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O passado passou, e só o presente é real, mas a atualidade do espaço tem isto de singular: ela é formada de momentos foram, estando

2. AS HERANÇAS DO PDI-1971 ATÉ 2007 DO PRIMEIRO AO TERCEIRO PLANO DIRETOR

Os Planos Diretores construídos e implantados no Brasil nas décadas de 1960 e 1970, em sua maioria financiada pelo Serviço Federal de Habitação e Urbanismo (SERFHAU), que vinculava o repasse de recursos, eram vistos como instrumentos tecnocráticos, desprendidos da participação popular e muitas vezes tidos como portadores de propostas irrealizáveis, e ineficazes, “permaneceram nas gavetas dos planejadores”, [em sua grande maioria] (CYMBALISTA; SANTORO, 2009, p. 5).

Estes Planos Diretores Integrados implantados no Brasil na década de 1970 se configuravam como uma resposta às propostas militares para o desenvolvimento nacional as quais deveriam ser injetadas em todas as esferas: nacional, regional ou local, as quais se configurariam como importante instrumento para mitigar os problemas que o país enfrentava naquele momento. (BUENO; SANT’ANA; FAVA, 2010).

Aproximadamente quatro décadas após a inserção dos planos de desenvolvimento integrado no cenário nacional, não se pode ignorar que eles caracterizam um importante instrumento de planejamento urbano. Ferreira (2007) preconiza a ideia de que tais planos diretores ainda merecem ser mais estudados. Acredita-se que não se pode considera-los obsoletos a partir apenas de uma leitura excessivamente superficial e simplificada.

Assim, ainda que apenas na profundidade necessária para uma compreensão linear de seus resultados a serem aplicados neste trabalho, pretende-se, através da leitura do PDI-1971 de Votuporanga, já realizada no Capítulo 1 concatena-lo com os anos 200026, e observar que o instrumento analisado, ainda que gerado no berço da tecnocracia que o período militar exigia, possibilitou heranças que contribuíram positivamente para reprodução do espaço urbano do município. Os demais Planos de Votuporanga, aprovados respectivamente em 1996 e 2007, também serão estudados neste capítulo, e analisados buscando-se uma compreensão da trajetória, processos, condicionantes e agentes que motivam suas formulações e aplicação.

Adota-se como princípio norteador para elaboração, desenvolvimento e formulação das questões do segundo capítulo deste trabalho o princípio da hermenêutica das leis orgânicas do município de Votuporanga. (LEPETIT, 2001).

No caso de Votuporanga, apesar de um diagnóstico aparentemente nivelador, e feito a distância, as diretrizes do PDI-1971 são perceptíveis e reproduzidas, na atual configuração do município. Isso não significa dizer aqui que o Plano foi um exímio exemplo de propostas atendidas, mesmo porque ele mantinha certa clareza em relação entre suas propostas e a possibilidade de suas

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implantações e implementações, especialmente naquilo que se direcionava às questões físico- territorial do município: “O estabelecimento de uma política de desenvolvimento físico territorial para o município de Votuporanga dentro do seu Plano de Desenvolvimento Local Integrado não significa, nem de pretender, a fixação de um Programa rígido de empreendimentos e objetivos.”(VOTUPORANGA, 1971, v. 3, p. 1).

A partir destas questões e do legado deixado pelo PDI-1971, o capítulo 2 remonta o processo de elaboração e aplicação dos planos de diretores de Votuporanga de 1996 e 2007, respectivamente lei nº 2830/1996 e Lei nº 106/2007 sendo as análises encerradas em 2012, quando é aprovado anexo VIII Alteração 26/10/2012- Lei 106/2007 e Lei Complementar nº 216/2012 denominado de ‘Mapa das ZEIS’, procurando apontar como as heranças deixadas pelo primeiro Plano-PDI-1971, contribuíram para a atual configuração espacial, física econômica e social do município. São aportes para este trabalho as análises presentes em alguns intelectuais e teóricos como: Feldman (2005a, 2005b, 2010), Santos (1965, 1993, 2012) Villaça (1978, 1999, 2001, 2005); e para o caso de Votuporanga, as análises baseiam-se em Sant’Ana (2007), Rodrigues (2004, 2006a e 2006b), [...], e, sobretudo, nos Planos de Votuporanga: PDI-1971, PDM-1996 e PDP-2007.

2.1 Das fichas cadastrais, os Boletins de inscrição cadastral e o Cadastro Técnico

Multifinalitário

Quando se dá a fundação do município, aproximadamente após nove anos, tem início um cadastramento municipal feito através de fichas para futuros lançamentos. Estas fichas continham os dados do imóvel, bem como os dados do proprietário deste. Ela era grafada com o emblema do município e ainda retratava os dados como número da quadra, número do lote e nome do ‘bairro’, naquele momento apenas se tinha o Patrimônio Velho. Com isso passou-se a fazer o lançamento de tributos sobre o imóvel ocupado. Segundo entrevistado 2 “no ano de 1946 é quando se identifica os primeiros registros dos imóveis do então Patrimônio urbano de Votuporanga”. (Entrevistado 2 em entrevista concedida à autora em 09/06/2014).

Uma alínea desta ficha era reservada para inserção de dados como a testada do lote, metragem quadrada do terreno e da edificação, o número do imóvel. A partir destes dados, tinha um agente do poder público municipal denominado “lançador”, que fazia o cálculo para o lançamento futuro dos impostos, onde inclusive o valor do IPTU deste imóvel seria anexo nesta ficha.

Ainda conforme o entrevistado 2, posteriormente esta ficha foi substituída por uma espécie de “bloco de anotações” (12,00 x 25,00 cm) cujo lançamento passou a ser feito não mais por imóvel, mas sim por rua, à época denominada “logradouro”. Todos os imóveis implantados neste logradouro eram cadastrados numa ficha que seria anexada para formar o bloco de anotações. Neste tipo de

processamento havia inclusive um espaço na ficha para fazer a implantação do imóvel, tudo num processo manualmente estabelecido.

Segundo o entrevistado 2, está ficha perdurou até 1970, pois quando foi aprovado o primeiro Plano Diretor em 1971, e estas fichas foram substituídas pelo BIC - Boletim de Inscrição Cadastral e pelas FCIs - (Ficha de Inscrição Cadastral). A partir daí o cadastramento já não era mais feito por logradouro, mas por quadra. A cidade foi dividida em quadrantes e o número de fichas passou a corresponder ao número de lotes. “A partir daí o cadastro passou a ser efetivamente implantado e a numeração dos imóveis passou a ser em função dos eixos X e Y, do Leste para oeste e do Sul para o norte a numeração nunca pode se repetir. Posteriormente as FCIs continuaram para complementar o sistema cadastral”. (Entrevistado 2 em entrevista concedida à autora em 09/06/2014).

Analisa-se que o PDI-1971, obsoleto ou não, sob vários aspectos deixa heranças de suma importância para a operação e o desenvolvimento da rede urbana municipal (dentre eles o cadastro físico municipal, que já trazia nas suas origens as fichas de inscrição cadastral, manualmente geridas e atualizadas, antes mesmo da aprovação do PDI-1971, como ora dito, e que incluía também o controle sobre a abertura dos logradouros públicos antes mesmo da Lei n. 6.766/79) e facilitava o lançamento do imposto predial e territorial urbano (IPTU). A partir da lei n. 6.766/1979, que regulamenta os parcelamentos do solo nos municípios brasileiros e com isso, Votuporanga também passa a parcelar seu solo com bases firmadas nesta legislação evitando a formação de loteamentos irregulares e clandestinos.

Assim, a partir de 1971, com a aprovação do PDI, o sistema cadastral passou a vigorar. O seu Capítulo 3 - Do Sistema de Referencia Cadastral, Art. 15, assim se mostra: “Para identificação dos elementos componentes da configuração física do município de Votuporanga, fica instituído um sistema cartesiano de coordenadas ortogonais. §3º Em decorrência do sistema cartesiano [...] o município de Votuporanga fica dividido em quadrantes, identificados por sua orientação e denominados respectivamente NE, SE, SO e NO”. (VOTUPORANGA, 1971, v.4, p. 6).

O sistema de referência cadastral de Votuporanga tem por finalidade (Artigo 16), a identificação precisa dos elementos componentes de sua configuração física e orientar a representação precisa dos equipamentos das estruturas urbana e rural. (VOTUPORANGA, 1971, v.4, p. 6).

Trata-se de um sistema de cadastramento apoiado pelo eixo de duas coordenadas onde são traçados paralelas equidistantes de 2 mil metros, constituindo-se as quadriculas. Na mesma forma, porem distante de 500 metros traçam-se os setores, e estes são constituídos por quadras, que por sua vez são constituídas pelos lotes. Por exemplo, um imóvel identificado com o cadastro: NO 20.30.40.50, está inserido no quadrante NO, da quadricula 20, do setor 30, da quadra 40 e lote número 50.

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