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CAPÍTULO I OS FUNDAMENTOS E OS CAMINHOS METODOLÓGICOS

2.5 POR UMA HISTÓRIA DA INFÂNCIA

2.5.2 A criança nas leis e documentos oficiais brasileiros

Situo nesta parte a organização legal do processo educacional de crianças de zero a seis anos de idade com base nas Constituições Federais (1934, 1937, 1946, 1967, 1988), na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDBEN (1961, 1971, 1996), em documentos oficiais como as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (DCNEI), o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (RCNEI), a Política Nacional da Educação Infantil (PNEI) de 2006, Plano Nacional de Educação (PNE) e nas Leis do FUNDEF26 e FUNDEB27. Considero as formas de encaminhamento e atendimento a crianças de zero a seis anos de idade e reflito sobre a compreensão de criança e de educação oferecida de acordo com o contexto histórico e social.

Nessa perspectiva, traço uma discussão sobre a educação infantil nas legislações e documentos oficiais brasileiros, como resposta aos seguintes questionamentos: que

26 Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério.

27 Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da

compreensão de criança/infância está explícita ou implícita nesses documentos oficiais do Estado brasileiro? Como a criança é vista em cada momento histórico?

Nem sempre a educação da criança foi contemplada na legislação brasileira. Quando se criava algum documento, o objetivo geralmente era o de suprir alguma carência.

As transformações políticas e econômicas da década de 1930 (processo de industrialização, urbanização crescente) influenciaram significativamente a visão de educação, que, a partir e então, passou a ser um meio de sucesso profissional e de ocupação de posições mais valorizadas na sociedade. A Revolução de 1930 instituiu a República Nova. Foi nessa década que surgiu o Programa de Educação dos Pioneiros da Escola Nova, que previu a criação de instituições que atendessem crianças do pré-escolar e creche, e a educação deveria estar assentada nos princípios de laicidade, obrigatoriedade e gratuidade. A Legislação Trabalhista de 1932, instituída por Getúlio Vargas, previa a criação de creches pelas empresas em seus estabelecimentos para atender às crianças em idade pré-escolar filhas das funcionárias. Também, nessa década, foi criado o Ministério da Educação e Saúde e já existia o Departamento da Criança no Brasil, que era um instituto de proteção e assistência à infância, criado em 1919, de vinculação privada28.

Nesse contexto de mudanças foi escrita a Constituição Federal de 1934, que, mesmo considerada uma lei democrática em razão da influência dos ideais apresentados no Manifesto dos Pioneiros29, que reconhecia a educação como o direto de todos e dever do Estado, e com avanço para a educação da sociedade brasileira, não faz nenhuma referência à educação de crianças com menos de sete anos. Esta Constituição, no Artigo 149, estabelece que “A educação é direito de todos e deve ser ministrada, pela família e pelos Poderes Públicos”. As alíneas a e b do Artigo 150 estabelecem respectivamente: “ensino primário integral e gratuito e de freqüência obrigatória extensivo aos adultos”; “tendência à gratuidade do ensino educativo ulterior ao primário, a fim de o tornar mais acessível”. Vemos nessas alíneas a importância dada à educação para as crianças em idade obrigatória (dos 7 aos 14 anos), uma referência ao ensino primário, que correspondia ao atendimento às crianças a partir dos sete anos de idade, considerada por muitos filósofos como a “idade da razão”. Já para a criança pequena, não existia e, se existisse, seria assistência, e não educação, como vimos anteriormente.

28 Kramer, 2006, p. 51

29 Grupo de educadores que lutaram por melhores condições para a educação e contra a pedagogia da imposição. Esses manifestantes, como Anízio Teixeira, Florestan Fernandes, Lourenço Filho, foram influenciados pelos ideais de John Dewey.

Ainda nessa década, começaram a ganhar força muitas ideias antiliberais e autoritárias, e o clima político ficou acirrado. Azevedo Amaral e Francisco Campos não estavam de acordo com uma “política descentralizada de ensino, que concedesse poderes às unidades federadas para a organização de seus respectivos sistemas” (HAIDAR e TANURI, 2004, p. 60). A orientação centralista desencadeou em 1937 numa nova Constituição e, logo em seguida, o Golpe de Estado que instituiu o Estado Novo. Se a educação ainda não gozava de efetivas mudanças, com essa lei, completamente oposta à de 1934, a situação se agravou. Foram eliminadas todas as conquistas do Movimento Renovado. Era uma carta que previa o mínimo de gastos e de envolvimento do Estado na educação.

Se a de 1934 foi considerada democrática por conter muitas ideias dos representantes do Manifesto dos Pioneiros, a de 1937 foi completamente antidemocrática, apresentando a real situação da ditadura Vargas. O Artigo 125, pro exemplo, estabelece que “A educação integral da prole é o primeiro dever e o direito natural dos pais. O Estado não será estranho a esse dever30, colaborando de maneira principal ou subsidiária, para facilitar a sua execução ou suprir as deficiências e lacunas da educação popular”. Percebemos que o compromisso do Estado com a Educação é secundário, já que a primeira obrigação é dos pais. O Estado poderia auxiliar, colaborar no que fosse possível, isto é, “não seria estranho a esse dever”, mas não era obrigado oferecer. Se o Estado não tinha compromisso com a Educação das crianças maiores (a partir dos sete anos, até então considerada obrigatória) imaginem a educação infantil para a qual nem mesmo existia a obrigatoriedade. Os Artigos 129 e 130 estabelecem que

a infância e à juventude, a que faltarem recursos necessários à educação em instituições particulares, é dever da nação, dos Estados e dos Municípios. O ensino primário é obrigatório e gratuito. A gratuidade, porém não exclui o dever de solidariedade dos menos para com os mais necessitados.

Havia incentivo para que a sociedade civil, empresas ou instituições assumissem a educação ou criassem instituições particulares.

Com a derrocada da ditadura Vargas, uma nova ordem começa a ganhar corpo, isto é, discute-se sobre a descentralização do poder instituído e uma Nova Carta Constitucional é promulgada em 1946 sob os ideais de redemocratização da nação. O Artigo 166 dessa Constituição determina que “a educação é direito de todos e será dada no lar e na escola”. O Artigo 168 inciso I afirma que “o ensino primário é obrigatório e só será dado na língua

nacional”. O Estado/Nação volta a assumir suas responsabilidades da educação nacional, o ensino primário é garantido por lei e o acesso à educação é direito de todos (sete aos quatorze anos de idade).

Apesar de a educação infantil não ter sido garantida na Constituição Federal, algumas instituições e projetos foram criados e implementados para o atendimento às crianças menores de sete anos. Em 1940 foi criado o Departamento Nacional da Criança (DNCr), vinculado ao recém-criado Ministério da Educação e Saúde, cuja tônica era o atendimento médico, objetivando uma medicina preventiva para que os altos índices de mortalidade infantil fossem minimizados. Embora esse departamento promovesse publicações de livros e artigos para divulgação sobre o desenvolvimento da criança e estabelecesse normas para o atendimento em creches, não teve força suficiente para que a educação de crianças pequenas começasse a ser vislumbrada. Sua atuação era muito mais assistencial do que educativa. Em 1942, foi criada a Legião Brasileira de Assistência (LBA), órgão federal que previa assistir às crianças e famílias carentes. Segundo Rosemberg (2006, p. 151), a LBA era “considerada como criadora e criatura do serviço social no Brasil, o qual desenvolveu uma série de programas destinados à maternidade e à infância, com base no voluntariado”.

Em 1961, a primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei 4.024/61, foi promulgada, trazendo (Artigo 23), pela primeira vez, uma referência à educação infantil, ou, como é denominada no texto da lei, educação pré-primária, “destinada aos menores de sete anos, e será ministrada em escolas maternais ou jardins-de-infância”. Embora se refira à educação para os menores de sete anos, não fala do dever do Estado em oferecê-la. O Artigo 24 determina que “as empresas serão estimuladas a organizar e manter, por iniciativa própria ou em cooperação com os poderes públicos, instituições de educação pré-primária”. Aí vemos o incentivo à criação de instituições particulares, ou mantidas por empresas ou grupos particulares.

Acreditamos que esta referência (educação pré-primária) seja para o atendimento a crianças de quatro aos seis anos, ou cinco e seis anos em escolas maternais ou jardins-de- infância. Observamos que as crianças de zero a três anos ficaram de fora, pois a creche não foi contemplada. Esta LDB de 1961 trata também da obrigatoriedade a partir dos sete anos de idade. Se com obrigatoriedade (curso primário, por exemplo), já era gritante a quantidade de crianças (a partir dos sete anos) fora da escola, imaginem a situação das crianças com menos de sete anos, para quem a obrigatoriedade de oferta de educação escolar não era contemplada na Lei! Mesmo que tenha ficado só no papel, a referência à educação pré-primária foi um

marco na história da educação infantil brasileira, pois, pela primeira vez, reconhecia-se o direito da criança à educação.

Nesse ínterim, em 1964, foi instituída a Ditadura Militar no Brasil e, em 1967, foi promulgada uma Nova Constituição Federal. A educação infantil assim como nas constituições anteriores não foi contemplada. A obrigatoriedade foi pronunciada apenas para as crianças a partir dos sete anos de idade.

Uma década mais tarde, em 1971, a Lei 4.024/61 foi substituída em sua grande parte, permanecendo apenas as finalidades e os objetivos, pela Lei 5.692/71, que fixa diretrizes e bases para o ensino de 1º e 2º graus. A educação infantil mais uma vez não foi contemplada nessa reformulação. Muda-se a nomenclatura para ensinos de 1º e 2º graus. Fala-se de currículos, dias letivos, organização administrativa e didática, disciplinas e habilidades dos profissionais. O Artigo 19, § 2º, pronuncia que “os sistemas de ensino velarão para que as crianças de idade inferior a sete anos recebam conveniente educação em escolas maternais, jardins de infância e instituições equivalentes”. No entanto, essa referência é muito vaga, pois o que é velar? Seriam as próprias instituições de primeiro grau que ofereceriam essa educação? E qual o papel do Estado frente a isso?

No Novo Dicionário Aurélio (2004), existem dois significados para a palavra velar. O primeiro vem do latim velare, significa cobrir com véu; encobrir, esconder, ocultar, disfarçar, dissimular; tornar sombrio; anuviar. O segundo, também de origem latina, vigilare, significa estar alerta; vigiar; estar de vigia, de guarda, proteger, patrocinar, zelar. Nesse caso, qual seria a função das escolas de primeiro grau em relação à educação infantil? Vigiar, proteger, zelar ou dissimular, disfarçar, ocultar o atendimento às crianças pequenas?

Ainda fazendo referência a Lei 5.692/71, o Artigo 61 fala no estímulo das empresas em organizar e manter educação que preceda o ensino de primeiro grau. Havia uma isenção completa do Estado em relação à educação de crianças pequenas. As poucas iniciativas que existiam em relação à pré-escola nessa década (1970) objetivavam “compensar” as crianças com déficit cultural, isto é, as crianças das classes populares eram consideradas menos capazes em virtude da privação cultural que sofriam e, se se quisesse melhorar os índices de aprovação no primeiro grau, seria necessário oferecer educação a essas crianças. Muitos acreditavam que as crianças fracassavam porque apresentavam desvantagens socioculturais e, assim, surgiram vários programas compensatórios, como afirma Kramer (2006, p. 24):

[...] a concepção de infância implícita nos discursos oficiais, ao contrário, supõe que existe um padrão médio, único e abstrato de comportando e desempenho infantil: as crianças das classes sociais dominadas (economicamente desfavorecidas, exploradas, marginalizadas, de baixa renda) são consideradas como “carentes”, “deficientes”, “inferiores” na medida em que não correspondem ao padrão estabelecido. Faltariam a estas crianças, “privadas culturalmente”, determinados atributos, atitudes ou conteúdos que deveriam ser nelas incutidos. A fim de suprir as deficiências de saúde e nutrição, as escolares, ou as do meio sócio-cultural em que vivem as crianças, são propostos diversos programas de educação pré- escolar de cunho compensatório.

Em 1975, o Ministério da Educação e Cultura criou a Coordenação de Educação Pré- Escolar (COEPRE)31 e, em 1976, a LBA implementou o primeiro programa de educação pré- escolar de massa que objetivava diminuir os índices de reprovação na primeira série e resolver alguns problemas sociais que estavam diretamente ligados à educação das crianças. Era preciso compensar essas crianças carentes, tanto social como culturalmente.

Porém, mesmo já em pleno século XX, o Brasil continuava atrasado em relação ao atendimento educacional às crianças de zero a seis anos. O que havia até então, como vimos no supracitado texto, era um atendimento caritativo, pois a maioria dos atendimentos estava vinculada aos Programas Sociais ou ao Ministério de Assistência Social.

As discussões, os debates e movimento de luta pela redemocratização não só do ensino brasileiro, mas da sociedade até então regida pela Ditadura Militar, estavam em uma verdadeira efervescência. A luta por eleições diretas encontrava-se no limiar de sua conquista. Em 1985 cai a ditadura militar e o primeiro presidente é eleito pelo voto direto. Assim, começam as discussões para a promulgação da Nova Constituição Brasileira a qual é promulgada em 1988. É só a partir dessa constituição que a criança começa a ser vista como um ser de direito.

Assim, as décadas de 80 e 90 do século passado foram cruciais nas conquistas das crianças pelo direito à educação. A partir de muitas discussões e mobilizações de vários segmentos da sociedade (profissionais de educação infantil, ONGs, sindicatos, sociedade civil organizada), começa-se a compreender a criança como alguém que tem direito a todos os direitos garantidos em lei, sem exceção ou discriminação de raça, cor, sexo, religião ou classe social. Passa-se a vê-las como um pequeno cidadão, enquanto tal, um ser de direito. Diante dessa realidade, Kramer (2008, p. 55) expõe que “as crianças - também as de zero a seis anos - são cidadãos de direitos, têm diferenças que precisam ser reconhecidas e pertencem a

diversas classes sociais, vivendo na maioria das vezes uma situação de desigualdade que precisa ser superada”.

A educação infantil dos anos 80 surge associada à afirmação de uma classe que começa a mobilizar, reivindicar esse direito. Ampliam-se os debates sobre a educação infantil. Alguns grupos de educadores e mães (donas de casa) passaram a lutar pela garantia da educação das crianças de zero a seis anos. Sendo a educação responsabilidade de todos (família, comunidade, poderes públicos), deve-se pensá-la em conjunto, envolvendo a todos. Foi isto o que a comunidade, pais e educadores fizeram: lutar pela garantia da oferta da educação pública e gratuita para seus filhos menores de sete anos. E assim várias instituições começaram a surgir no cenário brasileiro, porém as instituições destinadas a essa faixa etária, tinham, na sua maioria, ainda um caráter asilar e eram voltadas para as crianças das classes populares.

No entanto foi só a partir da Constituição de 1988 que, pela primeira vez, houve, efetivamente, a oferta dessa educação de maneira que pudesse atender as crianças de zero a seis anos. Porém havia ainda uma distância entre o que estava garantido na lei – o legal – e o que de fato era oferecido – o real. Embora a legislação, os poderes públicos passassem a reconhecer a criança como um ser de direto, ainda não havia uma política de criação de instituições e formação de profissionais para atender a essa faixa-etária. Muitas instituições continuaram sendo assistenciais e não educativas.

No Artigo 208 da Constituição de 1988, o Inciso IV pronuncia que o “atendimento às crianças de zero a seis anos de idade será em creche e pré-escola”. O Artigo 211, § 2º, reza que “os Municípios atuarão prioritariamente no ensino fundamental e na educação infantil”. Assim pela primeira vez, uma Constituição Federal se refere à educação infantil como dever do Estado, estabelece atribuições, isto é, responsabiliza os municípios em garanti-la.

A década de 1990 foi outro marco na história da infância brasileira. A criança passou a ser valorizada, compreendida e assegurada no seu direito à saúde, à educação, ao lazer, à proteção etc. Foram criados leis e documentos oficiais que beneficiaram a criança não apenas as de zero a seis anos, mas as crianças maiores e os adolescentes. O primeiro desses documentos foi o Estatuto da Criança e do Adolescente (1990), comumente conhecido como ECA. Entendemos que uma legislação específica para a infância e o adolescente é um ganho significativo porque, até então, não havia qualquer garantia em lei desse direito, exceto a Constituição de 1988. No Artigo 53, o ECA afirma: “A criança e o adolescente têm direito à educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da

cidadania e qualificação para o trabalho...” e no Artigo 54: “É dever do Estado assegurar à criança e ao adolescente (...) IV - atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a seis anos de idade”, reafirmando assim o que já estava garantido na Constituição Federal, que é o direito da criança pequena à educação.

Assim como foi exposto, ao longo do século XX, a educação infantil se desenvolveu de acordo com as políticas sociais e culturais, as quais influenciaram de forma decisiva, a partir das reivindicações de vários segmentos da sociedade, na criação e na garantia da educação dessa faixa etária. A criança não era mais vista com um adulto em miniatura, tampouco como um ser sem importância. A partir de então, inicia-se a criação de instituições infantis – creches e pré-escola. Era necessário que cada município ofertasse vagas para essa faixa-etária e garantisse o acesso das crianças.

Nessa mesma década,em 1994, foi instituída a Política Nacional de Educação Infantil (PNEI) com o propósito de esclarecer e desmitificar a dicotomia entre o cuidar e o educar, porquanto as instituições de atendimento a criança pequena permaneciam com as mesmas características das existentes até então, isto é, com um atendimento assistencial e caritativo. O objetivo dessa política era possibilitar uma discussão sobre os processos de educação e cuidado e que a educação não pode está desvinculado do cuidado e vice-versa. Nessa perspectiva, Bujes (2001, p. 16) aborda que

a educação da criança pequena envolve simultaneamente dois processos complementares e indissociáveis: educar e cuidar32. As crianças desta

faixa etária, como sabemos, têm necessidade de atenção, carinho, segurança, sem as quais elas dificilmente poderiam sobreviver... Na prática é que tanto os cuidados como a educação tem sido entendida de forma muita estreita.

Nesse caso, cuidar vai além da preocupação com higiene, alimentação, sono ou proteção dos acidentes, pois envolve os aspectos de afetividade, relacionamentos e de moral. O educar também vai muito além de uma escolarização ou disciplinamento. A dimensão educativa deve ver o sujeito-criança como um ser de sonhos, de fantasias, que brinca, cria e recria a realidade. Ainda hoje há uma discussão em torno desse binômio cuidar versus educar. Daí vale o questionamento: quem cuida, educa? E quem educa, cuida?

Com a promulgação da Nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9.394/96) a educação infantil (creche e pré-escola) se estabeleceu como a primeira etapa da

educação básica, juntamente com o ensino fundamental e o ensino médio, em vez de permanecer ligada às Secretarias de Assistência Social. Com isso, não mais focalizada apenas no cuidar, mas também no educar e como uma obrigação dos poderes públicos de oferecê-la. Um dos fatores que contribui para o assistencialismo, ainda hoje, nas creches está relacionado com a formação dos profissionais que atuam nessas instituições, os quais, na sua maioria, não possuem formação nem mesmo em nível de ensino médio, normal, o que caracteriza apenas o cuidar – dar banho, alimentar e colocar para dormir. Em relação aos profissionais da educação infantil, Cerisara (2002, p. 4) salienta que

[...] a lei proclama ainda que todas deverão até o final da década da educação ter formação em nível superior, podendo ser aceita formação em nível médio, na modalidade normal. Ou seja, até o ano de 2007 todas as profissionais que atuam diretamente com crianças em creches e pré-escolas, sejam elas denominadas auxiliares de sala, pajens, auxiliares do desenvolvimento infantil, ou tenham qualquer outra denominação, passarão a ser consideradas professoras e deverão ter formação específica na área. É importante ressaltar o desafio que esta deliberação coloca uma vez que muitas dessas profissionais não possuem sequer o ensino fundamental.

A Lei de Diretrizes e Bases declara, ainda, o direito das crianças à educação de zero a seis anos de idade e que, embora a educação nessa fase não seja obrigatória, é dever do Estado oferecê-la. O Artigo 29 determina que “a educação infantil, primeira etapa da educação básica, tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança até os seis anos de idade, em seus aspectos físicos, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade”.

No Título III, Do Direito à Educação e do Dever de Educar, o Art. 4º. [prevê que]: “O dever do Estado com a educação escolar pública será efetivado mediante a garantia de: IV - atendimento gratuito em creches e pré-escolas às crianças de zero a seis anos de Idade”.

Porém quando se refere à responsabilidade e incumbência de cada um dos entes federativos (União, Estado e Municípios), o Artigo 11 Inciso V, diz que os municípios deverão “oferecer a educação infantil em creche e pré-escola, e, com prioridade, o ensino