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4 RESULTADOS E DISCUSSÃO

4.3 INFERÊNCIAS OU INTERPRETAÇÃO DOS DADOS

4.3.2 Perspectivas Culturais e Calculadoras no Comportamento Político

Comportamento Político: metas e estratégias

O comportamento político observado no conteúdo enfoca situações de ação de direcionamento de recursos federais por meio de transferências voluntárias operadas por emendas individuais, em que os atores limitadamente racionais podem aderir a estratégias de natureza inclusiva/integrativa, autárquica e individualistas.

A meta voltada a propósitos eleitorais desponta nos docs. 1, 2, 5, caso em que a natureza individualista das estratégias do parlamentar se expressam no personalismo, no pork barrel (docs. 1, 2, 5) e nas articulações firmadas entre prefeitos e congressistas em torno do credit clamiling (docs. 1, 2, 6). As primeiras estão associadas a políticas localistas e distributivistas. As últimas se voltam à vinculação dos políticos aos créditos advindos dos recursos federais ou política pública de investimento local por eles sustentada, com vistas a enfrentar regras do jogo condicionantes, como as associadas à magnitude dos distritos e ao sistema eleitoral proporcional. Ditas estratégias guardam relação com a tendência de que os repasses orçamentários sejam concentrados nos municípios isoladamente considerados (doc. 2), por facilitar a vinculação aos créditos.

O conteúdo específico associa-se à natureza política do orçamento concebida por Giacomoni (2017). Isso porque, segundo o autor, no respectivo processo decisório as questões que atraem mais votos são mais valorizadas. Associa-se, também, ao componente empírico da pesquisa que revela o destaque dos repasses estudados em favor de municípios isolados (tópico 4.1.2).

Desbordaram, ainda, do conteúdo específico segmentos sobre comportamento político direcionado à construção da carreira política (doc. 2) e sobre a expectativa de efeito eleitoral positivo decorrente das transferências de recursos por emendas individuais (docs. 1, 5). Decorre daí o óbice de se ampliarem as conclusões de modo a configurar o comportamento político como de natureza cooperativa. Corrobora essa desvinculação a predisposição dos parlamentares de retribuir os distritos eleitorais com recursos advindos de emendas – confirmada pelo empenho dos congressistas na mudança das regras do jogo, que acrescentou a impositividade na execução das emendas orçamentárias individuais (docs. 1, 2).

Em síntese, verifica-se, a partir do que se extrai do conteúdo específico, que a tendência do comportamento político parlamentar no tocante às emendas orçamen- tárias individuais é de direcionar recursos para redutos eleitorais, seja na perspectiva de retribuir os votos recebidos ou de angariar novos eleitores (pork barrel). Vale-se do prefeito para processar a vinculação dos créditos (credit cremiling) personificados (personalismo) advindos da política pública distributiva implementada, assim visando à suposta garantia de uma maior chance em eleições.

De outro lado, o prefeito, ao tempo em que ocupa o papel relacionado ao credit clamiling em favor do congressista, se associa ao resultado da entrega da política pública de interesse coletivo, evidenciada por corresponder a investimento que refoge às entregas vinculadas a despesas correntes. A destinação de recursos da natureza estudada para investimento encontra amparo em Dallaverde (2016).

Saca-se, pois, a percepção de determinado nível de alinhamento incidente sobre a existência de influência das emendas orçamentárias no comportamento parlamentar, no conteúdo específico e no quadro teórico geral (SILVA, 2017). Isto se observa ainda que em medidas diferentes e mesmo entre os autores que refutam a capacidade desse constructo de influenciar eleições (quadro 17).

Desse modo, prefeito e parlamentar agem de modo racional e instrumen- talmente para maximizar benefícios. Trata-se da perspectiva que Hall e Taylor (2003) denominam de calculadora. Metas coletivas, advindas dos partidos ou das Comissões Orçamentárias, não apresentaram expressividade na modalidade de transferência de recurso estudada, ante a natureza individual (doc. 2). Ou seja, as regras da CMO, que moldariam um comportamento mais cooperativo segundo Souza (2003), não têm tanta influência nas prioridades atinentes às TDVEPI.

Em suma, o comportamento afetado por propósitos eleitorais contraria as feições atribuídas às descentralizações interfederativas por Arretche (2012), qual seja: a de mecanismo de indução institucional e solidariedade territorial. Além disso, a ratificação acerca da expectativa do parlamentar sobre o efeito das emendas individuais no voto, advinda da aprovação da impositividade da transferência operada por essa modalidade (docs. 1, 2), ataca o argumento de Souza (2003) sobre a cooperação nesse âmbito. Esta autora defendeu que o fato de os parlamentares serem os responsáveis pela edição das normas da CMO –

supostamente limitativas do pork borrel – ratificaria o comportamento político cooperativo ao invés de autointeressado.

Não foi possível identificar um conjunto de apontamentos que sustentasse a vinculação de adesões a estratégias de natureza inclusiva ou integrativa no comportamento dos atores no que diz respeito às emendas orçamentárias individuais. Em que pese o exposto, cabe, a título de ponderação, citar fragmentos que cogitaram que o parlamentar pode ter em vista uma determinada política pública específica, e que o partido pode conduzir metas de interesse mais amplo (docs. 1, 5). Logo, preponderam fragmentos que refletem a perspectiva calculadora dos congressistas e prefeitos representada pelo atributo utilitarista focado na personificação dos créditos sobre as políticas públicas no que toca aos repasses enfocados (docs. 1, 2).

Essa perspectiva vai de encontro ao propósito de redução das desigualdades entre entes federativos, atribuído às descentralizações de recursos no âmbito do quadro teórico geral (ARRETCHE, 2012; STN, 2016), que seria reflexo do federalismo cooperativo brasileiro (DALLAVERDE, 2016, MOUTINHO; KNIESS, 2017).

Na unidade de registro Comportamento político atrelada a CPI, históricos de estratégias autárquicas (docs. 7, 8, 10, 12), algumas superadas (docs. 7, 8), e de estratégias inclusivas ou integrativas (docs. 7, 8, 10, 11), marcam o conteúdo da unidade de registro Comportamento dos atores. Estas últimas associam-se a propósitos de cunho regional em vez de local, voltados à melhoria do serviço público e ao compartilhamento de problema comum (docs. 8, 12). Nesses casos, a meta política pode ser atrelada à despersonalização da gestão, nos moldes contidos no doc. 11. A adesão a associações municipalistas que figurem como atores voltados exclusivamente a propósitos de consolidação de alianças e fornecimento de suporte técnico também se apresentou no conteúdo (doc. 10) como estratégia dos atores com natureza inclusiva.

As estratégias autárquicas são definidas a partir de ranços históricos do federalismo brasileiro, associados à competição interfederativa e a conflitos político-partidários (docs. 7, 12), e podem ser expressadas por metas de concentração de poder e interesse político (doc. 12).

Portanto, diferentemente do conteúdo sobre emendas orçamentárias individuais, no dos consórcios, pelo critério da preponderância (docs. 7, 8, 10, 11), as estratégias e metas vinculadas ao comportamento político reverberam cunho cooperativo e regionalizado.

A adesão às estratégias inclusivas, em regra, é pautada por solidariedade, confiança e princípios de boa governança – atributos que qualificam as regras do jogo informais e que, segundo McGinnis e Ostrom (2014), condicionam o comportamento dos atores. Pode-se dizer que os CPIs afetam o comportamento dos atores por diminuírem disputas políticas (docs. 8, 10, 11), ampliarem a confiança (doc. 8), consolidarem uma identidade regional (doc. 7) e restringirem interesses individuais (doc. 7). Contribuem com essa influência os resultados positivos advindos das relações custo-benefício na condução da política pública (docs. 7, 9).

Para se concluir que o comportamento político no âmbito das duas categorias de contexto enfocadas (CPI e TDVEPI) se caracteriza pelo atributo cooperativo, haveria que preponderar motivações associadas ao desenvolvimento regionalizado, à redução de desigualdades territoriais e a estratégias comunitárias, ao invés de individualistas e autárquicas.

Não se identificaram, todavia, elementos suficientes no conteúdo que ensejassem essa generalização, muito embora a força da cooperação esteja expressa no consorciamento. E a respeito, cabe rememorar a lição neoinstitucional de que o entendimento mútuo entre atores pode moldar suas preferências (ANDREWS, 2005). Essa moldagem, embora possa advir do autointeresse, também pode decorrer de causalidades oriundas de fatores de contextos, da história, das ideias (IMMERGUT, 2007), das percepções subjetivas sobre as regras, papéis, identidades e práticas sociais (SOUZA, 2006).

Também não se pode atribuir exclusivamente ao comportamento dos atores as resultantes políticas e sociais (IMMERGUT, 2007), tendo em conta que outros fatores as influenciam. Liderança corresponde a um desses fatores estruturantes, representativo da próxima categoria de análise focalizada.