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Árdua História

No documento Marcados Pelo Amor (páginas 136-146)

Anos atrás

Capítulo 35 Árdua História

Capítulo 35 – Árdua História

Anos antes...

Foi quando a vida parecia incrível e sonhar era a certeza de que o futuro aconteceria, que a página virou, o capítulo mudou e o que parecia incrível se tornou infernal, o que era a certeza se desfez em dúvidas cujas respostas pareciam inexistentes. Foi quando o sorriso era constante que o estrondo o silenciou, o grito apavorou e a guerra dizimou a muitos.

Foi quando Adelaide tinha dezessete anos que seu pesadelo começou.

Estava em casa, com sua tribo, protegida por aqueles que compartilhavam do seu sangue, da sua língua, dos seus costumes e de sua cultura, quando os pássaros se dispersaram apavorados das copas de volumes árvores ao som de disparos seguidos e impiedosos. Os homens negros se colocaram em posição de batalha, acreditavam que enfrentariam o invasão de tribo inimiga, mas portadores de armas leves tiveram que levar as mãos aos céus em um gesto de rendição, homens brancos se apresentavam portando armamentos poderosos e imbatíveis.

Como se não tivessem nenhum valor, como se não tivessem liberdade alguma, tendo arrancado de suas mãos o direito de escolha, homens e mulheres, algemados, amarrados uns nos outros e encaminhados pela mata até o destino que nada mais era do que o início de grande infortúnio. Aqueles que reagiam eram violentamente domados, outros, amedrontados com o que viam, silenciavam-se passivamente. Ali começava a servidão, uma injustificável escravidão.

— Corra! — a mãe de Adelaide, colocando sobre o pescoço da filha o colar que deveria lhe passar no seu casamento, ordenou que a adolescente fugisse pela mata, adentrasse a floresta que tão bem conhecia, que cegamente dominava —. Precisa se proteger e assegurar a continuidade dos nossos ancestrais! Vá!

Relutante, com os olhos avermelhados pela angústia que em seu peito crescia, Adelaide não moveu nem um passo, amava a mãe, a família, se aqueles que amava sofressem, ela se ofereceria ao mesmo sacrifício.

— Não pode me ordenar algo assim, não posso viver sem a sua presença, é de quem retiro forças e admiração! — confessou os verdadeiros sentimentos que cultivava pela figura materna.

— Continuarei em sua vida em seu caminho, levar-me-á contigo dentro do seu coração, nas memórias que carrega — a mulher insistiu —. Sei que é forte, sei o quanto é capaz de vencer árduas batalhas, saberá enfrentar a saudade! Dê-me essa alegria, faça-me orgulhosa, salve-se!

A fim de contentar a quem amava, Adelaide decidiu obedecer, antes de partir abraçou a mulher que lhe trouxera ao mundo, um abraço que despertou a imediata saudade, um abraço que foi concedido como se fosse o derradeiro.

Apavorada pelo cumprimento da profecia, a adolescente correu, colocou toda a força possível sobre as pernas, subiu os montes cobertos por árvores e demais vegetações, deles

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137 Capítulo 35 – Árdua História

observou a tribo lá embaixo, viu a guerra instaurada, viu o horror chegar para o seu povo.

Lembrou-se de algo importante, lembrou-se de um alguém especial: Joaquim. Estavam preparados para aquele dia de tormento, seus antepassados anunciaram que a servidão chegaria e não pouparia dores, foram instruídos para que fugissem, escondessem-se na mata e assegurassem a permanência da tribo. Foram predestinados à união, concordaram com isso, amavam-se.

Mas o rapaz não estava no monte combinado.

Aquilo representava preocupante realidade.

Angustiada, confrontando o próprio cansaço, a adolescente tornou em sua corrida, avançou por entre árvores e arbustos na esperança de encontrar pelo caminho o futuro esposo.

Encontrou-o.

Acorrentado num tronco.

— O que aconteceu? — ignorando os perigos iminentes, esquecendo-se das muitas ameaças que rondavam o lugar, Adelaide se chegou ao namorado, mas este apenas a encarava com olhos assustados, a boca amarrada não permitia que as palavras fossem expostas, que o grito soasse —. Não é possível que isso esteja acontecendo! — tentou encontrar meios para libertar o jovem rapaz, mas parecia impossível.

— Parada! — o europeu, apontando a arma de fogo contra sua vítima em potencial, surgiu por entre as árvores, já escurecia, Adelaide não fora capaz de previamente notar sua presença —. Nem mais um passo! — falava em português, idioma confuso aos africanos da região, mas pela frieza da voz e pelo instrumento ameaçador entre os dedos, qualquer um compreenderia suas intenções.

Rapaz e moça foram ligados por correntes.

Rapaz e moça foram encaminhados ao tormento.

Homens e mulheres, crianças e idosos, tratados com desprezo, forjados de dignidade, eram aos montes amontoados em navios imensos, desconfortáveis, que cheiravam à morte, que anunciavam o inferno. Tinham que tirar suas roupas, tinham que aceitar a injusta e desumana acomodação, tinham que ser passivos e obedientes se quisessem manter a única liberdade que possuíam: respirar.

Rapaz e moça, distantes de seus pais, separados de seus familiares, sem nem ao menos terem notícias de como estavam, tiveram a sorte de estarem um ao lado do outro, cumprindo uma promessa antiga feita em nome do amor que compartilhavam, a promessa de nunca se afastarem, jamais se separarem, estarem sempre juntos.

Em condições deploráveis, em uma situação lastimável, a viagem durou meses infindáveis, meses de choro, de lágrimas, de desespero. Meses nos quais mortes aconteceram e corpos foram lançados ao mar sem qualquer digna cerimônia. Meses nos quais a fome se apresentou, uma fome que ameaçava matar quem a sentisse, uma fome que tirava dos sujeitos destinados a um futuro obscuro toda sua sobriedade e motivava guerra pelas migalhas que eram lançadas. Meses de podridão. Meses sem respirar ar puro, sentindo o cheiro putrefato dos dejetos humanos naquele ambiente mesmo lançados. Meses de escuridão e sustos intermináveis. Meses de pavor ao estrondar de tempestades altivas. Meses cruéis. Meses excruciantes.

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138 Capítulo 35 – Árdua História

Após meses de tortura os navios encalharam nos portos, deles saíram milhares de negros assustados, que sentiam os olhos arderem pelo retorno da luz, muitos dos quais acabaram cegados, sem o direito de enxergarem o mundo. Olhavam ao redor, pisavam em terra estranha, eram colocados num lugar que não o deles, eram lançados em território indesejável.

Rapaz e moça, de mãos dadas, oferecendo um ao outro a segurança de que precisavam, angustiaram-se ao perceber que homens e mulheres eram separados, dirigidos a lugares opostos, surpreendidos pela incerteza do reencontro.

Tiveram que romper a ligação entre as mãos.

Tiveram que se despedir através da fala do olhar.

Feita de mera mercadoria, colocada para ser comercializada como um simples objeto, Adelaide foi posicionada junto a outras negras para que ficasse exposta aos sórdidos olhos de fazendeiros perversos interessados na compra. Não demorou para ser escolhida pelo cliente que tinha preferência: foi comprada pelo antigo barão de São Pedro, um homem terrível, pai de Frederico, tão maligno quanto o filho.

Separada de sua família, tirada de suas origens como se não valesse nada, como se tivesse nascido para servir, a adolescente chegou a seu novo lar, à sua nova realidade, ao ambiente que lhe traria tormentos duradouros. Mas o semblante apavorado deu lugar ao sorriso quando seus olhos cruzaram com os de Joaquim: estariam juntos como um dia prometeram, como um dia sonharam.

— Essa é a história desse amuleto, a mais triste que poderia contar — Adelaide, sentada junto ao filho sobre o toco seco no lado de fora da senzala, contou um pouco sobre o passado, revelou a importância do acessório que carregava no pescoço —. Ao menos cumpri o desejo de minha mãe, tenho dois filhos, assegurei a continuidade da nossa tribo...

— Ouvir tudo isso traz revoltas ainda maiores, não entendo como são tão frios, como conseguem usar de tanta perversidade, chego a pensar que nunca se libertarão dessas mentes desprezíveis — Artur, atento a cada vírgula, esbanjou a ira.

— Não se incomode por isso, já foi e eu consegui sobreviver — repousou o colar sobre as mãos do filho —. Agora ele é seu — encarou-o nos olhos —. O amor que há entre você e Ana é grandioso e poderoso, não há outro fim que os aguarda se não a eterna união. Leve esse símbolo com vocês, mostre-o aos seus filhos, aos seus netos, faça a história do seu povo conhecida!

— É claro que farei, mas não acha cedo para me dar isso?

— Gostaria que fosse cedo, gostaria de ter a certeza de que os veria desfrutando da liberdade, mas essa é uma dúvida que tenho, é um medo que não me deixa... É claro, procuro alimentar a fé, mas não poderia ser imprudente e adiar o meu pedido, talvez falte tempo, o futuro sempre será um emaranhado de surpresas...

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139 Capítulo 36 – Insistência

Capítulo 36 – Insistência

As famílias ricas de São Pedro, pessoas poderosas e proprietárias de invejáveis valores, receberam o convite para a noite de gala que aconteceria em poucos dias, uma noite que para muitos poderia representar um marco, uma reviravolta, o impacto da novidade. Desconhecidos poderiam construir amizades, negócios poderiam ser feitos e, como não poderia deixar de ser, a comercialização de seres humanos aconteceria descaradamente, por isso a presença de escravos muito bem treinados à arte musical, seriam capazes de render grandes lucros aos seus avarentos senhores.

As famílias se animavam.

Entusiasmavam-se.

Quando os poderosos se reuniam a história mudava.

— Vejam só! — durante o jantar, deliciando-se com a fartura aos seus olhos exposta, Frederico exclamou —. Teremos uma noite para confraternizações e diversão — lia o convite recebido —. Será uma ótima oportunidade para que possamos formalizar o noivado de Ana!

Aquele maldito evento irritava a moça de coração rebelde, sabia como se davam as festas que participava, era um verdadeiro espetáculo de exibicionismos, pessoas já ricas preocupando-se em se enriquecerem ainda mais, em alimentarem a própria vaidade, em inflar o próprio erro a partir de contratos grandiosos e aquisições egoístas.

— Vamos mesmo insistir nesse casamento? — a jovem mulher interrompeu a refeição, levou o olhar rígido ao surpreso pai —. Cansei de dizer que essa não é a minha vontade, está longe de ser o meu desejo, sou tão incompreensível assim?

— Sua teimosia é irritante! — o barão disse com voz grave —. Acha mesmo que pode mudar minha decisão com seus protestos descabidos? Acredita de verdade que a sua opinião importa em alguma coisa? Não seja ingênua se julga ter o poder de mudar meu pensamento, já está decidido, poupe-se de raivas inúteis e de discussões que não chegarão a lugar algum, aceite de uma vez!

— Depois não reclame quando ouvir por aí que tem uma filha divorciada, uma filha topetuda que desprezou a sua ordem como se faz com piadas! — achou que ameaçando conseguiria alguma voz, mas agiu completamente equivocada.

— Isso é uma ameaça?! — o homem impiedoso golpeou a mesa, os talheres saltaram, soaram seu ruído —. Antes que jogue o meu nome aos porcos eu tiro a sua vida! — aquela sim era uma ameaça perigosa, certeira, algo que inquestionavelmente poderia acontecer.

— Frederico... — Laís, até então calada, compartilhando das angústias da pobre filha, levou a mão ao braço do marido em vã tentativa de acalmá-lo.

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140 Capítulo 36 – Insistência

— Chega! — o sujeito descontrolado se levantou rispidamente, os escravos que a tudo assistiam se assustaram, conheciam bem até onde chegavam os limites daquele homem, eles eram assombrosamente profundos —. Estou farto de ser desrespeitado dentro da minha própria casa! — esbravejou —. Esse assunto se encerra aqui, não quero ouvir nem mais uma reclamação, nem a menor oposição, esse casamento acontecerá queiram ou não, gostem ou não, é o que eu quero!

Assustada pela raiva que tomava o barão, Ana se recolheu à mudez, mas não significava que rendera-se ao conformismo, que aceitara o que parecia imutável, permaneceria na luta, uma sorrateira, discreta e silenciosa luta.

¤

Inscrito ao concerto com seu suposto escravo, Victor teve o direito a convidar duas pessoas, em sua mente não poderiam ter surgido companhias que não fossem as adoráveis vizinhas que, além de toda a boa ajuda concedida, ofertavam também uma agradável amizade.

O que o nobre cavalheiro não sabia era que convencer Rute a uma exposição em público não seria tarefa simples, mas ele não se dava por derrotado tão facilmente, acostumado a batalhar insistiu em seu desejo.

— Você não entendeu, apesar de esse papel ser um convite, a minha fala não é menos que uma convocação! — na casa da mascarada mulher, sendo sua companhia na bem ornamentada sala de estar, Victor encarava-a desejoso por ter seu pedido atendido —. Foi muito importante para que Felipe participasse desse evento, sua presença é fundamental, precisa estar conosco!

— Sei o quanto são honrados e gentis, já percebi o quanto são sinceros na amizade que nos oferecem, mas não precisa me convidar tão assiduamente por gratidão, vê-los contentes e animados por essa noite tão importante já é altamente gratificante! — Rute, também dominada por persistência, teimou em sua decisão, dificilmente mudaria de ideia, não se sentia preparada para encarar os olhos do mundo.

— E se eu disser que não é por gratidão? — o homem galanteador, sentindo afetos diferentes por aquela que se mostrava tão irredutível, assumiu como maior objetivo vencer a discussão.

— Por qual outro motivo seria? — a mulher descrente, esquivando-se dos perigosos pensamentos que invadiam sua mente também se propôs a não ceder às tentadoras investidas.

— Por admiração? Por companheirismo? Por que gostei de conhecê-la e adoraria passar mais tempo ao seu lado? — não se desconectava dos olhos castanhos que refletiam o brilho dos lampiões, olhos que ao conhecê-los eram sombrios, mas que agora recebiam de volta o brilho que tinham —. Todas essas razões são verdadeiras e você pode escolher a que melhor agradá-la, ao menos me dê o prazer de

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141 Capítulo 36 – Insistência

sua querida companhia! — seu coração o incentivava ao incansável clamor, começava a se apaixonar.

— Eu não posso, caro Victor, eu não posso... — abaixou os olhos, se não parasse de encarar a figura atraente corria o risco de se permitir ao que temia, percebia que seu ser era tomado pelas mesmas sensações de tempos atrás, de quando apaixonou-se pelo sujeito errado —. Sara terá toda a liberdade, representará a mim como sempre tem feito...

— Mas eu não quero sua representante, estimo sua pessoal presença! — desesperado por ouvir um singelo e doce “sim”, Victor tocou o queixo da mulher receosa, ergueu seu semblante, tornou a encarar o olhar que o encantava —. Se me der um bom motivo prometo não insistir.

— Sou uma aberração, alguém que afasta os outros de perto, alguém condenado à solidão — levou as mãos ao próprio rosto, onde estava a máscara que escondia as cicatrizes de um passado injusto —. Teria um motivo irrecusável para me fazer acreditar que sair de onde estou segura e protegida é uma ideia sensata?

— Ao contrário do que pensa, você é bela... — Victor, cheio de sentimentos por Rute, acolheu suas mãos, aproximou-se levemente daquela que começou a despertar um interesse diferente, algo mais íntimo, que só o coração conhece —. Sim, muitas pessoas lá estarão, mas o que isso importa? Talvez elas te julguem, isso não é um problema seu, talvez elas nem percebam sua presença e aí você verá o quanto foi inútil se esconder todos esses anos, mas o principal, o que não é um talvez, é a certeza de que estarei ao seu lado, serei seu companheiro, não permitirei que seja machucada, não mais, não a partir do momento que aceitar o que tenho a oferecer.

O toque singelo entre as mãos fez Rute se sentir acolhida, aceita, compreendida apesar de todos os medos, de todas as desculpas, de todos os receios que a impediam de andar, de tudo aquilo que usava para se esconder do mundo. Mas recolheu as próprias mãos, interrompeu a agradável sensação proporcionada pelo toque, não queria sofrer outra vez o que um dia a destruiu.

— Você é insistente — lançou o tímido e alegre sorriso, gesto que há muito não fazia, não tinha razões para fazê-lo —. Tudo bem, serei sua companhia mesmo acreditando que seja loucura, mesmo tendo a convicção de que deverei estar preparada para qualquer adversidade!

— Fará a mim o mais feliz dos homens! — beijou as delicadas mãos em um gesto cordial —. Ainda que algum inconveniente aconteça não se esqueça de que haverá alguém que a admira bem ao seu lado! — firmou a promessa.

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142 Capítulo 37 – Apaixonar-se

Capítulo 37 – Apaixonar-se

Naquela mesma noite na qual Rute permitiu que os sentimentos a governassem e decidiu por aceitar ao convite de um nobre guerreiro que, de maneira sutil, apresentava-se aos seus olhos, outro casal, inexperiente nos assuntos do coração, ingênuo quanto à força do amor, entregava-se a uma agradável conversa sentados no jardim que garantia à misteriosa casa um ar mais natural. Debaixo das estrelas, cheios de confusões, Felipe e Sara trocavam palavras amistosas, mas em silêncio, apenas para eles mesmos, confessavam o quanto era bom ouvir a voz um do outro.

— Sua ama e você são duas pessoas especiais, merecem o que de melhor a vida possa oferecer, se dependesse da minha vontade todos os seus dias seriam floridos...

— o jovem músico, animado pela chance de tocar perante um grande público, confessava o quanto fora imprescindível o apoio de duas pessoas que nunca imaginara conhecer.

— Acredito que recebemos aquilo que doamos ao mundo, aquilo que sinceramente está dentro de nós — a adolescente, compreendendo que a vida segue um fluxo e que naquele instante lhe proporcionava a experiência do gostar de alguém, sentia-se confortável para se abrir, revelar seus pensamentos, suas crenças — . Tenho certeza de que é merecedor de boas coisas. Depois de tanto sofrimento é esse sorriso que precisa estar na sua face todos os dias!

Não havia percebido, a curva de seus lábios era espontânea, estar com alguém que proporcionava a sensação de paz era em muito gratificante ao garoto acostumado com açoites, acostumado também com a ideia subversiva que lhe obrigavam a aceitar sobre a sua condição: merecia a escravidão.

— Sempre disseram o contrário, sempre acreditei no oposto, diziam que eu era um desalmado merecedor da servidão, digno apenas de um trabalho interminável, sinto-me lisonjeado ao ouvir que boas coisas devem me alcançar... — levou o olhar ao céu, tentava compreender a reviravolta que transformou seu viver, como queria que tamanha sorte alcançasse o seu povo, a sua família.

— Ouço dizer como funcionam as coisas por aí, contam a forma desumana pela qual pessoas como você são tratadas, mas não podem acreditar em discursos ignorantes, vocês são especiais, maravilhosos, tanto quanto qualquer outro ser humano — na intenção de oferecer conforto, como se tal gesto pudesse aliviar as muitas dores já sofridas, Sara repousou a mão sobre a do violinista, um toque singelo, sutil.

Um toque diferente.

A partir daquele momento, quando os corpos se tocaram, as almas juvenis também se conectaram através de olhares que brilhavam, reluziam, perdiam-se um no outro naquele misto de emoções que afloravam e confusões que despertavam.

Um toque agradável.

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143 Capítulo 37 – Apaixonar-se

Ficariam para sempre naquele gesto se não fosse a timidez despontar e a vergonha incomodar.

— Como eu estava dizendo — sendo o primeiro a romper a ligação dos olhares, Felipe motivou mesmo que indiretamente o curto afastamento de Sara, procuraram uma distração para os tantos pensamentos —, você e Rute são pessoas especiais para mim, sinto-me sortudo por ter o prazer de contar com essa amizade, por isso quero que estejam presentes na minha apresentação, esse pedido é inegociável! — frisando o quanto se importava com a presença daquelas que por toda a vida receberiam sua gratidão, o jovem garoto tirou do bolso o papel bem enfeitado, com letras estilosas e marcantes, estendeu-o à amiga —. Esse é o seu convite — e, então, voltaram a se encarar.

— Como seria capaz de negar? — possuindo o cartão, analisando seu conteúdo, a adolescente voltou a se atentar ao semblante que começava a almejar para sempre contemplar. O que acontecia com ela? Não queria admitir, por vergonha talvez, ou insegurança, mas sabia que experimentava o começo de uma paixão —. Imagino o quanto esteja feliz, é a concretização de um sonho!

— Como seria capaz de negar? — possuindo o cartão, analisando seu conteúdo, a adolescente voltou a se atentar ao semblante que começava a almejar para sempre contemplar. O que acontecia com ela? Não queria admitir, por vergonha talvez, ou insegurança, mas sabia que experimentava o começo de uma paixão —. Imagino o quanto esteja feliz, é a concretização de um sonho!

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