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3. O PAPEL DO SENADO FEDERAL NO CONTROLE DE

4.1. A natureza objetiva do processo constitucional e suas implicações

4.1.4. Distinção entre coisa julgada erga omnes, eficácia erga omnes e efeito

4.1.4.1. Diferença quanto à técnica processual

Acolhida a alegação de coisa julgada, ou reconhecida de ofício a existência de coisa julgada, o juiz extinguirá o processo sem resolução do mérito, nos termos do art. 267, V, c/c o art. 301, §§ 1o a 3o, do CPC.

224 Salvo situações excepcionais, tais como profunda alteração do quadro fático (cfr., retro, item 2.4.3.4.),

porquanto às decisões de controle abstrato também inere a cláusula rebus sic stantibus implícita, como sucede às sentenças dos processos subjetivos.

225 É o caso, v.g., de leis federais editadas em épocas diferentes ou de leis emanadas de Estados-membros

diversos que possuam conteúdo virtualmente idêntico. Cfr. a decisão unânime do Pleno do STF na ADIn- MC 1850, Rel.: Min. PERTENCE, DJU: 27.04.2001, p. 309, e, mais recentemente, a decisão proferida em 23.02.2005 na Rcl 2617-AgR-MG, Rel.: Min. PELUSO (Informativo no 377 do STF).

226 Com efeito, o art. 102, § 2o, da CF-88 prescreve que a decisão do STF em ADIn e ADC produz efeito

vinculante “relativamente aos DEMAIS órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal.”

Se a alegação de coisa julgada for concernente a questão prejudicial no processo mais recente e não à questão principal, o juiz, conquanto não deva extinguir o processo sem resolução de mérito (pois não há coisa julgada a respeito da questão principal), não deve rejulgar a questão: deve simplesmente aludir à existência de coisa julgada em relação à questão prejudicial. Assim, em boa técnica, o juiz não adentrará no mérito da questão prejudicial, mas tão-somente referirá a existência de coisa julgada em relação à questão prejudicial (a qual, no processo anterior, constituía questão principal), sem emitir nenhuma decisão, nenhum juízo de valor a seu respeito, incorporando a decisão já existente, transitada em julgado em outro processo, como premissa lógica irrecusável para a análise das demais questões subseguintes227.

Portanto, em ambas as hipóteses, a conseqüência processual é a mesma: o juiz não pode redecidir questão a cujo respeito se produziu coisa julgada, nem mesmo para decidir da mesma forma, pelo singelo fato de que já existe decisão judicial imutável e indiscutível a seu respeito228, sendo, portanto, além de nula, inócua uma nova decisão judicial (bis in idem).

Já no que concerne ao efeito vinculante, a conseqüência processual é diversa: acolhida a alegação de que há decisão do STF com efeito vinculante aplicável ao caso, ou reconhecida de ofício a existência de decisão do STF dotada de efeito vinculante aplicável ao caso, o juiz decidirá efetivamente a questão constitucional de conformidade com a decisão do STF. O juiz, em boa técnica, não se eximirá de decidir a questão constitucional em razão da existência de decisão do STF com efeito vinculante

227 “Por fim, cabe destacar em relação à própria coisa julgada duas modalidades de eficácia a ela

associadas. A primeira é denominada de eficácia preclusiva: a matéria coberta pela autoridade da coisa julgada não poderá ser objeto de novo pronunciamento judicial. Já a segunda modalidade, a eficácia vinculativa [prejudicial], significa que a autoridade da coisa julgada deverá prevalecer na solução de qualquer lide que esteja logicamente subordinada à questão já resolvida. Por exemplo: assentada a relação de paternidade em uma demanda, não poderá o juiz, em posterior ação de alimentos, rejeitar o pedido com base na inexistência da relação.” (BARROSO, Luís Roberto. O controle..., p. 150.) Os processualistas costumam subdividir a eficácia vinculativa da coisa julgada em eficácia vinculativa direta (impeditiva de que a mesma lide seja rejulgada no mesmo ou em outro processo) e eficácia vinculativa prejudicial (impediente de que a questão prejudicial, já julgada como questão principal em outro processo, seja rejulgada). Nesse sentido: “Além do efeito vinculativo direto, que se projeta entre processos relativos ao mesmo litígio, a coisa julgada também possui o chamado efeito vinculativo prejudicial, que se opera em relação a decisões proferidas sobre lides distintas, mas ligadas entre si pelo vínculo da prejudicialidade.” (FERNANDES, Sérgio Ricardo de Arruda. Questões importantes de processo civil: teoria geral do processo. 3a ed. Rio de Janeiro: Roma Victor, 2004, p. 125.) Não se deve,

todavia, confundir a eficácia vinculativa da coisa julgada, que vem de ser explanada, com o instituto do efeito vinculante, pois nada têm que ver.

228 Preleciona BARBOSA MOREIRA: “Haverá ofensa à coisa julgada quer na hipótese de o novo

pronunciamento ser conforme ao primeiro, quer na de ser desconforme: o vínculo não significa que o juiz esteja obrigado a rejulgar a matéria em igual sentido, mas sim que ele está impedido de rejulgá-la.” (Apud BARROSO, Luís Roberto. O controle..., p. 150.)

aplicável ao caso: ao revés, estará obrigado a decidir a questão constitucional, desprovido, porém, da liberdade de decidi-la de maneira diversa do que foi decidido pelo STF229.

Tal se dá por um singelo motivo: a questão constitucional decidida pelo STF em ADIn ou ADC não é a mesma questão constitucional com a qual se defronta o juiz, mas sim uma questão constitucional similar, análoga. Se não há decisão do STF em ADIn ou ADC sobre a mesma questão constitucional surgida no processo subjetivo, é preciso que haja uma decisão judicial a seu respeito no processo subjetivo, sob pena de negativa de prestação jurisdicional. Portanto, o juiz, no processo subjetivo, efetivamente decidirá a questão constitucional em consonância com a decisão do STF em ADIn ou ADC dotada de efeito vinculante sobre a questão constitucional similar, análoga, usada como parâmetro de julgamento pelo juiz.

Dessarte, diante de uma decisão do STF em ADIn ou ADC dotada de eficácia de coisa julgada erga omnes e de efeito vinculante, o juiz deverá verificar: (a) se a questão constitucional decidida pelo STF é exatamente a mesma que tem diante de si ou uma questão semelhante; e (b) se a decisão sobre a questão constitucional pelo STF é extensível à questão constitucional que depara à sua frente.

Se a questão constitucional decidida pelo STF for exatamente a mesma, o juiz não deverá rejulgá-la, em virtude da coisa julgada erga omnes, mas extinguir o feito sem resolução de mérito (se configurar questão principal) ou adotar a decisão do STF como premissa lógica necessária para o julgamento das demais questões (se constituir questão prejudicial). Se a questão constitucional decidida pelo STF não for exatamente a mesma, mas sim uma questão semelhante, o juiz deverá julgá-la230 –––

229 Assim como o ato do juiz não deixa de ser decisório quando simplesmente cumpre o comando legal ao

qual está vinculado, o ato do juiz não deixa de ser decisório quando cumpre o comando derivado do efeito vinculante de decidir em sentido idêntico ao decidido pelo STF. Por igual, a autoridade administrativa, subordinada ao princípio da legalidade, quando edita ato administrativo vinculado, não deixa de emitir ipso facto ato de cunho decisório. Ademais, o juiz sempre terá liberdade para decidir sobre a aplicabilidade ou não da decisão do STF ao caso concreto que tem diante de si, i.e., para decidir se é juridicamente possível e adequada a extensão da decisão do STF ao caso concreto. A possibilidade de cassação da sua decisão mediante reclamação não infirma esse poder-dever do juiz, porquanto aquela só se dará se o juiz não exercer corretamente seu poder-dever: a reclamação só será julgada procedente se o juiz deixar de estender ao caso a decisão do STF aplicável, se estender ao caso decisão do STF inaplicável ou se estender ao caso de forma indevida a decisão do STF aplicável, e nunca pelo simples fato de o juiz ter exercido juízo sobre a aplicabilidade ou não da decisão do STF (cfr., analogicamente, art. 103-A, § 3o,

da CF-88).

230 Tanto assim o é que, julgada procedente reclamação contra decisão que tenha desrespeitado o efeito

vinculante das decisões do STF em ADIn ou ADC, o STF simplesmente cassa a decisão exorbitante de seu julgado ou determina medida adequada à preservação de sua competência, devendo o juiz, se necessário, proferir outra decisão em conformidade com a decisão do STF provida de efeito vinculante (inteligência do art. 17 da Lei no 8.038-90). Quanto às súmulas vinculantes, o dever do juiz de julgar,

porque ainda não foi julgada ––– (a) em consonância com a decisão do STF em virtude do efeito vinculante se considerar extensível a decisão do STF à questão que encontra à sua face, ou (b) segundo o seu livre convencimento motivado, se considerar que a decisão do STF não pode ser estendida à questão presente no processo subjetivo.