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INFLUÊNCIA DAS VARIÁVEIS DEMOGRÁFICAS NA VINCULAÇÃO PRENATAL

CAPÍTULO 2. A RELAÇÃO MÃE-BEBÉ NA GRAVIDEZ

2.3. FACTORES E DIFICULDADES DA VINCULAÇÃO PRENATAL

2.3.2. INFLUÊNCIA DAS VARIÁVEIS DEMOGRÁFICAS NA VINCULAÇÃO PRENATAL

Idade

A idade pode ser considerada um marcador de maturidade e desenvolvimento psicossocial (Heinicke, 1995), mas a idade por si só não é uma variável psicológica... e de facto, os estudos realizados não têm encontrado resultados consistentes sobre o efeito desta variável na vinculação prenatal (Laxton-Kane & Slade, 2002).

Num estudo baseado na observação da interacção mãe-bebé após o parto, Ragozin e colaboradores (1982) verificaram que, na sua amostra de mães primíparas, quanto mais velhas fossem, mais interagiam com o bebé de forma positivamente afectuosa, estimulante e sensível.

Pelo contrário, Siddiqui e colaboradores (1999) encontrou uma correlação negativa entre a avaliação da vinculação prenatal e a idade da mãe, à semelhança dos estudos de Lindgren (2001) e de Mercer e colaboradores (1988) bem como Mendonça (2003), avaliando as atitudes face à gravidez e o bebé. Também Berryman e Windridge (1996) num estudo com grupos equivalentes, encontraram valores de vinculação prenatal mais baixos no grupo de grávidas com idade superior a 35 anos, comparando com um grupo de grávidas dos 20-29 anos. Estas diferenças, no entanto, desapareceram no final da

gravidez, pelo que foram atribuídas ao maior risco de gravidez em idades mais avançadas e consequentemente, a uma protecção pessoal de uma possível perda perinatal que, é mais provável no início da gravidez.

E de facto, a maioria dos autores não encontram correlação entre a vinculação prenatal e a idade materna (Mendes, 2002; Reading et ai, 1984; Bloom, 1995; Kemp & Page, 1987; Curry, 1987; Grace, 1989; Lerum & LoBiondo-Wood, 1989; Wayland & Tate, 1993, Zachariah, 1994). Bloom (1995) constata que o padrão de desenvolvimento da vinculação prenatal em grávidas adolescentes é equivalente ao de outros grupos. No entanto, o seu grupo de "adolescentes" era demasiado heterogéneo, incluindo grávidas dos 12 aos 20 anos, que estarão em níveis de desenvolvimento psicológico diferentes. Laxton-Kane e Slade (2002) compararam os valores obtidos no MFAS por Bloom (1995) com adolescentes e por Berryman e Windridge (1996) com grávidas de idade superior a 35 anos, verificando que os valores obtidos pela amostra de Bloom são mais elevados. No entanto, continua a faltar um estudo comparativo das diferentes idades: seria importante comparar directamente, num mesmo estudo e com grupos equivalentes, os valores de vinculação prenatal entre diferentes níveis etários.

Mesmo assim, Laxton-Kane e Slade (2002) concluem que a vinculação prenatal parece desenvolver-se independentemente da idade materna, ainda que as grávidas mais velhas possam apresentar valores mais baixos nas fases iniciais da gravidez.

Além disso, mais do que a idade, poderão ser as circunstâncias psicossociais das grávidas (diferenciadas quanto ao escalão etário) a condicionar a vinculação prenatal, o que é em parte sugerido por Cannella (2005), que, a partir da sua revisão de estudos, conclui que uma das dificuldades de encontrar resultados consistentes quanto a variáveis sociodemográficas como a idade poderá prender-se com a dificuldade de identificar separadamente o efeito de cada uma delas, o que se reflectirá, por exemplo, no estudo da idade ou da primiparidade, que normalmente coexistem, sendo difícil distinguir se os valores mais elevados de vinculação prenatal se atribuem a uma ou a outra variável (Cannella, 2005).

Paridade

Apesar de podermos esperar que a paridade (experiência prévia de gravidez e maternidade) influenciaria a actual experiência de gravidez, os resultados quanto ao efeito desta variável na vinculação prenatal, também não são conclusivos.

Siddiqui e colaboradores (1999) encontraram uma associação negativa entre os valores de vinculação prenatal e o número de filhos. Da mesma forma, também Mendes, utilizando o mesmo instrumento, encontrou um efeito significativo quanto à paridade (2002), à semelhança de Pascoe, Kokotailo e Broekhuizen (1995) ou de Curry (1987), ou como Mercer e colaboradores (1988) que, verificaram que os valores do Maternal

Fetal Attachment Scale diminuíam com o aumento do número de filhos em gravidezes

sem risco, e como Pearce e Ayers (2005) que, encontraram expectativas do bebé mais negativas nas multíparas que nas primíparas. A relação estabelecida por estes autores entre estas expectativas prenatais e a ligação materna ao bebé às 3 semanas após o parto, sustenta a hipótese de uma associação entre a paridade e a qualidade da relação mãe-bebé prolongada ao período após o parto.

No entanto, Cranley (1981) não encontrou qualquer relação entre a vinculação prenatal e a paridade, à semelhança de Muller (1992) e de Phipps (1986). Também Huang, Wang e Chen (2004) não estabeleceram qualquer associação da vinculação prenatal com a paridade na sua amostra de grávidas no 3o trimestre, nem Condon e

Esuvaranathan (1990) comparando a vinculação prenatal entre um grupo de 26 primíparas e um grupo de 26 multíparas no 3o trimestre de gravidez, não encontraram

qualquer diferença, mas é possível que o tamanho reduzido da amostra não tivesse permitido evidenciar diferenças significativas. Aliás, num estudo posterior, Condon e Corkindale (1997) verificam que o score global do MÃES tende a ser mais elevado na 1a gravidez, na subescala da intensidade da vinculação prenatal. No entanto, Berryman

e Windridge (1996), usando uma amostra maior, não encontraram qualquer efeito da paridade na vinculação prenatal.

Assim, Laxton-Kane e Slade (2002), na sua revisão dos estudos sobre a vinculação prenatal, concluem que à luz dos resultados disponíveis, é pouco provável que a paridade tenha um efeito na vinculação prenatal.

Estes resultados poderão confirmar a descrição apresentada anteriormente desta relação como "um laço recorrente" (Newman & Newman, 1988) em que, com cada novo filho, há todo um novo investimento emocional que em nada prejudica a vinculação parental aos filhos pré-existentes. Assim, apesar da experiência de gravidez prévia dever influenciar a experiência actual de gravidez, não é de esperar que a paridade influencie a vinculação prenatal, em que a gestação de um novo filho terá todo um investimento emocional novo, sem prejuízo para filhos anteriores, nem a existência de

outros filhos, diminuindo o novo laço parental.

Nível sociocultural

Em relação à influência do nível sociocultural na vinculação prenatal, não será de esperar uma relação directa, mas apenas um efeito indirecto, através de uma relação com os recursos sociais e económicos de apoio e com o nível de stress, numa transição que coloca desafios sociais e económicos acrescidos. Mas os dados não são conclusivos. Assim, Siddiqui e colaboradores (1999) identifica uma associação positiva entre os valores do PAI e a educação da mãe (correlação positiva). Mas, Mendes não encontra qualquer relação entre o MFAS e o nível de escolaridade ou o estatuto socioeconómico da mãe (2002) o que é consistente com os dados de outros autores com este instrumento (Cranley, 1981; Reading et ai, 1984; Kemp & Page, 1987; Muller, 1993; Curry, 1987; Lerum & LoBiondo-Wood, 1989; Fuller et ai, 1993; Mercer et ai, 1988), ainda que haja estudos que referem uma correlação inversa entre a vinculação prenatal e o nível de escolaridade materno (Mercer et ai, 1988; Lindgren, 2001). Da mesma forma, a maioria dos estudos não relacionam o nível socioeconómico com a vinculação prenatal (Curry, 1987; Lindgren, 2001; Zachariah, 1994), ainda que Mercer e colaboradores (1988), estudando a vinculação prenatal na gravidez de risco, tenham encontrado, nesse subgrupo, uma correlação inversa com o nível socioeconómico (mas não no grupo de controlo). Considerando as diferenças de raça e/ou etnia, também encontramos, quer estudos que evidenciam diferenças (Wayland & Tate, 1993; Mercer et ai, 1988), como outros que obtém resultados diferentes (Kemp & Page, 1987; Curry, 1987).

Em relação à influência cultural no comportamento materno, Fleming e Corter (1988) explicam que, independentemente dos modelos específicos de caretaking (pois estes autores identificam na nossa espécie inúmeras variações culturais destes modelos), a maioria das mães desenvolvem uma motivação para estar e interagir com o filho que é transversal a diferentes culturas (Fleming & Corter, 1988: 191).

2.3.3. INFLUÊNCIA DAS VARIÁVEIS PSICOSSOCIAIS NA VINCULAÇÃO