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1 INTRODUÇÃO

2.3 CONSÓRCIO PÚBLICO INTERMUNICIPAL

2.3.2 Consórcios Públicos Intermunicipais: desenvolvimento, integração

O Consorciamento corresponde à modalidade de integração federativa territorial compreendida por Lopes (2016) como relações entre esferas e jurisdições territoriais de governo, relevantes para o fortalecimento da capacidade de resposta da Federação aos desafios do desenvolvimento sustentável. Henrichs e Meza (2017) enquadram dita associação como instrumento de integração das relações governamentais, sobretudo nos munícipios. As autoras sustentam o papel do arranjo na concretização do desenvolvimento regional alavancado a partir do ambiente local, no qual se operam as relações entre cidadãos. Dito processo de endogenia, expressado nas forças da base que reverberam para múltiplos níveis e em contextos de reciprocidade, foi apontado também por Fillippim e Abrucio (2016).

Lopes (2016) menciona que os Governos municipais encontram na instituição uma possibilidade de ganho de eficiência no trato das questões locais. Abrucio e Sano (2013) relacionam os Consórcios a lógicas de busca de desenvolvimento e redução de desigualdade e registram casos em que os pequenos municípios se beneficiam da cooperação em decorrência da ampliação do atendimento das demandas e dos

ganhos de escopo. Mencionado mecanismo ainda se apresenta como saneador das deficiências da capacidade municipal de enfrentar questões que estão além de algumas de suas limitações (MOURA, 2009).

Ditas deficiências seguem vinculadas à autonomia federativa proveniente de descentralização que desconsidera aspectos de desigualdade intermunicipal, o que inviabiliza para alguns municípios o próprio gozo dessa autonomia por ausência de estrutura de diversas ordens (IPEA, 2010; ABRUCIO; SANO, 2013). Em linha de entendimento semelhante, Fernandes (2006) observa que o descompasso entre a ordem política que divide o território e a efetivamente estabelecida dá ensejo a um municipalismo formal que resulta no tratamento igualitário de municípios que estão em situação completamente diferente. O autor atribuiu como uma das causas para essa incompatibilidade o “municipalismo a todo custo”, marcante na fase de emancipação política desses Entes. Essas considerações podem ser objeto de reflexão em conjunto com a posição de Frey (2000b), que ao referenciar o entendimento Tocquevilliano aponta que a autonomia comunal não é real sem um grau razoável de igualdade.

De qualquer modo, a escassez de recursos de diversas ordens no plano municipal para dar conta das demandas coletivas integra o conjunto de fatores que estimulam esses Entes Subnacionais a formarem parcerias em torno de projetos de interesse comum (GELINSKI; SEIBEL, 2008; IPEA, 2010; NASCIMENTO; FERNANDES, 2015; PITERMAN; REZENDE; HELLER, 2016). Os municípios ao se integrarem e se articularem figuram como “Nós”, voltados ao enfrentamento de deficiências e criados pelo fator necessidade, arrolado por Nascimento e Labiak Jr. (2011) com uma das justificativas da criação de Redes de Cooperação.

Segue-se a isso que dita articulação intermunicipal geradora de parceria público-pública situa-se entre as possibilidades interescalares mencionadas por Monte-Mór (2007) como redefinidora da escala do desenvolvimento local. Descon- figuração de fronteiras faz emergir nova unidade funcional (McGINNIS; OSTROM, 2014), no caso, representada pelo conjunto de municípios.

A base da relação estabelecida no Consórcio Público é a igualdade com preservação da autonomia, de modo a prevalecer a horizontalidade das decisões (ABRUCIO; SANO, 2013). Dita igualdade no âmbito do pacto dos atores públicos permite estabelecer duas configurações do Consórcio Público. A primeira de figura

interorganizacional (SOUZA, 2012; MALMEGRIN, 2014), e a segunda de estrutura de Governança Cooperativa. Mencionada estrutura, derivada da abordagem neointitucio- nalista, é orientada para a regulação dos “comuns”, em nível de horizontalidade, negociação e cooperação (GONZÁLES-CHAVARIA, 2014).

Henrichs e Meza (2017) argumentam que a consolidação da perspectiva cooperativa depende de a interação estar estruturada em transparência, controle, prestação de contas e ética – constructos referenciados por Oliveira e Pisa (2015) como princípios da Governança. Assim, os laços entre Estado e sociedade nascem e se estreitam com os elementos de governança (HENRICHS; MEZA, 2017).

Cabe anotar que o desenho da tragédia dos comuns se ampara em circunstâncias em que as decisões firmadas por atores autônomos em prol da maximização de vantagens próprias são anônimas (OSTROM, 2007). Vale dizer que a aplicação de transparência influencia o trato dos bens comuns.

A caracterização do arranjo nos termos do aporte teórico consta sumarizada no quadro 9.

QUADRO 9 - CARACTERIZAÇÃO DOS CONSÓRCIOS PÚBLICOS MUNICIPAIS

CONSÓRCIO PÚBLICO FONTE

Caracterização

Estrutura de governança cooperativa

Modalidade de integração federativa territorial Rede de Cooperação

Advocacy

Arranjo de ação coletiva

Gonzáles-Chavaria (2014) Lopes (2016)

Malmegrin (2014)

Fillippim e Abrucio, (2016) Nascimento e Fernandes (2015) FONTE: Adaptado do quadro teórico.

Além da estruturação na governança outros elementos seguem citados como fatores que favorecem a sustentabilidade do arranjo, como os sumarizados no quadro 10.

QUADRO 10 - FATORES QUE FAVORECEM A SUSTENTABILIDADE DOS CONSÓRCIOS PÚBLICOS

FATOR FONTE DA INFERÊNCIA

Interação estruturada em princípios de Governança, como

transparência, controle, prestação de contas e ética. Henrichs e Meza (2017) Existência de lideranças ou empreendedores políticos.

Abrucio, Filippim e Dieguez (2013), Abrúcio e Sano (2013), Fillippim e abrucio (2016), Henrichs e Meza (2017), Nascimento e Fernandes (2015) Mecanismos de indução financeira. Abrúcio e Sano (2013), Henrichs e Meza (2017) Mecanismos de indução financeira por transferências

orçamentárias.

Fillippim e Abrucio, (2016), Nascimento e Fernandes (2015)

Henrichs e Meza (2017) apontaram como resultado de estudo de caso envolvendo Consórcio Público Intermunicipal o atendimento privilegiado por entes supralocais de demandas consorciadas em relação àquelas apresentadas isoladamente por município. Tal fato teria decorrido da percepção sobre a maior eficiência e possibilidade de controles relacionados ao apoio financeiro fornecido.

Machado e Andrade (2014) alertam que a ausência de mecanismos institucionais que equalizem o sistema de distribuição de custos e benefícios desse arranjo intermunicipal pode comprometer sua capacidade distributiva e de alavancagem em contexto regional. Os autores argumentam que o interesse comum focalizado pode se restringir ao dos governos envolvidos. Nascimento e Fernandes (2015), em estudo de caso de um Consórcio específico, arguiram que o arranjo se configura como mecanismo de atração de recursos externos e de solução de problema público específico, estando ausente um padrão de interação cooperativo.

De outro lado, a ampliação da cooperação pelo Consórcio Público foi atestada por Abrucio, Filippim e Dieguez (2013) como independente de questões político partidárias, mas ressalvaram os autores que na circunstância relatada o arranjo envolve apenas pequenos municípios. Nascimento e Fernandes (2015) também registram caso em que diferenças partidárias não obstaram o arranjo consorcial em razão do foco na solução do problema específico.

Em estudo de caso envolvendo dois Consórcios Públicos, Nascimento e Fernandes (2015) concluíram sobre a necessidade de amadurecimento de tal modelo de gestão compartilhada, para que o instrumento contribua com o federalismo cooperativo. Muito embora a citada pesquisa se relacione a contexto de região metropolitana e seja amparada na Teoria dos Recursos Comuns, os autores relacionaram elementos fáticos úteis às análises que envolvem agência e estrutura. Ditos elementos estão sumarizados no quadro 11.

QUADRO 11 - ELEMENTOS FÁTICOS INFORMADORES SOBRE CONSÓRCIOS PÚBLICOS MUNICIPAIS

CATEGORIAS CARACTERIZAÇÃO INFERÊNCIAS

Atores Municípios

Assimetria de poder econômico refletida em PIB, receitas próprias e grau de dependência de transferências

intergovernamentais. Padrões de

interação

Decisões centralizadas ou descentralizadas, nível de interação

Município líder; Estado participante; partilha. Regras Regras de uso, aspectos culturais, difusas

ou claras

Estimulam ou desestimulam a cooperação.

Situação de Ação Arena

Assembleias dos Consórcios ou processos decisórios com direito a voto.

Atributos físicos

do município Nível de conurbação Questões regionais.

Atributos da

comunidade Cultura, História

Cultura não colaborativa/

colaborativa; expectativa no papel de Ente Regional ou Federal. FONTE: Adaptado de Nascimento e Fernandes (2015).

De todo o exposto, é possível observar a presença de fatores que induzem ou fomentam a sustentabilidade dos Consórcios Públicos Municipais e a vinculação do arranjo ao desenvolvimento local, regional e sustentável. Cabe, então, ponderar sobre a existência de instituições dessa natureza com capacidade de regular o uso dos comuns (OSTROM, 2009) e enfocar os respectivos mecanismos de indução do arranjo cooperativo, entre os quais se apontam as transferências orçamentárias, objeto de abordagem no contexto do tópico a seguir delineado.