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CAPÍTULO I: Articulações Teóricas

1.1 Educação a Distância

1.2.2 Alfabetismo digital

Com o passar do tempo, os conceitos são aprimorados e evoluem, de maneira que o alfabetismo e o letramento são vistos hoje diferentemente daquela que se tinha havia duas décadas. De fato, naquela época não se falava ainda em letramento e, muito menos, em letramento digital; considerava-se apenas o termo alfabetização. Com as atuais formas de ensinar e aprender no contexto digital, mais precisamente em ambientes virtuais de aprendizagem, ter domínio sobre tais ambientes é imprescindível para tutores a distância.

Em relação ao conceito, no entanto, alfabetismo digital ainda se mostra flutuante e pouco usado na educação. Assim como o termo analfabetismo é mais conhecido e usado há séculos pela sociedade, para designar o “estado e condição”

26 O termo ainda não é utilizado com frequência. Encontrei um artigo de Magalhães (sem data), da

UFRJ, intitulado “Alfabetismo Digital Crítico: desconstrução da passividade no ato de aprender”. Esse artigo não apresenta conceito ou discute com profundidade o processo de alfabetismo digital; no entanto, utilizo-o para que o leitor compreenda o processo de aprendizagem e usabilidade das ferramentas e recursos do AVA Moodle nesse contexto específico da pesquisa.

(SOARES, 2008, p.29) de quem não sabe ler nem escrever, o termo alfabetismo é, ainda, desconhecido pela sociedade. Mais recentemente, Soares (op. cit.) retifica o conceito de alfabetismo, inicialmente usado pela autora como sinônimo de letramento.

Nesta pesquisa, o alfabetismo que, segundo Soares, pode ser conceituado de diferentes maneiras, será abordado como base para a compreensão do alfabetismo digital, que entendemos ser o conjunto de práticas voltadas à aprendizagem do uso e da navegação em ambiente virtual de aprendizagem.

Ouve-se falar muitas vezes em “nível de analfabetismo no Brasil”, mas, raramente, em “nível de alfabetismo”. Parece haver um desconhecimento do termo alfabetismo que, por esse motivo, se torna pouco usado. O termo circula, no entanto, entre os pesquisadores da área da linguística, para explicar novos fenômenos advindos da necessidade de expressar ideias a respeito das habilidades de leitura e escrita que surgem no desenvolvimento de novas pesquisas que envolvem as tecnologias de informação e comunicação.

É importante saber que a internet e o computador são ferramentas imprescindíveis para quem quer se inserir no mercado de trabalho. Isso porque, desde o balconista do supermercado até o dentista ou o advogado, a todos se impõe o uso da informática. Qualquer profissional precisa dominar as tecnologias de informação, seja ele quem for, esteja ele onde estiver. Hodiernamente, sem informação não há comunicação, o que resulta em exclusão, marginalização. Tudo isso tem uma relação direta com o que já vem sendo discutido pela UNESCO. Em 1958, ela definia como alfabetizada uma pessoa capaz de ler e escrever um enunciado simples, relacionado à sua vida diária. Vinte anos depois, sugeriu a adoção dos conceitos de analfabetismo e alfabetismo funcional. Tais conceitos são tão abrangentes que não podem deixar de considerar os usos da internet e de toda e qualquer ferramenta computacional.

É considerada alfabetizada funcional a pessoa capaz de utilizar a leitura e a escrita para fazer frente às demandas de seu contexto social e, também, para continuar aprendendo e se desenvolvendo ao longo da vida. O IBGE, na década de 90, seguindo recomendações da UNESCO, passou a divulgar índices de analfabetismo funcional, tomando como base não a autoavaliação dos respondentes, mas o número de séries escolares concluídas. Com menos de quatro anos de escolaridade, portanto, pelos critérios adotados, as pessoas seriam

consideradas analfabetas funcionais.

No caso desta pesquisa, recorro ao termo alfabetismo digital para explicar a necessidade que tutores a distância têm de aprender outras maneiras de ensinar, utilizando recursos e ferramentas do ambiente virtual de aprendizagem Moodle, ou seja, de dominar essas ferramentas e recursos para atuar na função.

Para explicar o que seja o alfabetismo, Rojo (2009) inicia afirmando que saber ler não significa apenas ter o conhecimento do alfabeto e saber decodificar palavras e frases. Para ela, alfabetismo implica compreender o que se lê e ser capaz de intertextualizar, o que requer estratégias especiais de leitura, tais como previsibilidade, levantamento de hipóteses, inferência e comparações, fatores importantes associados à leitura. É preciso, além disso, interpretar e criticar o texto, dialogar com ele e situá-lo em seu contexto. Da mesma forma, para escrever é preciso saber textualizar, estabelecer relações progressivas entre temas e ideias, considerar a coerência e a coesão, codificar e observar as normas da escrita. Essas habilidades juntas é que fazem parte de um processo que a autora chama de alfabetismo e que “tem um foco individual, bastante ditado pelas capacidades e

competências (cognitivas e acadêmicas) escolares e valorizadas de leitura e escrita (letramentos escolares e acadêmicos), numa perspectiva psicológica” (ROJO, 2009,

p.98).

Neste trabalho, a formação dos tutores a distância pode ser vista nesse leque de apropriação de conhecimentos diversos. Nesse sentido, aponto o alfabetismo e o letramento digitais, processos articulados, procurando mostrar como ambos estão presentes na formação dos tutores a distância. À medida que o conhecimento dos recursos e ferramentas do ambiente virtual de aprendizagem Moodle é adquirido por meio das tarefas didático-pedagógicas propostas no CCT, o processo de letramento digital passa, paralelamente, a ocorrer.

Nesta pesquisa, as reflexões sobre alfabetismo e letramento se referem às práticas digitais de leitura e escrita que os alunos-tutores vivenciam, como preparação para a tutoria online, ao participarem de um curso de capacitação na formação de tutores a distância. Quando trato de alfabetismo digital, refero-me às práticas de leitura e escrita que direcionam os alunos-tutores ao conhecimento do uso e navegação do ambiente Moodle; quando trato do letramento digital, me refiro às práticas digitais de leitura e escrita que os direcionam ao conhecimento dos fundamentos da EaD, do papel do tutor a distância e, enfim, dos aspectos inerentes

à modalidade EaD, permitindo ao aluno-tutor relacionar seu aprendizado ao contexto atual de educação a distância. Isso confirma a voz de Soares (2008, p.34), quando esta se refere à questão das "demandas sociais", enfatizando um “conjunto de

práticas governadas pela concepção de o que, como e por que ler e escrever” (p.35).

Não estou dissociando um processo do outro, mas indicando que ambos ocorrem de modo interdependente na formação dos tutores. Em suma: eles estão imbricados e se complementam; no entanto, é preciso diferenciar um processo de aquisição e apropriação que se constitui de tarefas didático-pedagógicas para aprender como exercer a função das práticas sociais necessárias ao desenvolvimento de letramento.

O alfabetismo, na visão de Rojo (2009), designa a condição das pessoas ou grupos que sabem não só ler e escrever, mas também utilizar a leitura e a escrita para participar de diferentes eventos de letramento em várias esferas de atividades, tanto na escolar, social, jornalística e cotidiana quanto em outras.

Como afirma Rojo (2009, p.44), o conceito de alfabetismo(s)27 “disputa

espaço com o conceito de letramento(s)”, o que confirma a complementaridade um

do outro; no entanto, torna o conceito bastante complexo e de natureza multidimensional, pois as capacidades tanto de leitura como de escrita são múltiplas e variadas, principalmente no contexto digital da EaD. O conceito considerado nesta pesquisa é aquele apresentado pelo INAF, que afirma ser alfabetismo “a capacidade

de acessar e processar informações escritas como ferramenta para enfrentar as demandas cotidianas” (ROJO, 2009, p.44).

Na verdade, a discussão em torno do alfabetismo ressurgiu após várias discussões e estudos sobre o ‘letramento e alfabetização’ (TFOUNI, 1988; SOARES, 1998, 2003; KLEIMAN, 1995; ROJO, 1998). Ainda se buscam esclarecimentos, a partir de abordagens que estabelecem o confronto entre os dois processos, visando a uma compreensão melhor sobre o que ocorre no contexto desta pesquisa, em relação ao alfabetismo. Para Soares (2008, p.34),

o alfabetismo é, pois, fundamentalmente, adaptação, segundo metáfora usada por Scribner (1984, p.9): Esta metáfora, alfabetismo como adaptação,

27 A autora, em sua recente publicação, usa o “s” entre parênteses no termo alfabetismo, mostrando

que o termo pode ser pluralizado, bem como usa o termo letramento no plural ou “letramentos múltiplos” para se referir às várias práticas de letramento que circulam nos diferentes contextos de leitura e escrita do cotidiano.

é usada para expressar conceitos de alfabetismo que enfatizam seu valor pragmático ou para sobrevivência.

Importante é entender que, no contexto desta pesquisa, o alfabetismo pode ser visto como a metáfora mencionada, isto é, visto como adaptação ao ambiente digital e, por essa razão, o denomino alfabetismo digital. Essa adaptação se refere ao conhecimento das ferramentas e recursos do ambiente Moodle. Dessa forma, entendo que as práticas de leitura e escrita dos alunos-tutores na formação, que ocorrem por meio do suporte de ferramentas digitais, os direcionam ao desenvolvimento de práticas de letramento digital, discutidas a seguir.

Como afirma Soares (2008, p.37), “há, pois, diferentes conceitos de

alfabetismo, dependendo das necessidades e condições sociais presentes em determinado estágio histórico de uma sociedade e cultura”. Essa afirmação justifica

o fato de, nesta pesquisa, ser considerado o alfabetismo digital como o processo de aprendizagem dos recursos e ferramentas do ambiente virtual de aprendizagem Moodle, desenvolvido durante a formação.

Diante dessa afirmação, é possível pressupor que o conceito de alfabetismo digital para explicar a aprendizagem do uso das ferramentas e recursos do ambiente virtual de aprendizagem Moodle seja adequado. Não estamos afirmando que alfabetismo digital esteja desvinculado das práticas sociais de letramento digital, mas que os dois processos, alfabetismo digital e letramento digital, andam juntos, na mesma medida que a alfabetização e o letramento.

Para explicar melhor, o alfabetismo digital é um processo contextualizado, visto que os alunos-tutores realizam tarefas didático-pedagógicas no CCT, que envolvem práticas digitais de leitura e escrita, de forma a prepará-los pata atuar no curso a distância que vão tutorar. A proposta do curso é expor aos futuros tutores a distância o contexto das práticas sociais digitais de leitura e escrita que deverão ser desenvolvidas ao exercerem a função. O perfil desses profissionais se pauta em características suscetíveis à aceitação de inovações. Vale dizer que um tutor a distância pode, sem abandonar suas práticas anteriores, ajustar-se e adaptar-se ao ambiente virtual de aprendizagem, apropriar-se de novos métodos de ensino e compartilhar sua função com outros atores envolvidos no processo de ensino- aprendizagem. Além disso, uma busca constante de aperfeiçoamento torna-se requisito essencial para que o tutor a distância tenha sucesso ao realizar sua função de tutoria.

Assim considerado, o conceito de alfabetismo transpõe-se para o contexto digital, extrapolando os contextos convencionais nos quais a discussão sempre se ancorou. Sua importância se relaciona ao fato de os tutores a distância aprenderem a usar novos espaços de leitura, escrita e comunicação, por meio de orientações e instruções recebidas a partir de recursos e ferramentas digitais. Denomino alfabetismo digital essa fase de aprendizagem por meio de tarefas didático- pedagógicas específicas, que envolve questões do tipo: como o aluno-tutor aprende a usar as ferramentas e recursos digitais na EaD? como ele vai tutorar seus alunos a distância?

Esses questionamentos significam que existe a necessidade de esse aluno- tutor adquirir capacidades e habilidades inerentes ao contexto digital. Por isso, na formação de tutores a distância, estes passam por um período de capacitação que lhes propicia entender as orientações que recebem e apropriar-se de práticas que associo ao alfabetismo digital, além de, como consequência dessas práticas, apropriar-se de novas práticas digitais de leitura e escrita.

Nesse sentido, considero importante esclarecer o conceito de letramento digital, na perspectiva da pesquisa, para melhor compreender como esse fenômeno se mostra presente na formação dos tutores a distância, principalmente nas ações e interações entre eles e seus formadores.