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DOS RECURSOS DE APELAÇÃO INTERPOSTOS PELOS RÉUS

No documento 179rdj090 (páginas 169-177)

ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL Nº 130, que, por maioria, declarou não-recepcionada pela Constituição Federal

2. DOS RECURSOS DE APELAÇÃO INTERPOSTOS PELOS RÉUS

Narram os autores, analistas de finanças e controle externo do Tribunal de Contas do Distrito Federal, que o colunista Carlos Honorato, haveria caluniado e ofendido publicamente suas honras, abalando a credibilidade da atividade pro- fissional por eles desempenhada, por meio de matérias jornalísticas publicadas aos dias 09 e 10 do mês de junho do ano de 2005, no Jornal de Brasília (fls. 03/09).

De outro lado, consoante relatado, sustentam os Réus a ausência de dano, sob o argumento central de que o colunista haveria agido em animus narrandi e em exercício regular do direito de informação e de crítica (fls. 318/319 e 331/333).

2 ADPF nº 130, voto do ministro Carlos Ayres Britto. Disponível em: http://www.stf.jus.br/arquivo/ cms/noticiaNoticia Stf/anexo/adpf130.pdf. Acesso em: 17.06.2009.

O pano de fundo da presente lide, portanto, gira em torno do conflito

entre os direitos fundamentais de resposta, proporcional ao agravo (artigo 5º, inciso

V, da CF/88) e de indenização pelo dano material ou moral decorrente da violação a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas (artigo 5º, inciso X, da CF/88), e os direitos de personalidade de livre manifestação do pensamento (artigo 5º, inciso IV, da CF/88), da expressão da atividade de comunicação (artigo 5º, inciso IX, da CF/88), e do exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão (artigo 5º, inciso XIII, da CF/88); bem assim do direito de acesso à informação, resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional (artigo 5º, inciso XIV, da CF/88), e, por arrastamento, aqueles atinentes à liberdade de imprensa, previstos no Capítulo V do Título VIII da Carta Magna (artigos 220 e seguintes, da CF/88).

Diante disso, compete ao intérprete ponderar e sopesar os princípios concorrentes, a fim de verificar qual deve preponderar na circunstância do caso em concreto, sem, contudo, invalidar o outro standard normativo, que continua em vigor, com a mesma intensidade e relevância constitucional.

No presente caso, devem prevalecer os direitos que salvaguardam a ativi-

dade jornalística, uma vez que não houve abuso do direito de informar, com ânimo de caluniar, difamar e injuriar os autores, mas tão-somente de narrar fatos, que foram levados ao conhecimento do colunista, exercendo de forma legítima o seu direito de manifestação do pensamento e de expressão, diante do interesse público.

Com efeito, depreende-se das provas carreadas aos autos, que o Réu Carlos Honorato publicou em sua coluna, no Jornal de Brasília, veiculado em mídia impressa e virtual, as seguintes reportagens:

Humilhação e arrogância

Dois analistas do TCDF estão praticando uma espécie de terrorismo com os servidores da Codeplan. Deslocados para a empresa para proceder o trabalho normal de auditoria, eles estariam indo muito além de suas atribuições legais ao tratar as pessoas com humilhação e arrogância. Aliás, tais itens não fazem parte de qualquer investigação séria. O curioso em tal processo é que o presidente da empresa, Durval Barbosa, determinou que todos os funcionários da Codeplan colaborem com todas as informações solicitadas pelos analistas. (Publicada em 09.06.2005 - fls. 98, 103 e 154)

Corregedoria investiga abuso de analistas

A Corregedoria do Tribunal de Contas do Distrito Federal vai apurar as denúncias feitas por servidores da Codeplan de que

estariam sendo vítimas da arrogância e humilhação por parte de dois analistas, que foram deslocados para a estatal para proceder uma auditoria de rotina. Em carta enviada a esta coluna, a asses- soria informa que o presidente do TCDF, conselheiro Manoel de Andrade, encaminhou o caso à Corregedoria para ser apurado. “Agir acima das atribuições e tratar servidores ou pessoas com humilhação e arrogância não é conduta aceitável no TCDF”, diz a correspondência. No início da noite de ontem, o presidente da Associação dos Analistas de Finanças e Controle Externo do TCDF (Afinco), Hugo Alexandre Galindo, distribuiu nota (ver a íntegra na Cartas dos leitores, página 2) dizendo que as acusações são levianas. Explica que os analistas foram enviados à Codeplan por determinação da presidência do TCDF para um procedimento fiscalizatório e vem agindo em perfeita “harmonia com os princípios do direito e as técnicas de auditoria, dentre as quais se incluem a solicitação de documentos públicos e entrevistas a servidores e gestores vinculados ao órgão fiscalizados”. Na verdade, o assunto parece que se resume mais ao possível comportamento de algum analista, que pode ter exagerado e tentou dar uma de “autoridade”. (Publicada em 10.06.2005 - fls. 106, 153 e 155).

De pronto, constata-se que nenhuma das duas menciona o nome dos

autores, de modo que não haveria como identificá-los. De mais a mais, não pro- varam a alegação de que várias pessoas - amigos, familiares, conhecidos - sabiam que a notícia se referia a eles.

Além disso, evidente o zelo do jornalista ao se utilizar de expressões a

entoar tratar-se de suspeitas, de fato noticiado, vulgarmente dito por “denuncia- do”, a ser investigado. Repiso os termos da reportagem: “estariam indo muito além de suas atribuições legais [...]”; “o assunto parece que se resume mais ao possível comportamento de algum analista, que pode ter exagerado e tentou dar uma de ‘autoridade’.” (g.n.).

Aliás, destaca na segunda reportagem, registro, publicada no dia seguinte a da primeira, que “a Corregedoria do Tribunal de Contas do Distrito Federal vai apurar as denúncias feitas por servidores da Codeplan de que estariam sendo vítimas da arrogância e humilhação por parte de dois analistas, que foram deslocados para a estatal para proceder uma auditoria de rotina.” (g.n.).

Denota-se, portanto, que não se tratava de mero boato negligentemente divulgado em jornal de grande circulação, mas de fato incerto, levado a conheci- mento das autoridades para a devida apuração.

Impende ponderar, também, que foram apresentadas ao público as

duas versões, pois se, em um primeiro momento, noticia a ocorrência de possível abuso de autoridade, em segundo, transcreve defesa apresentada pelo presidente da Associação dos Analistas de Finanças e Controle Externo do TCDF (Afinco), Hugo Alexandre Galindo, tendo inclusive publicado a íntegra da nota na sessão “Cartas dos leitores” (fl. 100).

Não se olvide, ademais, que o fato de essas acusações, levada ao conhe- cimento do público pelos réus, não mais subsistirem, não altera a circunstância pretérita, quando recaía aos autores, ou melhor, à dois analistas de finanças e controle externo do Tribunal de Contas do Distrito Federal quaisquer, as referidas suspeitas.

Nesse sentido, decidiu recentemente o Superior Tribunal de Justiça. Confira-se:

Direito civil. Imprensa televisiva. Responsabilidade civil. Ne- cessidade de demonstrar a falsidade da notícia ou inexistência de interesse público. Ausência de culpa. Liberdade de imprensa exercida de modo regular, sem abusos ou excessos. [...] - A suspeita que recaía sobre o recorrido, por mais dolorosa que lhe seja, de fato, existia e era, à época, fidedigna. Se hoje já não pesam sobre o recorrido essas suspeitas, isso não faz com que o passado se altere. Pensar de modo contrário seria impor indenização a todo veículo de imprensa que divulgue investigação ou ação penal que, ao final, se mostre improce- dente. Recurso especial provido. (Recurso Especial nº 984.803 - ES, Relatora: Ministra Nancy Andrighi. Disponível em https://ww2.stj.jus. br/websecstj/cgi/revista/REJ.cgi/COL?seq=5380102&formato=PDF. Acesso em 17.06.2009).

Acresça-se a isso a plena liberdade de informação jornalística, garantida pela Constituição Federal em seus artigos 220 e seguintes, e sua importância para a Democracia, sobretudo, quando a questão envolve atuação de agentes públicos.

A respeito dessa autonomia da impressa e de sua missão diplomática, ao transmitir e divulgar as práticas públicas aos reais titulares do Poder, leia-se, os cidadãos, destacou o eminente ministro-relator da ADPF nº 130:4

“[...] como verdadeira irmã siamesa da democracia, a imprensa passa a desfrutar de uma liberdade de atuação ainda maior que 4 ADPF nº 130, voto do ministro Carlos Ayres Britto. Op. Cit.. Acesso em: 17.06.2009.

a liberdade de pensamento e de expressão dos indivíduos em si mesmos considerados. Até porque essas duas categorias de liberdade individual também serão tanto mais intensamente usufruídas quanto veiculadas pela imprensa mesma (ganha-se costas largas ou visibilidade - é fato -, se as liberdades de pensamento e de expressão em geral são usufruídas como o próprio exercício da profissão ou do pendor jorna- lístico, ou quando vêm a lume por veículo de comunicação social). O que faz de todo o capítulo constitucional sobre a comunicação social um melhorado prolongamento dos preceitos fundamentais da liber- dade de manifestação do pensamento e de expressão em sentido lato. Comunicando-se, então, a todo o segmento normativo prolongador a natureza jurídica do segmento prolongado; que é a natureza de “DI- REITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS”, tal como se lê no título de nº II da nossa Constituição.” [g.n.]

No mesmo sentido, o nobre ministro Menezes Direito:5

“Não existe lugar para sacrificar a liberdade de expressão no plano das instituições que regem a vida das sociedades democráticas [...] Quan- do se tem um conflito possível entre a liberdade e sua restrição deve-se defender a liberdade. O preço do silêncio para a saúde institucional dos povos é muito mais alto do que o preço da livre circulação das ideias”. [g.n.]

E não foi outra senão esta a ideia encampada pelo Ministro Celso de Mello, ao frisar a abrangência dos direitos de informação e crítica, consoante notícia veiculada na página virtual do Supremo Tribunal Federal nos seguintes termos:6

Informar e buscar informação, opinar e criticar são direitos que se encontram incorporados ao sistema constitucional em vigor no Brasil, salientou Celso de Mello. Nesse sentido, prosseguiu o ministro, as crí- ticas dos meios de comunicação social dirigidas às autoridades - citou como exemplo -, por mais dura que sejam, não podem sofrer limitações arbitrárias. Essas críticas, quando emitidas com base no interesse público, não se traduzem em abuso de liberdade de expressão, e 5 Portal do STF. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.

asp?idConteudo=107402. Acesso em 18.06.2009.

dessa forma não devem ser suscetíveis de punição. Essa liberdade é, na verdade, um dos pilares da democracia brasileira, asseverou o decano. [g.n.]

De fato, como salientou o eminente Ministro Carlos Ayres Britto, o direito de conhecer e acompanhar a atuação dos Poderes, que a imprensa livre favorece, é próprio da cidadania, na medida em viabiliza um “heterodoxo e eficaz controle externo”, ao possibilitar que não apenas os operadores do direito, mas toda a população tome nota de quando, quanto e como trabalham os servidores públicos, que são, na verdade, servidores do público.7

É nessa esteira de conclusão que deve vigorar o caso em testilha, pois os

Réus, ora apelantes, agiram em estrita observância dos dispositivos constitucionais, que lhes asseguram a livre manifestação do pensamento e da expressão latu sensu, a liberdade da imprensa, o sigilo das fontes, sobretudo, quando envolve atuação de agentes públicos, não havendo se falar em violação da honra, da imagem, ou qualquer ofensa aos autores a ensejar responsabilização civil dos requeridos.

Por conseguinte, fica prejudicada a análise do recurso adesivo, interposto pelos autores, que requeriam o aumento do quantum indenizatório para 20 (vinte) mil reais.

Ante o exposto, DOU PROVIMENTO aos recursos dos Réus, para julgar improcedente o pedido inicial, e JULGO PREJUDICADO o recurso adesivo dos autores, que deverão arcar com as custas processuais e os honorários advocatícios, os quais arbitro em R$ 2.000,00 (dois mil reais).

É o meu voto.

Desa. Maria de Fátima Rafael de Aguiar Ramos (Revisora) - Presentes

os pressupostos de admissibilidade, conheço dos recursos principal e adesivo. Trata-se de ação indenizatória por danos morais proposta por André de

Oliveira Costa e José Vitor Akegawa Pierre contra Carlos Alberto Honorato e

a Gráfica e Editora Jornal de Brasília Ltda., cujo pedido foi julgado procedente para condenar os Réus ao pagamento de R$ 8.000,00 (oito mil reais), para cada um dos autores, corrigida desde a data da sentença de fls. 310/312, acrescida dos juros de mora, a contar da data da publicação da notícia, em 09/06/2005.

Os Réus foram condenados, ainda, a publicarem o inteiro teor da sentença no primeiro jornal a ser veiculado após o trânsito em julgado, no caderno ‘Cidades’, com o mesmo destaque da notícia objeto da presente lide, sob pena de incidirem na multa diária de R$ 300,00 (trezentos reais).

Apelaram da sentença os réus Carlos Alberto Honorato e a Gráfica e Editora Jornal de Brasília Ltda., bem como os autores André de Oliveira Costa e outro, na forma adesiva.

Da apelação dos réus

A ação de indenização por danos morais foi proposta em decorrência das reportagens “Humilhação e Arrogância” e “Corregedoria Investiga Abuso de Analistas”, publicadas em 09.06.2005 e 10.06.2005, respectivamente.

Na apelação de fls. 316/324, Carlos Alberto Honorato sustenta que agiu com animus narrandi e não declinou o nome dos Autores. Diz que utilizou da técnica da incerteza, a fim de demonstrar se tratar de suspeitas, pois o fato denunciado estaria sendo investigado. Alega, por último, que estaria acobertado pela excludente de ilicitude do artigo 27, inciso VI, da Lei de Imprensa, a Lei n.º 5.250/67.

Pede a improcedência dos pedidos ou a redução do valor da condenação para R$ 500,00 (quinhentos reais), afastando-se a determinação de publicação do interior teor da sentença no Jornal de Brasília.

Por sua vez, a Gráfica e Editora Jornal de Brasília Ltda., às fls. 326/361, pede a reforma da sentença ou a redução do valor da condenação. Em abono de sua defesa, traz à colação os mesmos argumentos contidos na contestação e na apelação do seu litisconsorte passivo.

A Constituição Federal garante o direito à inviolabilidade da intimi- dade, vida privada, à honra e a imagem das pessoas, sancionando a lesão a tal patrimônio espiritual com o direito de indenização pelo dano moral ou material respectivo.

Além da garantida à livre manifestação de pensamento, toda a cole- tividade tem o direito de ser informada dos acontecimentos verídicos, o que de fato ocorreu na espécie analisada, onde não restou demonstrada abusividade nas matérias combatidas, nem qualquer ato ilícito, nos termos dos artigos 186 e 187 do Código Civil.

Depreende-se das matérias o propósito de narrar fatos levados ao co- nhecimento do colunista, sem o ânimo de caluniar, difamar ou injuriar os autores, exercendo de forma legítima o seu direito de manifestação do pensamento e de expressão.

Note-se que as reportagens não indicam os nomes dos Autores, fazendo referência, apenas, aos cargos por eles ocupados.

As expressões utilizadas pelo jornalista são condizentes com a vontade de narrar, eis que não atribui aos sujeitos da reportagem juízo de valor ou críticas pessoais de qualquer natureza.

Logo, não há o direito de resposta e o dever de indenizar os alegados danos morais.

Do recurso dos autores

No recurso adesivo de fls. 378/382, pleiteiam os Autores a elevação do valor da indenização para R$ 20.000,00 (vinte mil reais).

Dou por prejudicada a análise do recurso adesivo, tendo em conta o posicionamento pela improcedência do pedido.

Assim, DOU PROVIMENTO aos recursos dos Réus e JULGO PREJU- DICADO o recurso adesivo dos Autores, impondo-lhes o pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, arbitrados em R$ 2.000,00 (dois mil reais).

É o meu voto.

Des. Natanael Caetano (Vogal) - Com o Relator. DECISÃO

Conhecer, julgar prejudicado o recurso adesivo e dar provimento ao recurso principal, unânime.

No documento 179rdj090 (páginas 169-177)