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Considerações finais da Educação Básica no contexto moçambicano

CAPÍTULO III: EDUCAÇÃO BÁSICA EM MOÇAMBIQUE

3.6. Perspetivas históricas da Educação Básica em Moçambique

3.6.4. Considerações finais da Educação Básica no contexto moçambicano

Como já tivemos a ocasião de referir, ao longo desse capítulo, que a educação básica congrega tudo o que uma pessoa necessita não só para sobreviver, mas também para poder exercer em pleno os seus diversos direitos, como ainda para desenvolver as capacidades de tomar decisões autónomas e, sobre tudo, para poder continuar a estudar de forma autónoma ao longo da vida. No caso de Moçambique, a síntese em torno desse nível de ensino segue a abordagem histórica que já tivemos a oportunidade de apresentar.

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Por motivos históricos, ligadas a colonização, não se pode falar da educação básica em Moçambique sem estabelecer a ligação com a história da presença portuguesa em Moçambique. Nesse ponto de vista, a emergência da escola de massas em Portugal tem sido caraterizada pela precocidade. Nos países precoces a criação visou responder as sucessivas derrotas ou ineficiência de politicas de industrialização ou de tentativa de levar o país a uma posição proeminente no contexto das relações mundiais, (Fernandes, 2011).

Quando se refere da escola de massas, está-se a falar da intervenção do Estado na educação escolar, tornando-a obrigatória, universal, laica e gratuita, envolvendo processos variados de declaração de interesse pelo campo escolar, financiamento, supervisão e definição de currículos.

No período colonial a educação básica oferecida aos moçambicanos era sectária e discriminatória na base da cor da pele, por proporcionar uma educação básica elementar virada para o domínio de trabalhos manuais para a maioria dos negros e uma educação de qualidade para a minoria branca e assimilada. Por causa desse carácter discriminatório, na altura da independência nacional, o índice de analfabetismo atingia mais de 90% da população.

Desde 1930 até à independência de Moçambique em 1975, o sistema educativo colonial foi objeto de várias reformas. Porém, nenhuma delas mudou substancialmente a sua natureza discriminatória. A própria abolição legislativa da distinção entre escola para brancos e escola para pretos de 1964, contemporânea a uma série de outras iniciativas destinadas a melhorar a imagem da colonização portuguesa, quer no interior quer no exterior do país, para contrabalançar a influência ideológica dos movimentos de libertação nacional incipientes e as críticas expressas pelas Nações Unidas, era apenas uma mudança de fachada ou melhor, cosméticas.

A fundação da FRELIMO, o início da luta de libertação nacional e o consequente aparecimento das zonas libertadas a partir de 1965, abriu uma nova página no processo da educação básica ao providenciar o acesso, sem descriminação, à educação básica a maioria das crianças nas zonas libertadas e na Tanzânia. A visão da FRELIMO sobre a educação era de se lhe dar maior importância, porque ela era considerada essencial para o desenvolvimento da luta, visto que o empenhamento e apoio da população aumentava na medida em que crescia a compreensão da situação, em segundo lugar um futuro Moçambique independente teria a necessidade de cidadãos educados que seriam guias na via do desenvolvimento.

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No geral, a falta de recursos materiais e humanos fez com que o grau de ensino providenciado, durante a luta de libertação nacional, não passasse de rudimentar. A necessidade de garantir a autossuficiência alimentar e a autodefesa às escolas fez com que os alunos partilhassem as aulas teóricas com a produção de culturas alimentares e instrução básica militar.

Depois da proclamação da independência nacional em 1975, surgiu a oportunidade para implementação da experiência educativa vivida nas zonas libertadas e na Tanzânia. A educação básica passou a ser um direito para todos os cidadãos moçambicanos. Para a concretização desse objetivo fez-se a nacionalização da educação e alteração dos conteúdos de ensino, com maior destaque para as disciplinas de História e Geografia.

Uma característica fundamental da educação básica nesta fase, foi o aumento significativo dos ingressos escolares, graças ao trabalho de mobilização que criou o maior envolvimento da população na matrícula dos seus filhos e na construção de escolas nos locais onde eram inexistentes.

Para garantir a melhor gestão do sistema educativo e a materialização das decisões do III Congresso da Frelimo foi projetado e implementado o Sistema Nacional de Educação em 1983 que tinha como finalidade a formação do Homem Novo. A escolaridade obrigatória e gratuita foi estendida de 4 para 7 anos. Alguns dos objetivos que nortearam o SNE ficaram ofuscados por causa das diversas insuficiências, a guerra civil e as calamidades naturais.

E, para fazer, face à crise económica que vinha assolando o país, Moçambique aderiu aos fundos do FMI/BM que, para tal, foi obrigatório introduzir algumas reformas que tiveram impacto significativo no sistema educativo porque era necessário adequar o SNE a essa nova conjuntura sociopolítica. Uma das alterações significativas foi a autorização da iniciativa privada para o ensino que antes era o monopólio do Estado. A entrada da iniciativa privada no ensino criou a situação de assimetria educacional, na medida em que a maioria dos alunos continuou a estudar em condições precárias comparando com a minoria pertencente a classe média e alta da sociedade moçambicana que passou a estudar nas escolas privadas que possuem as melhores condições materiais e humanas.

Igualmente, aderência de Moçambique aos fundos do FMI/BM implicou ao país estar em sintonia com os discursos que, a nível mundial, defendem a prioridade de educação básica de

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qualidade para todos. E, naturalmente, diversos organismos mundiais estão virados para apoiar iniciativas que promovam a educação básica de qualidade para todos. Esse fato explica a preocupação da maioria dos países em adequar os currículos as exigências desses organismos doadores.

É nesse sentido que, atualmente, o termo básico pretende sublinhar que não é só com a formação escolar primária que se podem cobrir as necessidades básicas de aprendizagem. Aquilo que se pode considerar de necessidades básicas para um indivíduo estende-se ao longo de toda a vida, por isso, a implementação da educação básica para todos precisaria de reformas educativas mais alargadas que pudessem viabilizar o reforço do papel da família e das comunidades na satisfação das necessidades básicas de aprendizagem.

A reforma que introduziu o novo currículo do ensino básico, em vigor, foi acompanhada pela conotação de relevância do currículo o que traduz na inventariação de elementos culturais, económicos, naturais, sociais que o aluno deve aprender, particularmente no âmbito da implementação do currículo local. O alvo principal, passou a ser a criança, havendo pouco campo para atender as necessidades básicas da juventude e dos adultos.

Por outro lado, os esquemas montados para a formação de professores não equacionaram e nem esgotaram as implicações da viragem da educação para as necessidades básicas. Por constrangimento de tempo e de orçamentos, as ações de formação de professores na base do novo currículo para o ensino básico em Moçambique passaram a ser uma serie de informações sobre as inovações do currículo assim como a distribuição e leitura de alguns documentos considerados instrumentos importantes para o ensino.

As limitações orçamentais fazem com que a educação básica de 7 anos seja encarada como o teto e não como a base, pois, quando se acabou de se desenhar o currículo para o ensino básico, outros níveis, particularmente o secundário, caíram no esquecimento, em termos de pensar o sistema na sua globalidade.

Na realidade, na fase atual, a educação básica, em Moçambique, enfrenta grandes desafios relacionados com o cumprimento integral do artigo 26 da Declaração universal dos direitos do Homem e Cidadão, que defende que “toda a pessoa tem direito à educação. A educação deve ser gratuita, pelo menos a correspondente ao ensino primário fundamental.” “ela deve visar a plena

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expansão da personalidade humana e reforço dos direitos do homem e das liberdade fundamentais e favorecer a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e todos os grupos raciais ou religiosos.

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