• Nenhum resultado encontrado

1.5. T EORIAS E CONÔMICAS PARA J USTIFICAR A P ROPRIEDADE I NTELECTUAL NO S ÉCULO

1.5.2. F UNDAMENTAÇÃO E CONÔMICA DA P ROPRIEDADE

Na década de 1960, surgiram, nos Estados Unidos, diversas abordagens econômicas que – a despeito de suas diferenças entre si – buscavam analisar não apenas a teoria marginalista de formação de preços, mas também as instituições que o formam e condicionam. A esse grupo de estudos, costuma-se denominar Nova Economia Institucional.

É importante ressaltar que não se trata de uma escola econômica, uma vez que as abordagens teóricas e orientações políticas entre os autores eram muito diversas, porém, de uma maneira geral, se mostravam críticos à teoria neoclássica, seja para aperfeiçoá-la (OLIVER E. WILLIAMSON), seja para substituí-la, seja para retornar à economia clássica

(RONALD COASE). Também se verifica uma maior preocupação com o comportamento dos

agentes do que com as estruturas de mercado93.

Destaca-se o texto de COASE, The Problem of Social Cost (1960). Este texto foi

dedicado a analisar o problema das ações das empresas que provocam prejuízos a outros (em termos econômicos, externalidades – como no típico exemplo de uma fábrica que produz emissões de fumaça prejudiciais às pessoas que habitam áreas vizinhas).

A solução neoclássica para este problema (com base no autor neoclássico ARTHUR

CECIL PIGOU) seria a responsabilização do proprietário da fábrica pela emissão dos gases,

ou a imposição de um tributo na proporção da poluição produzida. Essas alternativas foram consideradas como equivocadas por COASE.

Em uma breve síntese do raciocínio proposto por COASE, o que teria de ser decidido é se os ganhos sociais da cessação da poluição trariam seriam maiores do que as perdas originadas pela paralisação da atividade que produz o dano. Para COASE, os Tribunais fariam este tipo de análise com frequência, porém, a delimitação do direito [i.e., pelos tribunais] também dependeria da previsão legal de ilegalidade da conduta. Assim, a solução convencional dos economistas demandaria uma ação estatal, que, no entanto, poderia se revelar por demais condescendente com os responsáveis pelos danos.

A solução ideal para COASE seria o tratamento de todos os fatores de produção

como direitos de propriedade bem delimitados.

O exercício de tais direitos ao uso de fatores de produção (digamos, o “direito de poluir”), na ausência de outros custos, poderia ser transacionado no mercado, sem

93 A

RRUDA DE ANDRADE, José Maria, in “Economização do Direito Concorrencial e Positivismo Jurídico: entre Teoria da Decisão e das Provas” - Tese de Livre Docência - FDUSP, 2012, São Paulo.

45

necessidade de intervenção estatal94. Em resumo, em um mundo com direitos de propriedade bem definidos e baixos custos de transação, os direitos sempre seriam atribuídos aos agentes que mais os valorassem, produzindo, assim, uma alocação eficiente (Teorema de COASE).

Um determinado ramo da escola de Chicago, então hegemônica – principalmente, os autores que representavam esta escola de pensamento no campo jurídico (isto é, autores do Law and Economics) – utilizou-se desta teoria para fundamentar, economicamente, a propriedade privada em geral – a qual teria o efeito de internalizar as externalidades, fazendo o proprietário ser responsabilizado pelas suas próprias ações sobre o bem.

Essa argumentação concebia a propriedade como a solução ao que se denomina de Tragedy of Commons (ou, a tragédia dos baldios, termo tornado famoso em um artigo de GARRET HARDIN para a revista Science).

É importante perceber que este ramo do Law and Economics valeu-se de uma forma forte do Teorema de COASE, ao entender que as transações eficientes sempre

aconteceriam – isto é, que os bens sempre iriam para as mãos mais produtivas – o que, em nenhum momento, foi proposto por COASE95.

Conforme MARK LEMLEY96:

“Further support for the externality-reducing function of property law comes from those who apply a strong form of the COASE theorem. If one assumes that efficient transactions will always occur, it doesn't particularly matter who gets the property entitlement, as they will simply sell or rent the property to the most productive user. Thus, one of the significant risks of

94 “In fact it would be true under any system of law. A system in which the rights of individuals were

unlimited would be one in which there were no rights to acquire. If factors of production are thought of as rights, it becomes easier to understand that the right to do something which has a harmful effect (such as the creation of smoke, noise, smells, etc.) is also a factor of production. Just as we may use a piece of land in such a way as to prevent someone else from crossing it, or parking his car, or building his house upon it, so we may use it in such a way as to deny him a view or quiet or unpolluted air. The cost of exercising a right (of using a factor of production) is always the loss which is suffered elsewhere in consequence of the exercise of that right-the inability to cross land, to park a car, to build a house, to enjoy a view. to have peace and quiet or to breathe clean air. It would clearly be desirable if the only actions performed were those in which what was gained was worth more than what was lost. But in choosing between social arrangements within the context of which individual decisions are made, we have to bear in mind that a change in the existing system which will lead to an improvement in some decisions may well lead to a worsening of others. Furthermore we have to take into account the costs involved in operating the various social arrangements (whether it be the working of a market or of a government department) as well as the costs involved in moving to a new system. In devising and choosing between social arrangements we should have regard for the total effect. This, above all, is the change in approach which I am advocating”.(COASE, Ronald H. "The Problem of Social Cost", Journal of Law and Economics, Vol. 3, 1960, The University of Chicago Press)

95

LEMLEY, Mark, “Property, Intellectual Property, and Free Riding”, in Texas Law Review, vol. 83, 2004- 2005, pg. 1031-1075

96 L

EMLEY, Mark, “Property, Intellectual Property, and Free Riding”, in Texas Law Review, vol. 83, 2004- 2005, pg. 1031-1075

46

assigning property rights – that the property will be mismanaged because it falls into the wrong hands – disappears, at least in theory.

COASE himself never really believed this; he set up the zero transactions costs model to make a point. But the idea has taken on a life of its own, and is generally attributed to him”.

HAROLD DEMSETZ, também da Escola de Chicago, expressamente usou essa teoria

em sua análise econômica da propriedade privada97.O autor estendeu, automaticamente, o mesmo raciocínio à Propriedade Intelectual, sem, no entanto, um maior aprofundamento dos argumentos 98 . Essa extensão dos fundamentos econômicos da Propriedade Convencional para a Propriedade Intelectual revelou grande apelo retórico no âmbito judicial, trazendo consequências importantes para a interpretação dos limites conferidos pela proteção conferida pela Propriedade Intelectual.