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CAPÍTULO I: O CURRÍCULO

1.3 Teorias curriculares

1.3.4 Teorias curriculares pós-criticas

São vários autores que defendem que a teoria crítica, no quadro dos fundamentos que sustenta, racionalidade hermenêutica e pensamento dialético, não dá conta de toda a complexidade da realidade social, tendo em conta a multiplicidade de mudanças políticas, culturais, sociais e económicas que caracterizam a passagem para a pós-modernidade, (Fernandes, 2011). Estamos perante uma posição que não contraria a teoria crítica, mas a amplia incorporando novas significações, fomentadas a partir do diálogo com as múltiplas vozes em presença.

Para Giddens (1996,p.32) o pós-modernismo refere se “a estilos e movimentos no âmbito da literatura, da pintura, das artes plásticas e da arquitetura”. Enquanto Silva para (2000 b) o pós- modernismo é um movimento intelectual que questiona os princípios e pressupostos do pensamento social e político desenvolvido a partir do iluminismo.

Segundo Hall (1997,p.23) “foi nos anos de 1960, com o trabalho de Levi-Strauss e Barthes na França e de Williams e Hoggart no Reino Unido que a viragem cultural começou a ter impacto maior na vida intelectual e académica”. Continuando, o autor em referência acrescenta que concedeu-se a cultura o valor e o peso explicativo que não tinha antes. Passou-se a ver a cultura como uma condição constitutiva da vida social, o que provoca a mudança de paradigma nas ciências sociais e nas humanidades que passou a ser conhecida por viragem cultural.

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Lopes (2005,p. 53) defende que “nessa fase verifica-se a maior procura de estudos culturais por parte dos estudantes no Reino Unido e a nível internacional, onde o centro de estudos culturais

de Birmingham22 constitui o modelo fundador de estudos culturais”.

Canclini (2000) defende que estava em jogo a necessidade de se desenvolver a hibridação, um trabalho especificamente intercultural, de reconhecimento da diversidade cultural e da afirmação de solidariedade entre países e culturas. A crítica aos estudos e a teoria crítica era feita no sentido desfazer desaparecer a força das contradições e lutas sociais: lutas sociais, reivindicações étnicas, lutas de mulheres pela igualdade.

As teorias pós-críticas são domínios que têm sido influenciados pela filosofia de diferença, pelo

pós-estruturalismo, pós-modernismo23, pela teoria queer e pelos estudos feministas e de género.

Elas salientam a ideia de que o papel formativo do currículo não pode ser compreendido sem uma análise das relações de poder. O mapa de poder é ampliado para incluir processos de dominação centrados na raça, na etnia, no género e na sexualidade.

Nas abordagens pós-críticas há um desvio do sujeito para práticas discursivas e não discursiva. Neste contexto, Santos (1999, p.328) defende que “não há uma única forma de conhecimento valido, mas tantas formas de conhecimento”, daí a necessidade de conhecer as diferentes formas de conhecimento sob pena de deslegitimar as práticas sociais que as sustentam, neste sentido, promover a exclusão social. Paraíso (2004, p.286) refere que as pesquisas pós-críticas rejeitam explicações universais e visões totalitárias.

Na realidade, a plataforma concetual e epistemológica das teorias pós-críticas têm como foco a diferença cultural, na qual destacam as categorias de sexo, etnia, raça, sexualidade, diferença, cultura. Essas teorias não ignoram a produção das teorias críticas, mas integram e aprofundam no quadro de novos cenários sociais e culturais decorrentes das transformações ocorridas na sociedade contemporânea enquadradas no fenómeno de globalização

22A universidade Birmingham surgiu depois da II guerra mundial, com o objectivo de democratizar o ensino. Na

perspectiva de democratizar estruturas, modificar requisitos, criar mais espaços para trabalhar com mais liberdade. Um dos pontos que esteve na origem dos estudos culturais foi a questão da cultura popular, (Lopes, 2005).

23O pós-modernismo assinala o fim da pedagogia crítica e o começo da pedagogia pós-critica. Isso se associa aos

programas de militância política dos anos 70, a nova esquerda, o marxismo althusseriano, o neogramsciano, a teoria feminista e o movimento das mulheres, o movimento de direitos civis, (Fernandes, 2011).

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Em síntese, a definição do currículo jamais deixará de questionar-se à luz das diferentes perspetivas que se interligam e complementam. As teorias propostas não só se distanciam como também se antagonizam e incompatibilizam.

A construção do currículo a partir da prática é uma segunda formulação, menos formalizada da teorização curricular, já que partilha que os professores devem participar ativamente na tomada de decisões educativas. A diversidade dos argumentos e a excessiva teorização para a resolução de questões que são por natureza práticas e que são parte constitutiva de um projeto de formação explica a complexidade das questões curriculares.

A organização das aprendizagens dos alunos faz-se em função de um projeto cultural; um projeto cultural ocorre no contexto de determinadas condições políticas, administrativas e institucionais e o currículo não tem valor se não em função das condições reais em que se desenvolve.

Kemmis (1998) diz que enquanto a teoria prática se preocupou com a formulação de respostas à questão curricular central: qual é o papel da educação na sociedade? A teoria técnica contentou- se em proporcionar respostas as questões de menor entidade a cerca da construção do currículo nos sistemas educativos estatais. A teoria crítica tratou de conciliar esses dois tipos de temas: as relações entre a educação e a sociedade. Aprofundando sobre a teoria crítica ele diz que não deixa a elaboração teórica do currículo em mãos de experts estranhos à escola e nem a restringe ao trabalho dos professores individualmente, mas oferece formas de trabalho cooperativo nas quais professores e outros agentes podem começar a apresentar visões críticas da educação.

Em relação as teorias acima apresentadas pode se dizer que as tradicionais: pretendem ser neutras, científicas, desinteressadas. Ao aceitarem o stus quo, os conhecimentos e saberes dominantes, acabam por se concentrarem em questões técnicas. Elas procuram responder a questão, o que? Elas preocupam-se com a questão da organização. (Enfatizam: ensino, aprendizagem, avaliação, metodologia, didática, organização, planeamento, eficiência e objetivos).Enquanto as críticas e pós-críticas, em contraste, argumentam que nenhuma teoria é neutra, científica ou desinteressada, mas que está implicada nas relações de poder. Elas se submetem um constante questionamento, sua questão seria: por que? Estão preocupadas com as conexões entre saber, identidade e poder. Elas enfatizam conceitos de ideologia e poder

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permitindo ver a educação numa outra perspetiva. (Produção cultural e social do poder, emancipação e libertação, currículo oculto, resistência).