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Objectivo 4. Avaliar a associação entre a relação mãe-bebé e a vivência do corpo

4.6. INSTRUMENTOS DE AVALIAÇÃO

4.6.5. AVALIAÇÃO DA VINCULAÇÃO

Na operacionalização das variáveis a explorar na compreensão da relação com o bebé e da experiência corporal na gravidez, considerou-se pertinente introduzir ainda a avaliação da qualidade da vinculação da grávida, na medida em que é reconhecido o seu papel na forma como o sujeito psicológico se relaciona com o self e com o outro (com o objecto de vinculação, que será neste caso, o bebé). Esta dimensão não se sobrepõe à avaliação da relação com a mãe já abordada (QAG), na medida em que se centra menos na avaliação dessa relação propriamente dita, e mais na avaliação das estruturas de vinculação / nos modelos internos de si e do outro. Ainda que se reconheça a importância daquela relação para a qualidade desses modelos internos, estes constituem uma reconstrução pessoal que foi sendo reformulada e actualizada ao longo de todo o desenvolvimento nas diferentes relações significativas estabelecidas. Por outro lado, a avaliação da qualidade da vinculação também foi considerada pertinente pelo reconhecimento de que é nos momentos de crise (como a gravidez) que estes modelos internos são mais importantes, definindo formas de lidar com as emoções e com as necessidades emocionais de apoio decorrentes, em que se destacam as expectativas associadas à disponibilidade das figuras de vinculação e a percepção de ser ou não merecedor dessa disponibilidade. Esta avaliação da qualidade da vinculação focalizou não só a relação com a própria mãe, mas também a relação com o próprio pai. Apesar da grande tradição na psicologia associada à valorização da relação com a mãe na qualidade do desenvolvimento psicossocial do indivíduo, há cada vez mais evidências da importância de que a relação paterna também se reveste, por exemplo ao nível da qualidade da relação com o próprio corpo em termos de imagem corporal (Barbosa & Costa, in press). Além disso, e tendo em conta a tradicional ênfase na reconstrução da relação com a própria mãe como inerente à transição para a maternidade durante a gravidez, em que essa relação estaria em processo de actualização, a exploração da vinculação em relação ao pai permitiria eventualmente uma avaliação mais "estável" e mais fidedigna das estruturas de vinculação da grávida. Portanto, entendeu-se que a avaliação da vinculação ao pai e à mãe seria pertinente neste estudo.

Na selecção do instrumento de avaliação desta dimensão alguns aspectos foram valorizados. A avaliação da vinculação adulta que se desenvolveu privilegiando a

utilização de entrevistas (Adult Attachment Interview, George, Kaplan & Main, 1985; Family Attachment Interview, Bartholomew & Horowitz, 1991), tem evoluído também no sentido da construção de questionários de auto-relato que, para além das vantagens óbvias em termos da sua utilização no presente trabalho (quer em relação ao número de participantes envolvidos, quer em relação às condições de recolha de dados disponíveis), tem também evidenciado resultados prometedores em termos da sua validade e fidelidade. Assim, incluímos o Questionário da Vinculação à Mãe e ao Pai (QVPM, Matos, Almeida & Costa, 1998) no nosso estudo, o que constitui uma mais- valia na compreensão das dimensões em análise. Apesar de o QVPM ter sido construído para uma população de adolescentes, a sua utilização tem-se estendido aos jovens-adultos e a casais adultos, com igual robustez.

Questionário da Vinculação ao Pai e à Mãe III (QVPM)

Descrição do objecto de avaliação e das subescalas: O QVPM (Matos, Almeida &

Costa, 1997) é um questionário de auto-avaliação construído para avaliar as percepções relativamente às relações de vinculação actuais, num conjunto de 30 itens, distribuídos equitativamente em três dimensões, denominadas: Inibição da exploração

e da individualidade (IEI,"Os meus pais estão sempre a interferir em assuntos que só

têm a ver comigo"), Qualidade do Laço Emocional (QLE, "Sei que posso contar com os meus pais sempre que precisar deles"), e Ansiedade de separação e dependência (ASD, "Não sou capaz de enfrentar situações difíceis sem o apoio dos meus pais"). Com base nestas dimensões, é possível classificar os indivíduos quanto ao seu estilo de vinculação em seguro, preocupado, amedrontado e desinvestido. A estrutura factorial é comum ao pai e à mãe.

Escala de resposta e cotação dos itens: É pedido aos sujeitos que se posicionem

numa escala likert de seis pontos, de acordo com os seus sentimentos e pensamentos sobre a relação com cada progenitor, desde o "discordo totalmente" (1) até ao "concordo totalmente" (6), em que a valores mais elevados de qualidade do laço emocional e mais reduzidos de ansiedade de separação e dependência e de inibição da exploração e individualidade.

Estudos da consistência interna: Os diferentes estudos que têm utilizado este

instrumento confirmam a invariância estrutural do questionário, replicando a estrutura em três factores, quer com recurso a análises factoriais exploratórias (Barbosa, 2001; Silva & Costa, 2000; Barbosa, 2002; Galvão, no prelo; Moura & Matos, em preparação, cits por Matos & Costa, 2004), quer a análises factoriais confirmatórias (Oliveira & Costa, 2000; Bastos & Costa, 2004; Matos et ai, 1998). Da mesma forma, é possível verificar que, os valores da consistência interna são muito satisfatórios em diferentes estudos (Barbosa, 2001; Silva & Costa, 2000; Barbosa, 2002; Galvão, no prelo; Moura & Matos, em preparação; Oliveira & Costa, 2000; Bastos & Costa, 2004; Matos et ai, 1998, cits por Matos & Costa, 2004).

Estudos da Validade

Validade de constructo: Tem sido estudada pela exploração da relação entre os

resultados obtidos pelo QVPM e outras medidas independentes como o Inventory of

Parent and Peer Attachment de Armsden e Greenberg (1987), o Parental Separation Inventory de Hoffman (1984) e o Self-Description Questionnaire III de Marsh e

colaboradores (1983), verificando-se que as associações encontradas vão ao encontro das previstas, ie, a avaliação do QVPM é consistente com os factores e os indicadores associados à qualidade do desenvolvimento psicossocial dos indivíduos avaliados (Matos et ai, 1998).

Validade Concorrente: A validade deste questionário foi ainda testada ainda por

comparação com as classificações da vinculação atribuídas mediante a Family

Attachment Interview (Bartholomew & Horowitz, 1991) que levou os autores a

concluírem que, apesar das diferenças inerentes à avaliação por entrevista ou por auto- relato que inevitavelmente se reportam a aspectos diferentes dos constructos psicológicos em análise, é possível validar a avaliação das dimensões da vinculação pelo QVPM (Matos, 2002).

Validade Discriminante: O QVPM mostrou ser capaz de distinguir os sujeitos em

(Bastos,2005) e a experiência emocional do toque em jovens-adultos universitários (Barbosa, 2002) ou a imagem corporal em adolescentes (Barbosa & Costa, in press).

Concluindo, dispomos de dados muito animadores relativos à capacidade do QVPM

avaliar aquilo a que se propõe. No entanto, o instrumento foi desenvolvido para uma amostra de adolescentes, e é com esta população que tem sido mais usado (Matos, Barbosa, Almeida & Costa, 1999; Barbosa, 2001; Oliveira & Costa, 2000; Galvão, no

prelo; Moura & Matos, em preparação, cits por Matos & Costa, 2004) ainda que alguns

estudos com jovens-adultos (normalmente universitários) sejam também conhecidos (Barbosa, 2002; Bastos & Costa, 2002, cit por Matos & Costa, 2004), não sendo conhecida, no entanto, a sua utilização com adultos, ou mais especificamente com grávidas. Ora, os adolescentes apresentam naturalmente especificidades na sua relação com os pais, inerentes à etapa do desenvolvimento que atravessam. Aliás, os autores verificam que o instrumento é sensível a diferentes períodos desenvolvimentais, encontrando algumas alterações nas propriedades do questionário entre adolescentes mais novos e mais velhos, nomeadamente na correlação entre as subescalas e na capacidade discriminativa dos itens (Matos & Costa, 2004). Portanto, para a sua utilização no âmbito do presente estudo com grávidas adultas, foi necessário ajustar a formulação de alguns itens (o que foi discutido com as autoras do instrumento no sentido de validar estas alterações), no sentido de os adequar à etapa desenvolvimental em estudo, com a preocupação de não adultar o conteúdo dos itens34.

34 Por exemplo, em vez de "Estou sempre ansioso por chegar a casa.", adaptou-se para "Estou sempre

ansiosa por ir a casa dos meus pais"; ou, em vez de "Se tivesse de ir estudar para longe dos meus pais, sentir-me-ía perdido.", substituíu-se por "Se tivesse de ir morar para longe dos meus pais, sentir-me-ía perdida." Ou ainda, em vez de "Apesar de gostar muito de estar com os meus amigos, é bom regressar a casa.", propõe-se "Apesar de gostar muito de estar com o meu marido/companheiro, é bom ir a casa dos meus pais.".