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Breves considerações a respeito do direito intertemporal nos recursos

2. LEGISLAÇÃO ORDINÁRIA

2.12. Breves considerações a respeito do direito intertemporal nos recursos

A questão do Direito intertemporal (i.e., da aplicação da lei nova a situações jurídicas existentes ao tempo da sua entrada em vigor) sempre suscitou dificuldades ao intérprete em todas as áreas do Direito e em todos os ordenamentos jurídicos.

A dificuldade não é menor, relativamente ao Direito brasileiro, no Processo Civil – e neste, designadamente, no âmbito dos recursos excepcionais110 –, ganhando ainda mais importância diante da série de

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Súmula nº 728 STF: “É de três dias o prazo para a interposição de recurso extraordinário contra decisão do Tribunal Superior Eleitoral, contado, quando for o caso, a partir da publicação do acórdão, na própria sessão de julgamento, nos termos do art. 12 da Lei 6.055/74, que não foi revogado pela Lei 8.950/94”.

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Tito Costa, Recursos em matéria Eleitoral, p. 136; Raul Armando Mendes, Da Interposição do

Recurso Extraordinário; Joel José Cândido, Direito Eleitoral Brasileiro, p. 231.

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Ag. 129.876-PR, Rel. Min. Celso de Mello; Ag. 135.818-DF, Rel. Min. Celso de Mello, Ag. 135.906-DF, Rel. Min. Celso de Mello, RE. 120.971-DF, Rel. Min. Sepúlveda Pertence; RE 167.787 (AgRg)-RR, Rel. Min. Celso de Mello, RTJ 166/317.

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Segundo o Professor Cândido Rangel Dinamarco, “o direito processual intertemporal tem por objeto, como se vê, a determinação dos momentos de início e fim da vigência da lei processual e também a regência da eficácia da lei velha ou da nova em relação aos processos pendentes e aos já extintos no momento da vigência desta. As normas de direito processual intertemporal têm sua sede na Lei de Introdução ao Código Civil e são normas de superdireito, ou de direito sobre direito (elas são, especificamente, normas de produção jurídica)” (Instituições de direito processual civil, vol. I, p. 95).

modificações que o Código de Processo Civil vem experimentando na última década.111

De uma forma geral, a questão do direito intertemporal no processo civil deve inicialmente ser analisada sob dois prismas distintos. O primeiro diz respeito à aplicação da lei nova aos atos jurídicos processuais levados a efeito sob a égide da lei antiga. E o segundo é o relativo à aplicação da lei nova a situações jurídicas presentes com efeitos para o futuro.

Com relação ao primeiro prisma, a questão parece pacífica na doutrina, principalmente diante da vedação constitucional de a lei nova causar prejuízo à coisa julgada, ao direito adquirido e ao ato jurídico perfeito (art. 5º, XXXVI, CF). Esta tutela constitucional visa, primordialmente, à preservação da segurança jurídica como valor fundamental do Estado de Direito e como bem constitucionalmente assegurado.112 É certo, portanto, que a lei processual nova não poderá, sob pena de infringir diretamente a Constituição Federal e padecer de inconstitucionalidade, irradiar os seus efeitos sobre situações jurídicas que, ao tempo de sua entrada em vigor, já tenham ocorrido, estando, portanto, “perfeitas”. A tais situações são aplicáveis as leis que vigiam ao tempo em que elas se concretizaram. Os atos processuais praticados sob a égide da lei antiga – facta

praeterita – constituem o que parte da doutrina denomina de ato jurídico

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Diferentemente do que ocorreu no Direito Civil (no âmbito do qual, como se sabe, o legislador optou por simplesmente revogar o Código Civil de 1916 e inserir no sistema um novo Código Civil – Lei n.º 10.406/2002), no âmbito do Processo Civil, em vez de simplesmente substituir o Código de Processo Civil de 1973 por um “novo código”, optou-se pela sua reforma pontual nos pontos considerados essenciais. Esta “reforma” do CPC, que teve várias “etapas”, continua sendo levado a cabo pelo legislador pátrio ensejando, conseqüente e freqüentemente, problemas de direito intertemporal.

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processual perfeito,113 produzindo direitos adquiridos processuais.114 Nenhuma lei poderá, por exemplo, restaurar prazos ou promover modificações em situações (jurídicas) processuais já consolidadas, sob pena de violar direito adquirido

processual.115

Já no que se refere ao segundo prisma mencionado anteriormente (isto é, a questão da aplicação da lei nova a situações jurídicas presentes com efeitos para o futuro), a despeito das vicissitudes e das pequenas variações que a aplicação dessa regra pode comportar, existe certa uniformidade no entendimento por parte da doutrina e da jurisprudência pátrias. O entendimento é justamente o de que a lei processual possui aplicação imediata, aplicando-se a processos pendentes, mas para o futuro.

O artigo 1.211 do Código de Processo Civil dispõe o seguinte a este respeito: “art. 1.211. Este código regerá o processo civil em todo o território brasileiro. Ao entrar em vigor, suas disposições aplicar-se-ão desde logo aos processos pendentes”.

Infere-se da norma contida neste artigo que a lei processual aplica-se imediatamente às situações por ela disciplinadas (estas consideradas como sendo as que se materializarem após a entrada em vigor da lei), gerando efeitos,

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Nelson Nery Junior, Princípios fundamentais – teoria geral dos recursos, p. 426. Veja, também, na mesma toada, Nelson Nery Junior (Org.). Código de Processo Civil comentado, comentários ao artigo 1.211, p. 1.253 e ss..

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José Rogério Cruz e Tucci, Lineamentos da nova reforma do CPC, p. 166. 115

assim, após a vacatio legis,116 para o futuro à luz da máxima tempus regit

actum.117

Essas considerações relativas às normas processuais civis em geral merecem certa particularização quando se têm em conta os recursos.

Com efeito, no que se refere aos recursos cíveis, alinham-se duas situações diversas que merecem, por isto, tratamentos distintos: a primeira é justamente a de saber qual a lei aplicável no que se refere ao cabimento do recurso, e a segunda consiste em saber qual lei regulamentará o seu processamento.

Convencionou-se, com certo grau de pacificação, que a vigente no dia em que o julgamento foi proferido – isto é, no dia em que a decisão é tornada

pública porquanto declarado o resultado do julgamento,118 momento que se

adquire o direito ao recurso119 – é a que determina o cabimento do recurso,120 ao passo que a lei que estiver em vigor no dia em que o recurso foi efetivamente interposto regulará o seu processamento.121

116

Ensina o eminente Professor Cândido Rangel Dinamarco que “a lei processual passa a existir como tal, tornando-se portanto vigente, no momento que ela própria indicar (p. ex., no dia da publicação ou tantos dias após esta) ou, à falta dessa indicação, quarenta-e-cinco dias após publicada na imprensa oficial (LICC, art. 1º)” (Instituições de direito processual civil, vol. I, p. 94). 117

José Rogério Cruz e Tucci, Lineamentos da nova reforma do CPC, p. 167. 118

Gleydson Kleber Lopes de Oliveira, Recurso especial, p. 97. 119

Francisco Cavalcanti Pontes de Miranda ensina neste sentido que “os recursos interpostos, segundo a lei anterior, têm de ser respeitados, como se há de respeitar o direito a recorrer, se já nasceu, pois que é um direito adquirido” (Comentários ao Código de Processo Civil, Tomo XVII, comentários ao artigo 1.211, p. 15).

120

Neste sentido, Athos Gusmão Carneiro afirma peremptoriamente que “a lei do recurso é a lei do dia da sentença ou do acórdão” (Os novos embargos infringentes e o direito intertemporal, Revista

de Processo 107, p. 241 e ss., especialmente p. 245).

121

Neste sentido: Nelson Nery Junior, Princípios fundamentais – teoria geral dos recursos, p. 426. Veja, também, na mesma toada: Nelson Nery Junior (Org.). Código de Processo Civil comentado, comentários ao artigo 1.211, p. 1.253 e ss. Contra: Teresa Arruda Alvim Wambier, Anotações a

respeito da Lei n.º 9.756, de 17 de dezembro de 1998, Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis de acordo com a Lei 9.756/98, p. 562, apud Gleydson Kleber Lopes de Oliveira, op. cit., p.