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Capítulo V A Tributação dos Planos de Benefícios de Previdência

6.1 Possibilidade de Tributação de Parcela do Patrimônio

6.1.1 O Princípio da Capacidade Contributiva e o Regime Regressivo de

No tocante ao princípio da capacidade contributiva, descreveu-se, antes, que ele se destina a determinar que o ente político competente, sempre que possível, mensure as bases de incidência dos impostos de sua competência segundo a capacidade econômica dos respectivos sujeitos passivos.

Diante desse preceito, a base de cálculo e a alíquota dos impostos devem ser fixadas segundo um modelo que possa propiciar a gradação da carga tributária de acordo com a situação econômica do contribuinte. Essa gradação e a verificação da capacidade econômica do contribuinte devem ser medidas em coerência com a materialidade do tributo, posto que é esse o dado com o qual o poder competente estrutura a tributação que lhe compete instituir.

Em relação ao imposto de renda, isto significa dizer que a sua base de cálculo deve ser “personalizada” de forma que a base tributável guarde estrita correlação com a realidade econômica do contribuinte – daí decorre a autorização para dedução das despesas efetivamente incorridas pelo sujeito passivo.

Quanto à alíquota do imposto de renda, o princípio da capacidade contributiva impõe a fixação de percentuais progressivos, conforme aumentar o poder econômico do contribuinte. Essa imposição resulta, também, da aplicação do princípio da progressividade, consagrado especificamente para o imposto de renda, no artigo 153, parágrafo 2º, da Constituição Federal.

Importante observar que, como a mensuração da capacidade econômica do sujeito passivo deve estar relacionada à materialidade do tributo, a União deve medir a incidência do imposto de renda sempre em função da renda e dos proventos percebidos pelo contribuinte.

No caso da tributação dos planos de previdência privada, é possível observar que o Regime Progressivo de Tributação atende ao princípio da capacidade contributiva, pois, além de conter a previsão de alíquotas progressivas segundo a renda auferida pela pessoa física, tem a sua base de cálculo submetida aos descontos de despesas incorridas pelo contribuinte no respectivo ano-calendário – já que o imposto de renda, nesses casos, tem caráter de antecipação do devido ao final do período de apuração.

O mesmo não se pode afirmar do Regime Regressivo de Tributação. Este referido regime baseia-se na instituição de alíquotas regressivas, não segundo a renda do contribuinte, mas segundo o prazo de acumulação dos recursos no plano. Assim, conforme o tempo de acumulação dos recursos, a alíquota do imposto de renda é a mesma independentemente do montante de renda auferida pela pessoa física.

Ademais, a sua base de cálculo não é variável de acordo com a situação econômica pessoal do contribuinte. Isto porque o imposto de renda, nesta sistemática, é definitivo, não sendo computado quando da apuração do imposto de renda efetivamente devido no ano pelo indivíduo (sobre a renda efetivamente recebida no período) nem os rendimentos por ele tributados, nem o seu montante retido na fonte.

A única justificativa para este critério de incidência seria vislumbrar a aplicação da extrafiscalidade – técnica usada para imputar à configuração dos tributos, elementos que pudessem nortear seus comportamentos, de forma a estimular ou desestimular determinadas ações, julgadas de relevante interesse público, seja no âmbito social, político, monetário ou econômico.

Neste caso, porém, conforme anteriormente exposto, em se tratando de imposto de renda, a extrafiscalidade somente poderá ser exercida se a hipótese de incidência atingida contemplar a capacidade contributiva e a progressividade.

Roque Antonio Carrazza, a este respeito, leciona:

“De qualquer modo, os tributos extrafiscais, tanto quanto os fiscais, devem submeter-se aos princípios que informam a tributação: igualdade, legalidade, generalidade, proporcionalidade, não-confiscatoriedade etc.. Além disso, na medida em que interferem nas condutas das pessoas precisam encontrar respaldo num valor constitucionalmente consagrado, nunca em concepções ideológicas ou morais, incompatíveis com a liberdade na atuação da vida privada das pessoas, que deve imperar num Estado Democrático como o nosso”. 218

Tomando-se por base esta lição, ter-se-ia que a extrafiscalidade, neste caso em exame, deveria estar respaldada num valor consagrado pela Constituição Federal.

Não é o que se verifica.

A extrafiscalidade, no Regime Regressivo de Tributação, está relacionada ao incentivo de realização da poupança de longo prazo. Com efeito, a Exposição de Motivos nº 116, de 20 de agosto de 2004, que contém as razões para edição da Medida Provisória nº 209, de 2004, da qual resultou a edição da Lei nº 11.053/04, destaca que “deve existir um estímulo

para que o cidadão abra mão de um consumo imediato ou de investimentos de curto prazo em troca de uma poupança que exija períodos mais longos de maturação”.

O intuito da fixação das alíquotas regressivas é, portanto, de fazer com que as pessoas considerem a poupança da previdência como um investimento do longo prazo.

Este valor deveria, como ensina Roque Carraza, estar consagrado na Constituição Federal, para que pudesse ser aplicado como medida de mensuração do imposto de renda, e ainda assim não poderia ser sobreposto em prejuízo à aplicação dos princípios da capacidade contributiva e da progressividade.

Ocorre, porém, que, nem no Título VII, da Constituição Federal, que disciplina a ordem econômica e financeira no País ou mesmo o artigo 192, que trata

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especificamente do Sistema Financeiro Nacional219, nem no Título VIII, que trata da ordem social ou em seus artigos que tratam da previdência social, é possível encontrar disposição constitucional que privilegie a poupança de longo prazo. Dessa forma, na linha de pensamento de que a extrafiscalidade deve encontrar justificativa em fundamento constitucional, verifica- se que, no tocante ao Regime Regressivo de Tributação, a expressão extrafiscal do imposto de renda está fundada em valor não convencionado pelo constituinte.

Ainda que estivesse, a extrafiscalidade jamais poderia implicar a não aplicação dos princípios da progressividade e da capacidade contributiva. Assim, não se encontra razão para justificar a constitucionalidade da regressividade proposta nos artigos 1º e 2º da Lei nº 11.053/04.

A única situação em que, possivelmente, fosse afastado o caráter inconstitucional do Regime Regressivo de Tributação seria o de tal sistemática de apuração do imposto de renda resultar em efetivo benefício fiscal para o sujeito passivo. Isso ocorreria, por exemplo, se o participante viesse a deduzir integralmente as contribuições efetuadas para o plano previdenciário – à alíquota máxima de 27,5% –, e, posteriormente, quando do resgate ou do recebimento dos benefícios, a alíquota do imposto de renda fosse a mínima, de 10%.

6.1.2 O Princípio da Vedação ao Confisco e o Regime Regressivo de