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173qualidade da luz, a cor e a configuração característica das nuvens; o segundo é a relação

PARTE II | Do Reconhecimento da Arcádia

173qualidade da luz, a cor e a configuração característica das nuvens; o segundo é a relação

entre o céu e o território.

O juízo que fazemos dele varia, se o contemplarmos de uma planície, ou de uma configuração da paisagem muito marcada e com vegetação densa. No primeiro caso aparece-nos como um hemisfério perfeito, permanecendo grandioso e omnipresente, estando sereno; e no segundo caso aparece-nos apenas uma pequena porção, provocando a contração do espaço, apresentando-se numa paisagem intima e por vezes “estreita”, de insinuação dinâmica. Pode assim dizer-se que o céu é tão grande como o espaço a partir do qual nós o vemos. Sem dúvida que, todas estas características dependem das condições climáticas, sendo estas, uma espécie de contraponto das propriedades espaciais, onde um céu azul e sem nuvens acentua a imensidão do território e permite uma experiência cósmica da paisagem, no qual o espectador representa o centro.

Independentemente da sua apreensão, o céu está sempre longe e distingue-se pela sua diversidade de situações, enquanto a terra é de facto o cenário para a vida quotidiana, caracterizada por experiências distintas mas, quase sempre, intersubjetivas.

Assim, existe um conjunto de perceções comuns que qualificam a Paisagem. Apesar do significado e da imagem de um Sítio ser uma construção mental diferenciada ao nível individual, a sua imaginabilidade apresenta uma considerável quantidade de vetores consensuais. É dentro deste universo percetivo que, tendo por objetivo a intervenção arquitetónica, se torna possível o reconhecimento de uma paisagem, de forma a permitir a avaliação qualitativa e quantitativa deste espaço natural.

A metodologia desta abordagem resulta da dissecação das suas componentes principais - os descritores - (mais significativos e reconhecíveis pelo conjunto de perceções comuns), pertencentes a diversas áreas que apresentam potenciais dados, dentro do universo delimitado desta tese, que se pretende que seja o da Forma e do Carácter da Paisagem.

Uma vez que o protagonista central do reconhecimento da paisagem é o processo interativo da perceção, a sua análise deverá sempre abarcar, tanto os fenómenos que compõem o espaço, como as capacidades percetivas, valores e situação dos observadores. Será esta dualidade que constitui um descritor e cujas componentes se poderão individualizar, de acordo com o seu sentido, num conjunto de indicadores paisagísticos, que o informam qualitativa e quantitativamente.

Donde se deve concluir que, sempre que se pretende efetuar uma abordagem desta natureza, dever-se-á identificar claramente qual o seu sentido ou, por outras palavras, o

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Fig. 81, 82 – Serra de Sintra e Mosteiro da Pena, 1855-57, Cristino da Silva. Júpiter e Leda, 1798, Vieira Portuense. que se pretende com esta aproximação. A validade dos indicadores utilizados depende da clareza dos objetivos expostos desde o princípio.

Uma formulação metodológica possível, com fim a descodificar a forma da paisagem, parece apoiar-se na própria condição existencial humana: o espaço entre o céu e a terra representa o meio onde o homem descobre o seu lugar. O registo deste relacionamento fundamental céu/terra (representado estruturalmente pelo horizontal e pelo vertical) pode ser obtido de acordo com uma sintetização que torna este raciocínio operativo. Sendo a análise visual onde este raciocínio nos conduz, esta constitui um instrumento insubstituível na revelação e demonstração da estrutura da paisagem.

A definição de critérios que sustentam o ensaio projetual, dentro de um espaço natural em geral e aos Sítios com cariz arcadizante em particular, dever-se-á apoiar neste instrumento, tanto na identificação de uma estratégia de articulação com a estrutura do lugar, como na deteção de zonas sensíveis aos impactes da intervenção e respetivo grau de sensibilidade.

Ao aplicar esta abordagem, à forma da paisagem, na imagética arcadiana, identificam-se os seus elementos compositivos, o seu relacionamento. Mesmo tratando-se de representações planas consegue-se encontrar os seus limites visuais, obstáculos às vistas e pontos de vistas potenciais. A escolha pela localização do observador não é, porém, uma opção, apesar da sua matriz de penetrabilidade permitir o percorrer da paisagem através de linhas preferenciais, o ponto de observação é definido pelo autor, como tal, é fixo e exterior ao espaço que reproduz.

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Fig. 83 – Análise Visual da Paisagem: desenho do autor a partir de Enterro de Fócion (1648) de Nicolas Poussin.

A análise visual é ensaiada em três telas de forte referente da Arcádia: Enterro de

Fócion (1648) de Nicolas Poussin [Fig. 74] e Serra de Sintra e Mosteiro da Pena (1855-

57) de Cristino da Silva [Fig. 81], duas paisagens, separadas por dois séculos, onde o carácter do Sítio é essencialmente dado pela articulação da intervenção arquitetónica.

Júpiter e Leda, 1798 de Vieira Portuense [Fig. 82] é o terceiro exemplo, ligação entre a

tradição classicista e a anunciação de uma densidade compositiva que não se revelaria prolixa no nosso território. Este conjunto de pinturas, com especial enfoque para a especificidade nacional, é analisado nas Figuras 83, 84 e 85.

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A importância da análise visual da paisagem, entendida de um modo inclusivo, que, no fim de contas, engloba a perceção háptica ou táctil, revela-se fundamental na intervenção arquitetónica ao nível dos espaços naturais, bem como ao nível urbano. Os significados expressos pelas suas ambiências são construídos pelas populações, que os ocupam, tendo por base os elementos físicos seus componentes, uma vez que, na sua génese, todo o assentamento é preponderantemente decorrente da morfologia das invariantes da paisagem, apresentando, mesmo, alguns aglomerados construídos, numa estreita relação entre o seu modo de crescimento e a forma da paisagem.

2.6.1 Elementos de Composição

Podem destacar-se vários tipos de elementos delimitadores da paisagem, de acordo com a natureza da abordagem e, portanto, com o modo de observação:

• Áreas de Morfologia Homogénea: zonas, identificáveis (em termos de mancha) cartograficamente, possuidoras de uma relação morfologia do terreno / cobertura vegetal padronizável. Estas unidades morfológicas são identificadas, não tanto, pelas semelhanças formais mas pela continuidade de um sistema.

• Espaços de Unidade Visual: zonas (normalmente vales, planaltos ou encostas) limitadas, ou parcialmente limitadas, por elementos físicos tais como linhas de cumeada, montes, maciços rochosos pontuais ou conjuntos de árvores em cotas elevadas. Estes espaços de unidade visual caracterizam-se por possuir duas características específicas que advêm da sua morfologia. Do interior deste espaço as vistas centrífugas não ultrapassam os seus limites, de pontos elevados pertencentes aos seus limites físicos as vistas tendem a ser centrípetas. Dois intervenientes constantes do espaço de unidade visual são os subespaços visuais e os limites físicos.

• Subespaços Visuais: zonas incluídas nos espaços de unidade visual (habitualmente encostas) limitadas visualmente apresentando na sua maioria enfiamentos visuais, centrípetos em relação ao espaço onde se englobam.

• Limites Físicos: linhas para além das quais, quem se situe no espaço de unidade visual, não consegue vislumbrar mais paisagem. São fronteiras entre duas partes; interrupções lineares na continuidade, cristas montanhosas, frentes das orlas florestais, encostas altas e falésias; funcionam, no fundo, mais como referências

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