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CAPÍTULO I: Articulações Teóricas

1.1 Educação a Distância

1.2.1 Alfabetismo e letramento

Em primeiro lugar, ressalto que as concepções de alfabetização, alfabetismo e letramento discutidas aqui não são consideradas autônomas e independentes, mas, sim, interdependentes e entrelaçadas. Soares (2004), ao relacionar alfabetização e letramento, lembra-nos que, há quase vinte anos, quando a palavra letramento ainda não era utilizada, ela própria já anunciava o fenômeno em seus

estudos, porém, de maneira implícita. Hoje, Soares afirma que o termo ainda é polêmico, mas sua evolução, nesta última década, aponta novas concepções e novos letramentos para os dias atuais, por conta das novas tecnologias de informação e comunicação.

A autora (2003, p.15) afirma, convictamente, que a alfabetização é o “processo de aquisição do código escrito, das habilidades de leitura e escrita” e esclarece que o letramento, originado do termo literacy em inglês, traduzido por ela como alfabetismo, corresponde às práticas sociais de leitura e escrita. O termo letramento começou a circular nos ambientes acadêmicos educacionais a partir da demanda por uma nova palavra, como já dito, ante uma nova realidade social, para designar “o estado ou a condição que adquire um grupo social ou um indivíduo como

consequência de ter-se apropriado da escrita” (SOARES, 1998, p.18).

Levando em conta o contexto de formação discutido neste trabalho, para melhor explicar a concepção de letramento, recorro às palavras de Kleiman e Oliveira (2008, p.9) que, na apresentação do livro sobre letramentos múltiplos, sublinham:

Educar cidadãos, linguisticamente, para participarem produtivamente de um mundo tecnológico cada vez mais 'leiturizado' e 'escriturado' e informatizado é uma tarefa que exige voltar a atenção não só para a formação do professor e de outros agentes interessados na educação popular, como também para as orientações de letramento que norteiam esse processo formador.

Na concepção das autoras (p.8), o letramento passa a ser entendido como “um conjunto de práticas sociais que podem ser inferidas de eventos mediados por

textos escritos”, e não como um conjunto de habilidades para serem aprendidas

pelas pessoas. Essa concepção, elas explicam, está desvinculada do processo de escolarização e, portanto, de alfabetização. O que ocorre, na maioria dos estudos sobre letramento, é que o termo parece ter sido redirecionado para os eventos que não são necessariamente escolares, e sim, para as várias esferas do cotidiano (ROJO, 2009).

Recorro às palavras de Soares (1998, p.18), que define letramento como o “resultado da ação de ensinar e aprender as práticas sociais da leitura e escrita”, para articular a essa discussão, o fenômeno do letramento digital, pressupondo que, quando os tutores passam por uma aprendizagem específica no ambiente online, para adquirir a prática de ensinar e aprender com as ferramentas que a plataforma

Moodle24 oferece, eles vivenciam novas práticas de letramento digital. Nesse sentido, é possível associar toda a questão da apropriação do novo paradigma da EaD e das necessidades dos tutores em relação ao domínio da leitura e da escrita à ideia defendida por Soares (1998, p.39):

Ter-se apropriado da escrita é diferente de ter aprendido a ler e a escrever: aprender a ler e escrever significa adquirir uma tecnologia, a de codificar em língua escrita e de decodificar a língua escrita; apropriar-se da escrita é tornar a escrita “própria”, ou seja, é assumi-la como sua propriedade.

Reafirmando sua posição em relação aos dois termos, Soares (2004) destaca que a diferença fundamental entre o letramento e a alfabetização está no grau da ênfase que existe nas relações entre as práticas sociais de leitura e de escrita e a aprendizagem do sistema de escrita. Assim como se modificou o significado de alfabetizado25, modificou-se também a concepção do analfabeto, percebendo-se, dessa forma, que o letramento ultrapassa a questão do ato de ler e de escrever, mas diz respeito, na verdade, ao uso social que se faz da leitura e da escrita.

Dessa forma, Soares (op cit., p.15) insiste na diferença terminológica entre alfabetização e letramento e explica o uso dos dois termos:

A conveniência, porém, de conservar os dois termos parece-me estar em que, embora designem processos interdependentes, indissociáveis e simultâneos, são processos de natureza fundamentalmente diferente, envolvendo conhecimentos, habilidades e competências específicos, que implicam formas de aprendizagem diferenciadas e, consequentemente, procedimentos diferenciados de ensino.

Tais definições mostram que ser alfabetizado não significa ser letrado, mas que as duas ações andam juntas. A autora afirma ainda:

Assim, teríamos alfabetizar e letrar como duas ações distintas, mas não inseparáveis, ao contrário: o ideal seria alfabetizar letrando, ou seja: ensinar a ler e a escrever no contexto das práticas sociais da leitura e da escrita, de modo que o indivíduo se tornasse, ao mesmo tempo, alfabetizado e letrado” (SOARES, 1998, p.47).

24 Modular Object-Oriented Dynamic Learning Environment – Moodle designa um software livre, de

apoio à aprendizagem, executado em ambiente virtual; corresponde a um sistema de administração de atividades educacionais destinado à criação de comunidades online, voltado para a aprendizagem colaborativa (Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Moodle> Acesso em: 15/08/2009).

25Alfabetizado era, antigamente, o sujeito que declarava saber ler e escrever, quando, na verdade, só

era capaz de ler e escrever o próprio nome. Depois, passou a ser interpretado como saber ler e escrever um bilhete simples. Atualmente, saber ler, escrever e fazer uso da leitura e escrita envolve a alfabetização e o alfabetismo funcional, o que, segundo o INAF (Instituto Nacional de Alfabetismo Funcional), se refere a fazer uso dessas habilidades para funcionar na sociedade.

Alfabetização e letramento, enfim, andam juntos e são dois processos inseparáveis, significando que um complementa, faz parte do outro. Entretanto, nem todo sujeito alfabetizado pode ser considerado letrado, pois o letramento requer mais do que ler e escrever 'um bilhete simples', como foi, algum tempo atrás, o critério para designar o sujeito alfabetizado.

Considerando-se as discussões já apresentadas, parece-me claro que ambos os termos, alfabetismo e letramento, se referem a processos interdependentes e evidenciam quando um indivíduo conhece o ambiente dos textos e sabe usar o texto escrito em diferentes funções e contextos sociais. Com base nessa afirmação, pressuponho que letramento digital possa estar presente na formação de tutores a distância, no contexto das disciplinas observadas.

Em face das novas mídias digitais, letramento digital pode ser redirecionado para uma realidade social em que as tecnologias da informação e da comunicação enfatizam que se dominem as práticas de leitura e escrita no ambiente digital. Tal discussão se inicia pela compreensão de alfabetismo digital, apresentada a seguir.