• Nenhum resultado encontrado

Consumo de Drogas

No documento Sally Wendkos Olds • Ruth Duskin Feldman (páginas 124-127)

Praticamente tudo que uma gestante ingere chega até o útero. As drogas podem atra- vessar a placenta, assim como ocorre com o oxigênio, o gás carbônico e a água. A vul- nerabilidade é maior nos primeiros meses de gestação, quando o desenvolvimento é mais rápido. Alguns problemas resultantes da exposição pré-natal a drogas podem ser tratados se a presença de uma droga for detectada cedo.

Quais são os efeitos do uso de drogas específicas durante a gravidez? Primeira- mente, examinaremos os medicamentos, depois o álcool, a nicotina e a cafeína e, por fim, algumas drogas ilegais: maconha, opiáceos e cocaína.

Medicamentos Anteriormente pensava-se que a placenta protegia o feto contra as

drogas que a mãe ingeria durante a gravidez - até o início da década de 1960, quando um tranqüilizante, chamado talidomida, foi proibido depois de ter provocado atrofia ou ausência de membros, graves deformidades faciais e órgãos defeituosos em cerca de 12 mil bebês. A tragédia da talidomida sensibilizou os profissionais da medicina e o público para os perigos potenciais de tomar remédios durante a gestação. Hoje, sa- be-se que quase 30 remédios são teratogênicos em doses clinicamente recomendadas (Koren, Pastuszak e Ito, 1998). Entre eles encontram-se o antibiótico tetraciclina, al- guns barbitúricos, opiáceos e outros depressores do sistema nervoso central, diversos hormônios, incluindo o dietilestilbestrol (DES) e androgênios, alguns antineoplásicos, como o metotrexato Accutane, um medicamento freqüentemente prescrito para acne severa, e aspirina e outros antiinflamatórios, os quais devem ser evitados durante o terceiro trimestre.

Os efeitos podem não ser apenas físicos e podem ser de longa duração. Em um estudo, dinamarqueses entre 30 e 40 anos cujas mães tomaram fenobarbital durante a gravidez (especialmente durante o último trimestre) obtiveram escores de inteligên- cia verbal significativamente mais baixos do que um grupo-controle. Ser de origem socioeconômica inferior ou ter sido o produto de uma gravidez indesejada tendia a amplificar o resultado negativo, o que demonstra uma interação de fatores ambien- tais antes e depois do nascimento (Reinisch, Sanders, Mortensen, Psych e Rubin, 1995).

A Comissão de Drogas da Academia Americana de Pediatria (AAP) (1994) reco- menda que nenhum medicamento seja prescrito para uma mulher grávida ou em ama- mentação a menos que seja essencial para sua saúde ou a de seu filho. Mulheres grávi- das não devem tomar medicamentos vendidos sem receita sem consultar um médico (Koren et ai, 1998).

Álcool Como Abel Dorris, cerca de um bebê a cada 750 sofre de síndrome alcoólica fetal (SAF), uma combinação de retardo no crescimento pré e pós-natal, malformações faciais e corporais e distúrbios do sistema nervoso central. Os problemas relacionados com o sistema nervoso central podem incluir, na primeira infância, fraca sucção, ano- malias nas ondas cerebrais e perturbações do sono; na infância em geral, lento proces- samento de informações, pouca capacidade de atenção, inquietude, irritabilidade, hi- peratividade, deficiências de aprendizagem e dificuldades motoras.

O número de crianças com SAF aumentou mais de seis vezes desde 1979, atingin- do 6,7 a cada 10 mil nascimentos (Centers for Disease Control and Prevention [CDC], 1995). Entretanto, não se sabe se isso representa um real aumento no número de bebês com SAF ou apenas um aumento na consciência e notificação do problema. Para toda criança com SAF, até 10 outras podem nascer com efeitos fetais do álcool. Menos grave, es- sa condição pode incluir retardo mental, retardo no crescimento intrauterino e anorma- lidades congênitas menores.

V E R I F I C A D O R

Você é capaz de ...

Resumir as recomendações para dieta e exercício físico durante a gravidez?

• Milhares de adultos hoje vivos sofreram grandes anormalidades porque, na década de 1950, suas mães tomaram o tranqüilizante talidomida durante a gravidez. Por esse motivo, o uso de talidomida foi proibido nos Estados Unidos e em alguns outros países. Agora descobriu-se que a talidomida é eficaz no tratamento e controle de muitas doenças, desde úlceras da boca até o câncer de cérebro. Deve haver permissão para seu uso com esses propósitos, ainda que exista o risco de que mulheres grávidas possam tomá-la?

síndrome alcoólica fetal (SAF)

Combinação de anormalidades mentais, motoras e do desenvolvimento que afetam os filhos de mulheres que bebem muito durante a gravidez.

Mesmo o consumo moderado de bebidas alcoólicas pode prejudicar o fe- to, aumentando o risco de retardo no crescimento (Mills, Graubard, Harley, Rhoads e Berendes, 1984) e no processamento de informações (Jacobson, Jacob- son, Sokol, Martier e Ager, 1993). Quanto mais a mãe bebe, maior o efeito. O consumo moderado ou excessivo durante a gravidez parece alterar a qualida- de do choro de um recém-nascido, um indicador de sua condição neurocom- portamental. (O mesmo ocorre com o tabagismo durante a gravidez.) As per- turbações no funcionamento neurológico e comportamental podem, por sua vez, afetar a interação social com a mãe, que é vital para o desenvolvimento emocional (Nugent et al., 1996).

Alguns problemas da SAF desaparecem depois do nascimento, mas ou- tros, como retardo, problemas comportamentais e da aprendizagem e hipera- tividade, tendem a persistir até a idade adulta. Infelizmente, enriquecer a edu- cação ou o ambiente geral dessas crianças não parece melhorar seu desenvol- vimento cognitivo (Kerns, Don, Mateer e Streissguth, 1997; Spohr, Willms e Steinhausen, 1993; Streissguth et al., 1991; Strõmland e Hellstrõm, 1996).

Como se desconhece o nível seguro de consumo de álcool durante a gra- videz, as mulheres são aconselhadas a evitá-lo desde a época em que começam a pensar em ficar grávidas até o término da amamentação (AAP Committee on Substance Abuse, 1993). Infelizmente, a despeito dos conhecidos riscos à saú- de, o uso de álcool durante a gravidez tem aumentado consideravelmente; 16,3% das mulheres grávidas eram usuárias de álcool em 1995, comparado com 12,4% em 1991, e o índice de consumo freqüente de álcool aumentou qua- tro vezes, passando de 0,8 para 3,5% (CDC, 1997).

Nicotina Estima-se que o tabagismo em mulheres grávidas seja responsável pela

morte de 5.600 bebês e 115.000 abortos a cada ano nos Estados Unidos. Das mortes, 1.900 são casos de síndrome de morte súbita do lactente (SMSL), na qual um bebê aparen- temente saudável é inesperadamente encontrado morto (ver Capítulo 4); os outros 3.700 bebês morrem antes de completar um mês de vida, muitos deles por serem pe- quenos demais para sobreviver. Estima-se que o fumo durante a gravidez contribui pa- ra o nascimento de 53 mil bebês de baixo peso natal (isto é, que pesam menos de 2,5 kg ao nascer) a cada ano e 22 mil bebês que precisam de assistência intensiva (DiFranza e Lew, 1995).

Como as mulheres que fumam durante a gravidez também tendem a fumar depois de dar à luz, é difícil distinguir os efeitos da exposição pré e pós-natal. Um estudo fez is- so examinando 500 recém-nascidos aproximadamente 48 horas após o nascimento, en- quanto ainda estavam na maternidade do hospital - local onde é proibido fumar - e, portanto, não haviam tido contato com o fumo fora do útero. Os recém-nascidos cujas mães haviam fumado durante a gravidez eram mais baixos e mais leves e tinham pior funcionamento respiratório do que bebês de mães não-fumantes (Stick, Burton, Gurrin, Sly e LeSouéf, 1996).

O fumo durante a gravidez pode aumentar o risco de câncer no bebê. Amostras de urina de bebês em Düsseldorf, Alemanha, cujas mães haviam fumado durante a gra- videz continham um cancerígeno presente apenas no tabaco; amostras de bebês de mães não-fumantes não o apresentavam (Lackmann et al., 1999).

O fumo durante a gravidez parece ter alguns dos mesmos efeitos que tem o ál- cool sobre as crianças quando elas chegam à idade escolar: fraca capacidade de aten- ção, hiperatividade, ansiedade, problemas de aprendizagem e comportamentais, pro- blemas perceptivos, motores e lingüísticos, baixos escores de QI, colocação em grupos retardatários e problemas neurológicos (Landesman-Dwyer e Emanuel, 1979; Milber- ger, Biederman, Faraone, Chen e Jones, 1996; Naeye e Peters, 1984; D.Olds, Henderson e Tatelbaum, 1994a, 1994b; Streissguth et al, 1984; Wakschlag et al., 1997; Weitzman, Gortmaker e Sobol, 1992; Wright et al., 1983). Um estudo longitudinal de 10 anos ava- liou descendentes de 6 a 23 anos de idade de mulheres que disseram ter fumado mui- to durante a gravidez e constatou um risco quatro vezes maior de transtornos de con- duta nos rapazes, iniciados antes da puberdade, e um risco cinco vezes maior de de- pendência de drogas entre moças, iniciada na adolescência, em comparação com jo- vens cujas mães não haviam fumado durante a gravidez (Weissman, Warner, Wickra- maratne e Kandel, 1999).

Uma mulher que bebe durante a gravidez corre o risco de ter um filho com síndrome alcoólica fetal, como é o caso deste menino de 4 anos.

Desenvolvimento Humano 133 Em contraste com o uso de álcool, o fumo durante a gravidez está diminuindo.

Sua prevalência caiu em 26% entre 1991 e 1996 (de quase 20% para 14%). Entretanto, para gestantes adolescentes, dos 15 aos 19 anos, o tabagismo aumentou para 17,2% em 1995 e 1996, revertendo um declínio anterior (National Center for Health Statistics [NCHS], 1998b).

Cafeína Pode a cafeína ingerida por uma gestante no café, no chá, nos refrigerantes

ou no chocolate causar problemas para o feto? De maneira geral, a resposta é incerta. Parece claro que a cafeína não é teratogênica para bebês humanos (Hinds, West, Knight e Harland, 1996). Um estudo com controle de caso demonstrou que a cafeína não tem efeito sobre baixo peso natal, nascimento prematuro ou retardo no crescimen- to letal (Santos, Victora, Huttly e Carvalhal, 1998). Contudo, o consumo de cafeína tem sido associado ao aborto espontâneo (Dlugosz et al., 1996), e quatro ou mais xícaras de café por dia podem aumentar dramaticamente o risco de síndrome de morte súbita do lactente (Ford et al., 1998).

Maconha As descobertas sobre o uso de maconha por mulheres grávidas são mistas.

Algumas evidências indicam que o uso pesado de maconha pode levar a defeitos con- gênitos. Um estudo canadense revelou distúrbios neurológicos transitórios, como tre- mores e sobressaltos, e maiores taxas de baixo peso natal nos filhos de fumantes de ma- conha (Fried, Watkinson e Willan, 1984).

Na Jamaica, onde o uso de maconha é comum, a análise do choro de bebês con- cluiu que o uso pesado de maconha por parte da mãe afeta o sistema nervoso do bebê (Lester e Dreher, 1989). Por outro lado, em um outro estudo, bebês de três dias de mães que haviam usado maconha no período pré-natal não apresentaram diferenças em re- lação a um grupo-controle de recém-nascidos não-expostos; com 1 mês de idade, os bebês expostos eram mais alertas e sociáveis e menos irritadiços (Dreher, Nugent e Hudgins, 1994). Os autores desse estudo sugerem que as jamaicanas rurais que usam maconha tendem a ter melhor nível de instrução, maior renda e mais adultos vivendo em casa, e que esses fatores podem combinar-se para criar um ambiente de criação mais favorável. Assim, os cientistas não podem observar um único fator, como o uso de maconha, isoladamente, mas devem explorar o contexto cultural no qual ele ocor- re. Mesmo assim, o caminho mais seguro para mulheres em idade reprodutiva é não usar maconha.

Opiáceos As mulheres dependentes de morfina, heroína e codeína tendem a dar à luz

a bebês prematuros e dependentes das mesmas drogas; eles sofrem seus efeitos até pe- lo menos os 6 anos de idade. Os neonatos dependentes são inquietos e irritadiços e, muitas vezes, têm tremores, convulsões, febre, vômito e dificuldades de respiração; eles tendem a morrer logo após o nascimento (Cobrinick, Hood e Chused, 1959; Henly e Fitch, 1966; Ostrea e Chavez, 1979). Os que sobrevivem choram com freqüência e são menos alertas e menos responsivos do que outros bebês (Strauss, Lessen-Firestone, Starr e Ostrea, 1975). Na segunda infância têm menor peso, são mais baixos, mais desa- justados e têm resultados inferiores em testes de capacidade perceptiva e de aprendiza- gem (G. Wilson, McCreary, Kean e Baxter, 1979). Essas crianças tendem a não irem bem na escola, são excessivamente ansiosas em situações sociais e têm dificuldade para fa- zer amigos (Householder, Hatcher, Burns e Chasnoff, 1982).

Cocaína As estimativas oficiais do número de bebês expostos à cocaína nascidos nos

Estados Unidos a cada ano variam de 45 mil a 375 mil (Lester, LaGasse e Siefer, 1998). Os efeitos podem ser mais sutis do que os do álcool ou algumas outras drogas; muitos "filhos da cocaína" parecem bebês normais (Azar, 1997). Além disso, os efeitos da co- caína são difíceis de isolar, uma vez que as mulheres que a utilizam também tendem a utilizar outras substâncias, como álcool e maconha (Napiorkowski et al., 1996; Tronick, Frank, Cabral, Mirochnick e Zuckerman, 1996).

O uso de cocaína por parte de mulheres grávidas está associado a maior risco de aborto espontâneo, prematuridade, baixo peso natal e menor circunferência craniana. Os "filhos da cocaína", em geral, não são tão alertas quanto os outros bebês, nem tão responsivos, tanto emocional quanto cognitivamente (Alessandri, Sullivan, Imaizumi e Lewis, 1993; Kliegman, Madura, Kiwi, Eisenberg e Yamashita, 1994; Lester et al., 1991; Napiorkowski et al., 1996; Ness et ai., 1999; Phillips, Sharma, Premachandra, Vaughn e Reyes-Lee, 1996; Singer et al., 1994; Tronick et al., 1996; Zuckerman et al., 1989).

Estes bebês podem apresentar atividade motora prejudicada (Fetters e Tro- nick, 1996) ou atividade excessiva, bem como tensão muscular extrema, movimen- tos espasmódicos, sobressaltos, tremores e outros sinais de estresse neurológico (Napiorkowski et al., 1996). Eles tendem a ter problemas para regular a atenção (Mayes, Granger, Frank, Schottenfeld e Bornstein, 1993) e excitação emocional. Quando interrompidos, frustrados ou contrariados, têm dificuldades para se "rea- grupar", recuperar-se e seguir adiante. Essas e outras evidências sugerem que a co- caína pode afetar regiões específicas do cérebro em desenvolvimento que controlam essas funções (Bendersky, Alessandri e Lewis, 1996; Bendersky e Lewis, 1998). Quanto mais cocaína uma mulher usa durante a gravidez, maiores as chances de crescimento fetal e funcionamento neurológico prejudicados (Chiriboga, Brust, Ba- teman e Hauser, 1999).

Os filhos da cocaína tendem a ter problemas para interagir normalmente com quem o cuida. A inatividade, a letargia, a irritabilidade ou a falta de reação do bebê po- de frustrar a mãe e impedi-la de formar um relacionamento íntimo afetuoso com ele. Por outro lado, é possível que bebês expostos à cocaína não aprendam a regular e ex- pressar suas emoções porque suas mães usuárias de cocaína são menos sensíveis e res- ponsivas do que outras mães (Alessandri, Sullivan, Bendersky e Lewis, 1995; Ben- dersky et al., 1996; Bendersky e Lewis, 1998; Phillips et al., 1996).

Fisicamente, alguns bebês expostos à cocaína recuperam-se. Principalmente se ti- veram boa assistência pré-natal, eles podem alcançar peso, comprimento e circunferên- cia craniana normal no primeiro ano de idade (Racine, Joyce e Anderson, 1993; Wea- thers, Crane, Sauvain e Blackhurst, 1993). Entretanto, deficiências no controle motor, es- pecialmente no uso das mãos e na coordenação olho-mão, foram constatadas aos 2 anos (Arendt, Angelopoulos, Salvator e Singer, 1999). Os efeitos psicossociais tendem a du- rar mais tempo; crianças expostas à cocaína mostram tendência para problemas com- portamentais, como agressividade e ansiedade, sobretudo quando estão sob pressão (Azar, 1997).

A exposição à cocaína em pequena quantidade parece ter pouco efeito a longo prazo sobre a cognição, mas a exposição a níveis elevados pode produzir dificuldades, principalmente para adquirir habilidades complexas (Alessandri, Bendersky e Lewis, 1998). Os danos cerebrais menores decorrentes do contato com cocaína podem aumen- tar o número de crianças repetentes nas escolas e podem elevar os custos da educação especial nos Estados Unidos em cerca de 350 milhões de dólares por ano (Lester, LaGas- se e Seifer, 1998).

No documento Sally Wendkos Olds • Ruth Duskin Feldman (páginas 124-127)