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3.1 NO ÂMBITO INTERNACIONAL

3.1.3 A ONU e a proteção do meio ambiente artificial

Conforme se aduziu no capítulo anterior, o reconhecimento do direito ao meio ambiente, incluindo o aspecto artificial, resultou de imposições históricas advindas do processo de industrialização e da expansão urbana, que causaram significativas interferências no equilíbrio ambiental e na qualidade de vida das pessoas.

Foi essa realidade que estimulou o surgimento de novo significado para o meio ambiente, que passa a ter mais um designativo (meio ambiente artificial), abrangendo a problemática urbana e demandando dos Estados e de outros organismos que lhe seja conferido maior atenção.

A Organização das Nações Unidas (ONU) foi fundada em 1945, por 51 países, entre eles o Brasil, no contexto que se sucedeu à Segunda Guerra Mundial (1938-1944). Desde então, tem recebido novas adesões, tanto que já conta atualmente com 193 Países-Membros, tendo como propósitos principais manter a paz e a segurança internacionais, construir a amizade entre as nações e proteger os direitos humanos no âmbito universal116.

No cumprimento desse dever, é importante ressaltar que, desde a década de setenta, do século XX, a comunidade internacional tem se reunido em conferências para discutir as questões ambientais, voltando-se especialmente para o temário da sustentabilidade, quer seja

116 ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Conheça a ONU. Disponível em:

no meio natural, quer seja no artificial. Nesse aspecto, é possível se apontar uma cronologia dos eventos promovidos pela ONU sobre a temática ambiental, conforme se verá a seguir117.

Em 1972, ocorreu a Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente Humano, em Estocolmo (Suécia), cujo documento final, denominado de Declaração da Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente Humano ou simplesmente de Declaração de Estocolmo, contém proclamações e princípios e se constitui numa significativo manifesto em defesa da melhoria da qualidade do ambiente humano118.

Nessa conferência havia a percepção da forte e crescente interferência da ação humana na qualidade do meio ambiente, tanto que o primeiro item da Declaração reconhece alguns

paradoxos: “o homem é ao mesmo tempo obra e construtor do meio ambiente”. Se por um

lado é este meio que lhe dá sustento material e lhe oferece oportunidade para desenvolver-se

intelectual, moral, social e espiritualmente, em contrapartida “o homem adquiriu o poder de transformar, de inúmeras maneiras e em uma escala sem precedentes, tudo que o cerca”, em

função da rápida aceleração da ciência e da tecnologia.

Ressalte-se que nessa conferência não se prognosticou apenas um cenário catastrófico do fim da civilização humana, afinal alguns dos dispositivos da Declaração de Estocolmo enaltece a capacidade do homem para melhorar as condições de vida no planeta. Cite-se, a

título exemplificativo, a passagem onde se afirma expressamente: “com o progresso social e

os avanços da produção, da ciência e da tecnologia, a capacidade do homem de melhorar o

meio ambiente aumenta a cada dia que passa” (quinta proclamação).

Em função desse reconhecimento, a citada Declaração admite a importância do meio ambiente artificial e já na primeira proclamação aduz que “os dois aspectos do meio ambiente humano, o natural e o artificial, são essenciais para o bem-estar do homem e para o gozo dos

direitos humanos fundamentais, inclusive o direito à vida mesma”.

Quanto aos problemas afetos à habitação, essa Declaração de Estocolmo afirma que

nos países em desenvolvimento “milhões de pessoas seguem vivendo muito abaixo dos níveis

mínimos necessários para uma existência humana digna, privada de alimentação e vestuário, de habitação e educação, de condições de saúde e de higiene adequadas” (quarta

proclamação). Assim, propugna pelo compromisso dos Estados no sentido de “dirigir seus

117

Sobre essa retrospectiva dos eventos da UNU relativos a meio ambiente e desenvolvimento, cf. ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. A ONU e o meio ambiente. Disponível em: http://www.onu.org.br/a-onu-em-acao/a-onu-e-o-meio-ambiente/. Acesso: 29 Nov. 2012.

118

O conteúdo da Declaração da Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente Humano (Declaração de Estocolmo) está disponível em: <http://www.onu.org.br/rio20/img/2012/01/estocolmo1972.pdf> Acesso: 29 Dez 2012.

esforços para o desenvolvimento, tendo presente suas prioridades e a necessidade de salvaguardar e melhorar o meio ambiente” (quarta proclamação).

O citado documento dedica o seu Princípio 15 ao meio ambiente artificial, prevendo a necessidade de se planejarem adequadamente os assentamentos humanos e a urbanização, evitando prejuízos ambientais e assegurando a obtenção dos máximos benefícios sociais, econômicos e ambientais para todos.

Ainda no ano de 1972, influenciada pela Conferência de Estocolmo, a ONU criou o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), que coordena os trabalhos daquela organização relativamente ao meio ambiente global, como os aspectos ambientais das catástrofes e conflitos, a gestão dos ecossistemas, a governança ambiental, as substâncias nocivas, a eficiência dos recursos e as mudanças climáticas.

Posteriormente, o ONU instituiu a Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Comissão Brundtland), que, em abril de 1987, publicou um relatório,

denominado de “Nosso Futuro Comum”, apresentando o conceito de desenvolvimento

sustentável para a comunidade internacional, como sendo aquele que atende às necessidades atuais sem comprometer a habilidade das futuras gerações de atender suas próprias necessidades.

O trabalho dessa Comissão (Relatório Brundtland) foi de suma importância para a sedimentação do debate em torno da sustentabilidade ambiental. Suas recomendações foram de decisivas para a realização de outras importantes conferências da ONU.

No ano de 1992, o Brasil sediou, na cidade do Rio de Janeiro, a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, da qual resultou a Declaração sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Declaração do Rio-92), constituída de vinte e sete princípios119. O evento pretendia reafirmar o que fora proclamado vinte anos atrás em Estocolmo e avançar noutros aspectos, especialmente na questão do desenvolvimento sustentável.

No que se refere ao meio ambiente artificial, a Declaração do Rio-92 ressalta o dever

dos Estados de erradicarem a pobreza, a fim de “reduzir as disparidades de padrões de vida”

(Princípio 5)120. Além disso, precisam reduzir ou eliminar os padrões insustentáveis de produção e consumo, e promoverem políticas demográficas adequadas, de forma a se

119 O conteúdo desses princípios está disponível em: <http://www.onu.org.br/rio20/img/2012/01/rio92.pdf>

Acesso: 29 dez. 2012.

120 São vários os objetivos do Estado brasileiro e, entre eles, está garantir o desenvolvimento nacional, erradicar a

“alcançar o desenvolvimento sustentável e uma qualidade de vida mais elevada para todos”

(Princípio 8)121.

Em 2012, ocorreu a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, novamente no Rio de Janeiro, com o objetivo de discutir e reafimar o compromisso da comunidade internacional com o desenvolvimento sustentável, cujo conceito será apresentado no quarto capítulo.

Essas reflexões e construções advêm do cenário em que se encontra atualmente a humanidade, caracterizado pela necessidade de crescimento econômico com geração de renda e inclusão social, de forma a minimizar a pobreza, e, de outro lado, pela agressão aos elementos naturais (atmosfera, solo, água, flora, fauna, paisagem), criando uma situação de risco para a própria vida humana, portanto uma preocupação em nível universal.

Em verdade, chega-se a um estágio de compreensão de que não se pode crescer de qualquer forma, sacrificando gerações de pessoas. É preciso planejamento e disciplina na exploração e utilização dos espaços geográficos. Assim, a concepção de sustentabilidade aparece como fórmula para se compatibilizar o necessário crescimento da economia com a imprescindível melhoria da qualidade de vida das pessoas.

Nas palavras de José Afonso da Silva122, desenvolvimento sustentável consiste na exploração equilibrada dos recursos naturais, no intuito de satisfazer as necessidades do bem- estar da presente geração, assim como de sua conservação para as gerações futuras, eliminando a pobreza absoluta e propiciando um nível de vida que satisfaça as necessidades essenciais da população em geral, incluindo a urbana.

Diante da consolidação da opção pela vida nas cidades, a Organização das Nações Unidas passou a conferir um tratamento especial em relação ao meio ambiente artificial, realizando conferência, produzindo documentos e proclamando assertivas e metas a serem cumpridas pelos Estados com vistas a assegurar às respectivas populações um padrão adequado de moradia. É desses documentos que cuida o próximo item.