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3.2. A C RESCENTE I MPORTÂNCIA DA I NOVAÇÃO T ECNOLÓGICA PARA O D EBATE A TUAL

3.2.1 J OSEPH A LOIS S CHUMPETER

JOSEPH ALOIS SCHUMPETER foi um teórico austríaco que estudou com EUGEN VON

BÖHM-BAWERK e CARL MENGER – este último, um dos autores que, ao lado de WILLIAM

JEVONS e LÉON WALRAS, contribuiram para um maior refinamento técnico da teoria econômica clássica, ao introduzirem, na ciência econômica, o conceito de utilidade marginal264.

Nascido em Triesch, na Áustria, em 1883 (mesmo ano de nascimento de JOHN

MAYNARD KEYNES) e tendo vivido a efervescente atmosfera da capital do império austro- húngaro do início do Século XX, SCHUMPETER gradua-se em Direito em Viena, em 1906.

262 S

TIGLITZ, Joseph E., “Economic Foundations of Intellectual Property Rights”, Duke Law Journal, Vol. 57, No. 6 (Apr., 2008), pgs. 1693-1724, Published by: Duke University School of Law.

263

STIGLITZ, Joseph E., “Economic Foundations of Intellectual Property Rights”, Duke Law Journal, Vol. 57, No. 6 (Apr., 2008), pgs. 1693-1724, Published by: Duke University School of Law.

264 M

CCRAW, Thomas K., “Schumpeter Ascending”, in The American Scholar, Vol. 60, No. 3 (Summer 1991), pgs. 371-392, Published by: The Phi Beta Kappa Society

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Na universidade, cursou a disciplina da Economia, tendo como contemporâneos LUDWIG VON MISES, que se vincula à terceira geração da chamada Escola Austríaca de Economia, bem como vários jovens marxistas notáveis, como RUDOLF HILFERDING e EMIL

LEDERER265.

SCHUMPETER editou seu primeiro livro, um longo tratado sobre teoria econômica, em 1908, quando ele tinha somente vinte e cinco anos de idade. Seu propósito em escrevê- lo era apresentar um quadro de trabalho mais rigoroso à economia alemã.

Àquela época, no rescaldo do notório Methodenstreit, protagonizado pelo historicista GUSTAV SCHMOLLER de um lado e pelo teórico CARL MENGER do outro, a

academia alemã permanecia relativamente hostil à teoria266.

No livro, SCHUMPETER também prenunciou outro preconceito vitalício: uma

repugnância a aplicar prematuramente a teoria para elaboração de políticas econômicas. Ao mesmo tempo, ele aceitou o ferramental neoclássico e hipóteses, tais como a análise estática, competição perfeita e tendência constante ao equilíbrio. Esses traços básicos do sistema neoclássico, postulados por WALRAS, todavia, não sobreviveriam intactos nos

futuros escritos de SCHUMPETER267. Dois meses antes de sua morte, em novembro de 1949,

ele publicou um trabalho argumentando em prol do método histórico na análise dos ciclos de negócios268.

Esse contraste pode levar a uma errônea ideia de evolução no pensamento do autor, de um pensamento original pautado na ciência matemática, para um período de maturidade acadêmica, em que teria se curvado à importância do dado histórico no estudo dos fenômenos econômicos. Essa ideia é de fato equivocada, pois SCHUMPETER jamais abandonou o apego à teoria e à ciência matemática, nem tampouco ignorou a importância de se voltar para o dado histórico269.

De acordo com suas próprias palavras, quanto à metodologia, SCHUMPETER

trabalhou para “a combination of historical, statistical and theoretical analysis, and their

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CCRAW, Thomas K., “Schumpeter Ascending”, in The American Scholar, Vol. 60, No. 3 (Summer 1991), pgs. 371-392, Published by: The Phi Beta Kappa Society

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CCRAW, Thomas K., “Schumpeter Ascending”, in The American Scholar, Vol. 60, No. 3 (Summer 1991), pgs. 371-392, Published by: The Phi Beta Kappa Society

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CCRAW, Thomas K., “Schumpeter Ascending”, in The American Scholar, Vol. 60, No. 3 (Summer 1991), pgs. 371-392, Published by: The Phi Beta Kappa Society

268 “The Historical Approach to the Analysis of Business Cycles”, Universities-National Bureau Conference

on Business Cycle Research, November, 25-27, 1949. MACHLUP, Fritz, “Schumpeter's Economic Methodology”, The Review of Economics and Statistics, Vol. 33, nº 2 (May, 1951), pgs. 145-151

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ACHLUP, Fritz, “Schumpeter's Economic Methodology”, The Review of Economics and Statistics, Vol. 33, nº 2 (May, 1951), pgs. 145-151

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mutual peaceful penetration”270, defendendo que “there is no contradiction between the historical and the abstract approaches, and that the only difference was in their interest for different problems271”.

Tal ecletismo de SCHUMPETER torna difícil enquadrar este economista em qualquer uma das escolas de pensamento econômico que suas ideias tangenciam – neoclássica, austríaca, ou histórica.

De fato, pode-se observar que até mesmo a visão marxista do capitalismo como um processo dinâmico profundamente influenciou SCHUMPETER – o que pode se explicar

devido aos vários diálogos travados com colegas marxistas. Efetivamente, SCHUMPETER,

possui afinidades com as linhas de pensamento citadas, mas sua obra não se limitou a elas272.

Metodologicamente eclético, o pensamento de SCHUMPETER era rigoroso ao insistir

em três princípios cardeais. Ele se referia à economia como uma ciência, mas ao tipo da física do que ao das ciências sociais, mas também defendeu que toda boa economia deveria incluir teoria, história e estatística, assim como também trabalhava incansavelmente em favor da econometria.

Suas próprias publicações mais precoces tomavam uma abordagem matemática e ele posteriormente ajudou a organizar a Sociedade de Econometria e serviu como seu presidente. Em uma contradição típica dentro de sua natureza, contudo, ele próprio não era um matemático de primeira linha, como revelariam seu amigo RAGNAR FRISCH e um de seus alunos mais famosos, PAUL SAMUELSON273.

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SCHUMPETER,Joseph, “Business Cycles: A Theoretical Historical and Statistical Analysis of the Capitalist Process”, New York Toronto London : McGraw-Hill Book Company, 1939

271 S

CHUMPETER,Joseph,"Das Wesen and Hauptinhalt der theorestichen Nationalökonomie", Leipzig, 1908, p. 7, apud MACHLUP, Fritz, “Schumpeter's Economic Methodology”, The Review of Economics and Statistics, Vol. 33, nº 2 (May, 1951), pgs. 145-151

272 McCRAW, um dos biógrafos de S

CHUMPETER, ilustra tal ecletismo do autor, que era visto por seus alunos como uma de suas maiores qualidades como professor: “Ele via algo útil em praticamente todas as

abordagens, e por sua vez, era respeitado por economistas para além do espectro doutrinário. Um de seus mais calorosos admiradores era Paul Sweezy, um jovem marxista que o auxiliou no curso de graduação em teoria. Como muitos economistas, Sweezy achou de todo surpreendente que,em seus cursos, Schumpeter tenha omitido qualquer referência ao seu próprio trabalho. o invés disso, ele bancava o advogado do diabo. Como escreveu Sweezy, ele tinha "todas as mais raras qualidades em um professor - ele nunca mostrou qualquer inclinação a julgar estudantes ou colegas com base em quanto eles concordavam com ele". Keynesianos (que eram a maioria substancial após 1936) e Marxistas (frequentemente, em minoria de um, pelo menos enquanto estive em Cambridge) eram igualmente bem vindos em seu ciclo. Ele não se importava com o que nós pensávamos, contanto que pensássemos".(“Schumpeter Ascending”, in The American

Scholar, Vol. 60, No. 3 (Summer 1991), pgs. 371-392, Published by: The Phi Beta Kappa Society – tradução livre)

273 McCRAW, Thomas K., “Schumpeter Ascending”, in The American Scholar, Vol. 60, No. 3 (Summer

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À época de sua chegada à Harvard, em 1932, SCHUMPETER era já reconhecido como economista consagrado, tendo tido uma experiência curta (e fracassada) como Ministro de Estado, e, após isso, lecionado na Alemanha e no Japão – países que o acolheram após um período de ruína financeira e ostracismo. No Japão, como já dito, foi aclamado nacionalmente, tendo as suas ideias influenciado fortemente a elaboração de políticas econômicas naquele país274.

Em Harvard, polarizou com KEYNES, ao defender pontos de vista antagônicos sobre

a explicação das crises cíclicas do capitalismo e do crescimento econômico – problemas estes que evidenciavam as insuficiências da teoria econômica neoclássica então dominante.

A teoria neoclássica, basicamente, defende a existência de um equilíbrio estático, abalável apenas por curtos períodos, devido à superprodução de determinados insumos, sendo que o crescimento econômico ocorreria apenas graças a fatores exógenos ao sistema275.

Como consequência, a teoria do equilíbrio estático praticamente não se ateve à inovação. A rigor, a única prova da eficiência de mercados competitivos foi fornecida pelo modelo de ARROW-DEBREU e tal modelo toma como premissa que a tecnologia é fixa276.

Alguns autores que precederam SCHUMPETER –como MARSHALL, ARTHUR CECIL

PIGOU e H.LMOORE, a quem SCHUMPETER expressamente refere – já haviam apontado as

insuficiências do modelo estático neoclássico – sem, no entanto, abandonar seus marcos teóricos277.

274 McCRAW, Thomas K., “Schumpeter Ascending”, in The American Scholar, Vol. 60, No. 3 (Summer

1991), pgs. 371-392, Published by: The Phi Beta Kappa Society

275 M

CCRAW, Thomas K., “Schumpeter Ascending”, in The American Scholar, Vol. 60, No. 3 (Summer 1991), pgs. 371-392, Published by: The Phi Beta Kappa Society

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TIGLITZ, Joseph E. Economic Foundations of Intellectual Property Rights, Duke Law Journal, Vol. 57, No. 6 (Apr., 2008), pgs. 1693-1724, Published by: Duke University School of Law.

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“Marshall, na realidade, protesta repetidamente contra as limitações do aparato estático – cf.

especialmente em carta sua ao prof. John E. Clark. Ora, se fosse verdade que raciocinar por meio dele está “demasiadamente distante da vida para ser útil”, então, a maior parte da análise dos Princípios seria inútil, como seria a maior parte de toda ciência exata. Isto porque a análise marshalliana apoia-se tanto nas hipóteses da estática quanto na estrutura do prof. Clark. Mas isto não é verdade. Não há nada de indevidamente abstrato em considerar um a um os fenômenos que agem no funcionamento da vida econômica sob determinadas condições. Ao contrário, significa dar a estes problemas o tratamento que eles requerem. E o próprio Marshall contribuiu substancialmente para a perfeição deste tratamento ao criar instrumentos tão preciosos como seu excedente do consumidor e sua quase renda. Além disso, ele fez uso de hipóteses de estática tanto na sua teoria de distribuição como nos fundamentos dos seus catallactics; de fato, em ponto decisivo, tratando de detalhes que exigem rigor de análise, ele limitou seus argumentos aos custos crescentes. Finalmente, ele próprio insistiu na irreversibilidade e nas dificuldades peculiares de uma curva de oferta negativa e, ao fazê-lo, chega muito perto de dizer quase o mesmo que foi dito anteriormente. A lealdade para com a tradição, a aversão a parecer demasiado “teórico” – à qual ele atentava significativamente – e aquela sua tendência, que em outros aspectos devemos tanto, de resumir os problemas da vida prática podem justificar o fato de ele não ter sido conclusivo, e, por isso, só posso concordar com o Sr. Keynes em considerar como a parte menos satisfatória de sua análise, devidamente conduzida pelo prof.

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Tendo se valido da ideia de inovação como elemento endógeno de transformação econômica278, e, ainda, tendo como antecedente a eficiência dinâmica já presente em autores identificados com a Escola Austríaca de Economia279, SCHUMPETER descreverá o capitalismo como um processo dinâmico, no qual as estruturas endógenas do sistema são destruídas de tempos em tempos, por meio do desaparecimento de commodities, processos e mercados e sua substituição por novos, por meio da inovação.

Sraffa. Isto acarreta uma série de consequências, mas, fundamentalmente, o que dissemos nada mais é do que o desenvolvimento de uma tendência oculta por outras coisas, mas ainda presente nos Princípios. Podemos acrescentar o peso da autoridade do prof. Pigou, porque no artigo citado em nota anterior ele exclui da função de custo, por motivos de “coerência lógica”, o conjunto destes fenômenos que nós mesmos nos propomos a excluir, pela mesma razão. Na verdade, ele até rejeita o que chamamos de lei fundamental dos custos . Mas o faz apoiado apenas na hipótese técnica de que é “impossível construir-se uma função de custos” baseada nas mudanças dos valores relativos dos fatores de produção, possíveis de ocorrer em consequência das mudanças na escala de produção de uma indústria. Por outro lado, ele não rejeita inteiramente as economias externas. Mas o que ele conserva delas são meramente “variações nos custos agregados associados a variações na escala de produção e decorrentes destas” (op. cit., p. 189); e se inserirmos, como devemos, a palavra “automaticamente” nesta frase, serão encontrados poucos casos, se houver, que correspondam àquele critério, como foi apontado pelo prof. Young (Quarterly Journal of Economics, p. 678, Aug. 1913). Naturalmente, a expansão e o aperfeiçoamento estão intimamente ligados na vida real. Mas, como tentaremos explicar no texto, a causa principal é a que vai do aperfeiçoamento à expansão, e não pode ser de forma alguma adequadamente tratada pela análise estática. Se for correto, a posição do prof. Pigou poderá ser vista como bem próxima àquela assumida no texto, caso o leitor leve em conta o fato de que as economias, antes de se tornarem externas, devem geralmente ser internas em alguma firma ou firmas da mesma ou de alguma outra indústria.Não pretendo, além disso, com o que disse, levantar objeções às tentativas de determinar estatisticamente as funções de custo. Pelo contrário, sou um humilde admirador do trabalho pioneiro feito pelo prof. H. L. Moore e seus seguidores, apesar de pedir licença para dizer que falar de “equilíbrios em movimento” pode ser enganoso ante o fato de que o que realmente acontece é uma destruição dos equilíbrios no significado comumente aceito”. (SCHUMPETER,Joseph A., “A Instabilidade do Capitalismo”, Clássicos de Literatura Econômica - Textos Selecionados de Macroeconomia, IPEA, 3ª Edição, Reimpressão Especial, Brasília, 2010, pg. 22)

278 Embora tenha omitido uma referência explícita a Marx nas primeiras edições de sua obra mais famosa

“Teoria do Desenvolvimento Econômico” (“Theorie der wirtschaftlichen Entwicklung”, Original em Alemão de 1912, posteriormente revisada em 1926 e sua versão em inglês, de 1934, “Theory of Economic Development”), Schumpeter veio a corrigir tal omissão no prefácio da versão japonesa de 1937, reconhecendo a importância da influência de Marx para a ideia da inovação como elemento endógeno de transformação econômica: “It was not clear to me at the outset what to the reader will be obvious at once,

namely, that [my] ideas and [my] aim are exactly the same as the Idea and the aim which underlie the economic teaching of KARL MARX. In fact, what distinguishes him from the economists of his own time and those who preceded him, was precisely a vision of economic evolution as a distinct process generated by the economic system itself” (Tradução para o Inglês do Prefácio da Edição Japonesa de “Teoria do

Desenvolvimento Econômico, 1937, apud , SCHERER,F.M., “On Schumpeter”, Palestra na Harvard Kennedy School of Government, dispoonível em http://youtu.be/-ZvBjd1003M). Para FREDERIC M. SCHERER,no entanto, a omissão de Schumpeter foi proposital, pois ele havia originalmente escrito em meio ao Império Austro-Húngaro, um ambiente politicamente ultra consdervador. Suas teorias não teriam credibilidade se fossem associadas a MARX. Ainda segundo SCHERER, mesmo nos Estados Unidos das primeiras décadas do Século XX havia resistência quanto às ideias marxistas, o que mudaria radicalmente por volta da década de 1940, quando o relativo sucesso da União Soviética atraiu o interesse acadêmico nas teorias marxistas. Não por acaso, segundo SCHERER, SCHUMPETER dedicou grande atenção às ideias de Marx em “Capitalism, Socialism and Democracy” (1942).

279 D

E SOTO, Jesús Huerta, “The Essence of the Austrian School and the Concept of Dynamic Efficiency”, REBS Review of Economy, Volume 4, Issue 1, pgs. 15-32, 2011, ISSN – 1843-763x

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A esta destruição criativa, deflagrada pela inovação, se seguiriam ciclos de imitação, difusão e equilíbrio momentâneo, interrompido novamente por novos ciclos de inovação280.

A inovação, em SCHUMPETER, é, portanto, vista ao mesmo tempo como verdadeira essência do sistema e causa maior de sua instabilidade intrínseca281.

SCHUMPETER criticará a visão de curto prazo de KEYNES e a suposta ausência, neste autor, de uma teoria completa para o processo capitalista, atribuindo à inovação, e aos empreendedores incumbidos de sua introdução, um papel central na transformação endógena das estruturas do capitalismo. Também se mostrará um forte crítico da política do New Deal e da ferrenha repressão política da época contra os grandes negócios 282.

SCHUMPETER defendeu que as grandes empresas (i.e., monopólios) seriam mais

aptas a produzir inovação, por poderem, mais facilmente, suportar os enormes riscos da atividade inventiva. Uma preocupação excessiva com os monopólios não seria justificada, na visão de SCHUMPETER, uma vez que sempre existiria pressão competitiva sobre o

mercado, porque a posição do monopolista estaria constantemente ameaçada pela possibilidade de destruição do próprio mercado pela inovação. Por outro lado, ao menos na perspectiva histórica do autor, os Estados Unidos não haviam conhecido um monopólio econômico excessivamente duradouro até então, para que fosse considerado nocivo283.

No que se refere particularmente ao tema da relação entre a concorrência e a inovação e o papel da proteção da Propriedade Intelectual, as idéias de SCHUMPETER serão o ponto de partida para um intenso debate econômico, no qual se pretendeu, inclusive, testar empiricamente a hipótese Schumpeteriana de que mercados mais concentrados seriam mais tendentes a produzir inovação.