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1. A SUPREMACIA DA CONSTITUIÇÃO E A JURISDIÇÃO

1.6. Similitudes e dissimilitudes entre o controle abstrato e o concreto

1.6.3. Condições da ação e pressupostos processuais

1.6.3.3. Impedimento e suspeição

À vista da natureza objetiva do processo de controle abstrato, não admite o STF, salvo em casos excepcionalíssimos109, o cabimento de argüição de

107 Nesse sentido, confira-se o recente acórdão UNÂNIME do Pleno STF, que reflete a sua atual

jurisprudência sobre este tema: “AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. PRELIMINARES. [...]. 1. Atende as exigências legais procuração que outorga poderes específicos ao advogado para impugnar, pela via do controle concentrado, determinado ato normativo, SENDO

DESNECESSÁRIA A INDIVIDUALIZAÇÃO DOS DISPOSITIVOS.” (ADIn no 2728. Rel.: MAURÍCIO

CORRÊA. DJU: 20.02.2004, p. 16.) Entendeu-se que a exigência da individualização na procuração dos dispositivos legais impugnáveis na ação direta seria irrazoável, sendo bastante a referência genérica na procuração à lei ou ao ato normativo que o outorgante quer impugnar.

108 Cfr.: ADIn no 2098-ED-AgR. Rel.: Min. ILMAR GALVÃO. DJU: 19.04.2002, p. 50.

109 No julgamento da ADIn no 55, entendeu o STF que o Min. PERTENCE estava impedido de apreciá-la

por ter emitido parecer contrário ao mérito da pretensão (declaração de inconstitucionalidade). Diferentemente, entendeu-se que o Min. BROSSARD não estava impedido de apreciar a ADIn, apesar de haver referendado a lei impugnada, assinando-a na condição de Ministro de Estado junto com o Presidente da República. Considerou-se ainda que, embora o referendo ministerial e a sanção presidencial contenham um juízo implícito de constitucionalidade da lei, a referenda é um ato de natureza política, motivado muitas vezes pela solidariedade e lealdade do Ministro de Estado para com o Presidente, enquanto o parecer do Procurador-Geral da República é formulado com total independência e em bases estritamente jurídicas. Eis o teor do acórdão no ponto: “O Tribunal decidiu, por unanimidade, que nos julgamentos das Ações Diretas de Inconstitucionalidade não está impedido o Ministro que na condição de Ministro de Estado, haja referendado a lei ou o ato normativo objeto da ação. Também por unanimidade o Tribunal decidiu que está impedido nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade o Ministro que, na condição de Procurador-Geral da República, haja recusado representação para ajuizar Ação Direta de Inconstitucionalidade.” (ADIn no 55. Rel.: Min. OCTAVIO GALLOTTI. DJU: 16.03.1990, p. 1868. In: RTJ

146/3.) Foi aventado, nos votos proferidos no julgamento da ADIn no 55, que o Procurador-Geral da

impedimento ou de suspeição. Formulada a exceção de impedimento ou de suspeição fora desses casos singularíssimos110, o STF dela não conhece111.

Contudo, não se pode levar ao extremo a tese de que não é possível a existência de impedimento ou suspeição nos processos de controle abstrato em virtude da sua natureza objetiva. É que o só fato de ser inadmissível a discussão sobre interesses subjetivos concretos, individuais, no processo objetivo não quer dizer que eles não existam e que não possam influenciar, consciente ou inconscientemente, a decisão do Ministro votante112.

Inteiramente pertinentes as reflexões de GUSTAVO BINENBOJM a este

respeito:

“Como se vê, o conceito de que a ação direta de inconstitucionalidade instaura um processo objetivo deve ser entendido em seus devidos termos. Do ponto de vista da teoria processual, é correta

110 No julgamento da ADIn no 267 (relator: Min. CELSO DE MELLO; DJU 19.05.1995, p. 13390),

entendeu-se que o Min. GALLOTTI estava impedido de apreciá-la por ter prestado as informações na qualidade de Presidente em exercício do TSE (órgão requerido). Na ADIn no 4, considerou o STF que a

participação do Min. CELSO DE MELLO nas discussões administrativas que ensejaram a elaboração do ato normativo impugnado não era causa generante de impedimento, mas que a emissão de parecer, mesmo oral, do Min. PERTENCE como Procurador-Geral da República, sobre o ato normativo questionado, constituía motivo de impedimento: “1. Ministro que oficiou nos autos do processo da ADIn, como Procurador-Geral da República, emitindo parecer sobre medida cautelar, está impedido de participar, como Membro da Corte, do julgamento final da ação. 2. Ministro que participou, como membro do Poder Executivo, da discussão de questões, que levaram à elaboração do ato impugnado na ADIn, não está, só por isso, impedido de participar do julgamento. ” (ADIn no 4. Rel.: Min. SYDNEY SANCHES. DJU:

25.06.1993, p. 12637). No voto proferido nessa ADIn, afirmou o Min. MOREIRA ALVES: “Em processo objetivo, como é a ação direta de inconstitucionalidade, não há possibilidade de haver suspeição. E em matéria de impedimento, sempre entendi que só ocorre quando o Ministro figura nos autos como autor, réu ou representante do Ministério Público Federal”.

111 Foi o que aconteceu na ADIn no 1354, em que se argüiu a suspeição do Min. SEPÚLVEDA PERTENCE,

então Presidente do STF, por “ter se manifestado reiteradamente e em várias oportunidades, contra existência dos pequenos partidos”. Confira-se o teor da ementa a este respeito: “MEDIDA CAUTELAR EM AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. SUSPEIÇÃO DE MINISTRO DA CORTE: DESCABIMENTO. [...] 1. Manifestação de Ministro desta Corte, de lege ferenda, acerca de aperfeiçoamento do processo eleitoral, não enseja declaração de suspeição. Descabimento de sua

argüição em sede de controle concentrado. Não conhecimento.” (ADIn no 1354. Rel.: Min. MAURÍCIO

CORRÊA. DJU: 25.05.2001, p. 9.)

112 O próprio Min. MOREIRA ALVES, defensor intransigente da impossibilidade de suspeição ou

impedimento no âmbito dos processos objetivos, ao votar na ADIn-QO no 2187, referiu situação paradigmática em que o Ministro ALDIR PASSARINHO não se considerou com a necessária isenção para julgar uma representação de inconstitucionalidade “em que havia um interesse de um de seus familiares” e se viu obrigado a lançar mão de um artifício (pedir licença do Tribunal), para não transgredir esse entendimento firmado a respeito dos processos objetivos. Observem-se as palavras literais do Min. MOREIRA ALVES. que admite a existência de um interesse de um dos familiares do Min. ALDIR PASSARINHO no julgamento da representação de inconstitucionalidade: “O SENHOR MINISTRO MOREIRA ALVES - Sr. Ministro, o Sr. Ministro Aldir Passarinho, como Relator de uma representação de inconstitucionalidade, em que havia um interesse de um dos seus familiares, foi obrigado, para deixar de ser relator, a pedir licença do Tribunal por uma semana, porque não podia declarar-se impedido. Há alguma lei que diga que não há impedimento nesses casos? Não existe nenhuma, mas ele decorre da natureza mesma da ação direta.” (ADIn-QO no 2187. Rel.: Min. OCTAVIO GALLOTTI. DJU: 12.12.2003,

a classificação, eis que não há contendores litigando em defesa de direitos subjetivos concretos, que deverão ser assegurados pela prestação jurisdicional. O que não se pode admitir é que a decantada objetividade seja invocada para sustentar a falsa idéia de que a fiscalização abstrata da constitucionalidade se perfaça, através de um processo asséptico, meramente formal, desprovido da essência da idéia de lide que é o

conflito de interesses. Bem ao contrário, nele confluem os maiores

conflitos políticos, sociais e econômicos da nação, compondo um quadro representativo dos fatores reais de poder.” 113