• Nenhum resultado encontrado

Da necessidade ou não de interposição do recurso excepcional contra a decisão final

4. REGIME DA RETENÇÃO DOS RECURSOS EXCEPCIONAIS

4.7. Da necessidade ou não de interposição do recurso excepcional contra a decisão final

Foi dito anteriormente que o § 3º do artigo 542 não seria inconstitucional porque apenas se retardaria a apreciação do recurso para um momento posterior.272 Mas, e se o acórdão final, contra o qual não couber mais recurso ordinário, também não comportar recurso excepcional?

É que nem sempre será cabível o recurso extraordinário ou o recurso especial em face de acórdão que julga a apelação. Se não houver questão constitucional, não caberá recurso extraordinário. E se não houver questão federal, não caberá recurso especial.

A questão, enfim, é saber qual a solução para o caso em que os requisitos de admissibilidade dos recursos excepcionais (que são vários) estão perfeitamente preenchidos com relação ao acórdão que julgou o agravo de instrumento, mas não seja possível preencher tais requisitos, no que tange ao acórdão que julga a apelação.

Nesse ponto, quando se questiona se o recurso excepcional retido poderá ser conhecido independentemente do conhecimento do recurso extraordinário ou especial contra o acórdão que venha a julgar a apelação, há intensa divergência doutrinária.

José Miguel Garcia Medina defende que, se fosse essencial a efetiva interposição do recurso excepcional contra a decisão final, para que fosse

272

apreciado o recurso extraordinário ou especial retido, aí, sim, poderíamos cogitar de inconstitucionalidade. Ressalta o mesmo autor que o artigo 542, § 3º, do CPC menciona que a reiteração deve ocorrer “no prazo para interposição do recurso contra decisão final, ou para as contra-razões”. 273 Não se exige que a reiteração seja simultânea à interposição dos recursos extraordinário ou especial, mas somente que ocorra no prazo para interposição ou para as contra-razões.

Do mesmo pensamento comungam Gilson Delgado Miranda e Patrícia Miranda Pizzol, ao ressaltarem que, em tais casos,

“não poderia a parte prejudicada pelo acórdão proferido no julgamento do recurso interposto contra a decisão interlocutória (ou pela decisão interlocutória proferida pelo tribunal nos processos de competência originária) ter impedido o seu acesso aos Tribunais Superiores, até porque tais recursos estão previstos na Magna Carta, não podendo o legislador infraconstitucional criar empecilhos que o constituinte não criou.”274

No mesmo sentido, Rodolfo de Camargo Mancuso observa que, se a decisão final não comportar recurso extraordinário ou especial, o RE ou o REsp que ficaram retidos devem ser processados.275

Também nessa linha é o ensinamento de Athos Gusmão Carneiro, o qual ressalta, inclusive, que o acórdão da decisão final pode não comportar

273

José Miguel Garcia Medina, Recursos Extraordinário e Especial “Retidos” – aspectos problemáticos da novidade introduzida pela Lei 9.756, de 17.12.1998, Aspectos Polêmicos e

Atuais dos Recursos Cíveis, de acordo com a Lei 9.756/98, p. 365.

274

Algumas considerações sobre os recursos especial e extraordinário – requisitos de admissibilidade e recursos retidos, Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis, p. 195

275

Assim ensina o consagrado autor: “E se, acaso, a decisão final não for de molde a ensejar RE ou REsp, como, por exemplo, se nela não se vislumbrar querela constitucional ou federal adrede prequestionada, lobrigar matéria de fato ou direito local? Parece-nos que, em tais circunstâncias, não pode deixar de ser processado o RE ou o REsp que antes ficaram retidos, e isso para que se assegure a boa lógica na interpretação e a integral eficácia do § 3º do art. 542 do CPC, incluído pela Lei 9.756/98: ali se diz que o recurso retido, para ser efetivamente processado demanda reiteração ‘no prazo para interposição do recurso [principal] contra a decisão final, ou para as contra-razões’, não faria sentido que, vindo a configurar-se a inviabilidade técnica de RE ou REsp contra a decisão final, ficasse por isso ‘trancada’ ou ‘abortada’ a subida do recurso antes retido. A interpretação, como se sabe, deve conduzir ao entendimento que assegure a maior utilidade prática do dispositivo, e não que esvazie ou comprometa seu significado” (Recurso extraordinário

recurso excepcional, se faltarem os requisitos constitucionais para o seu cabimento.276

Em sentido contrário, Nelson Nery Júnior defende que o recurso extraordinário e o recurso especial retidos somente serão apreciados caso seja interposto recurso contra a decisão final e o mesmo seja conhecido.277

No mesmo sentido, Vicente Grecco Filho defende o ponto de vista segundo o qual, interposto o recurso numa das hipóteses previstas no § 3º do artigo 542 do CPC, este deverá somente receber o despacho de retenção e, uma vez retido, somente será processado depois da interposição do respectivo recurso especial ou recurso extraordinário contra decisão definitiva.278

276

Requisitos específicos da admissibilidade do recurso especial, p. 125. 277

Ensina Nelson Nery Junior: “A lei nova (Lei 9756/98) não modificou o cabimento, nem o prazo de interposição do RE ou REsp. Criou nova forma de interposição desses recursos, alterando-lhes o rito procedimental, e instituiu mais dois requisitos de admissibilidade: a) a necessidade de reiteração por ocasião das razões ou contra-razões do RE ou REsp interposto da decisão final; b) necessidade de que o recurso principal seja conhecido para que se aprecie o retido” (Teoria Geral

dos Recurso, p. 497).

278

A esse respeito, argumenta Vicente Grecco Filho: “ao contrário do disposto quanto ao agravo (art. 527, com redação dada pela Lei n. 10.352/2001), o recurso especial ou o recurso extraordinário não terá nenhum processamento imediato. Interposto, deverá somente receber o despacho de retenção com as observações do item anterior quanto a eventual discordância da parte a respeito. Uma vez retido, ele somente será processado depois da interposição do respectivo recurso especial ou extraordinário contra decisão definitiva na seguinte conformidade. Se o recorrente da decisão definitiva é o mesmo do agravo retido, deverá reiterá-lo no mesmo prazo (atendendo à redação legal, poderá sê-lo na própria petição de interposição ou em separado, desde que no prazo), o que provocará o processamento concomitante de ambos, ou seja, será dada vista para contra-razões, e em seguida receberá cada um o despacho do presidente do tribunal recorrido quanto à admissibilidade. Formalmente, o despacho poderá ser um só, mas deverá conter capítulos distintos, sobre a admissibilidade do recurso até então retido e do dirigido contra a decisão definitiva, porque devem ser examinados os pressupostos de ambos separadamente. É certo que o recurso retido, por ter efeito devolutivo, impróprio, imperfeito, dependente do recurso principal, somente será conhecido se este o for, mas a deliberação nesse caso não é da competência do presidente do tribunal; é somente do tribunal ad quem. Em outras palavras, o presidente deve examinar o cabimento dos recursos, em seus requisitos constitucionais e legais, em tese, independentemente da circunstância que decorre da subordinação , que somente será examinada e atuará posteriormente. Há quatro possibilidades, então, a examinar. 1) O presidente entende que ambos são admissíveis. Será então determinada a subida ao Supremo Tribunal Federal ou Superior Tribunal de Justiça. 2) O presidente entende que não é admissível o recurso retido, mas é o principal. Será também determinada a subida dos autos ao Superior Tribunal de Justiça, mas ali somente será examinado o retido se a parte tiver interposto tempestivamente o agravo de despacho denegatório, porque seu conformismo importará em preclusão da decisão de indeferimento. O agravo de despacho denegatório deverá também ser processado (art. 544), e somente após é que subirão os autos. 3) O presidente entende que estão presentes os pressupostos de admissibilidade do retido, nas não estão os do

Vicente Grecco Filho sustenta, inclusive, que, se ocorrer a admissão somente do recurso retido e não do dirigido à decisão final, o interessado deverá interpor, necessariamente, o agravo de instrumento previsto no artigo 544 do Código de Processo Civil, sob pena de ambos os recursos restarem prejudicados, tendo em vista a falta de “vida autônoma” do retido.279

Interessante também o posicionamento de Nelson Luiz Pinto, que entende que se faz necessária a interposição do recurso contra a decisão final, salientando que esta era a vontade dos tribunais superiores – os mentores da modificação promovida pela Lei 9.756/98 – quando instituíram o regime de retenção dos recursos excepcionais. E a partir de tal entendimento, o mencionado autor considera que seria inconstitucional o § 3º do artigo 542 do Código de Processo Civil, com a redação que lhe deu a Lei 9.756/98.280

Nessa discussão, um aspecto relevante a ser examinado diz respeito ao trânsito em julgado da decisão final.

É que se não houver recurso excepcional contra a decisão final ou se este recurso não for admitido pelo tribunal superior, haverá o trânsito em julgado

principal. Isso deverá ser explicitado separadamente. É evidente que o não seguimento do principal impedirá a subida do retido, ainda que em tese admissível. Cabe à parte interpor o agravo de despacho denegatório, e no Superior Tribunal de Justiça a questão será reexaminada. O que se quer alertar é que o presidente não pode inverter a ordem de exame, isto é, desde logo declarar inadmissível o retido porque o principal não é.Tal inversão ocorrerá, sim, mas no Superior tribunal de Justiça, por ocasião do exame do agravo contra o despacho denegatório. 4) O presidente entende que nem o retido nem o principal merecem admissão. Nesse caso, a parte deverá interpor dois agravos do despacho denegatório: ambos serão processados e remetidos ao Superior Tribunal de Justiça. Aqui, também ocorrerá a inversão referida no caso anterior (aliás, ocorrerá sempre): para que o retido seja conhecido, primeiro deverá examinar-se o conhecimento do principal. Parece a história do ovo e da galinha, especialmente no Supremo Tribunal Federal, em que a questão constitucional enquanto requisito de admissibilidade muitas vezes confunde-se com o pedido contido no recurso. Na hipótese de o recorrente da decisão definitiva ser a parte contrária da que recorreu contra a interlocutória, deverá reiterar o recurso retido no prazo da contra-razões. Somente aí, então, será processado, com vista para suas contra-razões à parte contrária, seguindo-se as alternativas acima previstas quanto à admissibilidade de ambos” (Direito

processual civil brasileiro, v. 2, p. 350-352).

279

Questões sobe a Lei 9.756 de 17 de dezembro de 1998, p. 607-608. 280

da decisão final, o que permite sustentar que os recursos extraordinário ou especial retidos tornar-se-iam prejudicados.

Seria a mesma situação que ocorre no caso de apreciação do agravo de instrumento depois de proferida a sentença da qual não foi interposta apelação ou quando desta não se tenha conhecido.

Tendo em vista o princípio da unirrecorribilidade, da mesma decisão não se admite a interposição simultânea de mais de um recurso, ou, em outras palavras, para cada decisão há somente um recurso cabível.

Sendo assim, os recursos extraordinário e especial retidos têm o condão apenas de impugnar a decisão interlocutória, não sendo cabível o entendimento de que se evitaria a formação da coisa julgada da decisão final.281

Do exposto é possível concluir que, quando a decisão final transita em julgado, os recursos excepcionais retidos tornam-se inadmissíveis naquilo que forem incompatíveis com a decisão final.282

Outra questão interessante é a levantada por Cássio Scarpinella Bueno. O consagrado autor aborda a hipótese, não rara no foro, de interposição de recurso especial retido de acórdão que julgou agravo de instrumento, quando a decisão final, por seu conteúdo, dá ensejo tão-somente a recurso extraordinário.

281

Ver Teresa Arruda Alvim Wambier, O novo regime do agravo, p. 357-358. 282

A esse respeito, Gleydson Kleber Lopes de Oliveira sustenta que, “embora a norma não preveja a aptidão de um recurso interposto contra decisão interlocutória evitar, também, a formação da coisa julgada da decisão final, o que por si só seria óbice para o intérprete fazê-lo em virtude da excepcionalidade da solução, vale consignar que , caso fosse dado provimento aos recursos extraordinário e especial retidos, teriam eles a possibilidade de, no que forem incompatíveis, desconstituir uma decisão transita em julgado. Não se defende o caráter absoluto da coisa julgada material. Se a desconstituição da coisa julgada material é uma exceção no ordenamento jurídico vigente, o meio para o citado escopo deve estar previsto ou, pelo menos, decorrer logicamente do direito positivo, o que não se constata na hipótese em discussão. Verifica- se que, se a decisão interlocutória recorrida resolver questão incidente (não tenha conteúdo de sentença), os recursos extraordinário e especial retidos ficam condicionados ao conhecimento do recurso interposto contra a decisão final, em virtude do requisito do interesse em recorrer” (Recurso especial, p. 383).

Cita como exemplo uma ação em que se discuta a inconstitucionalidade da CPMF, na qual a decisão final certamente tratará de questão constitucional, mas a tramitação do processo pode ensejar questões de caráter exclusivamente processual, que desafiariam somente recurso especial. Para esses casos, Cássio Scarpinella Bueno opina no sentido de que “a questão processual venha a ser absorvida pela ‘decisão final’, restando ao interessado discutir, no exemplo figurado, somente a questão constitucional (a constitucionalidade daquela contribuição) interpondo, para tanto, recurso extraordinário a tempo e modo oportunos”.283

Cabe assinalar, ainda, que, obviamente, à parte vencedora na decisão final falta interesse processual na reiteração de eventual recurso excepcional retido. Todavia, poderá reiterar esse recurso nas contra-razões do recurso interposto contra a decisão final. Nesse caso, é interessante observar que esse recurso excepcional retido somente será julgado se o recurso principal interposto pela parte contrária for provido. Do contrário, ou seja, se o recurso interposto pela parte contrária contra a decisão final não for conhecido ou for conhecido e improvido, os recursos retidos tornam-se inadmissíveis por ausência de interesse, visto que a parte que interpôs os recursos retidos permanece vencedora. Portanto, em resumo, os recursos excepcionais retidos interpostos por aquele que, posteriormente, sagrou-se vencedor na decisão final ficam condicionados ao provimento do recurso da parte contrária.284

283

Uma segunda reflexão sobre o novo § 3º do art. 542 do CPC (Lei 9.756, de 17 de dezembor de 1998), Aspectos Polêmicos e Atuais dos Recursos Cíveis, p. 94.

284

4.8. Dos meios para obtenção do processamento imediato do recurso