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PARTE III ESTUDOS DE CASOS

173 Imagem virtual dos acessos às plataformas

14.5 A DESTINAÇÃO MUSEU DETERMINANDO A INTERVENÇÃO NO EDIFÍCIO ADMINISTRATIVO

A nova destinação cultural do edifício administrativo teve amplo apoio dos dirigentes da CPTM, que também empreenderam todos os esforços para tornar aquela realização possível, tanto operacional como burocraticamente.

O restauro do edifício administrativo e sua reconversão e adaptação ao Museu da Língua Portuguesa, e a fachada voltada para o Jardim da Luz, bem como o projeto de iluminação foram realizados pela Fundação Roberto Marinho, com recursos incentivados pela Lei Rouanet.

A participação da FRM e da Secretaria da Cultura junto ao Projeto Luz resultou da oportunidade e da confluência de interesses. A CPTM ocupava o edifício pertencente a dois proprietários: o Governo Federal, representado pela Rede Ferroviária Federal,

182 As últimas dez fotos são de autoria da pesquisadora realizadas em visita à Estação em 12/10/2010.

183 Dados extraídos do site do Museu da Língua Portuguesa:

detentora de 50% da cota parte de todo o conjunto; sendo os outros 50% pertencentes ao Estado de São Paulo, sob a administração da CPTM. Suas instalações restringiam-se às áreas do subterrâneo e das linhas de trem e que lhe davam acesso. O restante do edifício, por sua configuração ultrapassada no que tange às necessidades de operação do sistema, não era mais utilizado e podia ser liberado para outro uso. Movido por interesses da Secretaria da Cultura, de um lado, e pela sensibilidade dos dirigentes da CPTM, de outro, foi então firmado um convênio, que oficializou para o restante do edifício, a destinação cultural.

Na época, ao redor do ano 2000, se comemoravam 500 anos oficiais do Brasil, assim, parecia oportuna a conexão com Portugal e a valorização do idioma como elemento de integração. Partindo de um Memorial ou de uma Estação Luz da Nossa Língua, chegou-se a um Museu, consagrado à riqueza imaterial que unifica o sentido de nacionalidade do país. O projeto foi realizado ao longo de quatro anos, de 2002 a 2006 concretizando uma das maiores realizações culturais já feitas no Brasil, e apesar das polêmicas, transformou-se em sucesso de público e de crítica.

O Museu da Língua Portuguesa conta com uma área correspondente a 4.333,62 m2, está distribuído em três andares e tem uma característica única: seu acervo “imaterial”, a Língua Portuguesa. O visitante é surpreendido pela ausência de acervo: em seu lugar, vivencia uma série de experiências sensoriais e interativas com a Língua, por meio de recursos audiovisuais e tecnológicos de última geração.

Nesta etapa da análise serão assinaladas as soluções projetuais dadas para o programa de uso, sendo que em alguns pontos registrou-se também o parecer dos especialistas chamados pelo IPHAN para balizar a aprovação dada pelo órgão. Os pontos reunidos nesta etapa destacam as decisões mais polêmicas apontadas ao longo do desenvolvimento e implantação do projeto. Cabe afirmar que os pareceristas do IPHAN, CONDEPHAAT, CONPRESP e os consultores externos foram extremamente criteriosos, respaldando suas posições na vivência profissional, na bagagem acadêmica e no conhecimento sobre o tema, que todos fizeram questão de realçar.184

Cabe destacar que o projeto de inserção do Museu da Língua Portuguesa no edifício da Estação da Luz tem um claro programa de uso voltado à reconversão do edifício histórico, cujo uso inicial já se tornara obsoleto, resultando no esvaziamento de suas dependências, contribuindo para sua deterioração. Assim, trata-se de uma obra de reconversão: “conjunto de intervenções arquitetônicas que visa atualizar o acervo construtivo, viabilizando-lhe as utilizações para novo fim, respeitadas as características fundamentais da construção”185, procurando, dessa forma, compatibilizar a nova

arquitetura à arquitetura existente, num diálogo profícuo para o entendimento da relevância da edificação do passado em um futuro próximo contextualizado.

184 Os consultores externos aqui citados são: o professor arquiteto Carlos Lemos e o professor

arquiteto Glauco Campello. Os pareceristas do IPHAN foram os arquitetos: Victor Hugo Mori, Antonio Gameiro, Haroldo Gallo e Marcos José Carrilho. Do CONDEPHAAT consultamos o parecer do Arqto. José Guilherme Savoy de Castro. Os documentos do IPHAN foram disponibilizados para uso nesta dissertação. Não tivemos acesso aos pareceres do CONPRESP. Os demais documentos e pareceres citados foram utilizados a partir de fontes bibliográficas devidamente referendadas.

185 Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa apud MORI, Victor Hugo. O Projeto da Estação da

Antes de apresentar o edifício em seu novo programa cabe acrescentar as ponderações do emérito professor Carlos Lemos sobre o que é essencial e o que pode ser visto como acessório nos edifícios históricos, para se poder compreender sua posição a respeito das decisões projetuais ali adotadas, que ele valorizou e aprovou.

“A nosso ver, o projeto cultural Estação Luz da Nossa Língua, tem um programa inédito porque pela primeira vez na nossa vida cultural foi concebida uma atividade como essa. Sendo uma idéia singular e, portanto, sem modelos anteriores, intuímos que aquele projeto cultural pode perfeitamente ser formulado de modo a bem se agasalhar nos espaços e áreas disponíveis ora oferecidos. Está claro que não postulamos uma subserviência à compartimentação arcaica ali presente. Bom senso e imaginação aliados permitirão a modernidade e o bom gosto que encontramos, por exemplo, na vizinha Estação Júlio Prestes da antiga Estrada de Ferro Sorocabana, onde foi instalada a Sala São Paulo de concertos musicais. ...

O ideal seria imaginar agenciamentos que mantivessem intocados os espaços originais. Essa intocabilidade é que cerceia as tentativas inteligentes de aproveitamento de edifícios históricos vazios. Não há meio termo: toca-se ou não se toca, não se podendo levar a sério a recomendação de se tocar pouquinho. O que se deve aconselhar é que se atenda aos limites estabelecidos pela Carta de Veneza, cujos artigos 5° e 6° devemos ler com a mente aberta. De início, o primeiro deles liga a "conservação" à "função útil à sociedade", portanto essa utilidade imposta só pode ser usufruída pelos usuários de hoje, com suas expectativas e necessidades hodiernas...Vimos que se procura sempre a preservação da volumetria original da edificação. É bom que se perceba que esses artigos não fazem menção a interiores dos monumentos arquitetônicos. É claro, também, que devemos considerar as partes internas e as externas como um todo, porém os espaços de dentro podem ter classificações segundo a sua importância dentro dos programas de necessidades. Quase todos os programas de edifícios públicos pressupõem locais considerados como centros de interesse, áreas para atuação básica das atividades principais previstas no empreendimento. Assim, num teatro de óperas, a platéia e o palco compõem o núcleo fundamental do edifício. Numa igreja católica, a nave e o altar mor...Numa estação de estrada de ferro, a gare com suas plataformas de embarque e desembarque. Nessas áreas focais há de se ter o maior respeito aos elementos de composição arquitetônica, à pintura, aos acabamentos, aos materiais, à estrutura, ao equipamento, etc. E há espaços secundários das atividades de apoio como salas da administração, sanitários, vestiários, depósitos, vestíbulos e elementos da distribuição das circulações, como corredores, escadas de serviço ou de emergência, elevadores, etc. etc.

Nas obras de aproveitamento, reutilização ou requalificação de edifícios essas áreas secundárias evidentemente podem ser remanejadas ou demolidas em benefício do novo uso. Já que sempre estão alheias à definição principal da composição arquitetônica, à tipologia e à função básica da construção. São áreas aderentes, sem personalidade própria. No caso da Estação da Luz a compartimentação presente nas sucessivas salas de escritórios ligadas por longo corredor não tem nenhuma representatividade cultural e sempre comparecem em todos os edifícios comerciais e de consultórios da cidade. Suas pinturas feitas a partir de máscaras também se repetiram à exaustão pelos prédios paulistanos. A questão da demolição do terceiro andar construído depois do incêndio é, também, irrelevante, pois inclusive, busca a volumetria original da Estação da Luz.” 186

186LEMOS, Carlos C. Parecer sobre o projeto de intervenção de restauro e adaptação na Estação da

O programa de uso: 1) Primeiro Andar:

A ala leste do primeiro andar comporta a sala destinada às exposições temporárias, que já recebeu mostras sobre Guimarães Rosa (Grande Sertão: Veredas), Clarice Lispector (A hora da Estrela), Machado de Assis, e Gilberto Freyre (Intérprete do Brasil), atualmente a exposição temporária é dedicada a Fernando Pessoa. Ficam nesse piso também a administração e salas de aula onde são ministrados diversos cursos para professores, estudiosos e público em geral. Já a ala oeste, onde ficam a administração e o setor educativo do Museu, dispõe de sala de aula para 50 pessoas e um espaço digital que pode atender até 20 pessoas.

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Trabalhos restauração de pisos, forros, lambris, pinturas. Esses espaços eram os que não haviam sido destruídos no incêndio de 1946 e, portanto, apresentavam condições de restauração.