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APELAÇÃO CÍVEL Nº 2006011077007-

No documento 179rdj090 (páginas 190-195)

Apelante - A. C. G. da S. Apelado - C. R. G. dos S. Relatora - Desa. Vera Andrighi Primeira Turma Cível

EMENTA

REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS. ACUSAÇÃO. LOCAL DE TRABALHO. TRANSMISSÃO DO VÍRUS HIV. LESÃO. AUTO-ESTIMA. HONRA PROFISSIONAL.

I - O réu, em seu local de trabalho (salão de beleza), foi acusado de transmitir o vírus do HIV ao falecido pai do autor, sem nenhuma prova do fato.

II - A conduta ilícita causou danos morais graves porque atingiu a auto-estima e a honra profissional do autor, dada a natureza do ofício que desempenha.

III - Demonstrados a ação e o nexo causal, o dano moral, consi- derado o conteúdo da acusação e a profissão do autor, presume-se o dano moral.

IV - Apelação conhecida e improvida.

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores da Primeira Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, Vera Andrighi - Relatora, Fátima Rafael - Revisora e Flavio Rostirola - Vogal, sob a presidência do Desembargador Lécio Resende, em conhecer e improver, unânime, de acordo com a ata de julgamento e notas taquigráficas.

Brasília (DF), 22 de abril de 2009.

RELATÓRIO

A. C. G. DA S. interpôs apelação da r. sentença (fls. 148/57), que, na ação de reparação civil, proposta por C. R.G. dos S., julgou parcialmente proce- dente o pedido.

Na petição inicial, o apelado-autor narra que exerce atividade de ca- beleireiro em salão de beleza há dois anos. Afirma que, em determinada ocasião,

o apelante-réu compareceu ao estabelecimento e, perante os presentes, acusou-o de ter transmitido AIDS ao seu pai (A. M. da S.) - com quem o apelado mantinha relação homoafetiva. Falou ainda que o próprio apelado também morreria desse mal logo em seguida.

Prossegue aduzindo que sofreu abalo na sua honra objetiva e subjetiva e, desde então, houve uma diminuição da clientela. Ressaltou que não é portador do vírus HIV e que seu companheiro faleceu em decorrência de câncer.

Diante disso, requer indenização por danos materiais, no valor de R$ 10.000,00, e por danos morais, no equivalente a R$ 10.500,00.

Em contestação, o apelante-réu argui ausência de interesse processual e, no mérito, nega ter acusado o apelado-autor de qualquer conduta. Aduz que o apelado-autor não sofreu nenhum dano, porque não era proprietário do salão de beleza, mas apenas empregado. Noticia a pendência de ação em que se discute posse e propriedade de um automóvel e do estabelecimento comercial, que eram de seu falecido pai.

A r. sentença condenou o réu a pagar indenização por danos morais no valor de R$ 3.000,00. Quanto à indenização por danos materiais, o pedido foi improcedente.

Na apelação, o apelante-réu sustenta a inexistência de ato ilícito, argu- mentando que houve apenas uma conversa normal de conteúdo doloroso a ambos. Alega ainda que não houve dano, nexo de causalidade nem elemento subjetivo.

Não houve preparo, devido à concessão de gratuidade de justiça (fl. 157).

O apelado-réu não apresentou contrarrazões (fl. 174). É o relatório.

VOTOS

Desa. Vera Andrighi (Relatora) - Conheço da apelação, porque presentes os pressupostos de admissibilidade.

Ao contrário do argumentado pelo apelante-réu, verifica-se estarem presentes os pressupostos da responsabilidade civil aquiliana, conforme dispõe art. 186 do CC: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou impru- dência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.”

Depreende-se dos elementos dos autos que o apelante-réu, perante outras pessoas, reputou ao apelado-autor a qualidade de soropositivo para vírus HIV e ainda o acusou de transmitir a moléstia a seu pai.

“(...) QUE o depoente afirma que o requerido chegou ao estabe- lecimento comercial dizendo que o autor teria transmitido vírus HIV para seu pai; QUE o autor e o requerido mantiveram uma conversa antes do requerido bradar em alto tom os referidos impropérios; (...)” (fl. 127).

Por sua vez, a testemunha M. G. P. F. afirmou:

“(...) QUE o requerido adentrou o estabelecimento comercial do autor, ocasião em que lhe foi informado que seu pai estava acometido de uma doença grave, não chegando a dizer qual, porém o requerido disse naquele momento ao autor que ‘eu já sei o que ele tem, pois foi você que lhe transmitiu AIDS, que seu pai iria morrer porém o autor também iria morrer logo em seguida’; QUE tais impropérios foram ditos pelo requerido em médio tom; (...)” (fl. 129)

Por fim, corroborando os outros depoimentos, a testemunha e funcionário da empresa M. V. L. B. de O. disse:

“(...) QUE tem conhecimento que o autor comunicou no refe- rido estabelecimento comercial que o pai do requerido possuía uma doença grave; QUE o requerido então disse para o autor que o seu pai tinha HIV, a mesma doença que o autor; QUE tal fato foi dito pelo requerido ao autor de forma normal, ‘apenas conversando’; QUE além da depoente também se encontravam naquele momento no estabelecimento, outras oito pessoas dentre funcionários e clientes (...)” (fl. 131)

Entretanto, o apelado-autor não tem a doença (fl. 09), tampouco conta- minou o pai do apelante-réu, porquanto esse faleceu por causa de câncer (fl. 10). A conduta de atribuir a alguém levianamente a AIDS, acusando-o de contágio (que, inclusive, subsume em tipo penal), na presença de outras pessoas, constitui ato ilícito que dá ensejo à reparação por danos morais.

Não se cogita da comprovação do dano moral, porque a jurisprudência o considera “em si mesmo” (in re ipsa), bastando a demonstração do fato causador. Na hipótese, é indiscutível a existência de mácula na honra subjetiva e objetiva do apelado-autor, que foi taxado de doente terminal (pois iria “morrer logo em seguida”) e transmissor da moléstia incurável.

O nexo de causalidade entre a conduta e o abalo moral é evidente, pois o constrangimento sofrido pelo apelado-autor decorreu diretamente das acusações que lhe foram dirigidas.

A conduta ilícita causou danos morais graves porque atingiu a auto- estima e a honra profissional do autor, dada a natureza do ofício que desem- penha.

Portanto, presentes os requisitos da obrigação de indenizar. Isso posto, conheço da apelação e nego provimento. É o voto.

Desa. Fátima Rafael (Revisora) - Presentes os pressupostos de admis-

sibilidade, conheço do recurso.

Trata-se de apelação de sentença que, em ação de reparação de danos materiais e morais, julgou parcialmente procedente o pedido e condenou o réu, ora apelante, a pagar indenização por danos morais fixados em R$ 3.000,00 (três mil reais).

A pretensão deduzida na petição inicial tem por fundamento a acusação do autor, de que o réu era portador de HIV e teria transmitido a doença ao seu pai, com quem mantinha relação homoafetiva.

Os depoimentos colhidos sob o crivo do contraditório comprovam que, realmente, as partes discutiram publicamente e o réu foi acusado de ser o causador da doença acometida pelo pai do autor.

Imputou o Réu ao Recorrido fato ofensivo à sua reputação e, ainda, submeteu-o à situação de constrangimento diante dos clientes do salão de beleza onde trabalhava.

Não houve mera insinuação por parte do réu apelante, conforme se extrai dos depoimentos das testemunhas e M. G. P. F. e M. V. L. B. de O.

Encontrando-se o autor injustamente acusado de ter infectado o falecido pelo vírus da AIDS, em decorrência do relacionamento afetivo-sexual entre eles mantido, incontestáveis são os prejuízos de ordem subjetiva e objetiva, devendo ser reconhecido o direito ao ressarcimento por dano moral.

Registre-se que o dano moral constitui prejuízo decorrente da dor im- putada à pessoa, em razão de atos cujas consequências ofendem, indevidamente, seus sentimentos, provocando constrangimento, tristeza, mágoa ou atribulações na esfera interna pertinente à sensibilidade moral.

Assim, nego provimento ao recurso do autor. É como voto.

Des. Flavio Rostirola (Vogal) - Com a Relatora. DECISÃO

Conhecido e improvido, unânime. ——— • ———

No documento 179rdj090 (páginas 190-195)