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Alocação de recursos para a produção de inovação tecnológica

4 RESULTADOS DA PESQUISA

4.3 Relações entre inovação tecnológica e estratégia

4.3.1 Alocação de recursos para a produção de inovação tecnológica

Os investimentos em P&D, típicos dos países desenvolvidos, conforme Galbraith e Lawler (2003, p.XXIV), tornam-se fundamentais ao mesmo tempo em que aumentam os custos fixos de todas as organizações. O início da nova era da competição global no final dos anos 70 marcou o começo de dispêndios maiores em P&D por parte dos países industrializados. Nos anos 80, nem mesmo as grandes organizações norte-americanas conseguiam volumes suficientes de seus mercados internos para cobrir seus custos fixos. Precisaram, como continuarão precisando, de um volume global para cobrir os crescentes investimentos em P&D. O encurtamento dos ciclos de vida dos produtos piora a situação em conseqüência da redução do número de anos ao longo dos quais os custos fixos são amortizados7. Um maior consumo proveniente de vários países precisa ser conseguido num menor número de anos. O resultado é que mais empresas precisam de volume global para que possam sobreviver.

Hamel e Prahalad (1995, p.286) afirmam que à medida que o custo da inovação tecnológica exige volumes imensos de investimento, como em setores de semicondutores, produtos farmacêuticos e telecomunicações, o imperativo da preempção global torna-se cada vez mais pronunciado. Por exemplo, uma empresa alemã de telecomunicações como a Siemens, que tem competido no mercado de grandes centrais telefônicas, na década de 60, investia no desenvolvimento de um comutador eletromecânico cerca de US$ 200 milhões, ao valor do dólar de 1993. Para recuperar esse investimento, o fabricante teria precisado conquistar praticamente a metade do mercado alemão. Nas décadas de 70 e 80, o custo de desenvolvimento da nova geração de comutadores digitais aumentou para cerca de US$ 1 bilhão. Para amortizar esse investimento, a empresa alemã teria precisado conquistar 100% do seu mercado doméstico, mais uma boa parte do mercado europeu. Extrapolando-se a tendência quanto ao nível de investimentos, no final da década de 90 e adiante, o desenvolvimento chegaria a custar US$ 2 bilhões. Tendo feito esse investimento, um fabricante da área de telecomunicações teria que conquistar 20% do mercado global apenas para amortizar seus custos. Essa lógica econômica inevitável estimulou onda após onda de consolidação de setores e levou uma forte concorrência por cada fatia de mercado do mundo em diversos setores. No setor de telecomunicações, a concorrência antes amplamente regional – a Alcatel versus Siemens na Europa, Northern Telecom versus AT&T nos Estados Unidos e NEC versus Fujitsu no Japão – hoje é global.

Aparentemente o desafio de se alcançar escalas mundiais que tornem os investimentos em P&D compensáveis está sendo vencido, pois, em sua avaliação macroeconômica da contribuição de P&D à lucratividade corporativa, Bruce Old apud Roussel, Saad e Bohlin (1992, p.1) demonstrou uma relação positiva entre lucratividade a longo prazo e a proporção de fluxo de caixa de uma empresa decide arriscar em P&D e no investimento produtivo que se segue.

Muitas novas tecnologias existentes na atualidade e muitos dos produtos derivados dessas tecnologias são frutos de grandes concentrações de recursos, muitas vezes, de vários centros de P&D da organização espalhados pelo mundo. A gestão corporativa da tecnologia exige convergência dos esforços organizacionais e, segundo Hamel e Prahalad (1995, p.184), a busca de uma única intenção estratégica ao longo de um período extenso garante que os esforços dos indivíduos, dos diferentes departamentos funcionais e da empresa inteira, convirjam para o mesmo objetivo. A convergência exige uma compreensão de como todos os recursos da empresa podem ser orquestrados de modo a se alcançar um objetivo amplo. A "alavancagem" de recursos ocorre apenas se as competências e a dedicação dos indivíduos,

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equipes, funções e negócios forem acumuladas pelas das unidades organizacionais ao longo do tempo.

Atualmente, menciona Gedanke (1992, p. XI), a gestão da pesquisa e do desenvolvimento deve ser encarada como uma das armas que a empresa dispõe para alcançar uma diferenciação competitiva. O indicador de sucesso dessa estratégia deve ser o crescimento do fluxo de caixa. Só com o crescimento dos recursos postos à disposição da empresa é que ela pode garantir a continuidade de sua liderança tecnológica e manter as suas vantagens competitivas para poder explorar conquistas maiores que criem novas oportunidades de mercado.

Cohan (1999, p.71) menciona que as líderes em tecnologia constroem sua riqueza alicerçadas em tecnologias essenciais. Se as tecnologias essenciais são suficientemente ricas para gerar produtos que são de valor único para os clientes, esse alicerce é forte e tem certo período de vida que irá gerar lucros para a organização. Contudo, o valor das tecnologias essenciais de uma empresa pode desgastar-se freqüentemente se novas tecnologias surgirem, como, por exemplo, um novo conhecimento envolvido em processo de mudança de

paradigma. A fim de se prevenir, as organizações devem praticar a vigilância tecnológica8 e possuir um portfólio9 atualizado de projetos viáveis com base em suas tecnologias essenciais para a exploração de oportunidades de mercado.

Segundo Lewis (1992, p.45), mesmo para as grandes organizações, o desenvolvimento de tecnologias importantes pode exigir um nível de esforço além das capacidades da própria empresa. Com orçamentos insuficientes, a produtividade de P&D é prejudicada, caminhos importantes não podem ser seguidos e as necessidades a longo prazo podem ser comprometidas. A cooperação tecnológica pode fazer uma diferença crítica10. Esse tema é abordado com mais detalhes no tópico 4.3.4 mais adiante.

Existem, porém, de acordo com Andrew e Sirkin (2003, p.78), organizações que investem pesadamente em P&D próprios e que gerenciam toda a cadeia do processo de geração de caixa por meio da inovação. Elas controlam cada passo do processo e assumem que podem, dessa maneira, reduzir riscos de insucesso. A Intel é um exemplo desse tipo de firma "faça tudo você mesmo" ou “integradores”. Com faturamento de US$ 26 bilhões ela investiu US$ 4 bilhões em pesquisa de semicondutores em 2002, tendo fabricado seus produtos quase que inteiramente em suas plantas, gerenciado seu marketing, sua marca, e a distribuição de seus chips. Ainda segundo o autor, o licenciamento é a mais recente maneira que as empresas estão encontrando para capitalizar em cima de inovação de produtos ou inovação tecnológica. Ele é amplamente utilizado nos setores de biotecnologia e de tecnologia da informação, onde a velocidade de mudança é muito rápida e, conseqüentemente, os riscos muito elevados. Por exemplo, em 2002 a Amgen faturou o US$ 330 milhões e a IBM US$ 351 milhões relativos a royalties de produtos e tecnologias que outras empresas levaram ao mercado. Há também empresas que criam novas tecnologias mas que não se sentem aptas a comercializá-las. Dessa maneira, elas se associam a outras e garantem uma participação nos resultados. Os “licenciadores” exercem a função de geradores da nova tecnologia e, nas etapas que se seguem, eles se aplicam em negociar e gerenciar a propriedade intelectual.

4.3.1.1 Risco e incerteza associados à inovação tecnológica

Schon apud Roussel, Saad e Bohlin (1992, p.77) relata a diferença de significado entre

risco e incerteza para o planejamento de pesquisa e inovação tecnológica:

Os homens envolvidos em inovação técnica numa corporação defrontam-se com uma situação em que a necessidade de ação é clara, mas a própria ação não o é. Contanto que esta situação exista, a corporação não pode funcionar efetivamente, porque não foi projetada para

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Ver também item 4.3.2.4- Vigilância e monitoramento tecnológicos 9

Ver também item 4.3.2.2- Portfólio de projetos e tecnologias 10

a incerteza – uma situação em que não há objetivos claros a serem alcançados, não há medição das realizações e nenhum conceito adequado de controle. Uma corporação não pode operar na incerteza, mas está maravilhosamente equipada para cuidar dos riscos. Ela é precisamente uma organização idealizada para desvendar, analisar, avaliar e operar sobre riscos.

Estar atento e ter informações de valor para avaliar o potencial de mercado de uma tecnologia em uso e principalmente de uma nova tecnologia, deve ser tarefa rotineira das empresas que investem grandes somas para se manter como vanguardistas no mercado. Quinn (2001a, p.313) relata um bom exemplo disso, ao mencionar que a Merck e a Hoffman- LaRoche antes de investirem US$ 20 a US$ 50 milhões para a aprovação de uma nova droga, precisam ter uma segurança razoável de que serão os primeiros no mercado. Tomam precauções aprimoradas para assegurar que o lançamento seja seguro e eficiente e que não poderá ser facilmente duplicado por outras empresas. Suas estruturas organizacionais bem como suas estratégias, são formuladas para que estejam na vanguarda da ciência, ao mesmo tempo em que se mantêm conservadoras dando suporte a P&D durante os longos períodos necessários aos testes com animais, avaliação clínica e controle de produção.

Uma das mais importantes características associada à pesquisa em busca de novas tecnologias comerciais, diz respeito ao risco de se perder o trabalho de P&D e conseqüentemente de se ter que lançar os seus custos como perda em lugar de serem considerados como "investimentos" na contabilidade da organização. Miller (1998, p.82) destaca que não deve ser surpreendente dizer que, em última análise, todo o processo de inovação se resume em gerenciamento de riscos.

Para Steele (1989, p 117) o risco para tecnólogos está associado a possíveis falhas como, por exemplo, um avanço tecnológico que, apesar de intensamente perseguido, não foi possível se alcançar ou, um componente ou processo que foi esmeradamente criado e que não funcionou.

Um risco sempre associado à introdução de nova tecnologia no mercado é referente à dúvida se ela irá realmente corresponder à expectativa. Um outro risco é relativo à vontade do cliente comprar o novo produto. Pergunta-se: será que isso vai pegar? Algumas vezes, mesmo tecnologias que se mostram eficientes, não se mostram atraentes para os clientes. Outro risco se refere à existência de substitutos ou equivalentes, ou ao sentimento de que haverá um substituto no curto prazo com características superiores ou preços inferiores. Ambas as situações derrubam as margens de lucro, pois, normalmente, elas conduzem à competição por preços. Um último risco diz respeito a dificuldades naturais relacionadas com o tipo do produto. Há produtos mais sofisticados, de custos elevados, de mercados mais restritos, de percepção difícil em relação aos benefícios que trazem etc. Esses produtos podem exigir altos investimentos para a realização de sua introdução no mercado (Andrew e Sirkin, 2003, p.82).

Etapa de desenvolvimento Probabilidade

Acabamento técnico (objetivos técnicos alcançados) 0.57

Comercialização (marketing total) 0.31

Sucesso no mercado (obtenção de retorno econômico) 0.12

Tabela 4.1– Probabilidade de sucesso de um novo produto

Fonte: Daft (2002, p.339)

Mansfield et al. apud Daft (2002, p.339) colocam que um levantamento realizado alguns anos atrás examinou 200 projetos em 19 laboratórios químicos, farmacêuticos e petrolíferos para descobrir os índices de sucesso. Para ser considerado bem-sucedido, o novo produto tinha de passar por três etapas de desenvolvimento: acabamento técnico, comercialização e sucesso de mercado. Os resultados sobre os índices de sucesso são apresentados na tabela 4.1.

Na média, 57% de todos os projetos empreendidos nos laboratórios de P&D alcançaram os objetivos técnicos - o que significa que todos os problemas técnicos foram resolvidos e os projetos passaram para a fase de produção. Menos de um terço (31%) foi plenamente lançado no mercado e comercializado. O fracasso nessa etapa deveu-se à estimativa de produção estar abaixo dos níveis adequados à economia de escala ou, aos resultados de testes de mercado serem desfavoráveis.

Existe uma relação direta e proporcional entre a recompensa esperada em face ao investimento planejado para a promoção da inovação tecnológica e o conseqüente risco envolvido na operação (Roussel, Saad e Bohlin, 1992). Apesar de que se podem contar como certas, são baixas as recompensas esperadas para investimentos baixos em P&D. À medida que se avolumam os investimentos, o retorno esperado também aumenta assim como o risco torna-se proporcionalmente maior.

Elevada Investimento em P&D – alto

Investimento em P&D – médio/ alto

Investimento em P&D – médio/ alto

Moderada Investimento em P&D – médio

Investimento em P&D – baixo/ médio

Baixa Investimento em P&D – baixo

Baixo Moderado Elevado

Quadro 4.3– Relação risco x recompensa sobre investimentos em P&D

Fonte: adaptado de Roussel, Saad e Bohlin (1992)

Conforme Dougherty e Hardy apud Daft (2002, p.337), as pesquisas têm explorado a imensa incerteza associada ao desenvolvimento e à venda de novos produtos. Para responder o que essa incerteza pode significar para as organizações, basta considerar fracassos como o do VideoDisc Player da RCA, que representou uma perda de US$ 500 milhões, ou o TV-cable Week da Time Incorporated, com uma perda de US$ 47 milhões. O êxito não é uma constante para o lançamento de novos produtos e isto faz parte do negócio em todos os segmentos. As organizações assumem o risco porque a inovação de produtos é uma das maneiras mais importantes pelas quais as empresas se adaptam a mudanças nos mercados, nas tecnologias e na competição.

As grandes organizações já estabelecidas e que têm um mercado substancial conquistado e cativo, correm um risco ainda maior ao empreender o lançamento de novas tecnologias, pois, além do custo direto referente ao investimento em P&D em novos processos de manufatura e em marketing, essas organizações, de acordo com Quinn (2001a, p.305), arriscam toda sua base de consumidores que já foi conquistada com grande custo e esforço. Além disso, arriscam seu relacionamento com o mercado e seu relacionamento com os colaboradores.

Para um novo empreendimento isso é diferente, pois ele não corre esses riscos, mesmo porque ele não tem base instalada de consumidores, tampouco relacionamentos interno e externo consolidados.

Andrew e Sirkin (2003, p.78) afirmam que algumas das grandes organizações já estabelecidas e consolidadas no mercado preferem gerenciar toda a cadeia de inovação como forma de reduzir os riscos de insucesso, pois entendem que sob seu comando os objetivos da P&D estarão sempre alinhados com a estratégia da empresa.

Existem outros aspectos que podem ajudar uma organização a obter sucesso na contínua busca por redução de riscos. Miller (1998, p.88) menciona que a DuPont tenta reduzir os riscos associados ao desenvolvimento de novas tecnologias por meio de dois processos

Risco R ec o m p en sa

distintos: um que envolve suas relações externas, ouvindo e colaborando com os clientes e outro que se refere às suas relações internas, combinando suas habilidades de marketing e de tecnologia.

Segundo (Lewis, 1992, p.44-47), outra maneira de se reduzir o nível de risco é a formação de alianças tecnológicas11 para se desenvolver novas tecnologias. Os benefícios de uma cooperação técnica vão muito além da união de competências diferentes. Eles auxiliam os participantes a dividir os riscos do desenvolvimento de novas tecnologias por meio do compartilhamento de recursos individuais já existentes, da "alavancagem" de novos recursos necessários, do estabelecimento de padrões técnicos e de escala de utilização.