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Constituição de uma classe de especialistas em matemática

2. A Quaestio no século XIV-XV

2.1. A escola de Paris

2.3.2. Constituição de uma classe de especialistas em matemática

De entre os vários factores apontados como fundamentais para a construção de uma conjuntura permeável à colocação do problema, sua discussão em profundidade, divulgação e constituição como pilar da cultura científica moderna, um dos mais notáveis é a formação de uma enorme comunidade de especialistas em matemática, superlativa em qualidade e concentrada geográfica e cronologicamente. A criação desta imensa comunidade permitiu a constituição de massa crítica para sustentar com força social um dos lados do debate208.

206 Livesey 1986, 68-69 e n. 58. 207 Veja-se Randall 1961, 22-23.

A partir do século XV, a matemática começa aos poucos a ser considerada um ramo do conhecimento independente e não apenas complementar, ganha autonomia nas Universidades e importância nas Academias. Progressivamente aumenta o número de cátedras que lhe estão associadas. O seu ensino passa a ser assegurado por docentes em exclusividade, com estatuto e autoridade suficientes para, como que por propriedade transitiva, assegurar vitalidade ao ramo de ensino que professavam.

As listas dos docentes de matemática nas universidades italianas são impressionantes e mostram bem o crescimento exponencial dos profissionais da matemática. Além disso, atestam a sua qualidade.

- em Ferrara estão listados 22 nomes que leccionaram matemática entre 1449 e 1625, entre os quais estão Georg Puerbach (1450-?), Regiomontanus (1460-?), Domenico Maria di Novara, Torquato Tasso. Entre os tópicos abordados contam-se a astrologia (em exclusividade ou em conjunto com filosofia), cosmografia, esfera e Euclides, hidrostática;

- em Florença há 7 nomes (1368-1522), entre os quais Luca Pacioli (1500-1503), que leccionou sobre Euclides. Outros tópicos abordados foram a astrologia, aritmética, geometria, esfera;

- Nápoles conta 6 docentes de matemática entre 1465 e 1651, entre eles novamente Luca Pacioli, que ensinou aritmética em 1490-1491. Interessante na universidade de Nápoles a ligação estabelecida entre a teoria da ciência e ciência matemática, materializada na criação de uma cátedra, depois de 1491, intitulada “logica posteriore e geometria” e a interrupção do ensino da matemática entre 1533 e 1606, anos em que o debate sobre a certeza das matemáticas se extremou, excepção feita a um curso de cosmografia e lógica em 1581;

- Pádua possui 29 docentes de matemática entre 1307 e 1657, entre os quais Pietro d’Abano, Biagio Pelacani, Puerbach, Regiomontanus, Federico Delfino, Pietro Catena, Francesco Barozzi (adjunto, sem ordenado), Giuseppe Moletti, Galileo Galilei.

- em Pavia conhecem-se 13 nomes no período 1274-1485, entre eles os já referidos Biagio Pelacani (1404-1407) e Iohannes de Marliano;

- Perugia conhece 27 nomes entre 1407 e 1633, incluindo Luca Pacioli, que ensinou aritmética entre 1477-1480 e 1486-1511;

- conhecem-se 9 nomes em Pisa entre 1543 (criação da cátedra de matemática) e 1624, incluindo Galileo Galilei;

- em Roma, finalmente, contam-se 19 nomes entre 1489 e 1621, incluindo Luca Pacioli e Luca Valerio209.

De salientar a alta rotatividade dos docentes pelas diversas universidades italianas, que facilitava divulgação de ideias e criação de uma cultura universitária comum.

Esta comunidade de matemáticos, notável pela sua superior competência, empenhou-se com grande ênfase na divulgação da disciplina e na defesa da sua superioridade científica. A luta pelo estatuto epistemológico da disciplina anda a par, portanto, com a defesa do estatuto social dos seus praticantes e com a emergência de uma nova classe de profissionais que necessitam de legitimação. Ora, o que não é demais realçar é a opção por uma nova estratégia para a promoção da matemática que os seus praticantes adoptam. Ao invés de entrarem no campo dos filósofos e defenderem a matemática no comentário a obras de Aristóteles, a nova classe emergente alicerça-se na prática dos matemáticos antigos e constrói uma defesa da disciplina na introdução às obras de carácter técnico que produzem e aos cursos que leccionam. Estes prólogos matemáticos referem-se invariavelmente aos tópicos da utilidade e certeza da disciplina, não poucas vezes acrescentando uma breve história da disciplina e recorrendo a artifícios retóricos mais que epistemológicos. Argumentos sobre demonstração e cientificidade raramente ultrapassam um par de parágrafos, mas mostram-se extraordinariamente eficazes.

É desta forma que o já referido Luca Pacioli reclama a superioridade da matemática na introdução ao seu De divina proportione, publicado em 1509. A sua opinião é que as matemáticas constituem o fundamento de qualquer outra ciência e possuem o primeiro grau de certeza, tese que baseia no já referido passo do livro segundo da Metafísica de Aristóteles. Luca Pacioli apela igualmente ao conhecido passo

209 As listas de professores de matemática das universidades italianas têm sido construídas em inúmeros

estudos e são tão extensas que seria moroso, além de redundante apresentá-las aqui; remetemos por isso para Biagioli 1989, 91-95, que as elabora com base em literatura secundária. As listagens de Biagioli possuem dois caueat. O primeiro é este: “These lists have been drawn mostly from secondary sources. Only in a few instances have I had access to partial reproductions of actual rotuli. Incongruences among different sources dealing with the same institutions have not been uncommon. Although the interpolation of various sources has made these chronologies generally reliable, they should not be treated as documentary evidence”. Ainda assim utilizo as listas, porque o panorama que pretendo apresentar é geral e genérico, e a realidade não pode andar muito longe daquela que se tira do referido estudo. O segundo senão é não possuir este estudo de M. Biagioli a lista da universidade de Bolonha, visto que esta se pode encontrar em U. Dallari, I rotuli dei lettori legisti e artisti dello studio bolognese dal 1384 al 1799, Bologna, 1888-1924. A situação de Bolonha é diferente da das outras universidades italianas porque possuia diversas cátedras de matemática, sendo a disciplina leccionada, por vezes, por quatro docentes em simultâneo.

da Escritura em que se afirma ser tudo constituído por peso, conta e medida, para sustentar a tese de que a matemática está imbuída no mundo210.

Outro exemplo famoso é o de Regiomontano que, em Abril de 1464, iniciou um curso sobre o De scientia stellarum (uma breve introdução à astronomia escrita por Al- Farghani no século IX e traduzida para Latim no século XII). Das lições não resta qualquer registo, mas o mesmo não se pode dizer da oração inaugural do curso, que despertou um interesse que hoje podemos compreender e que foi impressa em duas edições quinhentistas211. Das duas partes em que se divide, a primeira versa sobre os principais ramos da matemática, respectiva história, inventores, circunstâncias da sua descoberta e principais autores, cumprindo um aspecto importante do humanismo emergente que consiste na apresentação de textos recém-descobertos212. A segunda parte é substancialmente mais relevante, pois nela Regiomontano pretende ver reconhecido o valor científico da matemática, colocando-a em pé de igualdade com os estudos humanísticos, se não mesmo considerando que os ultrapassa em dignidade.

Da sua exposição, quatro pontos merecem destaque e são de reter. Em primeiro lugar, a abordagem do tópico da utilidade da matemática, onde vincula a capacidade de

210 “Conciosia che dicte mathematici seinno fondamento e scala de peruenire a la notitia de ciascun altra

scientia per esser loro nel primo grado de la certeza affermandolo el philosopho cosi dicendo. Methematice enin scientie sunt in primo gradu certitudinis et naturales sequuntur eas. Sonno commo edicto le scientie e mathematici discipline nel primo gradu de la certezza e loro sequitano tutte le naturali. E senza lor notitia fia impossibile alcunaltra bene intendere e nella sapientia ancora e scropto, quod omnia consistunt in numero pondere et mensura cioe che tutto cio che per lo vniuerso inferiore e superiore si squaterna quello de necessita al numero peso e mensura fia soctoposto. E in queste tre cose Aurelio Augustino in de ciuitate dei dice el summo opefici summamente esser laudato perche in quelle fecit stare ea quae non erant”. A citação está traduzida em Hoyrup 1992, 87, que se baseia na edição de Constantin Witenberg, Fra Luca Pacioli, Diuina proportione. Die Lehere vom goldenen Schnitt. Nach der

Venezianishen Ausgabe von Jahre 1509 neu herausgegeben, übersetzt und erlaütert, Wien, Carl Grasser,

1896. Não pude consultar esta edição, mas confrontei o texto com a edição original, existente na BNP (Res. 1537 V; veja-se Leitão 2004b, entrada 539 e Pacioli 1509). O provérbio bíblico, leit motiv na renascença, é do Livro da Sabedoria (11, 21).

211 A oração é publicada com o título Oratio Iohannis de Monteregio, habita Patauij in praelectione

Alfragani em Joh. Petreius, Rudimenta astronomica Alfragrani (sic) item Albategnius peritissimus de motu stellarum, Nuremberga, 1537 (veja-se Regiomontano 1537), e depois reimpressa com algumas

alterações por Erasmus Reinhold (Wittemberg, 1549). Podem encontrar-se notas bibliográficas abundantes sobre a oração de Regiomontano em Swerdlow 1993, 166-8 e em Rose 1975, 90-118. As datas de cada uma das reimpressões mencionadas (1537 e 1549) são muitíssimo relevantes e denotam específica intencionalidade: o Commentarium de Certitudine mathematicarum de A. Piccolomini, a que me referirei mais abaixo, é publicado em 1547 (veja-se Piccolomini 1547) e a oração, pronunciada por um matemático que toda a gente reconhecia como exímio intelectual perdendo o primeiro lugar apenas para Ptolomeu, aparece como recuperada em época de discussão acalorada. A análise da oratio e a indicação de outras obras onde o tópico é abordado está em Rose 1975, 95-97, Swerdlow 1993 e Byrne 2006.

212 A assistência conhecia os nomes de Arquimedes, Apolónio ou Diofanto, mencionados por

Regiomontano, mas entre os presentes na leitura da sua oração, com certeza ninguém conheceria o conteúdo das suas obras melhor que ele. É provável que a ideia de fazer uma resenha histórica da matemática e da astronomia viesse da introdução de Platão de Tívoli à tradução que fez de Albategnio presente na mesma edição impressa de 1537.

compreender e a competência em qualquer ramo do saber ao conhecimento prévio daquela ciência213. Em segundo lugar a defesa genérica da superioridade da matemática, que consiste na estabilidade dos seus resultados e na certeza das suas conclusões, em claro contraste com a incerteza característica da física, que deriva do carácter instável das propriedades da matéria, e da teologia ou metafísica, que assenta em abstracções invisíveis. Não se pode deixar de frisar este aspecto fundamental, pois constitui uma das principais mensagens da oratio: a matemática apresenta conclusões imutáveis, estáveis e certas, constituindo-se como saber superior à filosofia, caracterizada, pelo contrário, como uma massa de opiniões divergentes214. O terceiro ponto a reter é a constatação de

uma necessária ligação entre o estudo matemático e o estudo de Aristóteles. Por um lado, uma correcta hermenêutica do corpus aristotélico implica conhecimentos de matemática, sem a qual não se podem compreender inúmeros passos da Meteorologia,

Física, Metafísica ou o De Caelo; por outro lado, é o próprio Aristóteles quem atribui o

primeiro grau de certeza às ciências matemáticas e que considera que só quem estudar esta disciplina em profundidade poderá ser considerado sábio215.

213 Regiomontano 1537, B4r-v: “Cui per Deum immortalem haec dignissima studia non modo non

existunt utilia? uerumetiam in parte necessaria, nam in primis omitto Moechanicos omnes atque fabros, quos Geometria plurimum dirigeret, si praecepta eius acceepissent, siue aedificia constituere, siue aquas abducere, siue pondera transmouere tentauerint, memorare possem quotiens fornices templorum noui admodum ignauia architectorum corruerint, dum figuram ineptam assument, quod Venetiis nuper Monachi nonnulli obrupti sunt, turri quadam cadente ruditati opificis eam erigere tonantis imputatum est”. Seguem-se outros exemplos de artes e ciências para as quais a matemática é útil.

214 Regiomontano 1537, B4v-B5r: “Parum id obsecro tibi uidetur, quod in primo gradu certitudinis

disciplinas nostras collocarit [Aristoteles]? solum eum scientem arbitratus, qui eas docte consecutus est. Cui etiam Plotinus quidam Academicus alludens, utinam inquit omnia essent disciplinalia, adeo coepit eum facietas caeterarum artium, quae profecto non nisi diuersarum opinionum congeries aestimari possunt. Quis enim Anaxagorae aut Democrito uel aliis de substantia animae disserentibus non adhaesisset prius quam secta Peripateticorum inoleret: Nonne sequaces Aristotelis plurima scripta sua impudentius satis cum periculo hodie lacerant? incerti, uolueritne dicere de nominibus an potius de rebus. Quot ramos inter se et a stipite suo diuersos haec secta produxit? Pars Ioannem Scotum imitatur: alii sanctum Thomam: nonnulli autem ingenio promiscuo hac atque illac defluunt. Scotistas se pronuntiant victos, ubi uero liberam dicendi sententiam locus datur ad Thomam revertuntur. Igitur quo plures philosophia duces habet, eo minus hac nostra tempestate addiscitur. Princeps interea philosophorum prorsus destituitur, nomenque suum is sibi usurpat, qui in sophismatibus plus caeteris ualet, neque Aristoteles ipse si reuiuisceret discipulos suos atque sequaces satis intelligere crederetur. Quod de nostris disciplinis nemo nisi insanus praedicare ausit, quandoquidem neque aetas neque hominum mores sibi quicquam detrahere possunt. Theoremata Euclidis eandem hodie quam ante mille annos habent certitudinem. Inuenta Archimedis post mille secula uenturis hominibus non minorem inducent admirationem, quam legentibus nobis iucunditatem”.

215 Regiomontano 1537, B4v: “Nunquid nescitis quam crebro Mathematicis utitur exemplis Peripateticus

ille philosophus? cuncta ferme scripta sua mathesim redolent, quasi nemo Aristoteli intelligendo censeatur idoneus, qui liberale quadriuium neglexerit. Frustra tertio meteororum discendo te contuleris, nisi Geometrica fundamenta nactus his, aut docte perspectiuam teneas. Secundum et tertium de coelo & mundo nunquam intelliges, si Astrorum disciplinam socordia praeterieris. Qui septimum Physicorum absque notitia proportionum discere possit, arbitror esse neminem. Nonne arduum uidebatur Aristoteli in duodecimo metaphysicae suae naturam intelligentiarum coelestium demonstrare, inde adeo quod Astronomiae haud satis studuerit?”.

É claro que Regiomontano se baseia em Ptolomeu para esta sua aparentemente polémica proposta de revisão do estatuto dos saberes. A oratio não cita expressamente o nome do astrónomo máximo da antiguidade, mas Regiomontano possuía profundo conhecimento da sua obra e não podia deixar de conhecer o passo em questão. Pelo contrário, no epítome que Puerbach iniciara e que ele próprio se encarregara de concluir, um prefácio programático e epistemologicamente tão relevante não podia deixar de estar presente216.

Ao observar em Regiomontano competência matemática fora do comum, conhecimento de textos antigos vedados a outros e uma sensibilidade epistemológica que o aproximam da mentalidade moderna; além disso, ao querer marcar em Regiomontano o início do renascimento matemático sobre que nos debruçamos; por outro lado ainda, sem conhecimento de outros autores a quem se pudesse atribuir pensamento aproximado ao que encontramos formulado na oratio, N. M. Swerdlow, acaba por considerar o astrónomo natural de Königsberg um homem à frente do seu tempo e deslocado da mentalidade medieval217. Mas a verdade é que Regiomontano

216 Regiomontano 1550 (no Praefatio; o itálico é meu e realça o trecho mais importante): “[...] Etenim

ipsam speculationem Aristoteles decenter certe in tria prima genera diuidit, Naturale, scilicet Mathematicum et Theologicum. Cum enim omnia entia ex materia et forma et motu consistant. quorum unumquodque uideri quidem seorsum non potest, sed solum intelligi absque ceteris. Primam quidem motus uniuersi causam Deum ipsum inuisibilem atque immobilem recte quis putauit, eiusque inuestigationem scientiam Theologicam merito nominabit, cuius operationem sursum circa sublimiora mundi esse ponet omnino semotam a substantia sensibilium. Quod uero materialem et semper motam qualitatem inuestigat, circaque album et calidum, dulce et molle, et huiusmodi uersatur, naturale utique appellabit, quod inter corruptibilia ut plurimum et sub orbe lunari reperitur. Id autem quod species motusque locales qualitatis manifestat, figuram ac quantitatem, tum discretam tum continuam, Item locum et tempus et similia quaerit, Mathematicum iuste appellabit. Quod uero inter duo praedicta locum habet, non solum quoniam et per sensum et absque sensu percipi potest, sed etiam quoniam omnibus simpliciter entibus accidit, tum mortalibus tum immortalibus. Nam illis quae semper mutantur,

communicatur secundum motum localem, aeternis uero secundum immobilitatem atque immutabilitatem formae suae. Quo fit ut alia duo speculationis genera coniecturam potius quam scientiam aliquis nominabit, Theologiam quidem propter eius nimiam obscuritatem et incomprehensibilitatem, Naturalem quidem propter continuum et incertum materiae fluxum, propter quod neque speculari quis possit Philosophos de ea concordes esse futuros. Solam autem Mathematicam signis attentis accedendo ad eam, certam et indelebilem scientiam studiosis suis generare confitebitur. Siquidem eius probationes per certissimam Arithmeticae, Geometriaeque scientiam fiant. Ob quas res nos etiam compulsi sumus, quod

adfieri possit, omnem quidem speculationem, sed eam praecipue quae circa diuina coelestiaque uersatur exercere, tanquam illa sola sit, quae circa ea, quae semper et eodem modo se habeant, consideret, et ideo possibilis sit, primo quidem in sui ipsius compraehensione, cum nihil obscurum, nihil inordinatum ibi sit, semperque et eodem modo se habeat, quod proprium est scientiae. Deinde etiam ad aliarum intelligentiam non minus quam ipsimet cooperetur. Nam et ad Theologicam scientiam haec maxime nos ducit, cum sola possit recte considerare immobilem et inseparabilem substantiam ab earum uicinitate, quae sensibilibus quidem mouentibus ac motis, aeternis uero et impassilibus substantiis accidant, tum circa rationes, tum circa ordines motuum. Necnon etiam ad naturalem non modicum confert [...]”.

217 Swerdlow 1993, 133: “Further, it is evident, both from the oration and from Regiomontanus’s other

writings, that his appreciation of the mathematical sciences was profound in a way far beyond that of his contemporaries, in a way that one associates more with the late sixteenth and early seventeenth centuries - Viète and Fermat, Galileo and Kepler come to mind - and I would not hesitate to say that he was the first

mais não faz que tomar a palavra num debate há muito constituído e no qual já antes se haviam posicionado defensores e detractores da matemática218.

Esta estratégia de defesa da matemática tornar-se-á comum no futuro. O mesmo tipo de elogio encontra-se em introduções e orações inaugurais de cursos ou obras publicadas de Tycho Brahe, Pedro Ramo, John Dee, Henry Saville, Pietro Catena, Cardano ou Maurolico, só para citar alguns nomes219.

European to display, although within the limitations of his more restricted knowledge, the intellectual and aesthetic sensibility of modern mathematics”; ibid., 137-8: “It may not be entirely impertinent to remark here that to my perception, the Renaissance must be taken as a distinct period in the history of science with its own caracteristics, closely related to the humanism and scholarship of the age, and differing as much from the middle ages as from the more recent period conventionally, and correctly, called the Scientific Revolution.I believe this is evident in the oration, and is in fact the only way to make sense of the oration, that is, a characteristic humanist oration in praise of learning belonging as much to its age as an oration in praise of poetry or eloquence or the “good arts”. And as such, it appears to have no predecessors, at least no surviving predecessors, in the history of science. Something like it could have been written a century later by Maurolico or Commandino [...]. But it could never have been written a century earlier by a scholman, before the recovery of ancient science, in its own language and before the recovery of ancient eloquence, both the accomplishment of humanists”. Esta interpretação apresenta uma dificuldade, que Swerdlow aponta, mas descarta com ironia em ibid., 149-150: “Such repudiations of scholasticism [Swerdlow refere-se ao já referido contraste estabelecido por Regiomontano entre matemática e filosofia] became common enough in the sixteenth century, and are probably best known in various writings of Bacon, but Regiomontanus, here doubtless showing his humanist inclinations, is the earliest example I have discovered, and what is most important for our purpose, he puts the mathematical sciences in their place as the highest and, even after a thousand centuries, the most imperishable study. Ptolemy would have agreed and so too would Galileo, but one wonders what Regiomontanus’s listeners,

some of them certainly scholastically educated, made of it” (o itálico é meu).

218 A posição de James Steven Byrne é mais equilibrada, sem, contudo, negar o ponto essencial de

Swerdlow: “while the oration is styllistically consistent with humanist norms, the vision of mathematics presented in it is also deeply grounded in the university mathematical curriculum and in Regiomontanus’s own reading of mathematical texts” (Byrne 2006, 42). Acrescento apenas que, entre as leituras de Regiomontano que Byrne enuncia, parecem dever constar igualmente os textos sobre epistemologia da matemática então em voga.

219 À semelhança de Regiomontano, também Maurolico se baseia em Ptolomeu para salientar o carácter

superior da matemática: “De scientiarum diuisione [...] Praeterea Scientia praecedit Scientiam quinque