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A Teoria Bioecológica de Urie Bronfenbrenner

No documento Sally Wendkos Olds • Ruth Duskin Feldman (páginas 73-76)

A atualmente influente teoria bioecológica do psicólogo norte-americano Urie Bron- fenbrenner (1979, 1986, 1994; Bronfenbrenner e Moris, 1998) descreve a gama de in- fluências em interação que afetam o desenvolvimento de uma pessoa. Todo organismo biológico desenvolve-se dentro do contexto dos sistemas ecológicos que favorecem ou prejudicam seu crescimento. Assim como precisamos compreender a ecologia do ocea- no ou da floresta se quisermos compreender o desenvolvimento de um peixe ou de um

V E R I F I C A D O R Você é capaz de ... Identificar a principal preocupação e os pressupostos da perspectiva etológica?

Dizer que tipos de tópicos os pesquisadores etológicos estudam e assinalar os usos de seus métodos?

perspectiva contextual

Visão do desenvolvimento que vê o indivíduo como inseparável do contexto social.

teoria bioecológica

É a abordagem de Bronfenbrenner para a compreensão dos

processos e dos contextos do desenvolvimento.

O desenvolvimento mais lento do cérebro humano lhe proporciona maior flexibilidade ou plasticidade, uma vez que nem todas as conexões estão permanentemente definidas em idade precoce. "Essa flexibilidade comportamental e cognitiva talvez seja a maior vantagem adaptativa da espécie humana" (Bjorklund, 1997, p. 157). Ela ajuda a explicar a resiliência de crianças que foram vítimas de guerra, desnutrição ou abuso que conseguem superar os efeitos da privação ambiental inicial.

Sob uma perspectiva evolucionista, o prolongado período de imaturidade conhecido como infância permite aos seres humanos desenvolver habilidades adaptativas. Uma maneira importante de isso acontecer é brincar de "faz-de-conta". Esta menina, brincando de "médica" com seu ursinho de pelúcia, está desenvolvendo a imaginação e experimentando papéis sociais.

- Continuação 80 Diane E. Papalia, Sally W Olds & Ruth D. Feldman

O prologado período de imaturidade e dependên- cia durante a infância permite que as crianças passem grande parte do tempo brincando; como sustentava Pia- get, é sobretudo brincando que ocorre o desenvolvimen- to cognitivo. O brincar também permite que as crianças desenvolvam habilidades motoras e experimentem pa- péis sociais. É um veículo para a imaginação criativa e para a curiosidade intelectual, por excelência, as marcas do espírito humano.

A pesquisa com animais sugere que a imaturidade do funcionamento sensório-motor inicial pode proteger os bebês do excesso de estimulação. Ao limitar a quanti- dade de informações com a qual precisam lidar, ela pode ajudá-los a dar sentido a seu mundo e concentrar-se nas experiências essenciais à sobrevivência, como alimenta- ção e apego à mãe. Posteriormente, a limitada capacida- de de memória dos bebês pode simplificar o processa- mento dos sons lingüísticos e assim facilitar o aprendi- zado inicial da linguagem.

As diferentes taxas de desenvolvimento dos diver- sos sentidos podem minimizar a concorrência entre eles. Em muitas espécies, o sentido da visão é o último a se desenvolver. Estudos constataram que a estimulação vi- sual prematura pode prejudicar a capacidade olfativa de ratos recém-nascidos (Kenny e Turkewitz, 1986); filhotes de codorna que receberam estimulação visual pré-natal não são capazes de distinguir o chamado da mãe de ou- tra codorna (Lickliter e Hellewell, 1992). Por outro lado, muitas pesquisas apoiam o valor da estimulação sensó- ria precoce para bebês humanos. Os estudos com ani- mais mencionados acima apenas alertam que tal estimu- lação deve permanecer dentro da faixa normal, e que uma estimulação extraordinária pode ter efeitos negati- vos não-premeditados.

Limitações no pensamento das crianças pequenas podem ter valor adaptativo. Por exemplo, Piaget obser- vou que as crianças pequenas são egocêntricas; elas ten--

dem a ver as coisas sob seu ponto de vista pessoal. Al- gumas pesquisas sugerem que a tendência para o ego- centrismo pode, na realidade, ajudar as crianças a aprender. Em um estudo (Ratner e Foley, 1997), crian- ças de 5 anos se revezaram com um adulto na distribui- ção da mobília em uma casa de bonecas. Em um grupo- controle, o adulto já havia colocado a metade dos mó- veis, e as crianças deviam colocar a outra metade. Quando interrogadas posteriormente, as crianças que haviam se revezado com o adulto eram mais inclinadas do que as do grupo-controle a afirmar que haviam co- locado os móveis que, na verdade, o adulto colocara, mas elas também lembravam-se melhor da tarefa e eram mais capazes de repeti-la. E possível que uma tendenciosidade do tipo "eu que fiz!" ajude as crianças pequenas a recordar por evitar a necessidade de distin- guir suas próprias ações das ações dos outros. As crian- ças pequenas também tendem a ser irrealistas em sua avaliação de suas capacidades, acreditando que podem fazer mais do que realmente são capazes. Essa imaturi- dade no juízo de si mesmo pode ser benéfica no senti- do de que incentiva as crianças a fazer novas coisas e reduz seu medo de fracassar.

De modo geral, a teoria e a pesquisa evolucionista sugerem que a imaturidade não eqüivale necessaria- mente à deficiência, e que alguns atributos da infância persistiram porque são apropriados às tarefas de uma determinada época da vida. Isso não significa, evidente- mente, que todo comportamento inicial é adaptativo, ou que as crianças devem ser "mimadas" indefinidamente; "a maturidade ainda é o objetivo do desenvolvimento" (Bjorklund, 1997, p. 157). O que isso realmente significa é que cada fase de desenvolvimento merece respeito e compreensão por seu próprio mérito, e não apenas como um caminho para uma fase posterior.

Fonte: Bjorklund, 1997.

fóssil, precisamos compreender a ecologia do ambiente humano se quisermos com- preender como as pessoas desenvolvem-se.

Segundo Bronfenbrenner, o desenvolvimento ocorre por meio de processos ca- da vez mais complexos de interação regular, ativa e bidirecional entre uma pessoa em desenvolvimento e o ambiente cotidiano imediato - processos que são influen- ciados por contextos mais remotos dos quais a pessoa pode nem ter consciência. Pa- ra entender esses processos, precisamos estudar os múltiplos contextos em que eles ocorrem. Eles começam com o lar, com a sala de aula, com o local de trabalho e com o bairro; ligam-se externamente com as instituições da sociedade, como os sistemas de educação e transporte; finalmente abrangem os padrões culturais e históricos que afetam a família, a escola e praticamente tudo o mais na vida de uma pessoa. Bronfenbrenner identifica cinco sistemas contextuais interligados, dos mais íntimos aos mais amplos: mícrossistema, mesossistema, exossistema, macrossistema e cronossiste-

ma (ver Figura 2-2). Embora separemos os diversos níveis de influência para propó-

Um microssistema é um padrão de atividades, papéis e relacionamentos em um am- biente, como lar, escola, local de trabalho ou bairro, onde uma pessoa funciona de maneira direta e cotidiana. É através do microssistema que influências mais distantes, como institui- ções sociais e valores culturais, alcançam a pessoa em desenvolvimento.

Um microssistema envolve relacionamentos pessoais de contato direto, e influên- cias bidirecionais fluem de uma pessoa para a outra. Como, por exemplo, um novo be- bê afeta a vida dos pais? Como os sentimentos e as atitudes deles afetam o bebê? Ob- servando a família como um sistema funcional, os pesquisadores constataram algumas surpresas, como, por exemplo, o grau em que o ambiente dos irmãos difere dentro do mesmo lar (ver Capítulo 3). O local de trabalho de uma pessoa é outro microssistema importante. Como o tratamento que o empregador dispensa aos funcionários influen- cia na produtividade deles, e como a produtividade deles influencia no modo como o empregador trata-os?

Um mesossistema é a interação de dois ou mais microssistemas que envolvem a pessoa em desenvolvimento. Ele pode incluir ligações entre o lar e a escola (como reuniões entre pais e professores), entre o lar e o local de trabalho (como conflitos en- tre responsabilidades parentais e profissionais) ou entre a família e o grupo de ami- gos. A atenção aos mesossistemas pode alertar-nos para diferenças nos modos como uma mesma pessoa age em diferentes ambientes. Por exemplo, uma criança que con- segue fazer o dever de casa satisfatoriamente pode ficar muda quando indagada so- bre ele em aula.

Um exossistema, assim como um mesossistema, consiste de ligações entre dois ou mais ambientes; no entanto, diferentemente de um mesossistema, em um exossis- tema, pelo menos um desses ambientes não contém a pessoa em desenvolvimento, as- sim afetando-a apenas indiretamente. As influências do exossistema sobre o desen- volvimento das crianças incluem o local de trabalho dos pais e as redes sociais deles. Um homem frustrado no emprego pode maltratar o filho. Uma mulher cujo empre-

mesossistema

Na terminologia de

Bronfenbrenner, é um sistema de ligações entre dois ou mais ambientes dos quais uma pessoa faz parte.

exossistema

Na terminologia de

Bronfenbrenner, é um sistema de ligações entre dois ou mais ambientes, um dos quais não contém a pessoa em desenvolvimento.

microssistema

Na terminologia de

Bronfenbrenner, é um ambiente em que uma pessoa interage bidirecionalmente com os outros de forma direta e cotidiana.

Figura 2-2

Teoria bioecológica de Urie Bronfenbrenner. Os círculos concêntricos mostram cinco níveis de influência ambiental, do ambiente mais íntimo (círculo mais interno) até o mais amplo - todos dentro da dimensão de tempo. Os círculos formam um conjunto de influências aninhadas, como caixas que se encaixam umas nas outras, envolvendo a pessoa em desenvolvimento. A figura mostra o que veríamos se cortássemos as "caixas"

encaixadas ao meio e olhássemos para dentro. Não esqueça que os limites entre as "caixas" são flexíveis, e que as "caixas" são interligadas.

82 Diane E. Papalia, Sally W. Olds & Ruth D. Feldman

macrossistema

Na terminologia de

Bronfenbrenner, é o sistema de padrões culturais gerais que abarca todos os microssistemas, mesossistemas e exossistemas da sociedade.

cronossistema

Na terminologia de

Bronfenbrenner, é um sistema que mostra os efeitos do tempo no microssistema, mesossistema, exossistema e macrossistema.

Segundo o psicólogo russo Lev Semenovich Vygotsky, as crianças aprendem através da interação social.

teoria sociocultural

A teoria de Vygotsky, que analisa como práticas culturais específicas, especialmente a interação social com adultos, influenciam o desenvolvimento das crianças.

zona de desenvolvimento proximal (ZDP)

Termo utilizado por Vygotsky para a diferença entre o que uma criança pode fazer sozinha e o que ela pode fazer com auxílio.

gador incentiva a amamentação no seio, oferecendo bombas e equipamento para ar- mazenagem de leite, pode ser mais inclinada a continuar amamentando seu bebê.

O macrossistema consiste dos padrões culturais gerais, como aqueles estuda- dos por Margaret Mead: valores, crenças e costumes dominantes e sistemas econô- micos e sociais de uma cultura ou subcultura (como capitalismo e socialismo), que se infiltram de inúmeras formas na vida cotidiana das pessoas. Por exemplo, o ma- crossistema de uma cultura exerce forte influência para determinar se uma pessoa vive com a família nuclear ou com a família extensa. Podemos identificar uma in- fluência mais sutil do macrossistema nos valores individualistas enfatizados nos Es- tados Unidos, em contraste com o valor predominante da harmonia do grupo na cultura chinesa.

O cronossistema acrescenta a dimensão de tempo: o grau de estabilidade ou variação no mundo de uma pessoa. Isso pode incluir mudanças na composição da família, local de domicílio ou emprego, bem como acontecimentos maiores, como guerras, ciclos econômicos (consulte o Quadro 1-1) e ondas de imigração. Mudan- ças nos padrões familiares (como o aumento de mulheres nos postos de trabalho nas sociedades industriais ocidentais e o declínio dos lares de família extensa em al- guns países em desenvolvimento) são fatores do cronossistema. Como o são tam- bém a mobilidade entre classes sociais e a aculturação de grupos imigrantes (con- sulte o Capítulo 1).

Segundo Bronfenbrenner, uma pessoa não é apenas resultado do desenvolvimen- to, mas formadora dele. As pessoas influenciam seu próprio desenvolvimento através de suas características biológicas e psicológicas, talentos e habilidades, deficiências e temperamento.

Bronfenbrenner nos lembra que as pessoas não se desenvolvem isoladamente. Ao salientar os contextos inter-relacionados do desenvolvimento e as influências sobre ele, a teoria de Bronfenbrenner oferece uma chave para a análise dos processos de desen- volvimento que subjazem fenômenos tão diversos quanto comportamento anti-social e desempenho acadêmico. Ao mesmo tempo, a teoria chama atenção para a complexida- de de estudar e descrever tais influências e processos.

No documento Sally Wendkos Olds • Ruth Duskin Feldman (páginas 73-76)