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A D ICOTOMIA S CHUMPETER X A RROW : M ONOPÓLIOS SÃO MAIS P ROPENSOS A

3.2. A C RESCENTE I MPORTÂNCIA DA I NOVAÇÃO T ECNOLÓGICA PARA O D EBATE A TUAL

3.2.2 A D ICOTOMIA S CHUMPETER X A RROW : M ONOPÓLIOS SÃO MAIS P ROPENSOS A

PRODUZIR INOVAÇÃO?

ARROW, mais de duas décadas após o último livro de SCHUMPETER publicado em

vida (1942), retomará e rejeitará a hipótese de que mercados concentrados seriam mais propensos a produzir inovação.

280 S

CHUMPETER, Joseph, “Capitalism, Socialism and Democracy”, London: Allen Unwin,1943.

281

SCHUMPETER, Joseph, Capitalism, Socialism and Democracy, London: Allen Unwin,1943.

282 S

TIGLITZ, Joseph E., “Economic Foundations of Intellectual Property Rights”, Duke Law Journal, Vol. 57, No. 6 (Apr., 2008), pgs. 1693-1724, Published by: Duke University School of Law.

283 S

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ARROW divergirá dessa ideia, ao sustentar que, em certo nível, na eventualidade de haver barreiras à entrada – como, por exemplo, a Propriedade Intelectual – o incentivo marginal do monopolista para investimento em inovações passaria a ser decrescente, razão pela qual o processo de inovação deveria ser confiado a empresas de menor porte284.

Além disso, segundo ARROW, as atividades de pesquisa – sobretudo pesquisas de base, as quais considerou como chave para o processo de inovação – deveriam ser financiadas pelo governo, ou por outras instituições não sujeitas aos incentivos de perdas e ganhos do mercado285.

O debate em torno da influência da organização industrial sobre a inovação e o papel da regulação antitruste, tendo como ponto de partida o contraponto entre as ideias de SCHUMPETER e ARROW, produzirá uma extensa literatura que se dedicou a discutir a

hipótese de que os monopolistas teriam um maior incentivo à inovação.

Com base em uma analogia com o darwinismo, que não havia sido expressamente reconhecida por SCHUMPETER286, GEORGE STIGLER, por exemplo, defenderá que as forças

de seleção natural justificariam a manutenção do poder das firmas dominantes, uma vez que tal dominância seria o resultado de um superior desempenho tecnológico e administrativo287.

O estruturalismo Cepalino latino-americano possui certas convergências com as teses Schumpeterianas, como o reconhecimento da importância do processo de mudança

284"Kenneth Arrow observed that, with patent protection, the incentive to invest in research and development

is less under monopoly than under competitive conditions, which would suggest that monopolistic firms would be slower than competitors in developing new products or processes, ceteris paribus". (GILBERT, J. Richard, and NEWBERRY, David. M.G., “Preemptive Patenting and the Persistance of Monopoly”, The American Economic Review, Vol. 72, nº 3, Jun, 1982, pg. 514-526).

285

ARROW, Kenneth, “Economic Welfare and the Allocation of Resources for Invention”, in “The Rate and Direction of Inventive Activity: Economic and Social Factors”, Universities-National Bureau, UMI, ISBN: 0- 87014-304-2, 1962, pg. 609-626.

286 “Há muito a economia vem flertando com as idéias de evolução e seleção natural, com o darwinismo e

com a biologia evolucionária, mas até recentemente sem maiores compromissos. Os exemplos clássicos são Marshall, Veblen e, posteriormente, Hayek, de forma explícita, e Schumpeter, de forma implicita, ainda que talvez potencialmente mais fértil. Após 1950, uma incursão famosa mais ainda pouco sistemática foi o debate iniciado por Alchian (1950) e corroborado por Friedman (1953), e mais tarde por Becker (1962). Nesses casos, a introdução de elementos evolucionários, na tentativa de deslocar a crítica ao suposto comportamento maximizador de lucros da firma neoclássica do nível individualmente observável para níveis agregados, é ainda pautada por simples analogia com a seleção natural, e os argumentos permanecem no plano da análise econômica tradicional”. (POSSAS, Mario Luiz, “Economia Evolucionária Neo- Schumpeteriana: Elementos para uma integração micro-macrodinâmica”, in Estudos Avançados, vol. 22, nº 63, p. 281-305)

287 apud G

ILBERT, J. Richard, and NEWBERRY, David. M.G., “Preemptive Patenting and the Persistance of Monopoly”, The American Economic Review, Vol. 72, nº 3, Jun, 1982, pg. 514-526

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tecnológica e seus efeitos sobre a estrutura econômica. Para CELSO FURTADO, porém, a espinha dorsal deste processo não estaria na inovação, e sim, na acumulação de capital288.

Embora a perspectiva de CELSO FURTADO seja predominantemente macroeconômica – ao passo que a análise antitruste, foco de nosso trabalho, parte, em geral, de uma perspectiva microeconômica – é importante, para os fins deste trabalho, a crítica de que o processo de mudança tecnológica seria conduzido, majoritariamente, pela busca por acumulação e que o progresso técnico assim alcançado tenderia a gerar desigualdades sociais. FURTADO defende que a superação do subdesenvolvimento se dá

pela internalização dos centros de decisão econômica, e deve ser conduzida por valores outros que não a mera lógica de acumulação, por meio do planejamento estatal com vistas a resguardar o mercado interno e o interesse nacional.

Esta linha de raciocínio, embora convergindo em parte com as teses de SCHUMPETER, se aproxima de ARROW, para quem a atividade de Pesquisa e

Desenvolvimento deve ser impulsionada e conduzida pelo Estado (refutada, portanto, a tese schumpeteriana de que a mera concentração econômica geraria a transformação econômica pela inovação).

OLIVER WILLIANSON, por outro lado, seguindo uma abordagem pautada nos custos de transação, defenderá que as imperfeições de mercado contribuiriam para a persistência de monopólios e que, contrario senso, na ausência de falhas de mercado, a concorrência eliminaria as empresas dominantes289.

Segundo PARTHA DASGUPTA e JOSEPH STIGLITZ, a crença de que a concorrência em Pesquisa e Desenvolvimento se tornaria substituta da concorrência no mercado de produtos, ou que, em última instância, ensejaria a concorrência no mercado de produtos é de se suspeitar, pois há condições sob as quais os monopólios podem persistir, mesmo sem outras barreiras à entrada, que não somente aquelas representadas pelo sistema de patentes290.

RICHARD GILBERT e DAVID NEWBERRY, ao seu turno, construirão um modelo que considerará a interação estratégia entre agentes, para analisar os incentivos criados por

288 F

URTADO, Celso, “Desenvolvimento e Subdesenvolvimento”, Rio de Janeiro, Fundo de Cultura, 1961, pg. 272.

289

apud GILBERT, J. Richard, and NEWBERRY, David. M.G., “Preemptive Patenting and the Persistance of Monopoly”, The American Economic Review, Vol. 72, nº 3, Jun, 1982, pg. 514-526

290 D

ASGUPTA, Partha and STIGLITZ, Joseph, “Uncertainty, Industrial Structure and the Speed of R&D”, 11 Bell Journal of Economics, 1, 27, 1980.

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instituições, como o direito de patentes, para que empresas com poder monopolista mantenham sua posição dominante291.

Este modelo, em resumo, descreverá o recurso às patentes como uma forma de barrar a entrada de novos competidores no mercado. Segundo os autores, os monopolistas lançariam mão desse recurso sempre que os custos de antecipar a patente, ou os custos com P&D, fossem inferiores às perdas em lucros que seriam causadas pelo ingresso de novos competidores no mercado292.

A existência de programas de P&D e até mesmo o depósito de patentes, contudo, não implica, necessariamente, a implementação da inovação, com o emprego da ideia protegida na produção, mas pode representar apenas um bloqueio à entrada de novos competidores – mesmo em um mercado sem falhas.

Segundo os autores, o monopolista poderá decidir por efetivamente introduzir a inovação, porém, tomará tal decisão com base em outras circunstâncias do mercado. Ainda, os efeitos indesejáveis do uso de patentes sem intuito de produção (sleeping patents) seriam difíceis de evitar, pelas dificuldades de identificar esta prática, bem como em razão da existência de alternativas aos monopolistas para manterem sua posição dominante293.

Conforme observa FREDERIC M. SCHERER, de um modo geral, a relação entre

tamanho e insumos/produção em inovação é, em média, vagamente proporcional. Empresas relativamente pequenas e fora do mercado, contudo, aparentemente, originariam uma fração desproporcional das inovações mais radicais.

Uma descoberta paralela é que parece haver uma relação em forma de um “U” invertido entre a atividade em P&D e o nível de concentração econômica. A relação entre taxas de P&D/vendas aumentaria com a concentração em níveis modestos, especialmente em indústrias cuja base de conhecimento avança de forma lenta. A relação atingiria um pico ao nível de concentração de quatro firmas no mercado, entre 50% e 60%. A partir daí, um padrão decrescente se apresenta.

SCHERER concorda que tais estatísticas se enfraquecem ou anulam totalmente

quando levadas em conta as diferenças entre as indústrias quanto às oportunidades

291 G

ILBERT, J. Richard, and NEWBERRY, David. M.G., “Preemptive Patenting and the Persistance of Monopoly”, The American Economic Review, Vol. 72, nº 3, Jun, 1982, pg. 514-526

292

GILBERT, J. Richard, and NEWBERRY, David. M.G., “Preemptive Patenting and the Persistance of Monopoly”, The American Economic Review, Vol. 72, nº 3, Jun, 1982, pg. 514-526

293 G

ILBERT, J. Richard, and NEWBERRY, David. M.G., “Preemptive Patenting and the Persistance of Monopoly”, The American Economic Review, Vol. 72, nº 3, Jun, 1982, pg. 514-526

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tecnológicas e possibilidades de se apropriar dos benefícios da inovação. Tais dados, porém, sugerem que as condições de oferta e demanda são mais importantes que a estrutura de mercado como determinantes do vigor tecnológico294.

RICHARD GILBERT conclui que a literatura empírica não apoia a conclusão de que grandes empresas promovem inovação por possuírem altos fluxos de caixa, economias de escala (acima de certa faixa) ou por permitirem a diversificação de risco – contrariando, portanto, o argumento de SCHUMPETER de que o monopólio poderia gerar inovação por

supostamente possuir uma plataforma mais estável para P&D295.

Por outro lado, nem a teoria nem as evidências empíricas suportariam uma conclusão forte de que a concorrência é um estímulo eficaz à inovação. Há poucas evidências de que existiria um nível ótimo de concorrência para estimular os investimentos em P&D. Além disso, os estudos empíricos teriam falhado em provar uma relação entre concentração de mercado e investimentos em P&D, quando são levadas em conta diferenças de características entre as indústrias, como oportunidades tecnológicas e o nível de proteção existente quanto à apropriação dos lucros decorrentes da inovação.

GILBERT sugere que a pesquisa em indústrias específicas poderia conduzir a

resultados mais conclusivos. Logo, os estudos empíricos até aqui realizados não validam a tese de SCHUMPETER de uma forma geral296.

Para HOVENKAMP, SCHUMPETER estava correto ao afirmar que os ganhos de longo

prazo pela inovação superariam os ganhos resultantes de uma intervenção governamental com a finalidade de tornar a economia mais competitiva, de acordo com os tradicionais critérios de preço e oferta. No entanto, o autor reconhece que o problema de se mensurar as perdas resultantes de restringir uma inovação seria equivalente ao problema de se mensurar, de antemão, os ganhos que a inovação teria produzido caso tivesse sido introduzida. Na maior parte dos casos, um julgamento ex ante seria praticamente impossível, e, em todos os casos, altamente especulativo297.

294 S

CHERER, F.M. “Does Antitrust Compromise Technological Efficiency? A Conversation with F.M. Scherer”, Eastern Economic Journal, Volume XV, Nº1, January-March, 1989.

295

GILBERT, Richard, “Looking for Mr. Schumpeter: Where Are We in the Competition-Innovation Debate?”, the National Bureau of Economic Research, Vol. 6 “Innovation Policy and the Economy”, Jaffe, Adam B., Lerner, Josh and Stern, Scott (editors)., the MIT Press, August, 2006.

296 G

ILBERT, Richard, “Looking for Mr. Schumpeter: Where Are We in the Competition-Innovation Debate?”, the National Bureau of Economic Research, Vol. 6 “Innovation Policy and the Economy”, Jaffe, Adam B., Lerner, Josh and Stern, Scott (editors)., the MIT Press, August, 2006.

297 H

OVENKAMP, Herbert J. “Schumpeterian Competition and Antitrust”, University of Iowa Legal Studies Research Paper, Number 08-43, October, 2008.

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Mesmo com tais limitações, HOVENKAMP afasta a conclusão de que o antitruste nada poderia fazer quanto ao problema da inovação. Em certos casos, seria necessário considerar consequências de curto prazo para a concorrência e ignorar as possibilidades de inovação que se mostrassem muito remotas. Em outros casos, deve-se considerar qual é o resultado mais provável: a inovação ou sua restrição. A probabilidade de que uma conduta venha a reforçar a inovação deve servir para enfraquecer ou, talvez, até mesmo tornar prejudicada, a preocupação levantada pelo antitruste. Em contraste, a probabilidade de uma prática restringir a inovação mereceria ser olhada com cautela ainda maior298.

MICHAEL KATZ e HOWARD SHELANSKI, por sua vez, defendem que, em mercados

de alta tecnologia, o conceito de concorrência no mercado (i.e., concorrência por preços) é, efetivamente, substituído pela concorrência de agentes pelo mercado, por meio da inovação tecnológica. Em tais mercados, sujeitos a rápido progresso tecnológico, o que haveria seria uma sucessão de monopólios, nos moldes preconizados por SCHUMPETER299.

STIGLITZ, no entanto, critica a premissa de SCHUMPETER quanto à temporariedade

dos monopólios. Para ele, uma vez estabelecidos, os monopólios poderiam ser perpetuados, havendo, inclusive, um incentivo econômico para que isso viesse a ocorrer – especialmente, em mercados em que há barreiras à entrada, como externalidades de rede (network externalities) e custos de mudança (swtiching costs).

Essa seria a razão para casos como o da Microsoft, em que o poder de monopólio persistiu mesmo após afastadas as práticas abusivas300.

STIGLITZ conclui que os incentivos para inovação de um monopolista não apenas são inferiores, como, também, podem aumentar os custos de seus rivais, desencorajando a inovação e aumentando ainda mais seus lucros.

298 H

OVENKAMP, Herbert J. “Schumpeterian Competition and Antitrust”, University of Iowa Legal Studies Research Paper, Number 08-43, October, 2008.

299

“In some markets subjetct to strong technological progress, this process may play itself out repeatedly.

That is, competition may take the form of a succession of "temporary monopolists" who displace one another through innovation. At any one time, there is little or no head-to-head price competition.But there is significant innovation competition over time. This pattern of competition is often referred to Schumpeterian rivalry, after Joseph Schumpeter, who asserted that it is a central feature of the modern economy”. (KATZ, Michael L., SHELANSKI, Howard A., “Meger Policy and Innovation: Must Enforcement Change to Account For Technological Change?”, National NBureau of Economic Research, Working Paper 1070 - http://www.nber.org/papers/w10710)

300

“Some of my earlier research, however, pointed out that SCHUMPETER was wrong about the temporary nature of monopoly. Monopoly power, once established, can easily be perpetuated. Not only is it possible to perpetuate monopoly power, in fact, there is an incentive to do so. This is particularly evident in the case of network externalities and in situations where there are important switching costs, such as those that arise from learning. That is one of the reasons why Microsoft is so difficult to deal with. The monopoly power persists even after the bad practices which enabled it to create that power have been terminated”. (STIGLITZ, Joseph E. “Economic Foundations of Intellectual Property Rights”, Duke Law Journal, Vol. 57, No. 6, Apr., 2008, pgs. 1693-1724, Published by: Duke University School of Law).

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Desse modo, ao contrário do que supôs SCHUMPETER, o poder de monopólio – mesmo aquele obtido por meio de um direito de Propriedade Intelectual – pode desencorajar a inovação, ao invés de incentivá-la301.

Ao ler os clássicos, é preciso compreender cada autor dentro de sua época. Ao defender que os monopólios não seriam duradouros, é preciso considerar que SCHUMPETER

partiu de uma perspectiva histórica limitada. Levando-se em conta o seu apego aos dados históricos e à estatística é de se cogitar se, diante das pesquisas empíricas até aqui realizadas, SCHUMPETER atenuaria ou até mesmo reconsideraria algumas de suas

conclusões.

Por outro lado, é inegável a contribuição deste clássico economista no que se refere à importância da inovação tecnológica para o desenvolvimento econômico. Além disso, os conceitos de eficiência dinâmica e de mercados de inovação desenvolvidos a partir de suas ideias têm sido utilizados como ferramentas analíticas do antitruste, como veremos.