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CAPÍTULO I OS FUNDAMENTOS E OS CAMINHOS METODOLÓGICOS

4.4 CONCEPÇÕES DE CURRÍCULO NO CONTEXTO DA PRÉ-ESCOLA E A

4.4.1 O currículo e os aspectos socioculturais na constituição da identidade e na

A criança que frequenta a pré-escola é um ser em formação e, como tal, está em processo de construção da sua identidade e de constituição de valores indispensáveis à vida de qualquer ser humano, e, a forma como a escola concebe e constrói seu currículo irá influenciar positiva ou negativamente na constituição do sujeito como um todo. Querendo ou não há influência na formação da criança, não apenas no aspecto cognitivo, mas todos as dimensões que constituem o sujeito. Assim nos questionamos: em que medida os aspectos socioculturais presentes no currículo influenciam na construção da identidade e do conhecimento das crianças?

Vimos que historicamente o paradigma da racionalidade sustenta a razão como suporte do conhecimento e desvelamento das “verdades” científicas. A interação social em nenhum momento era cogitada como estratégias para o desenvolvimento de trabalhos com as crianças pequenas. O que era diferente, o que não fazia parte do “padrão”, estava errado e não se devia levar em conta. A cultura não era pensada como uma das dimensões da vida do ser humano que possibilitaria a construção do conhecimento.

A formação da identidade da criança se constitui um processo histórico e não como algo inato/biológico. Na escola de educação infantil faz-se necessário levar em conta a cultura da criança, sua etnia, classe social, família, para a sua formação. A valorização dos aspectos socioculturais, suas referências individuais e coletivas, seu reconhecimento como parte de um grupo social contribuirão na construção da identidade da criança e na sua constituição enquanto pessoa solidária, cooperativa, amiga e humana.

Em relação ao conhecimento o que se percebe é a valorização dos saberes instituídos pela humanidade, a supervalorização da cognição. O conhecimento discutido aqui é a construção do conhecimento e não a sua reprodução, é a construção dos diversos saberes da humanidade como o científico, o religioso, o social, a arte, e todas as formas de expressões da humanidade.

Quando questionada sobre a construção da identidade e do conhecimento da criança a partir do currículo, a professora Regina descreve sua felicidade quando vê o resultado do seu trabalho e salienta:

A gente quer formar cidadãos. O mundo já tem tanta coisa ruim, a gente só quer o melhor. Porque é muito gratificante quando a gente vê um menino que já passou por minha mão e hoje está na faculdade, em outro curso, e as professoras falam que ele tem bom comportamento (Entrevista feita com a profa. Regina em 22/07/2008).

Esse “formar cidadãos” é uma expressão que está cristalizada nos discursos das pessoas. Que cidadão a escola de educação infantil quer formar? A criança não é um cidadão?

Fico me questionando o que seria esse “bom comportamento” para a professora. Seria estar quieto em sala de aula ou seria respeitar as pessoas, desenvolver a cooperação e a solidariedade? É interessante pensar no que a escola tem estimulado no aluno, pois uma escola comprometida com a criança, com o seu desenvolvimento, com certeza, despertará valores de solidariedade, respeito às pessoas, cooperação e coletividade, e não apenas “bom comportamento”, no sentido de quietude ou do não questionamento.

A professora Regina se esforça para educar as crianças nos ensinamentos de Deus e argumenta que a base religiosa é muito importante para a formação do ser humano não na indicação da religião certa ou errada, mas fazendo com que a criança creia em Deus, como o Supremo Ser, obedeça aos pais, e procurando educá-las na ética e nos valores. Como a educação infantil é a base, é preciso passar as coisas boas para que a criança seja um bom cidadão amanhã.

A professora Ivani argumenta que o currículo não influencia tanto assim na vida da criança. Salienta que “a escola tem essa visão de formar cidadãos críticos, a gente tenta fazer isso com a criança, mas essa formação é no dia-a-dia, não é só falando, é assim... você tem que fazer desse jeito, é trabalhando no cotidiano da escola que essa formação vai acontecer”. Segundo a professora, não é só na fala, através do discurso que as crianças vão se desenvolver, mas nas ações cotidianas. Isso nos faz pensar que, mesmo tendo uma concepção de currículo como conteúdo e programa, a professora acaba argumentando que o cotidiano da escola influencia na vida da criança. Assim salienta:

Às vezes a criança chega aqui sem saber ir na Secretaria, é uma forma de conhecer a escola, de mostrar onde vai, como é... Isso tudo, acho que faz parte do currículo. Conhecimento do dia-a-dia. Tem criança que no início mal sabia falar o nome e agora... [Mudou até] no sentar, falar as histórias deles para o outro. Para mim tudo isso é conhecimento e às vezes até mais do que... Se preocupar com os conteúdos, com o currículo, com atividades. Acho que resolve muito mais (Entrevista feita com a profa. Ivani em 22/07/2008).

Constatamos uma contradição na fala da professora, pois, num primeiro momento, ela assegura que o currículo não influi tanto na vida da criança, referindo-se aos conteúdos e ao planejamento e, em outro momento, ela argumenta que o conhecimento cotidiano dos alunos, as suas histórias de vida, o próprio caminhar dos alunos pela escola fazem parte do currículo. Para ela tudo isso é conhecimento e, às vezes, muito mais importante que os conteúdos. No final, ela afirma que o conhecimento cotidiano é mais importante que o currículo, o que nos deixa ver a sua idéia de currículo como algo estático e programático.

Os conhecimentos cotidianos, as atividades do dia-a-dia, a valorização do contexto social, as interações sociais são realmente imprescindíveis na aprendizagem da criança. Garcia (2000, p. 17) afirma que “coisas tão simples como lavar as mãos podem tornar-se situações de aprendizagem, não apenas de hábitos, mas de conhecimentos”. Ao transformar esse ritual de lavar as mãos em discussões e construção de conhecimento, confirma-se que esse cotidiano, as vivências dos alunos são ponto de partida para o desenvolvimento da criança.

A professora Fúlvia argumenta que é preciso a criança ter bom desenvolvimento e aprendizagem para se tornar um bom cidadão:

O professor deve se preocupar em formação adequada. Essa formação adequada é que tenha oportunidade, ajudar a criança a se desenvolver. No desenvolvimento motor, na psicomotricidade, porque a gente vê muitas crianças com dificuldades. Umas avançam, outras são mais lentas,

demoram de pegar o que a gente passa50. A gente precisa estar atenta e perceber, porque a gente sabe que nem todo mundo é perfeito51 e que o potencial de cada um é diferente (Entrevista feita com a profa. Fúlvia em 14/10/2008).

O destaque da professora Fúlvia está muito relacionado ao desenvolvimento cognitivo e motor da criança. Ao falar das dificuldades, a professora se refere aos conteúdos abordados em sala de aula, os quais algumas crianças conseguem fazer com mais facilidades e outras, não. A diferença entre as crianças se manifesta para professora como um problema que algumas crianças apresentam. Outro ponto destacado por essa professora em relação à formação da criança está ligado à formação religiosa, que a criança precisa ter e que essa formação deve-se dar também em casa com os pais.

Declara ainda que: 50 Grifo nosso

Da minha parte, pra eu dar conta desse cidadão, com o conhecimento, uma formação cultural, social, é muito difícil, principalmente aquele que tem mais dificuldade. O que já está bonzinho52, você não se preocupa muito, mas aquele que está lá engatinhando, para a gente chegar e dar uma formação adequada a esse aluno, eu acho muito difícil (Entrevista feita com a profa. Fúlvia em 14/10/2008).

Constatamos uma preocupação com uma educação preparatória que manifesta a supervalorização da aprendizagem da leitura e da escrita. Como assevera Saint-Exupéry (2006, p. 10), as “pessoas grandes” estão mais preocupadas com os conhecimentos de história, geografia, matemática, e não com desenhos ou – por que não dizer? – a arte, a ludicidade. Como na crítica desse autor, as professoras estão muito mais preocupadas com o desenvolvimento da leitura e da escrita da criança do que com o seu desenvolvimento social, afetivo, psicomotor, linguístico, intelectual, espiritual, estético e ético. Muitas vezes o professor fica tão angustiado, ansioso em “passar” os conteúdos que se esquece de ouvir as próprias crianças, de observar as suas ações e interações. “Aprender com as crianças pode ajudar a compreender o valor da imaginação, da arte, da dimensão lúdica, da poesia, do pensar adiante” (KRAMER, 2008, p. 106).

O argumento da professora Teresinha confirma essa visão cognitivista e preparatória da educação infantil, quando enfatiza que tudo é uma continuação e que a criança começa na pré-escola e vai continuando, mas ela não pode dizer que a criança saiu preparada por que

[...] às vezes alguns conseguem avançar em uma coisa e o outro não consegue, não quer dizer que ninguém não conseguiu nada. Todo mundo conseguiu alguma coisa. Então no Pré eles devem sair preparados: fazer o

nome, identificar as letras, saber as cores, os conceitos de lateralidade.

Às vezes a gente fala assim “aí em cima”, e o menino não sabe nem o que é “em cima”. Muitos podem pensar que isso é bobagem, mas não é, pois até hoje tenho dificuldade com lateralidade porque não foi trabalhado comigo (Entrevista feita com a profa. Teresinha em 29/07/2008).

Essa visão cognitivista está presente em muitos discursos apresentados pelas professoras, como se a influência do currículo estivesse relacionada apenas ao aspecto cognitivo e que essa dimensão fosse a mais importante na constituição do sujeito. Outro argumento apresentado pelas professoras é a sua concepção de “cidadão”, a qual manifesta que a criança não é, mas será, um cidadão a partir do momento em que ela for educada para tal. Se pensarmos a criança como sujeito social, como um ser de direitos, ela já é um pequeno cidadão como salienta Kramer (2008, p. 81) um “cidadão de pouca idade”.

Há uma diferença muito grande entre a execução mecânica de tarefas e a possibilidade de participação das crianças na criação, produção e execução das atividades propostas pela escola de forma que não limite a sua capacidade criativa. O que se observa muito nessas escolas pesquisadas são produções feitas pelos adultos. Se é uma capa de atividades, ela já vem pronta, só para as crianças pintarem. Se é um painel para enfeitar a sala, a professora confecciona, pois fica mais bonito e “bem feito”. As crianças pouco participam das produções da escola.

A professora Alessandra, por sua vez, aponta que, no desenvolvimento do seu trabalho, não está preocupada com a assimilação dos conteúdos, mas com a formação do sujeito para que possa interagir, questionar, compartilhar. Para isso, ela acrescenta: “a gente faz muita rodinha, muita socialização, muitos momento de conversa com as crianças”. Argumenta ainda a professora:

Então, em uma história, elas falam muita coisa, dessa história vivenciam o que elas vivem em casa. A leitura de mundo que elas já têm. Acho que é essa busca de sugar tudo que têm, pois a criança vem já com um conhecimento. Elas não vêm sem conhecimento pra escola, então [deve-se] sugar esse conhecimento e compartilhar. Esse conhecimento que o professor tem junto com o do aluno é uma troca que aí vai enriquecendo. Eu aprendo muito com elas também. Muitas coisas elas falam que eu fico “nossa onde você aprendeu isso”? Então é uma descoberta a cada momento. A gente trabalha mais com essa questão de observar a criança e tentar tirar o máximo dela. Tá sempre buscando mais, não limitando essa criança. Às vezes a gente sente a necessidade de trabalhar (letras...), trazer os conteúdos programáticos, mas, primeiro, tem que ter um sentido, deixar eles demonstrarem um pouco a infância. Tem que resgatar isso, porque eles estão chegando aqui sem ter esse apoio em casa. A escola está resgatando isso também, a infância da criança (Entrevista feita com a profa. Alessandra em 25/07/2008).

O argumento da professora confirma a sua prática no cotidiano da escola, a qual possibilita às crianças momentos diversos, tais como valorização das diferentes linguagens, do lúdico, das conversas, troca de ideias e manifestação dos sentimentos a partir dos diálogos. Garcia (2000, p. 17) salienta que é preciso “dar sentido as atividades, eis o que faz uma professora competente, sabendo que cada atividade traz a possibilidade de novas aprendizagens e provoca novos desenvolvimentos”. Um momento interessante na prática da professora Alessandra foi quando colocou as crianças sentadas em um tapete e entregou para elas vários gibis que havia trazido de sua casa. Foi um momento mágico para as crianças. Elas ficaram fascinadas com os livros. Folheavam, observando atentamente cada imagem, mostravam unas para as outras, corriam para mostrar à professora ou para mim. Havia um

garoto (4 anos) próximo a mim que “lia as histórias” através das imagens, com toda a atenção. O interessante é que ele fazia em voz alta. Quando chegava ao final do gibi, ele pedia outro. Todas as crianças, indistintamente, estavam imersas no mundo da criação e da magia.

Em outro momento, a professora Alessandra passou a contar a história de um livro intitulado: Pode o redondo ser quadrado? Nesse livro o personagem ia tomando forma de animais e objetos, sempre redondos. Embora estivesse escrito no livro o que era cada novo objeto, a professora perguntava para as crianças e elas iam falando, de acordo com o que achavam, a partir da sua imaginação; estavam livres para criar as suas imagens. Houve uma gravura que no livro dizia ser um ovo estrelado, porém uma criança disse ser um CD e DVD, e realmente era semelhante, outra disse ser um pneu, outra disse ser um volante de carro, e assim as crianças iam identificando os desenhos ou criando outros. Como essas atividades contribuem para o aguçamento da criatividade e imaginação da criança! Como elas conseguem fazer a relação com a realidade! Não foi percebida nenhuma dificuldade nas crianças de falarem, argumentarem e criarem. Se o Pequeno Príncipe estivesse ali diria que essa professora é uma “pessoa grande” que sabe compreender a criança, pois não precisou ficar dando explicações detalhadas para que as crianças entendessem a história, tampouco desvalorizando as suas como ele “fora desencorajado, aos seis anos, pelas pessoas grandes, da carreira de pintor” (SAINT-EXUPÉRY, 2006, p. 12).

Ainda segundo essa professora, a escola pode, sim, contribuir muito na formação da criança, e é papel do professor vê-la e respeitá-la como criança e a mudança só será possível

a partir do momento em que cada um ocupe sua função. Professor é professor, não psicólogo, pai, mãe, enfermeiro, coordenador. Ser de acordo com a sua função. Cada um assumindo a sua identidade profissional. Acontece muito isso, às vezes, o professor está se perdendo por estar assumindo o lugar de outro, de mãe, de psicólogo (Prof.ª Alessandra na discussão do Grupo Focal em 01/08/2008).

Essa é uma observação interessante feita pela professora Alessandra. É preciso o professor assumir o seu papel, a sua identidade profissional. Enquanto alguns consideram que o professor tem que ser tudo, palhaço, psicólogo, mãe, a professora argumenta a necessidade de que cada profissional assuma o seu papel. E o professor já tem o seu próprio papel, não precisa assumir os de outrem.

A professora Fúlvia, contrapondo-se à concepção da professora Alessandra, contra- argumenta com uma total descrença na possibilidade de mudança: “Vamos esperar que venha essa mudança, vamos esperar...” Nessa discussão (Grupo Focal), a professora deixa claro que

não acredita mais em mudanças em relação à educação infantil. Fico me perguntando o que fazer quando o professor chega a um total estágio de descrença na possibilidade de mudança.

Uma das questões fundamentais na educação infantil é assegurar a valorização da cultura, das experiências de vida. Talvez por se tratar de crianças, não levamos em conta que elas já possuem experiências, pois geralmente relacionamos experiências às pessoas mais velhas. Segundo Kramer (2008, p. 103), as “experiências da cultura possuem um potencial humanizador e formador” para as crianças.

Para a professora Sônia, a contribuição do currículo na formação da criança é muito grande:

Antes eu falava assim: “Um dia vou ser professora do pré- escolar porque a professora do Pré não faz nada. Só canta e faz bagunça e mais nada. Vou querer trabalhar com o Pré”. Mas não é, é o primeiro alicerce. Se a gente não estiver olhando, observando, pesquisando, a gente acaba fazendo o trabalho errado, e a criança vai ter deficiência pro resto da vida, na seqüência de aprendizagem (Entrevista feita com a profa. Sônia em 30/07/2008).

Mesmo manifestando uma mudança na sua concepção de educação infantil e de criança, percebemos que há ainda no discurso da professora alguns estereótipos, como o de que a criança que não desenvolve determinada atividade acaba desenvolvendo uma “deficiência”. Essa deficiência abordada pela professora está relacionada às dificuldades que a criança passa a enfrentar na sua vida escolar em decorrência de uma má alfabetização, de uma educação infantil que não a preparou direito para as séries seguintes.

A professora ainda argumenta que o currículo deve formar um ser humano que pense, que reflita e que na sua época de criança não era assim; a criança não argumentava nem questionava o professor; ela só fazia o que o professor mandava. Argumenta:

Hoje vejo que até mesmo na educação infantil a criança participa, pergunta, fala o que pensa. Até mesmo nas atividades, quando não gostam, elas falam: “Tia essa não está boa”. Outras dizem que está muito difícil, como foi o caso de uma aluna que/, ao tentar fazer a atividade, disse que aquela “prova” estava muito difícil. Em outros momentos, elas dizem que não vão fazer determinadas atividades. Isso a gente não via no nosso tempo. Hoje, a criança sabe que pode expor suas idéias (Entrevista feita com a profa. Sônia em 30/07/2008).

Mesmo com reflexões sobre essas mudanças na pré-escola, na prática pedagógica dessa professora, as crianças estão sempre executando atividades mimeografadas, sem nenhum sentido para elas, num processo contínuo de “prontidão”, isto é, de treino e repetição,

sem nenhuma relação com a sua realidade, com os seus conhecimentos prévios, com a sua vida.

Uma situação que merece destaque e que me deixou angustiada foi quando a professora Sônia me perguntou se estava certa a forma como ensinava os alunos a contar as vogais em uma determinada palavra. Dizia ela: “Eles insistem em contar duas vezes quando há duas vogais iguais em uma mesma palavra e eu acho que eles só devem contar uma vez. Eu ensino, ensino e eles continuam contando duas vezes”. Esclarecendo melhor: ela pedia que as crianças identificassem quantas vogais havia na palavra PANELA, e as crianças falavam três. Para a professora, a criança deveria responder duas, pois havia dois “As”, os quais não deveriam ser contados duas vezes. Essa concepção da professora demonstra uma visão restrita de construção de conhecimento, de percepção, do ser criança, da sua capacidade, limitando-a, achando que não está “madura” para isso ou aquilo. O que fica patente é que a criança foi muito além da percepção e compreensão da professora.

Houve um fato bastante curioso em uma das visitas a essa mesma turma: quando cheguei, as crianças estavam todas sentadas em seus lugares, comportadas (quietas), esperando a professora chegar. Uma funcionária da escola ia sempre à porta da sala para ver se estavam bagunçando. Assim que a professora chegou, uma aluna questionou sobre o seu atraso, argumentando que professora não pode chegar atrasada e que iria falar com a tia (a diretora) para não deixá-la entrar. Diante dessa fala da aluna, a professora deu risada e tudo ficou por isso mesmo. Observamos, no entanto, quantos conteúdos poderiam ser explorados pela professora. Outra questão é que, mesmo querendo agir de forma “dedo duro”, delatando e denunciando, há uma compreensão por parte da aluna sobre a relação de poder existente na escola. Ela entendia que havia uma hierarquia, ou seja, que a diretora tinha o poder sobre a professora, assim como a professora questionava os atrasos deles (alunos).

Mesmo tendo cinco anos e a professora considerá-la como uma das crianças que tem “dificuldades de aprendizagem”, por não dominar ainda a leitura e a escrita de letras, números e palavras trabalhadas, esta criança é muito esperta e participativa nas aulas. A professora a considera “fraca” por não dominar código escrito, mas esta mesma aluna pediu à professora para recitar uma poesia sobre as mães. E ela o fez na frente da sala para os colegas e ainda dramatizou, depois veio até a mim e cantou uma música dos dias das mães. Ela é uma criança capaz e muito esperta. Situações como essas nos levam a perceber a falta de preparo de algumas professoras para lidar com situações problemas em sala de aula.

Outra questão destacada pela professora é que o currículo poderá contribuir na