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Capítulo V A Tributação dos Planos de Benefícios de Previdência

5.1 Regime de Diferimento do Ônus Financeiro

5.1.1 Dedutibilidade das Contribuições na Apuração do Imposto de

5.1.1.2 Pessoa Jurídica

Quando da análise do tema da tributação dos planos de previdência complementar privada, a primeira impressão é a de que se está tratando apenas dos reflexos tributários relativos ao imposto de renda devido pela pessoa física. Porém, como a contratação de um plano dessa natureza pode incluir a participação de uma pessoa jurídica na qualidade de

patrocinadora, é preciso, também, averiguar qual o impacto das contribuições por ela feitas em favor de seus empregados e dirigentes.

Essas contribuições, por se dirigirem ao benefício de terceiros que mantêm vínculo empregatício com a patrocinadora, assemelham-se, à primeira vista, a uma remuneração concedida em razão do serviço prestado. Assim sendo, em termos tributários, haveria a incidência do imposto de renda sob a mesma sistemática aplicável aos salários e demais remunerações decorrentes do contrato de trabalho (i.e., incidência do imposto de renda na fonte com base de tabela progressiva).

Ocorre, porém, que, especificamente para esses valores, o artigo 6º, inciso VIII, da Lei nº 7.713/88 previu a isenção do imposto de renda. Dessa forma, sobre as contribuições realizadas pelas pessoas jurídicas haverá apenas a incidência do imposto de renda para a pessoa física quando houver a efetiva disponibilidade dos recursos, na realização de resgates ou recebimento dos benefícios previdenciários183.

Do ponto de vista da empresa patrocinadora, há de se verificar quais os ditames legais para determinação do seu tratamento tributário.

Editada na mesma data que a Lei nº 9.250/95, que introduziu a sistemática de diferimento fiscal ao investimento em previdência privada, a Lei nº 9.249, ao estabelecer normas para a incidência do imposto de renda das pessoas jurídicas, assegurou a possibilidade de dedução, na apuração do lucro real (base de cálculo do imposto de renda) e da base de cálculo da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, das contribuições efetuadas pessoas jurídicas aos planos de previdência complementar em favor de seus empregados e dirigentes:

“Art. 13. Para efeito de apuração do lucro real e da base de cálculo da contribuição social sobre o lucro líquido, são vedadas as seguintes deduções, independentemente do disposto no art. 47 da Lei nº 4.506, de 30 de novembro de 1964: (...)

V - das contribuições não compulsórias, exceto as destinadas a custear seguros e planos de saúde, e benefícios complementares assemelhados aos da previdência social, instituídos em favor dos empregados e dirigentes da pessoa jurídica; (...)”

A dedução, no tocante ao imposto de renda, está autorizada apenas para as pessoas jurídicas tributadas pelo lucro real, conforme expressamente consta do texto legal.

183

“Art. 6º Ficam isentos do imposto de renda os seguintes rendimentos percebidos por pessoas físicas: (...) VIII - as contribuições pagas pelos empregadores relativas a programas de previdência privada em favor de seus empregados e dirigentes (...)”

Aquelas tributadas pela sistemática do lucro presumido não possuem tal faculdade, visto que, assim como referido quando se tratou da pessoa física, a base de cálculo presumida do imposto de renda das pessoas jurídicas não admite a dedução de despesas especificamente autorizadas na legislação.184

Ademais, interessante notar que mais uma vez a redação da lei faz referência a “benefícios complementares assemelhados aos da previdência social”, o que, conforme antes afirmado, ressalta a característica de complementaridade da previdência privada no sistema previdenciário nacional, nada mais185.

Outra expressão usada pelo legislador, no artigo 13 supratranscrito é “contribuições não compulsórias”, cujo cabimento somente é possível para os seguros e planos de saúde, mencionados no dispositivo legal, ao lado dos planos de previdência privada. Isto porque, conforme antes comentado, a previdência privada é marcada pela característica da liberdade de contratação, sendo facultado às partes das relações jurídicas a ela subjacentes (participantes, entidades de previdência e patrocinadoras) estabelecer livremente as condições que desejarem, inclusive no tocante à periodicidade e ao valor das contribuições a serem efetuadas. Assim sendo, em se tratando dos planos de previdência privada instituídos em favor de empregados e dirigentes, é desnecessária a menção à não-compulsoriedade das contribuições da patrocinadora.

Outra observação possível é a de que o texto não condiciona que as contribuições sejam feitas em favor de todos os empregados e dirigentes da empresa para que possam ser consideradas dedutíveis. O que está determinado legalmente é que, efetuando a pessoa jurídica contribuições para custear benefícios de previdência complementar instituídos

em favor de empregados e dirigentes, estará assegurada a dedutibilidade. Em outras palavras,

sendo o plano de benefícios instituído para todos os empregados e dirigentes, ainda que apenas alguns deles tenham efetuado a sua adesão, as contribuições vertidas pela patrocinadora podem ser descontadas do imposto de renda devido no respectivo período de apuração. Em outras palavras, a universalidade é obrigatória quanto à disponibilização do plano previdenciário para os empregados e dirigentes da empresa; porém, a adesão individual destes ao plano é facultativa.

184

A dedução é presumida.

185 Vide comentários à característica de complementaridade da previdência privada no Capítulo II do presente estudo.

Ocorre que, assim como aconteceu com a dedutibilidade das contribuições da pessoa física, o artigo 11 da Lei nº 9.532/97 estabeleceu um limite para o desconto das contribuições realizadas pelas pessoas jurídicas em planos privados de previdência em favor de seus empregados e dirigentes. Confira-se:

“Art. 11 (...)

§ 2o Na determinação do lucro real e da base de cálculo da contribuição social sobre o lucro líquido, o valor das despesas com contribuições para a previdência privada, a que se refere o inciso V do art. 13 da Lei no 9.249, de 26 de dezembro de 1995, e para os Fundos de Aposentadoria Programada Individual - Fapi, a que se refere a Lei no 9.477, de 24 de julho de 1997, cujo ônus seja da pessoa jurídica, não poderá exceder, em cada período de apuração, a 20% (vinte por cento) do total dos salários dos empregados e da remuneração dos dirigentes da empresa, vinculados ao referido plano.

§ 3o O somatório das contribuições que exceder o valor a que se refere o § 2o deste artigo deverá ser adicionado ao lucro líquido para efeito de determinação do lucro real e da base de cálculo da contribuição social sobre o lucro líquido.”

Desde 1998, portanto, nos planos coletivos abertos ou nos planos fechados, em que a pessoa jurídica participe como patrocinadora, o valor das despesas com contribuições por ela efetuadas poderá ser deduzido na apuração da base de cálculo do imposto de renda, desde que não exceda, em cada período de apuração, a 20% do total dos

salários dos empregados e da remuneração dos dirigentes da empresa, vinculados ao referido plano.

A justificativa dada para a inclusão deste limite para dedução das contribuições da pessoa jurídica, conforme a Exposição de Motivos nº 644, de 14 de novembro de 1997, foi a de que seria necessário colocar uma “trava” na possibilidade de postergação do pagamento do imposto de renda mediante a constituição de planos de previdência no encerramento dos períodos de apuração com resgates previstos para prazos curtos, com a única finalidade única e exclusiva de obter vantagens de natureza fiscal. Confira-se:

“O artigo 11 trata das contribuições para a previdência privada, limitando as deduções das pessoas físicas a até doze por cento do seu rendimento bruto no período a que corresponder as contribuições.

Relativamente à parcela das contribuições cujo ônus seja da pessoa jurídica instituidora, o limite estabelecido é de até o dobro do valor suportado pelos empregados e dirigentes da empresa.

Referidos limites compatibilizam-se com os que atualmente são praticados pela esmagadora maioria das empresas que proporcionam este tipo de benefício a seus

empregados e dirigentes, notadamente aquelas com participação societária do setor público.

Essa medida, ao mesmo tempo que em nada prejudica o setor da previdência privada, coloca uma trava na possibilidade, hoje existente, de postergação do pagamento do imposto de renda mediante a constituição de planos de previdência no encerramento dos períodos de apuração com resgates previstos para prazos curtos, com a única finalidade única e exclusiva de obter vantagens de natureza fiscal.”

Com a introdução deste limite, o legislador não apenas restringiu a dedução das contribuições da patrocinadora do plano com a fixação de um percentual, mas também vinculou esse percentual à remuneração dos respectivos beneficiários.

De um lado, parece razoável ter-se limitado a dedução das contribuições para evitar que a previdência privada pudesse ser usada como instrumento de pagamento de salários e gratificações a seus empregados, conforme asseveram Andréa Nogueira Neves e Fabiana Ulson Zappa:

“A dedução de tais contribuições era ilimitada até a edição da Lei nº 9.532/97, por meio da qual ficou restrita a 20% do valor dos salários dos empregados e da remuneração dos dirigentes vinculados ao plano previdenciário, o que é bastante compreensível na medida em que evita a substituição de parcelas salariais – sujeitas a pesados encargos sociais (FGTS, contribuições para a previdência social, 13º salário, férias, verbas rescisórias etc.) por contribuições a planos de previdência complementar.” 186

No mesmo sentido, Eurico Marcos Diniz de Santi e Paulo Ayres Barreto afirmam:

“Esta é a finalidade do art. 11, §2º, da Lei nº 9.532/97, que – diante da dificuldade de se precisar os contornos e critérios de dedutibilidade das despesas com o custeio de previdência complementar (...) – estabeleceu o limite máximo de 20% da folha de salários, demarcando, por via oblíqua, o conceito de despesa necessária nesta matéria.

Fixar limites assim cabe legitimamente em tais circunstâncias – se ausente a regra objetivamente, ao contribuinte sobre-restaria poder unilateral para furtar-se à incidência do IR ou mesmo reduzir artificialmente sua base de cálculo.

Sendo assim, é plenamente constitucional a aplicação do limite estabelecido nesta regra às despesas ordinárias correntes com contribuições destinadas a custear seguros, planos de saúde e benefícios complementares assemelhados aos da previdência social, instituídos em favor dos empregados e dirigentes da pessoa jurídica, a partir de 1º de janeiro de 1998.” 187

186

“Dedutibilidade das Contribuições Destinadas a Planos de Previdência Complementar” cit. p. 517. 187

“Contribuições para Previdência Privada – Dedutibilidade em face do Imposto sobre a Renda – Força da EC 20/98 – Aplicabilidade da Lei 9.532/97, no Tempo”, Revista Dialética de Direito Tributário nº 93, junho/03, p. 130.

No entanto, ao se observar essa previsão de forma sistemática, considerando os critérios da dedutibilidade da pessoa física, anteriormente descrita, é possível verificar que não há uma “complementação” que pudesse justificar a limitação para a realização dessas contribuições – nem para o participante, nem para a patrocinadora.

Com efeito, o limite, estabelecido para as patrocinadoras, de 20% da remuneração dos empregados e dirigentes vinculados ao plano não guarda qualquer coerência nem com o limite fixado para desconto das contribuições realizadas pelo participante, nem com o imposto que irá incidir sobre o resgate ou aposentadoria recebidos do plano, pela pessoa física.

Não obstante, é forçoso reconhecer que a faculdade para dedução das contribuições da pessoa jurídica é um verdadeiro estímulo para a instituição de planos de previdência em favor de empregados e dirigentes, e, com isso, um importante fator para o desenvolvimento da previdência privada no País, e, por conseguinte, da evolução de todo o sistema previdenciário nacional.

Alguns ajustes quanto à aplicação dos dispositivos atinentes à dedução das contribuições das patrocinadoras, porém, carecem ainda de adaptação por parte das autoridades tributárias. Isto porque, nos últimos anos, é possível verificar a lavratura de autos de infração que, a pretexto de questionarem a satisfação das condições legais para dedutibilidade das contribuições da pessoa jurídica ao plano de benefícios, acabam por descaracterizar o plano de benefícios como um todo188.

Esses questionamentos devem ser analisados com a devida cautela, para se separar o que é análise das condições para dedutibilidade das contribuições da pessoa jurídica – e, com isso delimitar o âmbito de competência da Administração Tributária – daquilo que é condição contratual do plano de benefícios – submetido à fiscalização e controle da Secretaria

188

“IRPJ E CSLL – BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS - EMPREGADOS E DIRIGENTES – INDEDUTIBILIDADE: São indedutíveis as contribuições não compulsórias destinadas a custear planos de benefícios complementares não assemelhados aos da previdência social, instituídos em favor dos empregados e dirigentes da pessoa jurídica. A previsão contratual de resgate independentemente da ocorrência de um estado de necessidade como o que ocorre na previdência social, descaracteriza a semelhança, tornando indedutíveis os pagamentos. (Lei nº 9.249/95 art. 13 inciso V c/c Lei 8.213/91 arts. 1º e 18).

de Previdência Complementar (SPC)189 ou da Superintendência de Seguros Privados (SUSEP), conforme antes exposto.