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Crítica à redação do artigo 542, § 3º, do CPC, dada pela Lei 9.756, de 17.12.1998.

4. REGIME DA RETENÇÃO DOS RECURSOS EXCEPCIONAIS

4.4. Crítica à redação do artigo 542, § 3º, do CPC, dada pela Lei 9.756, de 17.12.1998.

Diz o § 3º do artigo 542 do CPC que

“o recurso extraordinário, ou o recurso especial, quando interpostos contra

decisão interlocutória em processo de conhecimento, cautelar, ou embargos à

execução, ficará retido nos autos e somente será processado se o reiterar a parte, no prazo para interposição do recurso contra decisão final, ou para as contra-razões.” (grifamos)

Se adotada a interpretação literal, chegar-se-á ao entendimento de que é cabível a interposição tanto de recurso especial, quanto de recurso extraordinário contra decisão interlocutória.

235

A Lei 9.756/98 e suas inovações, Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis, p. 544 236

Segundo o autor, “a finalidade da norma que estabeleceu o regime retido dos recursos extraordinário e especial foi a de evitar o acesso imediato destes quando interpostos contra decisão interlocutória proferida em processo de cognição e cautelar, fazendo com que fiquem retidos nos autos, na expectativa de restarem prejudicados com o desenvolver do procedimento, ou serem analisados juntamente com o recurso interposto contra a decisão final, na hipótese de se não tornarem prejudicados” (Recurso especial, p. 367).

Contudo, essa interpretação do texto legal não faria sentido à luz do sistema recursal vigente, dado que as decisões interlocutórias são impugnáveis por intermédio de agravo.

Ademais, as hipóteses de cabimento dos recursos extraordinário e especial encontram-se dispostas na Constituição Federal, artigos 102, inciso III, e 105, inciso III, respectivamente. E em mencionados dispositivos constitucionais nada indica que tais recursos possam destinar-se à impugnação de decisões interlocutórias.

Em outras palavras, os recursos excepcionais são cabíveis contra decisão proferida “em única ou última instância”, sendo um contrasenso imaginar que caberiam diretamente contra decisões interlocutórias.

Poder-se-ia questionar se, em situações excepcionais como a da Lei 9.099/95 (Lei dos Juizados Especiais Cíveis), em que não se prevê o cabimento do recurso de agravo contra decisões interlocutórias, seria o caso de admitir-se o recurso extraordinário.237

Deve-se levar em consideração que, no tocante às decisões emanadas do colegiado recursal do juizado especial cível, cabe recurso extraordinário, embora não caiba o recurso especial.238

237

A esse respeito, Rodolfo de Camargo Mancuso explica que “o recurso extraordinário perdeu, para o recurso especial, a seara do controle de inteireza positiva do direito federal; em compensação, ganhou a possibilidade de ser oponível contra decisão de 1º grau quando esta fosse prolatada em causa de instância única. E com isso se contornou o inconveniente de que, eventualmente, uma afronta à Constituição ficasse sem revisão do STF, como ocorreria se o recurso extraordinário só coubesse de acórdão” (Recurso extraordinário e recurso especial, p. 84). No mesmo sentido, José Carlos Barbosa Moreira observa que “(...) A Carta em vigor nem inclui nem exclui a hipótese, em termos expressos. Todavia, o confronto entre o art. 102, n. III, e o art. 105, n. III, demonstra dado relevante; No segundo dispositivo, atinente ao recurso especial, cuidou-se de deixar claro que recorríveis só podem ser decisões de tribunais. Se a cláusula limitativa não figura no outro texto, conclui-se que , para o recurso extraordinário, não prevalece a limitação” (Comentários ao Código de Processo Civil, v. V, p. 572-573).

238

Nelson Nery Junior, Princípios Fundamentais – Teoria geral dos recursos, p. 210, e Rodolfo de Camargo Mancuso, ob. cit. p. 85.

Porém, no caso das decisões interlocutórias, a doutrina e a jurisprudência têm admitido o recurso de agravo. E mesmo os que não o admitem no procedimento perante os Juizados Especiais Cíveis têm admitido o mandado de segurança contra as decisões interlocutórias.239

Donaldo Armelin, a esse respeito, ressalta, ainda, que, salvo em se tratando de decisão interlocutória, proferida em processo de competência originária dos tribunais, não se admite a interposição de recurso especial ou extraordinário sem que antes seja utilizado o recurso de agravo de instrumento da decisão proferida pelo órgão de primeiro grau de jurisdição, conforme estabelece a própria Constituição, ao referir-se a “causa decidida em única ou última instância” – arts. 102, III, e 105, III.240

Diante de tais aspectos, José Miguel Garcia Medina sustenta que seria melhor que no § 3º do artigo 542 do CPC o legislador, em vez de dizer “interpostos contra decisão interlocutória”, dissesse “interpostos contra acórdão proferido no julgamento do agravo de instrumento”.241

Todavia, a referência expressa aos recursos excepcionais interpostos “contra acórdão proferido no julgamento de agravo de instrumento” também poderia causar alguma dificuldade de interpretação.

Cássio Scarpinella Bueno pondera que, de fato, do ponto de vista estático, não há maiores dificuldades em identificar o que seria uma decisão interlocutória na concepção adotada pelo Código de Processo Civil,

239

V. Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery, Código de Processo Civil Comentado, p. 1687.

240

Apontamentos sobre as alterações ao Código de Processo Civil e à Lei 8.038/90, impostas pela Lei 9.756/98, Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis de acordo com a Lei 9.756/98. 241

Recursos Extraordinário e Especial “Retidos” – aspectos problemáticos da novidade introduzida pela Lei 9.756, de 17.12.1998, Aspectos Polêmicos e Atuais dos Recursos Cíveis, de acordo com

consubstanciada no art. 162, § 2º, daquele diploma, segundo o qual, interlocutória é a decisão que resolve questão incidente sem encerrar o processo. Todavia, o mesmo autor observa que algumas decisões interlocutórias, ao serem revisadas por intermédio de agravo de instrumento , podem levar ao encerramento do processo, tornando-se, substancialmente, uma sentença (CPC, art. 162, § 1º).242

Como já foi visto anteriormente, quando se tratou das hipóteses nas quais se aplica o regime da retenção,243 há casos em que o acórdão que julga o agravo de instrumento extingue o processo.

Tendo em vista essas situações, Nelson Nery Junior conclui que

“andou bem o legislador ao fazer referência, na norma comentada, à expressão decisão interlocutória, em vez de se utilizar do termo agravo de instrumento. Portanto, ainda que se trate de acórdão oriundo de agravo de instrumento, se o conteúdo desse acórdão não for de decisão interlocutória (CPC 162 § 2º), mas de decisão final, de extinção do processo, com ou sem o exame do mérito (CPC 162 § 1º), caberá contra ele RE ou REsp de subida imediata, não se aplicando a obrigatoriedade de retenção prevista no CPC 542 § 3º.”244

Ainda quanto à redação do § 3º do artigo 542 do CPC, Tereza Arruda Alvim Wambier tece a seguinte crítica: “a má redação do dispositivo dá a impressão de que o recurso deveria ser reiterado. Todavia, ao que parece, deve- se, isto sim, reiterar a intenção de que o recurso seja julgado, como ocorre com o agravo retido”.245 Especificamente o tema sobre a reiteração do recurso excepcional será tratado mais adiante.246

242

Uma segunda reflexão sobre o novo § 3º do art. 542 do CPC (Lei 9.756, de 17 de dezembro de 1998), Aspectos Polêmicos e Atuais dos Recursos Cíveis, p. 85.

243

Item 2, retro. 244

Ibidem. 245

Anotações a respeito da Lei 9.756, de 17 de dezembro de 1998, Aspectos polêmicos e atuais

dos recursos cíveis, p. 566.

246

Por fim, convém registrar, ainda, a crítica de Cássio Scarpinella Bueno, que lamenta o fato de o legislador não ter previsto expressamente a exclusão do regime da retenção para os casos que, embora resolvidos por decisões interlocutórias, exijam urgência na sua resolução.247