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O conteúdo mínimo legal exigido pelo Estatuto da Cidade e pela Lei Orgânica Municipal de Salvador para a elaboração/

revisão de Plano Diretor

O legislador pátrio tornou clara a exigência de que os planos diretores te- nham um conteúdo mínimo, através da dicção dos arts. 42 e 42-A do Estatuto da Cidade. O primeiro estabelece o conteúdo mínimo de todo e qualquer Plano Diretor. O segundo adiciona outras exigências para as cidades que in- tegram o cadastro nacional de municípios com áreas suscetíveis à ocorrên- cia de deslizamentos de grande impacto, inundações bruscas ou processos geológicos ou hidrológicos correlatos – no qual Salvador se insere em virtude dos deslizamentos.

Importante registrar, neste ponto, que a Lei Orgânica de Salvador também baliza o procedimento de elaboração/revisão do Plano Diretor, robustecendo as exigências já contidas no Estatuto da Cidade, sendo imprescindível, por- tanto, operar-se uma análise conjunta destas legislações.

Primeiro, trazemos dispositivos da Lei Orgânica de Salvador:

Art. 74:

A elaboração do Plano Diretor, bem como sua revisão, atualização, complementação e ajustamento o são da iniciativa e atribuição do Executivo, por intermédio de seus órgãos de planejamento, e dele de- verá constar, como conteúdo básico:

I – análise e diagnóstico dos sistemas urbanos do município; II – projeções relativas à demanda real de equipamentos, infraes- trutura, serviços urbanos e atividades econômicas em geral para os horizontes estudados;

III – diretrizes relativas à estrutura urbana, uso e ocupação do solo, zoneamento, áreas de interesse social e especial infraestrutura urba- na, além das diretrizes socioeconômicas, financeiras e administrati- vas. (SALVADOR, 2014)

E, agora, colacionamos a clara e determinante redação dos arts. 42 e 42-A do Estatuto da Cidade:

Art. 42. O Plano Diretor deverá conter no mínimo:

I – a delimitação das áreas urbanas onde poderá ser aplicado o par- celamento, edificação ou utilização compulsórios, considerando a

existência de infraestrutura e de demanda para utilização, na forma do art. 5o desta Lei;

II – disposições requeridas pelos arts. 25, 28, 29, 32 e 35 desta Lei; III – sistema de acompanhamento e controle.

Art. 42-A. Além do conteúdo previsto no art. 42, o Plano Diretor dos Municípios incluídos no cadastro nacional de municípios com áreas suscetíveis à ocorrência de deslizamentos de grande impacto, inun- dações bruscas ou processos geológicos ou hidrológicos correlatos deverá conter:

I – parâmetros de parcelamento, uso e ocupação do solo, de modo a promover a diversidade de usos e a contribuir para a geração de emprego e renda;

II – mapeamento contendo as áreas suscetíveis à ocorrência de desli- zamentos de grande impacto, inundações bruscas ou processos geo- lógicos ou hidrológicos correlatos;

III – planejamento de ações de intervenção preventiva e realocação de população de áreas de risco de desastre;

IV – medidas de drenagem urbana necessárias à prevenção e à miti- gação de impactos de desastres;

V – diretrizes para a regularização fundiária de assentamentos urba- nos irregulares, se houver, observadas a Lei no 11.977, de 7 de julho de 2009, e demais normas federais e estaduais pertinentes, e previ- são de áreas para habitação de interesse social por meio da demarca- ção de zonas especiais de interesse social e de outros instrumentos de política urbana, onde o uso habitacional for permitido.

VI – identificação e diretrizes para a preservação e ocupação das áreas verdes municipais, quando for o caso, com vistas à redução da impermeabilização das cidades. (BRASIL, 2001)

O conteúdo mínimo previsto pelo Estatuto da Cidade é regra de direito obrigatória para os gestores municipais. Faz parte do dever-poder de pro- mover a função social das cidades, e jamais pode se entender como mera faculdade, sob pena de esvaziamento do mencionado princípio. Mais do que isso, sob pena de esvaziamento de todo o Capítulo da Política Urbana previsto na Constituição, e de todas as diretrizes impostas pelo art. 2º do

Estatuto da Cidade.

Neste ponto, pedimos licença para reproduzir, em sua extensão, os ensi- namentos de Nelson Saule Junior (ESTATUTO DA CIDADE, 2002, p. 282-283) sobre o conteúdo mínimo de um Plano Diretor previsto na legislação e sua obrigatoriedade, dada a clareza da redação desse doutrinador pátrio:

A questão fundamental sobre o conteúdo do Plano Diretor é se o conteúdo mínimo previsto no artigo 42 é obrigatório para os mu- nicípios que têm a obrigação de ter um Plano Diretor como os com mais de vinte mil habitantes ou se é uma mera faculdade. Isto é, os Municípios com mais de vinte mil habitantes deverão ou poderão aplicar os instrumentos previstos no artigo 42.

A leitura literal do §4º do artigo 182 da Constituição Federal impli- ca em responder que é apenas facultativo para o Município aplicar estes instrumentos. Porém, se for feita uma leitura abrangente da Constituição Federal e do Estatuto da Cidade, verifica-se que esta fa- culdade se torna uma obrigatoriedade em razão de o Município ser o principal responsável pela promoção da política urbana e do Plano Diretor ter como principal objetivo o estabelecimento das exigências fundamentais de ordenação da cidade para a propriedade urbana cumprir a sua função social.

O Município, que tem a obrigação de ter um Plano Diretor e tem áreas urbanas que não estão cumprindo uma função social, tem a obriga- ção de identificar e delimitar estas áreas do plano como dispõe o ar- tigo 42 do Estatuto da Cidade.

Como o Município atenderá às diretrizes da política urbana estabe- lecidas no artigo 2º do Estatuto da Cidade como referentes à ordena- ção de uso e controle do solo destinadas a evitar o parcelamento do solo, a edificação ou o uso excessivos ou inadequados em relação à infraestrutura urbana; bem como a retenção especulativa de imóvel urbano, que resulte na sua subutilização ou não utilização sem o em- prego dos instrumentos indutores da política urbana?

A nossa conclusão é que o Município somente executará uma polí- tica urbana que assegure o pleno desenvolvimento das funções so- ciais da cidade e da função social da propriedade a partir do Plano Diretor, se forem definidas as áreas que não atendem à função so- cial da propriedade.

Dessa forma, a delimitação destas áreas urbanas, nos termos do in- ciso I do artigo 42 do Estatuto da Cidade, é conteúdo obrigatório do Plano Diretor. Portanto, o Município, nas hipóteses mencionadas tem a obrigação e não a mera faculdade de utilizar os instrumentos voltados a assegurar que a propriedade urbana atenda à sua função social, sendo portanto uma regra vinculante e não discricionária para o Município. (SAULE JUNIOR, 2002, p. 282-283)

Negar a obrigatoriedade do conteúdo mínimo significaria então, em últi- ma análise, negar a própria existência do direito difuso à ordem urbanística,

enquanto prestação positiva do Estado voltada para seus cidadãos. Em rela- ção ao “Novo PDDU de Salvador”, aprovado na primeira gestão de ACM Neto, foi exatamente isto que ocorreu, já que o PL formulado pelo Executivo e apro- vado pela Câmara não detinha vários dos elementos exigidos como conteúdo mínimo pelo art. 42 do Estatuto da Cidade.

O “Novo PDDU de Salvador”: conteúdo muito aquém do

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