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PARTE II – O PAGAMENTO DE BENEFÍCIOS E RESGATES EM PLANOS

4.1 O Antecedente da Norma Tributária

4.1.1 Critério Material – Renda e Proventos de Qualquer Natureza

O critério material da hipótese da regra-matriz tributária está voltada para a verificação do comportamento objeto da incidência, isolado dos demais elementos que formam a situação passível de tributação. Cuida-se, no aspecto material, de extrair da

incidência tributária qual a ação ou estado passível de tributação, de forma destacada de seu contexto (pessoas, espaço, tempo etc.).

Para esta tarefa de identificar tal comportamento, é necessário compor um enunciado formado por verbo e complemento mínimo.

Sabe-se que este critério material está relacionado com a obtenção de renda e proventos de qualquer natureza, conforme competência constitucionalmente atribuída à União. Contudo, a definição precisa do “verbo mais complemento” relativo a este imposto advém da análise do disposto na lei complementar à Constituição – tomando-se por premissa, obviamente, que ela somente será válida se estiver coerente com o texto constitucional.

A lei complementar a que se refere é o Código Tributário Nacional (Lei nº 5.172/66), que foi formalmente editada como lei ordinária, sob a égide de ordenamento constitucional anterior, mas recepcionada pela Constituição Federal de 1988 com status de lei complementar.

O artigo 43, com redação ajustada pela Lei Complementar nº 104, de 10 de janeiro de 2001, desse diploma estatui:

“Art. 43. O imposto, de competência da União, sobre a renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica:

I - de renda, assim entendido o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos;

II - de proventos de qualquer natureza, assim entendidos os acréscimos patrimoniais não compreendidos no inciso anterior.

§ 1º A incidência do imposto independe da denominação da receita ou do rendimento, da localização, condição jurídica ou nacionalidade da fonte, da origem e da forma de percepção.

§ 2º Na hipótese de receita ou de rendimento oriundos do exterior, a lei estabelecerá as condições e o momento em que se dará sua disponibilidade, para fins de incidência do imposto referido neste artigo.”

Na linha do que foi exposto anteriormente, ao definir o “fato gerador” do imposto de renda, a lei determina, além do aspecto material, outros elementos da hipótese de incidência tributária, os quais serão analisados separadamente. O que importa, neste momento, é precisar o comportamento tributável.

A este respeito, o artigo supratranscrito contém a dicção de que o comportamento passível de tributação é adquirir renda, assim entendido o produto do capital,

do trabalho ou da combinação de ambos, e/ou proventos de qualquer natureza, assim entendidos os acréscimos patrimoniais não compreendidos no conceito de renda. Tem-se aí o

verbo (adquirir) e o seu complemento (renda... e/ou proventos de qualquer natureza...), a descrição do critério material do imposto.

Não basta, porém, a menção das locuções contidas na prescrição normativa. É preciso entendê-las, dissecando o que se pode compreender por materialidade desse tributo.

Neste sentido, não oferece maiores dificuldades o conteúdo semântico do termo “adquirir”. Adquirir é alcançar, conseguir, obter. A substituir o verbo adquirir, vem sendo bastante usado na doutrina o verbo auferir, que significa colher, obter, receber134.135

Já as definições de renda e de proventos de qualquer natureza merecem maior atenção.136

Para este exame, é preciso se ter em mente as delimitações já contidas implicitamente na Constituição a respeito da extensão que essas expressões podem conter, para fins de incidência do imposto federal. Com isso, somente a partir desses limites constitucionais é que se definirá o núcleo da materialidade do referido tributo.

Ao conceituar renda, o Código Tributário Nacional remete-se a três elementos: (i) produto do capital, (ii) produto do trabalho ou (iii) produto da combinação de capital e trabalho.

O produto do capital é tudo aquilo que resulta da aplicação de bens, materiais ou imateriais, móveis ou imóveis, permanentes ou não, em razão da sua aplicação, investimento ou disponibilização. Estão aí incluídos os juros, os aluguéis, os rendimentos e os ganhos de aplicações financeiras.

Já o produto do trabalho é o que resta do exercício de atividade de prestação de serviços, com ou sem vínculo empregatício, regular ou esporádico, em caráter público ou privado. Neste contexto, situam-se os salários, as gratificações, as remunerações de prestação de serviços, os vencimentos.

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Significados extraídos do Michaelis Moderno Dicionário de Língua Portuguesa, cit.

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Neste sentido, José Artur Lima Gonçalves entende que o verbo auferir é “inquestionavelmente aceito como o mais adequado à hipótese” (apud Paulo Ayres Barreto, “Imposto de Renda – Pessoa Jurídica”, cit. p. 773).

O produto da combinação de capital e trabalho, como se extrai das definições anteriores, é aquilo que é fruto da conjunção da aplicação de bens e do exercício de atividade de prestação de serviços. É, por exemplo, o produto da venda de plantações, rebanhos, o lucro da atividade econômica de produção, ou ainda o que se recebe por obras de arte ou literárias (pois nelas não está embutido apenas o serviço que as concretizam, mas também a propriedade imaterial que lhes é inerente).

Assim, renda, para fins de interpretação do artigo 43, I, do Código, compreende todo o universo dos resultados acima mencionados. Resultados esses que, por limitação constitucional, somente estão alcançados pela tributação se positivos e líquidos.

Interessante notar que um dos elementos dessa definição de renda corrobora o que antes foi exposto acerca da necessidade de a renda representar riqueza nova, para que possa ser alcançada pela incidência do imposto de renda. O inciso I do artigo acima transcrito destaca que a renda será o produto do capital. Ora, se os resultados positivos já acumulados (independentemente de terem sido tributados ou não – isto é, de terem ou não correspondido ao conceito de renda) compõem o patrimônio do indivíduo, são parte do seu capital, e, portanto, somente são atingidos pela incidência sobre aquilo que os ultrapassar, o que os

acrescer.

Ademais, quando se trata do produto do capital, claramente afasta a possibilidade de se pretender tributar a reposição patrimonial, e toda forma de indenização ou reembolso (como também a correção monetária). Isso porque, sendo uma recomposição do próprio capital (ainda que imaterial), a reposição não pode ser resultado, e, com isso, não corresponde a produto.

No tocante aos proventos de qualquer natureza, o conceito dado pelo artigo 43, II, do Código Tributário Nacional é mais amplo: todos os acréscimos patrimoniais que não sejam considerados como renda.

Trata-se, portanto, de tudo o quanto acresce o patrimônio do indivíduo, sem que ele tenha aplicado capital, nem trabalho. Estão contemplados, nesta espécie, os prêmios de loterias e sorteios, as riquezas naturais, extraídas, por exemplo, de minas (que não

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Afasta-se a análise dos termos “receita” e “rendimento”, presentes no parágrafo 2º do artigo 43, visto que, inseridos no contexto do mesmo dispositivo legal que o que define a renda e os proventos de qualquer natureza como elementos materiais de incidência do imposto, estão por estes abrangidos.

representem remuneração do trabalho), e, a princípio até mesmo as heranças e as doações137 e a valorização patrimonial (de moeda, bens móveis ou imóveis)138.

Também está abraçado pelo termo “proventos” as aposentadorias e os benefícios previdenciários recebidos pela pessoa física, quer seja da previdência estatal ou da previdência privada. Isto porque tais valores não decorrem diretamente da aplicação do capital (pois não é extraído da aplicação de bens, exclusivamente), tampouco do trabalho (mas justamente da inatividade laboral do beneficiário – pressuposto usual para concessão de aposentadoria).

Importa esclarecer que o inciso II do artigo 43 trata de outros acréscimos patrimoniais não contemplados no conceito de renda. Isto quer dizer que tanto a renda quanto os proventos estão dirigidos ao que acresce o patrimônio139, não podendo jamais abranger o que decresce o patrimônio (do contrário, estar-se-ia diante de um imposto sobre ingressos ou sobre receitas, e não sobre a renda). Assim, claro está, mais uma vez, que não pode o imposto de renda, já pela redação constitucional, mas adicionalmente também por uma limitação da lei complementar, alcançar parcela que corresponda a diminuição de patrimônio. Isso reforça a idéia de que somente os resultados positivos líquidos estão alcançados pelo imposto.