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CAPÍTULO II: O CURRÍCULO DO ENSINO BÁSICO EM MOÇAMBIQUE

2.5 Inovações previstas para o plano curricular do Ensino Básico

2.5.5 Promoção Semiautomática ou Progressão normal

A promoção semiautomática está ligada aos ciclos de aprendizagem, trata-se de promoção do aluno por ciclos de aprendizagem, quer dizer, dentro do mesmo ciclo o aluno progride, sem reprovar, e teoricamente está dito que o aluno é acompanhado de modo que resolva os problemas de aprendizagem através da avaliação formativa.

[A promoção por ciclos de aprendizagem assenta], fundamentalmente, numa avaliação predominantemente formativa, onde o processo de ensino-aprendizagem está centrado no aluno, e permite, por um lado, que se obtenha uma imagem o mais fiável possível do desempenho do aluno em termos de competências básicas descritas no currículo e, por outro, o de servir como mecanismo de retro alimentação do processo de ensino aprendizagem. Uma vez assegurada a avaliação formativa, o que significa que se providenciou a recuperação dos alunos com problemas na aprendizagem [assim], existem condições de base para os promover para os estágios seguintes, mesmo que ainda existam algumas dificuldades de percurso.

Excepcionalmente, poderá haver casos de repetência no final de cada ciclo de aprendizagem. No entanto, isso somente acontece, nos casos em que o professor, o Director da Escola e os Pais/Encarregados de Educação cheguem a um consenso de que a criança não atingiu as competências mínimas e, por isso, não beneficiará da progressão para o estágio seguinte. Uma das razões que sustenta a progressão dos alunos é o facto de os resultados mostrarem que os alunos repetentes têm tendência a ter um rendimento baixo relativamente aos não repetentes. Isto pode significar que, em alguns casos, a repetência não melhora significativamente a qualidade de ensino-aprendizagem; pelo contrário, pode provocar bloqueios nos alunos, quer porque a sua faixa etária não condiz com a dos colegas da turma, criando complexos de inferioridade, inibições e até bloqueios cognitivos, quer porque, eventualmente, lhe foi impedida uma progressão. Note-se que é necessário ter em conta que os ritmos de aprendizagem e desenvolvimento são variáveis de pessoa para pessoa, e isto também se deve poder aplicar ao nível da escola, principalmente nos primeiros anos de escolaridade, (INDE/MINED, 2003,pp.28/29).

35Em forma de testemunho deste preceituado, neste momento, Moçambique não está a receber o financiamento do

FMI para o orçamento desde princípios de 2016 o que na verdade está a pôr em causa o cumprimento do plano quinquenal. A interrupção do apoio do orçamento surgiu em consequência das dívidas ocultas contraídas por algumas empresas com o aval do Estado e seguido de uma avaliação negativa do FMI.

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No que se refere a progressão por ciclos de aprendizagem é, efetivamente, possível pelo menos em teoria encarar que em todas as escolas moçambicanas existam condições que garantam a avaliação formativa. Porque na realidade, muitos alunos estudam ao ar livre, nas sombras de árvores, onde não existe carteira e muito menos cadeiras. Quando chover durante uma semana, garantidamente, também será uma semana sem aulas. Nessas circunstâncias, o professor estará preocupado em realizar a avaliação formativa ou tentar cumprir com o programa? Na perspetiva de ser uma classe de exame que é elaborado centralmente e, quando no mesmo saírem conteúdos que os alunos não viram o professor deve prestar contas, mesmo, sabendo-se em que condições os alunos estudam.

Já dissemos também que os alunos do Ensino Básico estudam em turnos com a duração máxima de quatro horas cada. As horas de contato entre o aluno e o professor não são suficientes, o que de certa forma, dificulta o alcance dos objetivos. Na realidade, o professor não dispõe de tempo suficiente para acompanhar a evolução das crianças, não tem como conhecer as particularidades individuais de cada aluno uma vez que as turmas são, geralmente, superlotadas o que, em parte, dificulta a avaliação formativa.

Igualmente, nessas circunstâncias pode-se dar o caso de o professor que, durante as aulas, detete um aluno que precise de um trabalho adicional e, tendo vontade de faze-lo em que local pode trabalhar separadamente com este aluno? Igualmente dissemos que os professores durante a formação são geralmente, submetidos a avaliação sumativa, neste sentido, como os professores seriam capazes de aplicar um modelo de avaliação diferente daquele que conhecem? Por outras palavras e em termos mais genéricos, em Moçambique, neste momento não estão reunidas as condições para se assegurar, mesmo querendo os professores, a avaliação formativa.

Postas as coisas nestes termos, transitemos para a questão de negociação entre o professor, o diretor da escola e os pais ou encarregados de educação. Quanto a este ponto começaremos por observar que, atualmente, em Moçambique o que se valoriza é o certificado, ninguém está muito preocupado em demonstrar as competências para conseguir ser competitivo quer para conseguir um emprego como para mudar de categoria salarial no emprego. Assim, nenhum pai ou

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encarregado de educação vai negociar para o seu filho não progredir, mesmo sem reunir requisitos mínimos.

O outro aspeto que merece um comentário do nosso lado relaciona-se com a visão que defende que, geralmente, os alunos repetentes não melhoram os seus resultados daí a razão de passagens semiautomáticas. Se um aluno não melhora a sua aprendizagem numa determinada classe ao progredir significará que irá melhorar a aprendizagem? Pelo que nos diz respeito, essa foi a pior inovação já vista numa reforma curricular, pois transformou o PEA numa atividade sem valor, já que sabendo como o aluno não progride. É exatamente por este motivo que muitos alunos concluem o Ensino Básico e até o secundário com lacunas de base que perduram por toda a escolarização.

O que é preciso reter de tudo isso é que a progressão por ciclos de aprendizagem, é bastante contestada, na sociedade moçambicana, apesar disso, é politicamente viável porque, em parte, permitiu que muitas crianças moçambicanas tivessem acesso à escola, sem qualidade desejada, pois a transição automática gera a disponibilidade de mais vagas, sabendo se que o país dispõem de poucos recursos financeiros para construir e apetrechar mais escolas. Essa estratégia permite ao governo apresentar relatórios sobre o cumprimento das metas desenhadas para o ensino primário no que toca ao acesso a educação básica universal.