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Capítulo V A Tributação dos Planos de Benefícios de Previdência

5.1 Regime de Diferimento do Ônus Financeiro

5.1.1 Dedutibilidade das Contribuições na Apuração do Imposto de

5.1.1.1 Pessoa Física

Conforme antes transcrito, o artigo 8º da Lei nº 9.250/95 estabelece que a base de cálculo do imposto devido no ano-calendário “será a diferença entre as somas de

todos os rendimentos percebidos durante o ano-calendário, exceto os isentos, os não- tributáveis, os tributáveis exclusivamente na fonte e os sujeitos à tributação definitiva” e as

deduções relativas a, entre outras despesas, “contribuições para as entidades de previdência

privada domiciliadas no País, cujo ônus tenha sido do contribuinte, destinadas a custear

benefícios complementares assemelhados aos da Previdência Social”.174

Com isso, passou-se a autorizar (ou facultar) a pessoa física a descontar, do montante devido a título de tributos, todo o valor destinado aos planos de previdência complementar, os quais são, posteriormente, submetidos ao imposto de renda, quando de sua disponibilização ao beneficiário.

Alternativamente, o desconto pode ser efetuado sobre o imposto anual, diretamente, ou sobre o imposto devido mensalmente, desde que o valor das contribuições seja deduzido da base de cálculo relativa a rendimentos do trabalho com vínculo empregatício ou de administradores.

No momento do recebimento dos benefícios previdenciários, por outro lado, o artigo 33 da Lei nº 9.250/95 impõe a incidência do imposto sobre a importância total recebida pela pessoa física.

Partindo-se da premissa de que os valores, durante a sua acumulação no plano de benefícios, não sofreriam tributação pelo imposto de renda175, estar-se-ia, com essa

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O texto da norma faz menção a “benefícios complementares assemelhados aos da Previdência Social”, o que remete ao debate sobre o alcance desse dispositivo. A este respeito, para se evitar repetições, faz-se referência aos comentários tecidos quando do exame do caráter complementar da previdência privada (Capítulo II), em que, basicamente, se expôs o entendimento no sentido de considerar que a complementaridade da previdência privada reside, não na complementação dos benefícios mínimos de aposentadoria assegurados pela previdência estatal, mas no papel do regime de previdência privada como parte do sistema previdenciário brasileiro, a servir de complementação, e não como um regime paralelo, ao de filiação obrigatória.

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sistemática, atendendo à desejada finalidade de postergar a tributação pelo imposto de renda para o momento do recebimento dos recursos.

É de se ressaltar que a postergação ora referida há de ser considerada em seu aspecto fiscal e não financeiro, pois se assim o for, deve-se ter em mente que a tributação posterior pode representar perda financeira, na medida em que o principal investido é tributado sob uma realidade econômica posterior, em que provavelmente há maior ônus econômico do que aquele existente quando da dedutibilidade das contribuições.

Ademais, a afirmação de que se estaria diante de um efetivo diferimento parte da premissa de que a tributação seria imposta sob os mesmos critérios vigentes quando da dedução. Assim, a mudança de alíquotas e/ou base de cálculo do imposto no intervalo temporal entre o momento da dedução e o do resgate ou recebimento do benefício previdenciário pode implicar um prejuízo financeiro e fiscal.

Em todo caso, esta realidade foi alterada em 1997, sendo que, desde 01 de janeiro de 1998, passou a vigorar o disposto no artigo 11 da Lei nº 9.532, de 10 de dezembro de 1997, que incorporou à sistemática prevista na Lei nº 9.250/95, um limite de 12% para a dedução das contribuições realizadas pelas pessoas físicas aos planos de previdência privada176, sem que tenha havido, em contrapartida, uma limitação para o imposto de renda devido sobre os resgates e benefícios.

Em outras palavras, dois anos após a instituição do regime de diferimento fiscal, a lei alterou tal sistemática, impondo um limite para a dedução das contribuições efetuadas pela pessoa física a plano de previdência privada, mas mantendo a incidência, sem

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A redação original do artigo tem o seguinte teor:

“Art. 11. A dedução relativa às contribuições para entidades de previdência privada, a que se refere a alínea ‘e’ do inciso II do art. 8º da Lei nº 9.250, de 26 de dezembro de 1995, somada às contribuições para o Fundo de Aposentadoria Programada Individual - FAPI, a que se refere a Lei n.º 9.477, de 24 de julho de 1997, cujo ônus seja da pessoa física, fica limitada a doze por cento do total dos rendimentos computados na determinação da base de cálculo do imposto devido na declaração de rendimentos.

§ 1º Aos resgates efetuados pelos quotistas de Fundo de Aposentadoria Programada Individual - FAPI, aplicam- se, também, as normas de incidência do imposto de renda de que trata o art. 33 da Lei nº 9.250, de 1995.

§ 2º Na determinação do lucro real e da base de cálculo da contribuição social sobre o lucro líquido, o valor das despesas com contribuições para a previdência privada, a que se refere o inciso V do art. 13 da Lei nº 9.249, de 1995, e para os Fundos de Aposentadoria Programada Individual - FAPI, a que se refere a Lei nº 9.477, de 1997, cujo ônus seja da pessoa jurídica, não poderá exceder, em cada período de apuração, a vinte por cento do total dos salários dos empregados e da remuneração dos dirigentes da empresa, vinculados ao referido plano.

§ 3º O somatório das contribuições que exceder o valor a que se refere o parágrafo anterior deverá ser adicionado ao lucro líquido para efeito de determinação do lucro real e da base de cálculo da contribuição social sobre o lucro líquido.

limites, sobre a totalidade dos valores recebidos pelo plano, quando do resgate ou pagamento dos benefícios.

Em 2001, em atendimento ao novo perfil de público dos planos de previdência privada, notadamente aqueles operados por entidades abertas de previdência complementar e sociedades seguradoras autorizadas, o Poder Executivo editou a Medida Provisória nº 2.113-30, de 26 de abril de 2001, que possibilitou, pelo seu artigo 61, a dedução das contribuições efetuadas por pessoas físicas em favor de seus dependentes, assim relacionados na Declaração Anual do imposto de renda177, 178. Foi mantido, porém, o limite de 12% para dedução das contribuições, limite este considerado globalmente, isto é, em relação ao valor total destinado a planos de benefícios, tanto em favor próprio, como de seus dependentes.

O referido dispositivo legal nada mais fez que adequar a legislação ao regime de tributação já vigente para os rendimentos recebidos pelos dependentes, os quais devem ser somados aos rendimentos do contribuinte, para efeitos de tributação pelo imposto de renda, quando da elaboração da Declaração Anual do imposto.

Mais recentemente, em 18 de junho de 2004, foi editada a Lei nº 10.887, que estabeleceu mais uma limitação para tal dedutibilidade: a condição de que, para efetuar a dedução das contribuições, a pessoa física também contribua, ao menos com o valor mínimo estabelecido pela legislação, para o regime geral de previdência social ou para o regime próprio de previdência social dos servidores públicos, condição esta somente dispensada, por questões óbvias, aos participantes aposentados por um desses regimes previdenciários estatais.

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“Art. 61. A partir do ano-calendário de 2001, poderão ser deduzidas, observadas as condições e o limite global estabelecidos no art. 11 da Lei no 9.532, de 1997, as contribuições para planos de previdência privada e para o Fundo de Aposentadoria Programada Individual - FAPI, cujo titular ou quotista seja dependente do declarante.”

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Instrução Normativa SRF nº 15 de 6 de fevereiro de 2001: “Art. 38. Podem ser considerados dependentes:

I - o cônjuge;

II - o companheiro ou a companheira, desde que haja vida em comum por mais de cinco anos, ou por período menor se da união resultou filho;

III - a filha, o filho, a enteada ou o enteado, até 21 anos, ou de qualquer idade quando incapacitado física ou mentalmente para o trabalho;

IV - o menor pobre, até 21 anos, que o contribuinte crie e eduque e do qual detenha a guarda judicial; V - o irmão, o neto ou o bisneto, sem arrimo dos pais, até 21 anos, desde que o contribuinte detenha a guarda judicial, ou de qualquer idade quando incapacitado física ou mentalmente para o trabalho;

VI - os pais, os avós ou os bisavós, desde que não aufiram rendimentos, tributáveis ou não, superiores ao limite de isenção mensal de R$ 900,00 (novecentos reais);

Essa alteração, como demonstrado na exposição de motivos da lei (Exposição de Motivos MP/MPS nº 08), tem por finalidade criar uma vinculação financeira entre o regime de previdência complementar privada e os regimes de filiação obrigatória, seguindo uma interpretação que é equivocada179. Confira-se:

“A legislação relativa ao imposto de renda pessoa física, especialmente o art. 11 da Lei nº 9.532, de 1997, possibilita que tanto as contribuições pagas à previdência social obrigatória, quanto as vertidas aos planos de previdência privada sejam dedutíveis da base de cálculo do imposto de renda devido pela pessoa física. Contudo, não exige, para fins dessa dedução, nenhuma vinculação entre os regimes previdenciários. A parcela vertida à previdência privada pode ser deduzida, mesmo não havendo qualquer contribuição ap RGPS ou a qualquer outro regime próprio de previdência social da União, Estados ou Municípios.

Essa situação não é razoável. Um dos principais atrativos da participação em fundos de previdência privada tem sido a dedução das contribuições do valor a ser pago a título e imposto de renda da pessoa física. Esse tipo de poupança deve ser estimulado, Entretanto, não há como desvincular a participação do segurado na previdência privada de sua participação nos regimes de previdência oficial. Isto porque a filiação a esses regimes é de caráter obrigatório para qualquer pessoa física que exerce atividade remunerada. É justo que somente seja concedido o incentivo fiscal da dedução aos contribuintes do regime de previdência complementar, nas modalidades aberta ou fechada, desde que seja comprovada a sua regularidade em relação à previdência de filiação obrigatória, vale dizer, desde que op sujeito, primeiramente, desincumba-se do dever constitucional de solidariedade social, fazendo-o ao verter as suas contribuições para os sistemas oficiais de previdência. Do contrário, os regimes deixam de ser complementares, tornando-se simplesmente substitutivos.”

Vale destacar que a regulamentação trazida pela Instrução Normativa da Secretaria de Receita Federal nº 588, de 21 de dezembro de 2005, no tocante a esta condição imposta pela Lei nº 10.887/04, deixa claro o entendimento das autoridades fiscais no sentido de que, para realizar a dedução de contribuições a planos de previdência privada pelas pessoas físicas em favor dos seus dependentes fiscais, é necessário que também os dependentes contribuam para os regimes de previdência estatal, se forem maiores de 16 anos de idade. Confira-se:

“Art. 7º As contribuições para planos de previdência complementar e para Fapi, cujo titular ou quotista seja dependente, para fins fiscais, do declarante, podem ser deduzidas desde que o declarante seja contribuinte do regime geral de previdência social ou, quando for o caso, para regime próprio de previdência social dos servidores titulares de cargo efetivo da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios, observado o disposto no art. 6º.

Parágrafo único. Na hipótese de dependente com mais de 16 anos, a dedução a que se refere o caput fica condicionada, ainda, ao recolhimento, em seu nome, de

VII - o absolutamente incapaz, do qual o contribuinte seja tutor ou curador. (...)”

179 A este respeito, vide Capítulo II, quando tratou-se do regime jurídico da previdência privada e o seu caráter complementar.

contribuições para o regime geral de previdência social, observada a contribuição mínima, ou, quando for o caso, para regime próprio de previdência social dos servidores titulares de cargo efetivo da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios.”

O elemento que salta aos olhos, no tocante a este dispositivo, é a fixação de uma condição que não reflete o perfil da população brasileira – quer porque muitos dos jovens de idade igual ou superior a 17 anos não têm emprego, estando ainda em fase de conclusão do ensino médio, ou porque exercem atividades sem vínculo empregatício (até mesmo na economia informal)180.

Não obstante tais críticas, tem-se hoje vigente a seguinte redação do artigo 11 da Lei nº 9.532/97:

“Art. 11. As deduções relativas às contribuições para entidades de previdência privada, a que se refere a alínea e do inciso II do art. 8o da Lei no 9.250, de 26 de dezembro de 1995, e às contribuições para o Fundo de Aposentadoria Programada Individual - Fapi, a que se refere a Lei no 9.477, de 24 de julho de 1997, cujo ônus seja da própria pessoa física, ficam condicionadas ao recolhimento, também, de contribuições para o regime geral de previdência social ou, quando for o caso, para regime próprio de previdência social dos servidores titulares de cargo efetivo da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios, observada a contribuição mínima, e limitadas a 12% (doze por cento) do total dos rendimentos computados na determinação da base de cálculo do imposto devido na declaração de rendimentos. § 1o Aos resgates efetuados pelos quotistas de Fundo de Aposentadoria Programada Individual - Fapi aplicam-se, também, as normas de incidência do imposto de renda de que trata o art. 33 da Lei no 9.250, de 26 de dezembro de 1995. (...)

§ 5o Excetuam-se da condição de que trata o caput deste artigo os beneficiários de aposentadoria ou pensão concedidas por regime próprio de previdência ou pelo regime geral de previdência social.”

Assim, atualmente, a pessoa física poderá deduzir, para apuração do imposto de renda devido no ano, as contribuições vertidas para o plano de previdência complementar privada, desde que: (i) a contribuição seja destinada a custear benefícios em plano de previdência próprio ou para seus dependentes fiscais; (ii) não se ultrapasse o limite de 12% dos rendimentos tributáveis anuais; (iii) haja contribuição para o regime geral da previdência social ou para regime próprio de previdência social dos servidores públicos

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A realidade a que se refere está baseada na constatação de que o recolhimento de contribuição para o regime geral da previdência social está intimamente ligado ao exercício de atividade com vínculo empregatício; sendo possível, ainda que remotamente se verifique concretamente, a realização de contribuição, por estes jovens, na condição de segurado facultativo deste regime previdenciário estatal.

(exceto aposentados por estes regimes), e, nos casos de contribuição em favor de dependentes fiscais maiores de 16 anos, estes também contribuam para o regime previdenciário estatal.

Diante disso, algumas considerações merecem destaque.

A primeira é que nem sempre a dedução dá-se da forma descrita na legislação supra mencionada. Isto se deve ao fato de, atualmente, a pessoa física pode apurar o imposto de renda anual segundo duas modalidades, que se convencionou referir pelo modelo de declaração anual do imposto: segundo uma base presumida (em que a declaração é apresentada em modelo dito simplificado) e um base real (cuja declaração segue o modelo dito completo).

Apurando o imposto pela base presumida, o contribuinte há de considerar, para formação da base de cálculo do imposto de renda, a totalidade dos rendimentos e ganhos auferidos no ano-calendário, com dedução de um percentual de 20%, que, presumivelmente, tenha sido consumido para despesas necessárias à subsistência do indivíduo. Neste caso, não importa se houve ou não a realização de contribuições para o plano de previdência complementar. O percentual de 20% é descontado para formação da base tributável independentemente de qualquer comprovação por parte do sujeito passivo.

Segundo a base real, por outro lado, parte-se da totalidade dos rendimentos e ganhos auferidos no ano, para então serem descontadas as despesas autorizadas pela lei, nos limites e condições legalmente fixados. Nesta hipótese, a pessoa física que tenha realizado investimento no plano de previdência complementar, poderá descontar as contribuições efetuadas, até o limite de 12% dos rendimentos tributáveis anuais, mas desde que também contribua para um dos regimes da previdência estatal181.

Assim, nos casos em que a pessoa física opte pela apuração do imposto de renda anual pelo sistema de tributação presumida182 e contribua para plano de previdência privada, a sua dedução efetiva pode ser maior ou menor que aquela autorizada pela lei, e ainda é possível que não haja nem mesmo satisfação da condição de contribuição ao regime de previdência estatal. Ao passo que, se essa mesma pessoa escolher a apuração pelo regime da tributação real, os limites e condições previstos legalmente serão aplicados.

181 Ressalvados os aposentados por um dos regimes estatais, conforme antes mencionado. 182

Outra observação que se faz é que o cálculo do limite de 12%, repousa sobre os rendimentos tributáveis anuais, isto é, outros rendimentos (isentos ou tributados exclusivamente na fonte) não são computados para determinação deste limite quantitativo, resultando numa limitação ainda mais estreita que aquela possivelmente atribuída, se considerados esses outros rendimentos.

Ademais, a limitação para os rendimentos tributáveis acarreta a impossibilidade de dedução das contribuições para os planos de previdência complementar para aqueles que não auferem rendimentos tributáveis, o que poderá ser tanto aqueles que estão abaixo da faixa tributável (segundo a tabela progressiva do imposto de renda) quanto os que aufiram rendimentos considerados isentos por sua natureza, tal como os lucros e dividendos e a aposentadoria recebida do regime geral da previdência social.

Por todas estas razões, observando-se exclusivamente as condições para dedução das contribuições para os planos de previdência complementar, pela pessoa física, verifica-se que, por existir uma limitação para tal desconto, sem que haja tal limitação para incidência do imposto no resgate de contribuições ou recebimento dos benefícios, não se alcança o almejado “diferimento fiscal”.

Ademais, mesmo que se tome como exemplo um indivíduo que contribua anualmente para o plano de previdência privada até o limite de 12% dos seus rendimentos tributáveis, é possível, como mencionado anteriormente, que as condições impostas para dedução das contribuições acarretem a vedação, total ou parcial, dos descontos desses valores, da base do imposto de renda devido no respectivo ano-calendário.