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3. O PAPEL DO SENADO FEDERAL NO CONTROLE DE

4.1. A natureza objetiva do processo constitucional e suas implicações

4.1.4. Distinção entre coisa julgada erga omnes, eficácia erga omnes e efeito

4.1.4.2. A súmula vinculante

A EC no 45-2004, ao incluir o art. 103-A na CF-88, criou a figura da súmula vinculante com a seguinte configuração231:

“Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004.)

§ 1º A súmula terá por objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas, acerca das quais haja controvérsia atual entre órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica.

§ 2º Sem prejuízo do que vier a ser estabelecido em lei, a aprovação, revisão ou cancelamento de súmula poderá ser provocada por aqueles que podem propor a ação direta de inconstitucionalidade.

§ 3º Do ato administrativo ou decisão judicial que contrariar a súmula aplicável ou que indevidamente a aplicar, caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal que, julgando-a procedente, anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial reclamada, e determinará que outra seja proferida com ou sem a aplicação da súmula, conforme o caso.” Não há diferença ontológica substancial entre o efeito vinculante que a CF-88 agregou às decisões do STF em ADIn e ADC e às súmulas do STF

como decorrência do efeito vinculante, é ainda mais evidente, porquanto não há decisão judicial do STF nos autos do processo subjetivo em questão nem nos autos de processo objetivo, mas mera tese jurídica cristalizada em súmula vinculante, a qual, por não constar de sentença judicial, não produz sequer coisa julgada, razão pela qual o próprio legislador constituinte (art. 103-A, § 3o, in fine) foi explícito em afirmar

que, ao cassar a decisão reclamada contrária à súmula vinculante, o STF deverá determinar que outra decisão seja proferida pelo juiz, desta feita em consonância com a súmula vinculante, aplicando-a ou não, conforme o caso concreto.

231 Tal artigo foi regulamentado pela Lei no 11.417-2006. Ao disciplinar o § 2o do art. 103-A da CF-88, o

art. 3o da Lei no 11.417-2006 estendeu a legitimidade para propor a edição, a revisão e o cancelamento de

enunciado de súmula vinculante ao Defensor Público-Geral da União, aos Tribunais Superiores, aos Tribunais de Justiça de Estados ou do Distrito Federal e Territórios, aos Tribunais Regionais Federais, aos Tribunais Regionais do Trabalho, aos Tribunais Regionais Eleitorais e aos Tribunais Militares, bem como a qualquer Município, incidentalmente nos processos em que seja parte, sem que isso importe em suspensão do processo (art. 3o, § 1o).

aprovadas nos termos do art. 103-A da CF-88. Trata-se, portanto, do mesmo instituto (efeito vinculante), a incrementar a eficácia das decisões do STF em ADIn e ADC (controle abstrato) e a eficácia das súmulas por ele aprovadas nos termos do art. 103-A da CF-88 (oriundas do controle concreto de constitucionalidade exercido pelo STF). Os limites subjetivos de ambas as espécies de efeito vinculante são idênticos. Até a medida processual prevista para garantir a eficácia concreta do efeito vinculante da súmula aprovada nos moldes do art. 103-A da CF-88 é a mesma empregada para garantir a eficácia concreta do efeito vinculante das decisões do STF em ADIn e ADC: a reclamação.

Todavia, o âmbito de atuação do efeito vinculante da súmula vinculante parece ser diverso do âmbito de atuação do efeito vinculante das decisões do STF em ADIn e ADC232.

De fato, conquanto o efeito vinculante das decisões do STF em ADIn e ADC não opere nos processos em que se discute questão constitucional idêntica à decidida pelo STF, mas apenas nos em que se discute questão constitucional análoga, em razão da existência de coisa julgada erga omnes a impedir qualquer decisão do juiz, ainda que em conformidade com a decisão do STF munida de efeito vinculante, o efeito vinculante da súmula vinculante atua exclusivamente nos processos em que se discute questão constitucional idêntica à tratada na súmula vinculante, uma vez que não há o óbice da coisa julgada erga omnes.

De feito, a súmula vinculante, embora seja precedida de várias decisões judiciais do STF em processos subjetivos, não constitui ato judicial proferido no bojo de nenhum desses processos, não consta do dispositivo de sentença de nenhum desses processos, configurando, portanto, mera tese jurídica (abstrata) desenvolvida pelo STF em matéria constitucional vazada em verbete sumular publicado na imprensa oficial, à qual se deve obediência, mas incapaz de produzir coisa julgada (inter partes ou erga omnes)233.

232 A diferença entre as duas espécies de efeito vinculante repousa, portanto, em elemento acidental, não- essencial ao conceito de efeito vinculante. Identicamente, se em dado ordenamento jurídico a fundamentação da sentença também produzir coisa julgada, nem por isso se dirá que em tal sistema não existe coisa julgada, mas apenas que o instituto da coisa julgada assume nele uma configuração acidentalmente diferente da existente em nosso sistema.

233 Conquanto a súmula vinculante não integre nenhum dos acórdãos que embasaram sua edição, por

determinação do § 7o do art. 543-A do CPC (acrescentado pelo art. 2o da Lei no 11.418-2006, que regulamentou a “repercussão geral” referida no § 3o do art. 102 da CF-88), a súmula da decisão do STF

sobre a repercussão geral ––– que não é uma súmula vinculante, nos termos do art. 103-A da CF-88 ––– “constará de ata, que será publicada no Diário Oficial e valerá como acórdão”. Essa mesma Lei no

Se a súmula vinculante não produz coisa julgada, não há nenhum obstáculo à atuação do efeito vinculante nos processos em que se discute questão constitucional idêntica à versada na súmula. Aliás, foi o próprio legislador constituinte que, usando da sua liberdade de conformação, circunscreveu o âmbito de atuação do efeito vinculante da súmula vinculante apenas às questões constitucionais idênticas:

“Art. 103-A. [...] § 1o. A súmula terá por objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas, acerca das quais haja controvérsia atual entre órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre QUESTÃO IDÊNTICA.”

Destarte, por força da manifesta opção do legislador constituinte, a súmula vinculante não pode ser aplicada à solução de questões constitucionais análogas à questão constitucional objeto da súmula, mas tão-somente à solução da mesma questão constitucional (referente à mesma norma).

4.1.5. Da cláusula rebus sic stantibus implícita na coisa julgada erga omnes, na eficácia