• Nenhum resultado encontrado

29Apercebendo-se da perda do território específico, sobre a concepção da natureza,

PARTE I | Do Significado da Arcádia

29Apercebendo-se da perda do território específico, sobre a concepção da natureza,

próprio das operações artísticas, Dufourny contrapõem uma aproximação por sínteses capaz de representar a natureza na sua totalidade através de uma linguagem que se exprime com a metáfora e a alegoria.

No contexto de uma visão oposta, os desenhos das paisagens projetadas por Le Corbusier (1887-1965) revelam uma conceptualização de espaço global contínuo. Na medida em que o universo não-natural da precisão tecnológica tende a subjugar integralmente a natureza num processo contínuo e coenvolvente de transformação, Le Corbusier afirma a totalidade da estrutura antropogeográfica. Entre 1929 e 1931, com os planos de Montevideu, para Buenos Aires, São Paulo, Rio de Janeiro e com a experiencia final do Plano Obus para Argel [Fig. 11], Corbusier, contrariamente às realizações de

Ernest May (1886-1970) ou Gropius (1883-1969), quebra a sequência

arquitetura/bairro/cidade. Deste modo a estrutura urbana, enquanto unidade física e funcional, é depositária de uma nova escala de valores e a dimensão, na qual à que buscar o significado das suas comunicações, é a da própria paisagem, como espaço de intervenção radicalizado e total.64

Em matéria de perceção e compreensão do ambiente, apesar das, aparentemente, radicais alterações no pensamento da ultima metade do nosso século, a questão chave é que grande parte das nossas ideias são herdadas de um corpo de pensamento que data de há três mil anos atrás e que se tem mantido vivo, em formas modificadas, pois ainda serve um prepósito útil. Tais são as ideias que estão na génese dos conceitos de paisagem como a Criação, a Tradição Judaico-Cristã, a Dominação sobre a Natureza, a Natureza- Máquina, a Teologia ou o Empirismo.

Uma das contribuições mais brilhantes da Época das Luzes foi a “formulação” da Estética. Esta concepção surge, no séc. XVIII, nas três principais “nações filosóficas”; em Inglaterra, com Shaftesbury, Addison, Hogarth, Burke, etc.; em França, com Du Bos, Batteux, Diderot, etc.; e na Alemanha, com Baumgarten, Lessing, Kant, Schiller, etc. Cita-se todos estes nomes, sem o devido enquadramento temporal, uma vez que que se optou não aplicar a sua obra diretamente ao tema desta tese. Exprimem, porém, a quantidade de obras que se concentraram no desenvolvimento de uma doutrina estética, que dominou o pensamento desse século e permaneceu ativa durante as épocas seguintes. A ideia estética do espaço natural abarca tanto os jardins como a paisagem, com conceitos renovados como o de Montanha e do Mar. No entanto nunca ensaia

64

30

verdadeiramente a articulação das mutações do conceito com as metamorfoses da visão, manifestadas, por exemplo, na teoria do sublime de Burke ou de Kant. Aqui torna-se dificilmente compreensível esta articulação fora da sua referência específica. É neste campo - na extensão do olhar para o “alto” e para o “amplo” - que a estética se vai manifestar dentro de novas áreas teóricas desconhecidas das centúrias precedentes.

O conceito de paisagem, do séc. XVIII, conquistou não apenas uma consciência cosmética, mas mais cosmológica65. De facto a dualidade País/Paisagem torna-se uma chave constante e subjacente em toda a conceptualização dos espaços pictóricos, escultóricos, literários, etc.. Esta condição, decorrente diretamente do termo, encontra, como já foi exposto atrás, uma correspondência na maioria das línguas ocidentais. Desta dualidade do léxico dos termos País e Paisagem torna-se decorrente um sentido de apropriação do espaço natural, surgindo a necessidade da deteção nas suas formas, de símbolos de identificação.

O Romantismo atribui ao termo Paisagem um significado de supernatureza, um valor cognitivo de plenitude e infinito que a define como uma forma particularizada de idealismo; a interpretação romântica da paisagem toma-se uma busca de fim nunca alcançável.

Durante o séc. XVIII desenvolveram-se os mais duradouros conceitos sobre a paisagem, tais como o de Sublime, entendendo-se como o oposto de Belo, introduzido pelo reverendo William Gilpin (1724-1804) e ilustrado por Edmund Burke66. Para Burke o belo, num cenário natural, era suave, redondo, místico, com relvados verdejantes e pores-de-Sol dourados ou céus prateados, induzindo sentimentos de paz e bem-estar. O sublime era acidentado, terrível, com penhascos e ou avalanches prestes a precipitarem-se em cima do observador.

Pitoresco67 foi o conceito compromisso que William Gilpin “encontrou” na paisagem. Um cenário natural menos ocasional, não muito suave nem muito escarpado

65

ROGER, Alain - Composer Le Paysage, constructions et crises de l'espace (1789 - 1992), Paris: Editions Champ Vallon, 1989, p. 67.

66

BURKE, Edmund - A Philosophical Enquiry into Origin of Our Ideas of the Sublime and the Beautiful, 1 [S.I.]: [s.n.], 1757.

67

Para Rosalind Krauss, o pitoresco parte da experiência da realidade e não do reconhecimento de pinturas de paisagem, já que apenas refere o que, sendo parte da realidade, seria ideal para transformar numa pintura de paisagem. De facto, a parte fundamental desta definição é aquela que exalta a particularidade do “pitoresco” como singular porque é esta singularidade que diferencia a “paisagem real” da “pintura de paisagem”. Para sublinhar esta ideia Krauss assenta a sua tese sobre as opiniões de William Gilpin para quem a pintura de paisagem, sendo um género, não teria nada de singular ao contrário da realidade da natureza. Assim, Krauss considera que para Gilpin a realidade natural que propicia o pitoresco, não tem nada de estático, de permanente ou de genérico, mas que se trata de uma relação entre o sujeito observador e o momento em que este observa a “paisagem”: KRAUSS, Rosalind - "The originality of the avant-

31

Outline

Documentos relacionados