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1. A SUPREMACIA DA CONSTITUIÇÃO E A JURISDIÇÃO

1.6. Similitudes e dissimilitudes entre o controle abstrato e o concreto

1.6.3. Condições da ação e pressupostos processuais

1.6.3.4. Carência originária e superveniente do direito de ação

Se no momento do ajuizamento da ação faltar uma das suas condições, diz-se que há carência originária do direito de ação. Se no instante do ajuizamento da ação não faltava a condição, mas no curso da ação vem a faltar, afirma- se que há carência superveniente do direito de ação. Quais as conseqüências desses dois fenômenos processuais nos processos subjetivos e objetivos de controle de constitucionalidade?

A carência originária do direito de ação quando ainda persistir a ausência da condição da ação no momento em que se proferir a decisão, tanto nos processos subjetivos, como nos objetivos, importa na extinção do processo sem resolução de mérito. Todavia, a controvérsia surge quando a carência originária do direito de ação só é percebida no curso do processo, após o implemento da condição que faltava à época do ajuizamento da ação. Seria possível o saneamento da carência originária do direito de ação?

Segundo a teoria de LIEBMAN, esse saneamento seria possível, mas

segundo já decidiu o STF (RE 100.397-9, em 27.09.85, Rel. p/ o acórdão Min. OSCAR

CORREA,DJU: 17.03.86, p. 2841), a carência originária não admite convalescimento.

Não há razão aparente que justifique tratamento diverso para os processos objetivos: se se entender que a carência originária não pode convalescer nos processos subjetivos, deve-se, por identidade de razão, admitir que o mesmo se passe nos processos subjetivos, dada a inexistência de especificidade dos processos objetivos capaz de impor tratamento diferenciado.

113 A nova jurisdição constitucional – Legitimidade democrática e instrumentos de realização. 2a ed. Rio

Todavia, o STF, no recente julgamento da ADIn no 3367, sobre a constitucionalidade da EC no 45-2004, no ponto em que instituiu o CNJ, entendeu que a carência originária do direito de ação pode convalescer até o momento da sentença:

“Condição. Interesse processual, ou de agir. Caracterização. Ação direta de inconstitucionalidade. Propositura antes da publicação oficial da Emenda Constitucional nº 45/2004. Publicação superveniente, antes do julgamento da causa. Suficiência. Carência da ação não configurada. Preliminar repelida. Inteligência do art. 267, VI, do CPC. Devendo as condições da ação coexistir à data da sentença, considera-se presente o interesse processual, ou de agir, em ação direta de inconstitucionalidade de Emenda Constitucional que só foi publicada, oficialmente, no curso do processo, mas antes da sentença.”114 (ADIn

3.367. Rel.: Min. PELUSO. DJU: 17.03.06, p. 4.)

No atinente à hipótese de carência superveniente do direito de ação, entende-se que esta, tanto que verificada, enseja a extinção do processo sem resolução do mérito nos processos subjetivos, porquanto a partir do instante em que vem a faltar qualquer das condições da ação, qualquer decisão sobre o mérito da ação seria viciada.

Todavia, nessa hipótese há uma razão justificativa de tratamento diverso para os processos objetivos: o princípio da indisponibilidade da ação objetiva (Lei no 9.868-99, arts. 5o e 16).

Ora bem, se o autor não pode desistir da ação objetiva, prosseguindo o processo até o seu final mesmo contra a vontade do autor, se este é um mero deflagrador do processo abstrato, que se desenvolverá oficiosamente até os seus ulteriores termos, não há por que exigir do autor que mantenha a sua legitimidade ativa ou o seu interesse objetivo até o término da ação.

Assim, a perda, no curso da ação, da representação no Congresso que o partido político detinha à época do ajuizamento da ação direta não acarreta a extinção do processo sem resolução do mérito por carência superveniente do direito de ação (ilegitimidade ativa superveniente), pois é no momento do ajuizamento da ação objetiva que a condição deve existir.

114 O STF admitiu o convalescimento da carência originária do direito de ação na referida ADIn no 3.367

com esteio na instrumentalidade do processo e nos princípios da celeridade e da economia processual, argumentando, basicamente, que seria um formalismo contraproducente extinguir sem resolução de mérito a ADIn já ajuizada para que, logo em seguida, fosse ajuizada nova ADIn, de conteúdo idêntico. Portanto, a argumentação do STF não se fulcrou nas peculiaridades do processo objetivo, mas na reinterpretação do art. 267, VI, do CPC, importando, dessarte, apesar de não reconhecida explicitamente, em revisão de sua jurisprudência anteriormente firmada no RE 100.397-9, de 27.09.85 (DJU: 17.03.86, p. 2841).

Nesse sentido, alterando sua jurisprudência anterior sobre o tema, veio a decidir recentemente o STF:

“O Tribunal, por maioria, deu provimento a agravo regimental interposto contra decisão do Min. Carlos Velloso, relator, que, por ilegitimidade ativa ad causam, negara seguimento a ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pelo Partido Social Liberal - PSL contra as expressões ‘conjunta dos Presidentes da República, da Câmara dos Deputados, do Senado Federal e’, constantes do art. 7º da Emenda Constitucional 19/98, que incluíra o inciso XV no art. 48 da CF, dispondo sobre a iniciativa legislativa para a fixação do subsídio dos Ministros do STF. Entendeu-se que a aferição da legitimidade deve ser feita no

momento da propositura da ação e que a perda superveniente de

representação do partido político no Congresso Nacional não o desqualifica como legitimado ativo para a ação direta de

inconstitucionalidade. Vencidos o Min. Carlos Velloso, relator, e Celso de Mello, que consideravam que a perda da representação implicava a perda da capacidade postulatória. [...]. ADI 2159 AgR/DF, rel. originário Min. Carlos Velloso, rel. p/ acórdão Min. Gilmar Mendes, 12.8.2004.(ADI- 2159).”115

No entanto, é óbvio que se a condição da ação supervenientemente ausente não disser respeito à pessoa do legitimado ativo, como a impossibilidade jurídica do pedido, o processo objetivo poderá ser extinto sem resolução do mérito pela superveniente impossibilidade jurídica do pedido. É o caso, e.g., da revogação da norma impugnada no curso da ação, que, segundo a atual jurisprudência majoritária no STF, ocasiona a impossibilidade jurídica do pedido116.