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Causalidades do pauperismo no modo de produção capitalista

No documento MESTRADO EM PSICOLOGIA SOCIAL SÃO PAULO 2014 (páginas 185-195)

OS PERCURSOS DA PESQUISA

PRINCÍPIOS

4.2 Causalidades do pauperismo no modo de produção capitalista

Ambas as questões – da tendência de redução do salário relativo e da manutenção de um patamar estrutural de desemprego – decorrem de que o modo de produção capitalista, mais do que forma específica de produção de mercadorias, é um modo de acumulação de capital que se sustenta na produção, extração e apropriação de mais-valor (MARX, 2013, p. 695), o que depende da existência de mais-trabalho, isto é, de que se disponha de uma determinada quantidade de trabalho não pago (ibid., p. 602). Assim, compreender as causalidades do pauperismo passa pelo entendimento de que a própria forma de produção social de riqueza no modo de produção capitalista determina inexoravelmente sua apropriação desigual.

Uma vez que o preço pago ao trabalhador por sua força de trabalho não pode nunca ser o valor do produto de seu trabalho, pois do contrário se desfaz a produção de mais-valor enquanto fundamento da produção capitalista (MARX, 2013, p. 606), é preciso definir quais as determinações, enquanto leis tendenciais, do valor pago como salário. Neste sentido, aponta Marx (1988), o valor da força de trabalho é determinado pelos meios de vida necessários para manter o trabalhador e é formado por dois elementos, um físico e o outro sócio-histórico. O elemento físico se refere ao necessário para a subsistência dos trabalhadores, para que se mantenham vivos e possam se reproduzir e assim gerar mais trabalhadores. Este elemento determina, em condições gerais, o limite mínimo do salário, pois do contrário não se mantém e nem se repõe o volume necessário de trabalhadores para realizar a produção. O elemento sócio-histórico se refere ao fato de que, em cada sociedade em um determinado momento histórico, se constitui um padrão de vida, que envolve não apenas a satisfação das necessidades fisiológicas básicas, mas também a ―satisfação de determinadas necessidades resultantes das condições sociais em que os homens vivem e foram criados‖ (MARX, 1988, p. 79). O próprio modo de produção capitalista cria estas necessidades que não podem ser limitadas àquelas estritamente envolvidas com a subsistência, pois depende do consumo das mercadorias produzidas: os trabalhadores são também os consumidores de seus próprios produtos (MARX, 1980). Neste sentido, ao passo em que o capital se defronta com os trabalhadores também enquanto consumidores, é preciso garantir um volume tal de salário que mantenha o nível de consumo que possa

assim satisfazer as ―novas necessidades‖ criadas (MARX, 2011c, p. 225). Desta forma, o elemento sócio-histórico influi na composição dos salários até o limite máximo em que permaneça algum nível de lucro. A determinação concreta do salário, entre o mínimo fisiológico e o máximo que garanta a existência de patamar mínimo de lucro, depende da correlação de forças, a cada momento, entre as classes em luta (MARX, 1988).

A influência decisiva da ação política dos trabalhadores organizados não elimina, contudo, a existência de tendências econômicas objetivas na determinação do quanto de riqueza produzida que será apropriada pelos trabalhadores na forma de salário. A identificação de tais tendências é decisiva para a apreensão do sistema de causalidades do pauperismo, como expressão desta relação desigual.

Em linhas gerais, o que importa para a resolução desta questão é ―a composição do capital e as alterações que ela sofre durante o processo de acumulação‖ (MARX, 2013, p. 689). Inicialmente, o crescimento total do capital é acompanhado pelo crescimento do capital variável (o valor da força de trabalho, a soma total de salários). Na condição de manutenção de uma determinada base técnica, isto é, que para movimentar certa massa de capital constante (meios de produção, máquinas e matérias-primas) seja necessária sempre a mesma massa de força de trabalho, a demanda de trabalho e o valor investido como capital variável crescem proporcionalmente ao capital. Neste sentido, amplia-se o número total de empregos e a acumulação de capital se torna também a multiplicação de proletários. A dependência do trabalho ao capital se amplia, assim, de forma extensiva e não intensiva. Por sua vez, com a expansão de mercado, as necessidades de acumulação podem exceder o crescimento do número de trabalhadores, fazendo com que a procura da força de trabalho seja maior do que a sua oferta. Em tais condições de pleno emprego, que são as mais favoráveis aos trabalhadores, crescem os salários e melhora o acesso ao consumo.

Nestas condições, o preço do trabalho continua a subir apenas enquanto não perturba o progresso da acumulação. A alternativa é a de que a elevação do preço do trabalho implique em queda no nível de acumulação. Neste caso, ao cair o nível de acumulação, desfaz-se também a condição necessária à elevação do preço do trabalho e a demanda de trabalho e os salários caem novamente a

um patamar compatível com a nova necessidade de acumulação, cujo ritmo pode assim voltar a subir.

A acumulação decresce, porém ao decrescer desaparece a causa de seu decréscimo, a saber, a desproporção entre capital e força de trabalho explorável. O próprio mecanismo do processo de produção capitalista remove, assim, os empecilhos que ele cria transitoriamente. O preço do trabalho cai novamente para um nível compatível com as necessidades de valorização do capital, seja esse nível inferior, superior ou igual ao que se considerava normal antes do advento do aumento salarial (MARX, 2013, p. 696).

Com isso, se explicita o limite colocado pelo modo de produção capitalista para a elevação dos salários. O aumento do preço da força de trabalho apenas reduz, no melhor caso, a quantidade de trabalho que não é pago. Trata-se, ―em última instância, da relação entre os trabalhos não pago e pago da mesma população trabalhadora‖ (ibid., p. 697). Isto é, se há suficiente aumento da quantidade de trabalho não pago, consequentemente é possível aumentar o valor do trabalho pago. A elevação dos salários, neste caso, não apenas mantém intactos os fundamentos da produção capitalista, como possibilita sua reprodução ampliada.

Fosse mantida a mesma base técnica, o processo recomeçaria com um novo ciclo de expansão, a ser seguido por outro de recessão e assim indefinidamente. Mas, não é assim que concretamente acontece. O próprio curso da acumulação tende a alterar a composição técnica do capital através da criação tecnológica e da consequente substituição de trabalho vivo por trabalho morto. Esta alteração da base técnica tem por consequência a produtividade crescente do trabalho: diminui a massa de trabalho proporcionalmente à massa de meios de produção que ela movimenta. Altera-se assim a composição técnica e consequentemente a composição do valor, com o aumento crescente da parte constante do capital em relação à sua parte variável. Não iremos detalhar aqui como esta se dá, mas Marx indica ainda a concomitante tendência de centralização do capital, que reforça e acelera estes efeitos da acumulação, ampliando e acelerando a revolução da composição técnica. Assim, o ritmo de desenvolvimento da força produtiva e a alteração que ocasiona na composição orgânica do capital são ainda mais intensos do que o ritmo do progresso da acumulação e aquele do crescimento da riqueza social. Desta forma, com o crescimento do capital total, diminui a demanda relativa de trabalho, o que

significa a atração proporcionalmente menor de trabalhadores pelo capital adicionado que se forma no decorrer da acumulação e pela repulsão cada vez maior de trabalhadores pelo velho capital que se reproduz em uma nova composição (MARX, 2013, p. 704).

Assim, ao contrário do que se poderia supor a partir da abstração inicial (em que a base técnica se mantém e os salários sobem), o componente variável do capital decresce proporcionalmente, em vez de crescer, na medida em que cresce o capital total. Isso não elimina os períodos de expansão da acumulação sobre uma mesma base técnica, que implica na elevação do preço da força de trabalho, mas significa que estes se tornam mais curtos. A existência destes períodos de expansão e sua duração dependem, portanto, do ritmo em que o capital é capaz de alterar sua composição técnica.

Esse processo tem dois desdobramentos principais. O primeiro é a tendência de queda do valor médio dos salários relativos (MARX, 1988). Para compreender o que esta significa, é preciso delimitar a distinção entre salário nominal, salário real e salário relativo, conforme discutida por Marx (1987). O salário nominal se refere ao preço em dinheiro que é pago pelo trabalho; o salário real se refere ao poder de compra do salário, a soma de mercadorias que se pode comprar com o valor pago nominalmente; o salário relativo, por sua vez, exprime a cota de riqueza apropriada pelo trabalho em relação à cota de riqueza apropriada pelo capital no montante total da riqueza socialmente produzida. Dada esta relação, o salário nominal pode subir, por exemplo, sem que seja alterado o salário real, no caso em que o custo de vida suba em igual proporção. Da mesma forma, e é isso que mais nos interessa aqui, tanto o salário nominal quanto o salário real podem aumentar e ainda assim haver diminuição do salário relativo, o que significa que o aumento do poder de compra dos trabalhadores se deu em proporção menor do que o acúmulo de capital. De qualquer forma, havendo ou não aumento dos salários nominal e real, a tendência objetiva, aponta Marx, é que ocorra a queda do valor médio dos salários relativos em decorrência das alterações da composição técnica do capital ao longo do processo de acumulação (MARX, 1980).

Outro desdobramento deste processo é a geração de uma margem estrutural de desemprego. A diminuição relativa do componente variável do capital ao longo do processo de acumulação, ou seja, a menor necessidade de

força de trabalho para a produção de um mesmo volume de mercadorias, produz ―uma população trabalhadora adicional relativamente excedente, isto é, excessiva para as necessidades médias de valorização do capital e, portanto supérflua‖ (MARX, 2013, p. 705), um contingente de trabalhadores desempregados ou semiempregados que Marx denomina ―superpopulação relativa‖ e ―exército industrial de reserva‖.

Essa superpopulação relativa se apresenta sob quatro formas. Na forma que Marx denomina de ―flutuante‖, se refere aos trabalhadores que são constantemente atraídos e repelidos ao longo dos ciclos industriais. Neste caso, mesmo que o número total de trabalhadores possa vir a aumentar, isto se dá em proporção decrescente em relação à escala de produção (MARX, 2013, p. 716). Outra expressão da superpopulação, a latente, se refere ao contingente de trabalhadores ocupados em setores econômicos em que a acumulação de capital cresce ao custo da repulsão de trabalhadores sem que haja um movimento complementar de atração, como é o caso da agricultura. A superpopulação relativa latente está, portanto, ―continuamente em vias de se transferir para o proletariado urbano ou manufatureiro, e à espreita de circunstâncias favoráveis a essa metamorfose‖ (ibid., p. 717). Há ainda a forma estagnada, que se refere a uma parte dos trabalhadores ativos, mas com inserção irregular e precária de trabalho (caracterizado pelo máximo de tempo de trabalho e o mínimo de salário), o que os torna um depósito de trabalho disponível que pode ser acessado quando há necessidade de expansão em outros ramos mais estáveis da produção. Este é o caso, cita Marx, dos trabalhadores domésticos. Por fim, encontra-se aquele ―sedimento mais baixo da superpopulação relativa [que] habita (...) a esfera do pauperismo‖, formado pelo lumpesinato, pelos ―órfãos e os filhos dos indigentes‖, ―os degradados, maltrapilhos, incapacitados para o trabalho‖, assim como por trabalhadores aptos ao trabalho que engrossam a fileira de desempregados ao longo das crises capitalistas (ibid., p. 719). É na superpopulação relativa que encontramos o que podemos denominar de pobreza absoluta, aquela em que inexiste mesmo a garantia do limite mínimo do salário, em que a própria subsistência física pode estar constantemente ameaçada diante da ausência dos recursos mínimos necessários para a sua manutenção.

O ―exército industrial de reserva‖ não é, porém, apenas produto da acumulação capitalista, mas também uma alavanca da acumulação capitalista e mesmo uma condição de existência deste modo de produção (MARX, 2013, p. 707). É sua existência que possibilita que a expansão econômica possa se desvincular do limite imposto naturalmente pelo aumento populacional, ao garantir a existência, a qualquer momento, de trabalhadores disponíveis para serem empregados na expansão em setores consolidados ou novos sem que haja risco de quebra na escala de produção. Afastando as barreiras naturais do crescimento populacional (pois, a rigor, não pode nunca as eliminar), a existência desta margem estrutural de desemprego e semiemprego garante ao capital sua liberdade de ação.

Mais do que disponibilizar uma margem segura e garantida de expansão de mão-de-obra, a superpopulação relativa possibilita aumentar a intensidade da exploração do trabalhador ativo através do aumento de sua produtividade, de modo que um volume maior de força de trabalho seja executado por um número menor de trabalhadores, ao mesmo tempo em que esta intensificação da produtividade dos trabalhadores ativos reflete na ampliação do exército de reserva.

O sobretrabalho da parte ocupada da classe trabalhadora engrossa as fileiras de sua reserva, ao mesmo tempo que, inversamente, esta última exerce, mediante sua concorrência, uma pressão aumentada sobre a primeira, forçando-a ao sobretrabalho e à submissão aos ditames do capital. A condenação de uma parte da classe trabalhadora à ociosidade forçada em razão do sobretrabalho da outra parte, e vice-versa, torna-se um meio de enriquecimento do capitalista individual, ao mesmo tempo que acelera a produção do exército industrial de reserva num grau correspondente ao progresso da acumulação social (MARX, 2013, p. 711 – 712).

Desta forma, os movimentos gerais do salário são regulados, grosso modo, pela expansão e contração do exército de reserva, pela proporção variável em que os trabalhadores se dividem em exército ativo e exército de reserva.

Há, portanto, uma tendência econômica objetiva, definida pelo modo de produção de capitalista, de empobrecimento daqueles que precisam vender sua força de trabalho. Este empobrecimento se apresenta, no limite, como pobreza absoluta, isto é, como incapacidade de suprir as necessidades mínimas de sobrevivência ou aquelas sócio-historicamente determinadas em um contexto

cultural. Nos demais casos, se apresenta como pobreza relativa, isto é, aquela em que ―mesmo quando os seus salários aumentam, aumentam bem menos do que as riquezas do capital‖ (MANDEL, 1968, p. 154).

Existe, assim, uma base material, insuprimível no marco deste modo de produção, que se expressa como inevitabilidade da pobreza.

Não há desenvolvimento da maquinaria, nem descoberta na química, nem aplicação da ciência à produção, nem aperfeiçoamento dos meios de comunicação, nem colônias novas, nem emigração, nem abertura de mercados, nem livre comércio, nem tudo isso junto que possa eliminar a miséria das massas trabalhadoras (MARX, 1864 apud ROSDOLSKY, 2001, p. 253).

Contudo, para colocar corretamente o problema, é preciso considerar que a inevitabilidade da pauperização relativa não significa que haja qualquer lei de pauperização absoluta. A consideração das formas concretas de objetivação desta tendência depende de se ponderar outros fatores. O primeiro, já citado, mas que vale ser frisado, é que em períodos de expansão da acumulação sob uma dada base técnica, por mais curtos que venham a ser, há a possibilidade de elevação dos salários, no sentido nominal, real e relativo. Além desse, Mandel (1968) cita, por exemplo, o fato de que a tendência de queda do valor médio dos salários relativos só pode ser entendida se considerada a sociedade capitalista em escala global e não nacional, afinal pode haver elevação do valor médio dos salários em certos países à custa da sua redução em outros. Pontua também a existência de outros fatores econômicos que interagem com esta tendência, modificando-a, como a ampliação do setor de serviços, que leva à constituição de uma ―nova classe média‖ (na expressão de Mandel) que impede uma expansão do exército de reserva. Na direção contrária, em determinadas condições, é possível que o salário se rebaixe além de seu limite inferior, do mínimo necessário para a subsistência, seja porque a disponibilidade de trabalhadores no exército de reserva torna desnecessária a manutenção de todos, seja porque outros fatores, além do salário, competem para a sua subsistência. Neste sentido, Marx (1988) cita exemplo histórico de como o salário pôde ser rebaixado abaixo do mínimo fisiológico ao ser complementado pelas doações oriundas do caixa instituído pela Lei dos Pobres. Por último, mas não menos importante, encontra-se a maneira pela qual a ação política dos trabalhadores influi na composição dos salários e assim nas formas de

apropriação da riqueza socialmente produzida. Como pontua Engels (1982), se a miséria dos trabalhadores não cresce de modo absoluto é porque sua organização e resistência colocam-lhe uma barreira. Se na luta puramente econômica o capital é sempre mais forte, a ação política pode garantir condições mais favoráveis ao trabalho, como acontece, por exemplo, na limitação da jornada de trabalho pela via legislativa (MARX, 1988). Tendências econômicas como a de intensificação do sobretrabalho por conta da concorrência entre trabalhadores empregados e desempregados podem ser eliminadas, e mesmo revertidas, a partir de sua ação política conjunta. Criam-se, assim, condições para que não se tornem ―uma massa informe, esmagada, de seres famintos para os quais não haveria salvação‖ (ibid., p. 84).

Não há, portanto, uma lei de empobrecimento absoluto, o que também não significa que inexistam tendências objetivas deste empobrecimento, que podem ser encontradas temporariamente em todos os contextos de crise e permanentemente nas regiões tidas como subdesenvolvidas (ROSDOLSKY, 2001). De qualquer forma, resta sempre o limite absoluto de que o pauperismo, ainda que em sua forma relativa, não pode ser superado dentro das relações capitalistas, o que não elimina as possibilidades de seu enfrentamento, que possibilita alguma melhora nas condições de vida dos trabalhadores. Esta contradição entre a necessidade da ação e os seus limites, entre a ação política imediata e a revolucionária, é assim expressa por Marx:

Se a classe operária cedesse covardemente no seu conflito diário com o capital, privar-se-ia sem dúvida da possibilidade de empreender movimentos de maior envergadura. Ao mesmo tempo, (...) os operários não devem superestimar o resultado final desta luta quotidiana. Não podem esquecer que lutam contra os efeitos e não contra as causas desses efeitos, que o que fazem é refrear o movimento descendente, mas não alterar o seu rumo; que aplicam paliativos, e não a cura da doença (MARX, 1988, p. 84 – 85).

Em síntese, a pobreza é uma condição objetiva de subsunção do trabalho ao capital, de constrangimento estrutural a que cada sujeito possa se apropriar do acúmulo de riqueza material e espiritual disponível em um determinado momento histórico, determinada pelo modo de produção capitalista, no interior do qual é irreformável e insuprimível. Enquanto fenômeno social que se insere, assim, na totalidade do ser social sob a forma historicamente particular da sociabilidade capitalista, a pobreza possui uma dimensão objetiva, determinada

pelas condições materiais de produção, mas seu caráter causal, na medida em que é causalidade posta pela práxis social humana, não elimina sua determinação por uma dimensão subjetiva tanto nas formas pelas quais a pobreza é produzida, justificada e legitimada (como estamos e continuaremos abordando aqui), quanto nas formas pelas quais determina as formas em que é vivenciada pelos sujeitos (como abordaremos posteriormente). Apontamos estes elementos para justificar a compreensão de que a pobreza é um fenômeno que não pode, portanto, ser resumido a uma condição apenas material, que as concepções economicistas buscam relacionar a níveis de renda e de consumo, ao mesmo tempo em que esta dimensão objetiva da pobreza, determinada pelas leis econômicas do modo de produção capitalista, não pode ser negada pela restrição do fenômeno às maneiras pelas quais é construído ou apreendido como problema, como defende, por exemplo, Paugam (2003) quando afirma que ―o que é sociologicamente pertinente não é a pobreza em si, mas as formas institucionais que esse fenômeno assume numa dada sociedade‖ (p. 55).

É a partir da impossibilidade de apreender a pobreza em suas causalidades, enquanto produto historicamente determinado da práxis social da humanidade, que se produzem os discursos ideologizados que isolam e privilegiam, a cada momento, elementos parciais do fenômeno sem que estes sejam apreendidos enquanto compondo a totalidade social, revelando assim aspectos que não são de todo falsos, mas que se apresentam sempre de forma mistificada. Retomaremos estas questões adiante quando abordarmos as concepções ―flexíveis‖ de pobreza.

CAPÍTULO 5.

POBREZA, “QUESTÃO SOCIAL” E POLÍTICAS SOCIAIS

Neste capítulo, apresentaremos, aprofundando a discussão iniciada no capítulo anterior, elementos para a compreensão do desenvolvimento histórico das políticas sociais, a partir de sua gênese nas lutas entre capital e trabalho, a

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