opção aos.

(23) 23. refugiados, além de um palco de brigas de gangues (SILVA, PAULA, COLOMBO, 2010, p. 27). As reestruturações econômicas e sociais da época afetaram a vida cotidiana dos indivíduos. Na cidade nova-iorquina, houve um declínio, por exemplo, nos empregos. Não bastasse a crise, o então presidente Ford vetou uma garantia do Governo Federal para que a metrópole não fosse à falência. Mesmo conseguindo depois um empréstimo, houve cortes em serviços sociais e em salários, crise na habitação, prejudicando os menos favorecidos, como negros e hispânicos, levando-os a confinarem-se em guetos. Eram nesses espaços que se reuniam também os desempregados ou mal remunerados americanos, além de imigrantes, pessoas que fugiam da crise econômica de seus países e da exclusão social, como porto-riquenhos e jamaicanos. Segundo Kellner (1995, p. 231), os governos conservadores negligenciaram negros e pobres naquela época. Iniciou-se, então, na década de 70, a uma luta entre a criatividade e a criminalidade. Enquanto uns praticavam violência, outros procuravam por mudanças, como é o caso do considerado pai do Hip Hop, o jamaicano Kool Herc (SILVA, PAULA, COLOMBO, 2010, p. 28). Se Herc foi o pai, Afrika Bambaataa, fundador da organização Zulu Nation Universal, é considerado o irmão precursor do hip hop. A música criada por ele, que envolvia o ritmo jamaicano e outras misturas, foi chamada de rap, sendo o primeiro sucessso a "Planet Rock", em que a letra pedia para que as pessoas buscassem seus sonhos, socializassem, remexessem e deixassem a alma guiá-las, no hip (movimento atual) e no hop (saltos-jogo dos quadris). A esperança dos indivíduos, diante de diversas brigas entre as gangues, causadas pelo estado de violência, que habitavam os guetos, estava na música e na arte. Por volta de 1974 ele reorganizou “The Organization” e renomeou de “Zulu Nation”, inspirado pelos estudos feitos sobre a história africana (ele ficou impressionado pelos “Zulus”, pois lutavam com honra e armas simples contra o colonialismo e o poder, apesar de aparentemente inferiores). Cinco dançarinos uniram-se a organização usando o nome de “Shaka zulu King” ou simplesmente “Zulu King” com os gêmeos NiggerTwins eram eles os primeiros B.Boys sempre gritando de alegria. A “Zulu Nation” organizou festas e reuniões a qual os membros, principalmente Afrika Bambaataa, passaram o conhecimento sobre a cultura Hip Hop para as pessoas, como era possível dar as pesssoas uma alternativa para a saída das gangues e das drogas (SILVA, PAULA, COLOMBO, 2010, p. 31).. 1.1 O que é hip hop, afinal?.

(24) 24. É necessário compreender o que é este movimento. Entende-se por Hip Hop não somente uma manifestação musical. Segundo Moassab (2011, p. 53), trata-se também de um “movimento político-cultural nascido nos bairros negros das cidades estadunidenses”, como uma resposta à violência urbana sofrida na época por populações hispânicas e afrodescendentes com “forte viés identitário, de afirmação da autoestima do negro e de reivindicações pelos direitos civis, juntamente com a expressão cultural e artística”. Não é apenas através da música que se manifesta o hip hop. A expressão cultural e artística está presente em várias manifestações: 1. No break, dança dos b-boys e b-girls; 2. Nas pinturas urbanas do grafitti; 3. No canto falado do rap (rythmandpoety), entoado pelos MCs, mestre de cerimônia; na prática, o cantor ou o responsável pelo comando da festa, com base nas batidas ritmadas fornecia pelos DJs; e 5. A chamada “consciência” ou “atitude”, que é o modo pelo qual os integrantes do hip hop se posicionam diante do grupo e perante a sociedade, isto é, seu comprometimento social. Sem esses cinco pilares em conjunto não se pode falar em hip-hop [...] (MOASSAB, 2011, p. 54).. Nesse sentido, o hip hop tem sua importância baseada na possibilidade de unir arte e cidadania e dar voz aos subalternos. “Bem, assim seria o hip hop para muitos: DJs descobrindo e criando os break-beats, MC’s rimando, B.Boys dançando e a maioria dos membros da cultura Hip Hop também eram escritores” (SILVA, PAULA, COLOMBO, 2010, p. 32). Bambaataa acreditava na mensagem “lutar com criatividade, não com violência”. Para Pimentel (AMÉRICA..., 2010), é, no entanto, na América Latina, que floresce o hip hop político já nos anos de 1990. As letras recuperavam ideias do movimento negro dos anos 60 e 70 que chegaram a ser alvo de investigações do FBI (Agência Federal de Investigação - em inglês: Federal Bureau ofInvestigation). Cada grupo a seu modo, como PublicEnemy e NiggerswithAttitude (NWA), mostravam em suas rimas o descontentamento com a violência policial e com a falta de oportunidades econômicas. O autor aponta momentos importantes como a queda do muro de Berlim, em 1989, e a eleição do democrata Bill Clinton, em 1993, os quais deram maior força ao projeto neoliberal, impondo padrões econômicos que interessavam apenas aos mercados financeiros. Na América Latina, os governos alinhados com a política dos EUA causaram um descaso na economia com a abertura de mercados e privatizações, tendo como consequências dívidas com o FMI e o Banco Mundial. A música, no entanto, ainda tinha os reflexos do mundo: [...] Favorecida pelas políticas de livre mercado, as privatizações e as novas tecnologias, com o advento da internet, sobretudo, a economia americana.

(25) 25 viveu um período de grande prosperidade. Em paralelo, o rap ganhou espaço no mainstream (3M: mercado, mídia, moda) ao mesmo tempo em que o protesto político passou a ser uma corrente minoritária. Ganhava espaço, principalmente, o gangsta rap, cada vez mais celebrando um modo de vida consumista de artistas que passavam a ganhar dinheiro com a música. Se os clipes de rap antes denunciavam a violência da polícia contra os jovens negros na rua, agora passavam a mostrar como, mesmo em um automóvel luxuoso de último tipo um negro ainda podia ser parado como suspeito. No fio da navalha entre as duas tendências ficavam figuras como certo filho de Afeni Davis, uma antiga integrante do Black PanthersParty, conhecido como TupacShakur, mais tarde 2Pac (PIMENTEL apud BRASIL DE FATO, 2010).. Rose (1997, p. 209) explica que seria ingênuo imaginar que os envolvidos no hip hop nunca tiveram interesses econômicos com seu trabalho, mas muitos dos primeiros integrantes não sabiam como lucrar com o prazer. Para Rose (1997, p. 212), com poucos bens econômicos e muitos recursos estéticos e culturais, “a juventude da diáspora africana designou as ruas como o local para a competição e estilo, como um acontecimento de prestígio e recompensa”. De acordo com Pimentel (2010), a consciência política do hip hop, entretanto, não morreu e, sim, emigrou. Espalhou-se pelo continente escondida na globalização neoliberal. Foi trilha de revolta de jovens na França, na Palestina, na África, contra o autoritarismo, e enquanto ganhava a indústria cultural norte-americana, na América Latina o hip hop era força e voz dos subalternos. Nessa combinação de arte e política, vários jovens passaram a ler Malcolm X e Martin Luther King, bem como a ter informações sobre o Zumbi dos Palmares, Che Guevara, LuisaMahin ou TupakKatari, “ao mesmo tempo em que promovem festas, cursos de dança, desenho e poesia, além de trabalhos sociais nas comunidades onde vivem” (PIMENTEL, 2010). Do ponto de vista histórico, é preciso lembrar que, com o intuito de conciliar o ideal de liberdade e economia escravocrata, os Estados Unidos negaram aos negros a condição humana, acarretando uma difícil reversibilidade na invisibilidade e anonimato a que foi jogada a comunidade negra americana desde o princípio (Cornel apud Castells, 2003, p 67). Para não se perder de si mesma, essa comunidade teve que se imbuir de uma profunda noção de significado coletivo (ibid.), cujos sonhos foram personalizados nos líderes do anos 60 e continuados através do hip hop. Desde essa ótica, é bastante significativa a influência do pensamento libertário dos Panteras Negras e de outros líderes importantes para a comunidade afrodescendente naquele período: Malcom X, Marthin Luther King, James Brown ( MOASSAB, 2011, p. 53).. Sobre cultura, abrimos uma brecha para entendermos que há uma dificuldade na definição do termo, mas que é importante destacar, de acordo com Williams (2000, p..

(26) 26. 10), o emprego significativo do plural “culturas” para diferenciá-lo de qualquer sentido de “civilização”. Mas há ainda questões fundamentais, no uso mais geral, como “cultivo ativo da mente”, que coexistem, por vezes, para indicar modos de vida de um povo ou grupo social, no uso antropológico ou sociológico: Podemos distinguir uma gama de significados desde (i) um estado mental desenvolvido – como em “pessoa de cultura”, “pessoa culta”, passando por (ii) os processos de desenvolvimento – como em “interesses culturais”, “atividades culturais”, até (iii) os meios desses processos – como em cultura considerada como “as artes” e “o trabalho intelectual do homem” (WILLIAMS, 2000, p.11).. “É importante que cultura seja uma alternativa para civilização, na medida em que civilização indica basicamente a supremacia colonial europeia”, segundo Hollanda (2012, p. 12). A autora leva em conta a noção de cultura como recurso, tanto usada pela indústria cultural como por aparelhos culturais ou pelas periferias, não apenas como um catalizador do capitalismo cultural, mas também como resultados culturais, sociais, econômicos e políticos. O mercado cultural da década de 90, se reinventam-se em uma nova produção e circulação de produtos culturais, apontados, segundo Hollanda (2012, p.18), dentro da economia cultural, dos mercados emergentes, como um dos mais promissores do século XXI. Estaríamos, portanto, segundo a autora, diante não somente de uma nova noção de cultura, como também da posição no mercado capitalista, de modo que o [...] lugar da cultura, antes uma esfera autônoma da produção e restrita a poucos, hoje é o centro da economia global e, de certa forma, acessível senão a todos, pelo menos a uma fração bastante significativa de diversos segmentos sociais. Em termos conceituais, portanto, a noção de cultura e seus usos inserem-se de maneira decisiva nesse novo quadro de culturalização, economia da cultura ou melhor, economia criativa, direito ao conhecimento e ao livre acesso à cultura. A antiga ideia de arte e cultura para transcendência, para um fim em-si ou para fins não instrumentais emigra para novas direções e funções sociais da arte e da produção cultural mais abrangente (HOLLANDA, 2012, p. 18 e 19).. Esse novo quadro de criatividade gera, então, resultados em diferentes setores, não somente na cultura, mas também no social, político ou econômico. Quando analisamos uma comunidade, é essa criatividade, por meio da música, por exemplo, que se torna instrumento de transformação social. Embora os passos para enxergarmos essa produção nas periferias tenham sido dados inicialmente na década de 80, foi mesmo nos anos 90 que passamos a perceber melhor, no lazer de uma favela, por exemplo, que.

(27) 27. fomentava não apenas um prazer a esse local, mas também a inclusão social e até mesmo uma forma de sobrevivência. Para Hollanda (2012, p.28), o “campo de operações” eleito por movimentos jovens foi a “militância nas artes”, com o compromisso nas mudanças sociais. Essa criatividade é inovada, ainda de acordo com a autora, “na ampliação deste engajamento, na direção do enfrentamento das questões da exclusão e das desigualdades sociais sofridas pelas populações de baixa renda, na sua maioria composta por negros, pardos e imigrantes” (HOLLANDA, 2012, p. 28), servindo como forma de intervenção política que transforma ainda o cotidiano de suas comunidades. 1.2. Movimento no Brasil. Quando o movimento chegou ao Brasil de fato, na década de 90, o país passava por mudanças na organização social e nos movimentos urbanos - em meio a uma luta política pelo fim do regime militar e a conturbada economia devido à “crise do petróleo”. Por meio das letras de rap, os rappers nacionais mostravam o cotidiano de um país desigual. Em síntese, podemos dizer que as ações coletivas nos anos 70 e 80, no Brasil, foram impulsionadas pelos anseios da redemocratização do país, pela crença no poder quase que mágico da participação popular, pelo desejo de democratização dos órgãos, das coisas e das causas públicas, pela vontade de se construir algo a partir de ações que envolviam os interesses imediatos dos indivíduos e grupos. Os movimentos sociais, populares ou não, expressaram a construção de um novo paradigma de ação social, fundado no desejo de se ter uma sociedade diferente, sem discriminações, exclusões ou segmentações. (GOHN, 1995, p. 203).. Zeni (O NEGRO...2004) mostra que no Brasil, ainda nos anos 70, era comum os bailes black, animados por soul e funk, como os organizados por Milton Salles, exprodutor dos Racionais. Ele lembra também a figura de Nelson Triunfo, pernambucano, que era B.Boy e foi um dos primeiros a dançar nas ruas da capital paulista. Toda “panca” do dançarino passava, por vezes, a imagem de um Brasil libertário, o que não era de fato. Outros nomes importantes, destacados por Moassab (2011, p. 55), foram os de Thaíde, DJ Hum, Styllo Selvagem, Sampa Crewn, Racionais MC`s e Rappin`Hood. Na década de 80, na cidade de São Paulo, segundo o artigo disponibilizado pela Black Sound (2010), intitulado “História do hip-hop no Brasil, que tudo iniciou, quando uma das primeiras letras de rap abordou o tema crítico-social e falou sobre a violência da metrópole. No mesmo artigo, consta que as letras sobre pobreza, racismo e injustiças sociais foram produzidas a partir apenas do final da mesma década. O primeiro registro.

(28) 28. fonográfico só veio em 88, quando foi lançada a coletânea “Hip-Hop – Cultura de Rua” (SILVA; PAULA; COLOMBO, 2010, p. 34 e 35). Foi, nesse momento, que surgiu o MH2O – Movimento Hip-Hop Organizado e outros abrangentes como a Nação Hip Hop Brasil (NHHB). Em site oficial, o MH2O define-se como o movimento mais organizado de Hip Hop do país, já a Nação como uma organização sociocultural. Nos anos de 1990, o Hip Hop consolida o quinto elemento, chamado por Moassab (2011, p. 57) de “consciência” ou de “atitude”, que significava o comprometimento com os problemas enfrentados além do espaço da música, o da comunidade. Para Moassab (2011, p. 192), usando do conhecimento, podemos entender que a mensagem está em todos os elementos do hip hop, seja no break, no grafismo ou no rap. Além disso, “fortalece um elo com a história brasileira e de seus povos originários, tanto no que se refere aos africanos desterrados quanto aos indígenas, cuja cultura oral é mantida até os dias atuais” (MOASSAB, 2011, p. 201). Ao entender o hip hop e seus elementos, podemos encontrar muito mais que um simples movimento. Entendemos que se trata de um instrumento de comunicação, um ato cultural, reivindicatório político, econômico e social dos indivíduos considerados subalternos. O movimento, devido a esse caráter, pode enfrentar privações na grande mídia e, portanto, despertar nessas pessoas a criação de novas formas para serem ouvidas, servindo como processo alternativo de comunicação para grupos ou comunidades, principalmente, ao público jovem. O uso do hip hop para inclusão dos jovens ocorre quase que naturalmente nas periferias deste Brasil afora e nas periferias de todo o mundo. Isto acontece porque o Hip Hop, em primeiro lugar, é uma cultura genuinamente do gueto e tem uma eficácia entre os jovens devido aos valores que estão enraizados em todos os elementos que o compõe. Para ser mais claro, o Hip Hop proporciona aos jovens a auto-afirmação, sensação de liberdade e pertencimento, domínio da situação e do próprio corpo, liberdade, autovalorização e reconhecimento, espírito de liderança, união, respeito e amizade (SILVA; PAULA; COLOMBO, 2010, p. 60).. Nem todo rap tem espírito crítico, mas o considerado por esta autora leva em conta o quinto elemento, que é o conhecimento. No Brasil, como espaço de reivindicação e, portanto, de ciência, o rap trouxe à tona os problemas das periferias do país, das favelas e da juventude negra, inspirado em nomes como Racionais MCs, Sabotage e MV Bill um dos nomes do hip hop da CUFA (Central Única das Favelas) no país – que trabalha, justamente, com a juventude. Além da CUFA também há outro movimento de Hip Hop no país, o chamado Movimento dos Enraizados. No entanto, a CUFA é a precursora com os indígenas de Mato Grosso do Sul, por isso vamos analisá-la melhor neste trabalho..

(29) 29. A CUFA surgiu no Rio de Janeiro, sendo considerada por Jovchelovitch (2013, p. 121) como uma organização híbrida, caracterizada por uma identidade múltipla, que tem como líderes, principalmente, rappers e cantores de hip hop. Faz parte de organizações, como explica Jovchelovitch (2013 p. 208), que [...] expressam respostas de base para a pobreza, a violência e a segregação. Elas são exemplos paradigmáticos de um processo de renovação de atores políticos tradicionais e de inovação em métodos de intervenção na esfera pública. Suas ações alteram a agenda de transformação social, que se torna decentralizada nas múltiplas localizações da atuação coletiva de jovens populações periféricas.. Entre os participantes do movimento hip hop, a atitude é chamada de revolução gangsta que, segundo Hollanda (2012, p. 34), a meta é “construir algum sentido de comunidade no quadro de violência e miséria da vida na periferia urbana. Um dos eixos deste projeto de transformação social é a priorização da ação eficaz e pedagógica, em lugar do confronto agressivo”. Um dos exemplos que se pode citar é o de Nega Gizza, rapper e coordenadora da CUFA. Com seu programa em rádio, enfatiza que a divulgação intensiva de informação é dentro da política do hip hop uma das táticas mais utilizadas, seja para falar sobre as demandas raciais ou sociais, como para falar sobre o cotidiano do negro na favela. Outro exemplo é o de seu irmão, MV Bill, que negocia espaços na mídia tradicional, como foi o caso já no Fantástico, para divulgar o drama de jovens, os “Soldados do Morro”, que mostrou o trabalho de menores no tráfico. Podemos citar ainda o mesmo trabalho de divulgação da precariedade da vida nas favelas pelas ações do AfroReggae, uma ONG (Organização Não Governamental) que tem como missão promover a inclusão e a justiça social por meio da arte, da cultura afro-brasileira e da educação. Daí a importância dessa Central para os jovens do movimento hip hop, por atuar e propor a transformação social, com potencial que vem da cultura, do conhecimento, da identidade das comunidades da qual faz parte ou representa. Crônicas do cotidiano, o rap representa o subúrbio, em perspectivas diferentes daquelas propagadas na grande mídia. Mesmo dotadas do conformismo e das ambiguidades da cultura popular, ao retratar a favela, o hip-hop trata de desconstruir o mito de sociedade democrática, da liberdade e igualdade de condições que o capitalismo tenta vender, e mostrar que vivemos em uma sociedade dotada de sentidos e finalidades diferentes para cada uma das classes. A despeito de sua escassa com- preensão do Estado, os griots da periferia sabem que a lei – o aparato jurídico e policial – está a serviço das elites. Se o tratamento da polícia para o playboy é de proteção, para o negro favelado é bem diferente (COUTINHO, 2008, p. 54)..

(30) 30. A CUFA usa de outro conceito que contribui para esta pesquisa, o de sociabilidade. Para entender a cultura e a sociabilidade, Jovchelovitch (2013, p. 30) também utiliza o conceito de mundo da vida de Schutz (1967), considerando-o como “um sistema de significados, práticas, valores e objetos que constrói o horizonte de fundo no qual as pessoas vivenciam suas vidas”. Compreendendo que esse mundo permaneça invisível, que não permite sua aproximação com a esfera pública, ela entende essas sociabilidades como subterrâneas, como “as formas de vida social que se tornam invisíveis aos olhos da sociedade por conta de barreiras geográficas, econômicas, simbólicas, comportamentais e culturais” (JOVCHELOVITCH, 2013, p. 21 e 22). A noção de sociabilidade foi introduzida por Simmel (1950) para descrever a forma lúdica da vida social, assim como a alegria e a imaginação que acompanham a experiência do social Simmel define a sociabilidade como a forma lúdica da sociabilização, ou seja, a experiência prazerosa, alegre e agradável decorrente da interação das pessoas na sociedade. Imagine se a situação social perfeita: divertir-se com os pares, conversar, rir, brincar e desfrutar o prazer completo de estar junto com outras pessoas. Para Simmel, essa experiência é a essência da sociabilidade. Esse prazer puro da sociabilidade é possível porque atores sociais são capazes de se desprender das formas reais, materiais e concretas da vida social que envolvem estruturas e posicionamentos relacionados a hierarquias e à desigualdade nos campos sociais. Ao se conseguir abstrair a riqueza, a posição e o poder, esquecer o status e outras obrigações da vida “real”, então é possível envolver-se ludicamente no jogo da sociabilidade, na apreciação da presença de outros, nos jogos de conversação e de relação que produzem a convivência e a experiência compartilhada Elemento básico da cultura brasileira, a sociabilidade como ludicidade está particularmente presente na cultura da favela, como expressão da identidade cultural e como um ato de resistência contra as duras condições de vida Ao relacionar a sociabilidade com a brincadeira, o jogo e a arte, Simmel enfatiza o poder da imaginação como um recurso importante da vida individual e social [...] (JOVCHELOVITCH, 2013, p. 30).. Mesmo que a atuação da CUFA, a princípio, fosse na favela, a organização expandiu as ações e atualmente tem atuado em diversos territórios, para além de sua origem, com parcerias nacionais e internacionais. A prova é que as mais diversas vertentes têm ganhado espaço no Hip Hop, a mais recente o rap indígena dos Guarani- Kaiowá, mas ainda há exemplos na Bolívia, no Chile. [...] O Hip Hop na América Latina não para de evoluir e transformar-se. Como na metáfora dos modernistas brasileiros, evocando a herança dos índios tupi da costa brasileira, canibais à época da conquista, o continente promove uma antropofagia cultural, engolindo, digerindo e transformando a herança da diáspora negra (PIMENTEL apud AMÉRICA..., 2010)..

(31) 31. Curioso que, ao pesquisar imagens da reserva de Dourados, por duas ocasiões, as divulgações se referiram a Reserva como a “favela” ou “favelão”.. FIGURA 1 Reservas Jaguapirú e Bororó. Fonte: Revista Época FIGURA 2 Reserva como favela. Fonte: Divulgação.

Referências

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